Intervenção de Carla Cruz na Assembleia de República

«É preciso garantir o reforço do SNS, gerido pelo Estado e assente na sua proximidade aos cidadãos»

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhores Membros do Governo,

O PCP promoveu o agendamento desta Interpelação ao Governo sobre a política de saúde porque a vida dos utentes, dos profissionais e o futuro do SNS exigem medidas concretas de defesa do SNS e de melhoria da sua qualidade.

O Serviço Nacional de Saúde é a única garantia do cumprimento do direito à saúde e da prestação de cuidados de saúde de elevada qualidade a todos os utentes independentemente da sua condição económica. Apesar da violenta ofensiva de que tem sido alvo por parte dos protagonistas da política de direita e dos defensores da ideologia do negócio da saúde, essa é a realidade e não é possível esconde-la, por muito que os grupos económicos privados e o PSD e o CDS se esforcem com as suas tentativas de denegrir o SNS.

A ofensiva contra o Serviço Nacional de Saúde visa abalar os pilares fundamentais do serviço público, como sejam a qualidade e segurança dos cuidados prestados, os quais são o seu garante de credibilidade. Atacando estes pilares, os grupos económicos e os seus representantes políticos pretendem aprofundar a privatização da saúde com o apoio financeiro do Estado e a promiscuidade entre setor público e setor privado.

É neste quadro que se insere a operação de chantagem lançada por alguns dos principais grupos privados da área da saúde contra a ADSE.
Operação montada na sequência da exigência feita pela ADSE para que os grupos privados devolvam os 38 milhões de euros que receberam indevidamente. Perante tal exigência, a resposta de dois grandes grupos foi rasgar os contratos com a ADSE e recusar-se a prestar cuidados de saúde, numa operação de chantagem sobre o Estado em que os doentes ficam em segundo lugar face ao objetivo desses grupos económicos manterem os milhões que receberam indevidamente.

Esta operação de chantagem deixa claro que não é o direito à saúde que move os grupos privados, mas sim transformar a doença em lucro! Assim como fica claro para quem dúvidas tivesse o que significa a chamada liberdade de escolha. Ou seja, com a liberdade de escolha, na prática, a saúde dos portugueses ficaria em segundo plano e nas mãos dos que fazem negócio com ela.
Por isso, a resposta que é necessária dar por parte do Governo para responder a tão poderosa e intensa ofensiva é não ceder à chantagem e reforçar o Serviço Nacional de Saúde!

O SNS está confrontado com problemas que, sendo da responsabilidade de sucessivos governos da política de direita, em particular de PSD/CDS, não foram ultrapassados por falta de compromisso do PS e, sobretudo, porque não foram concretizadas medidas importantes propostas pelo PCP e aprovadas na Assembleia da República, como as que estavam contempladas no Programa de Emergência para a Saúde.

O Serviço Nacional de Saúde precisa de uma aposta determinada e efetiva no investimento público que dê resposta às suas necessidades, designadamente, de modernização das suas infraestruturas e equipamentos e que trave e inverta a sua degradação.
A degradação das instalações dos hospitais do SNS resolve-se com a concretização das medidas contempladas no orçamento do estado, como as que preveem a construção de hospitais, em Évora, Seixal, Lisboa, Barcelos e Algarve. Assim como com investimentos na reparação e ampliação dos estabelecimentos hospitalares e dos cuidados de saúde primários.

A obsolescência dos equipamentos resolve-se com o aumento do investimento público, afetando verbas que estão disponíveis no orçamento do estado e de fundos europeus.
Não é admissível que um utente espere por uma consulta de neurologia 560 dias em Lamego, 535 dias em Leiria ou 220 dias no Hospital de Santo António no Porto. Assim como não se pode aceitar que os utentes esperem 784 dias na Guarda, 486 dias em Cantanhede, 444 dias em Lisboa no Hospital de Santa Maria ou 3895 dias em Portimão por consulta de oftalmologia. Ou ainda que os utentes para terem uma consulta de ortopedia tenham que aguardar 1090 dias em Faro, 10150 em Faro, 960 na Guarda.

O combate às listas de espera faz-se através da contratação de profissionais de saúde, com a abertura de vagas nos concursos para os hospitais que necessitam desses profissionais. E, se persistirem áreas geográficas em que as vagas ficam por preencher, então o Governo tem de fazer como o PCP tem proposto: criar incentivos, pecuniários e não só, que possibilitem a fixação dos profissionais nessas zonas.
As listas de espera para consultas e cirurgias são um obstáculo aos cuidados de saúde, como o são as taxas moderadoras e os critérios de atribuição de transporte não urgente de doentes. Estes obstáculos só persistem porque, mais uma vez, PSD e CDS deram ao PS e ao Governo o apoio que era preciso para chumbar as propostas que o PCP apresentou para remover tais obstáculos.

Há muitos doentes, sobretudo os doentes crónicos e idosos, que não conseguem comprar toda a medicação que necessitam. Também esta situação é inaceitável! Por isso, é necessário que sejam tomadas medidas para disponibilizar os medicamentos gratuitamente aos doentes crónicos com mais de 65 anos, como o PCP propõe.

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,
Sr. Membros do Governo,
Os profissionais de saúde são imprescindíveis para o SNS que, aliás, não existiria sem eles!
São importantes os avanços que foram já alcançados nesta legislatura, como a contratação de mais trabalhadores, a reposição de salários, das 35 horas semanais, o pagamento das horas de qualidade e o combate à precariedade. Medidas só possíveis graças à luta dos trabalhadores e à correlação de forças existente na Assembleia da República. Medidas, porém, criticadas e reprovadas por PSD, CDS!

Todavia, persistem problemas no descongelamento das progressões, continua por criar a carreira dos auxiliares de ação médica, assim como não há uma efetiva valorização e dignificação das carreiras entretanto criadas, designadamente, dos técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica.
Ao longo destes anos, os vários profissionais de saúde têm lutado e reclamado pela contratação de mais profissionais, pela valorização das carreiras e das respetivas grelhas salariais, bem como pelo justo descongelamento da progressão das carreiras.

As reivindicações dos profissionais de saúde são justas, convergem com as propostas do PCP e acolhem da nossa parte a maior solidariedade. A justeza dessas reivindicações e da luta para as alcançar em nada se confunde com outros processos controversos e perigosos, como o da greve às cirurgias, que visam objectivos alheios aos interesses de todos os enfermeiros e contribuem para atacar o Serviço Nacional de Saúde.

O que se exige é a resposta do Governo com a adopção de medidas que assumam os direitos dos profissionais como parte integrante da qualidade do SNS.
Não são admissíveis mais protelamentos na resolução dos problemas com o descongelamento das progressões!
Não são admissíveis mais protelamentos na valorização e dignificação das carreiras, nem na criação da carreira dos auxiliares de ação médica.
É preciso valorizar o trabalho e os trabalhadores da saúde, é preciso prosseguir-se todos os dias o combate à precariedade e atribuir vínculo público a todos os trabalhadores do SNS.

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,
Srs. Membros do Governo,

O PCP reconhece e valoriza todos os avanços conseguidos nestes anos e registamos que não se foi mais longe por responsabilidade e opção do PS e do seu Governo que em questões de grande relevância preferiram convergir com PSD e CDS para rejeitar as soluções propostas pelo PCP para os problemas do SNS! Mas foram, sobretudo, as opções do PS e do seu Governo de submissão às imposições da UE que impediram uma resposta cabal aos problemas do povo e do país e limitaram o investimento no Serviço Nacional de Saúde.

São essas opções e imposições externas que é preciso ultrapassar para que, no quadro de uma política alternativa, patriótica e de esquerda, se possa dar resposta aos profissionais de saúde, aos utentes e reforçar o SNS.

É preciso romper com a política de direita e com a ideologia do negócio da doença! Foram décadas de tais políticas que reduziram trabalhadores, acabaram com carreiras específicas, substituíram trabalhadores com vínculos por trabalhadores precários. Transformaram hospitais em empresas, transferiram doentes e recursos financeiros para os grandes grupos económicos que operam no sector da saúde e puseram empresas a gerir unidade hospitalares em função do lucro, secundarizando a missão de garantir a saúde de todos os cidadãos.

Foram anos destas opções de direita que fragilizaram o Serviço Nacional de Saúde e promoveram a insatisfação dos profissionais.
É esta a política que PSD e CDS querem prosseguir! É a esta política que se tem que dizer basta!

É preciso garantir o reforço do SNS! Um SNS gerido pelo Estado, assente na sua proximidade aos cidadãos, garantindo que não exista qualquer entrave na acessibilidade, com profissionais em número adequado, devidamente valorizados e motivados, com equipamentos renovados e atualizados e com instalações que garantam a prestação de cuidados de saúde em qualidade e em segurança.

É este o sentido desta interpelação. É este o sentido das propostas apresentadas pelo PCP.
Andar para trás, não! O caminho é avançar na defesa e na melhoria da qualidade do SNS!

Disse.

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