Projecto de Lei

Determina o cancelamento e a reversão do processo de reprivatização indireta do capital social da TAP, SGPS, S. A.

Determina o cancelamento e a reversão do processo de reprivatização indireta do capital social da TAP, SGPS, S. A.

Os últimos quatro anos caracterizaram-se por um longo processo de desestabilização da TAP, da responsabilidade do Governo PSD/CDS. Um processo que implicou duas tentativas de privatização, a primeira falhada em 2012 e a segunda a ser lançada com as eleições à vista, como parte integrante da campanha eleitoral, mas que ainda não se concretizou.

Foram quatro anos marcados por uma sucessão de mentiras e chantagens, com o Governo a alimentar uma permanente campanha de desvalorização da TAP ao mesmo tempo que a tentava oferecer ao grande capital.

O que o Governo do PSD/CDS fez à TAP e ao país foi um autêntico crime de proporções gigantescas e de consequências dramáticas, ainda não totalmente contabilizáveis:

- Impôs-lhe restrições à livre contratação de trabalhadores, que se traduziram numa enorme e perigosa saída de trabalhadores altamente qualificados - nomeadamente de técnicos de manutenção e pilotos - e criaram a necessidade de deslocalizar muito do trabalho de manutenção para o Brasil.

- Impôs-lhe restrições no acesso ao crédito, que levaram a uma crescente degradação da situação financeira da empresa, nomeadamente criando a necessidade de reestruturação da dívida da TAP.

- Suspendeu a renovação da frota da Portugália, desarticulando a solução que estava encontrada.

- Impôs uma política suicida no verão de 2014 (com uma oferta superior à capacidade de resposta da companhia) e perante a greve de abril de 2015 (apostando no confronto e na ampliação dos seus efeitos sobre os clientes) degradou muito o prestígio que a TAP ganhou ao longo dos anos, e que custou já largas dezenas de milhões de euros.

- Ao mesmo tempo que justificava com o segredo comercial o facto de esconder da Assembleia da República e dos Trabalhadores os sucessivos relatórios de avaliação da companhia e os documentos dos processos de privatização, mandava a companhia revelar, sucessivamente, toda a sua informação comercial e estratégica aos concorrentes mais diretos da mesma, facto que explica a existência de tantos «interessados» que nem sequer entregaram propostas, e se limitaram a estudar toda a informação interna da companhia.

Quatro anos depois, quatro anos de profunda e sucessiva desestabilização, a TAP ainda sobrevive graças aos seus trabalhadores e ao imenso património que representa. Mas o seu futuro depende da imediata travagem desta privatização, do abandono definitivo da tentativa de privatizar a TAP e da adoção urgente de um plano «Em defesa da TAP!».

A forma como o Governo desenvolveu o processo de privatização da TAP trouxe ainda novas e acrescidas razões para travar este processo.

Desde logo, o Governo pautou a sua atividade por uma opacidade extrema, recusando o acesso, até à Assembleia da República, de toda a documentação de avaliação da companhia, dos planos estratégicos dos grupos concorrentes, dos termos finais dos contratos assinados. Em vez de transparência, o Governo assentou a discussão pública nas suas próprias declarações, mentindo umas vezes, escondendo outras, deturpando sempre.

A forma como em 24 horas se produziram relatórios de avaliação das propostas apresentadas pelos diversos concorrentes deixaram claro que os diversos pareceres (Administração da TAP, Parpública, etc.) eram apenas formalismos para um negócio arrumado noutro local e com objetivos espúrios. A forma como o Governo procedeu à nomeação do Conselho de Administração da ANAC descredibilizou completamente esta «Autoridade», e ajuda a perceber que perante a flagrante violação dos Regulamentos Europeus, a ANAC tenha optado por enviar recomendações de como poderiam simular cumprir esses regulamentos em vez de reconhecer essa não conformidade e as implicações daí decorrentes à luz do direito comunitário.

Por último, e nestas questões formais, importa destacar aquilo que se conhece do negócio firmado entre o Governo e a Atlantic Gateway (David Neeleman e Humberto Pedrosa). Desde logo, o preço ridículo acertado, de 10 milhões de euros, só possível pela artificial desvalorização dos ativos da companhia e pelo ignorar de muitos desses ativos: o Governo ignorou o valor dos "slots" da TAP em alguns dos principais aeroportos do mundo, muitas delas avaliadas em mais de 10 milhões; o Governo ignorou o valor das opções de compra dos novos Airbus 350, avaliada em centenas de milhões de euros; o Governo escondeu que a companhia possui ativos suficientes face ao seu passivo.

Para o PCP não há nem haverá um preço bom para a TAP. Mas vender o maior exportador nacional por menos de 10% do valor de um dos seus 71 aviões é chocante. Como é chocante pensar que o que Humberto Pedrosa vai pagar, de facto, pela TAP é quase metade do perdão de dívida conseguido com um único despacho da Secretaria de Estado dos Transportes em Agosto de 2015. Como é chocante saber que a TAP comprou a Portugália, ou vendeu os 49% das Lojas Francas de Portugal, ou os 49% da Cateringpor, ou os 50,1% da SPDH, por mais dinheiro, em qualquer desses negócios, do que o Governo vende agora o Grupo TAP, com a TAP, a Portugália, os 51% das Lojas Francas, os 51% da Cateringpor e os 49,9% da SPDH.

A ação do Governo PSD/CDS foi tal que o levou a ignorar todas as lições dadas pelo anterior processo de privatização da TAP. Em 1998, o processo de privatização foi abortado face à falência do «comprador» da TAP, a Swissair, e acabou por provocar prejuízos à TAP de centenas de milhões de euros. Nessa altura também se afirmava que a «a TAP ou era privatizada ou desaparecia», e afinal teria desaparecido se a privatização estivesse concluída, e não se privatizando continuou a crescer. É sempre importante recordar as lições do processo de 1998, mas essa importância cresce face às recentes notícias vindas do Brasil que confirmam um quadro de enorme dificuldade financeira da empresa (a Azul) a quem o Governo quer oferecer a TAP, empresa que está à beira da falência e dependente de eventuais apoios do Governo brasileiro para sobreviver, e quando algumas notícias falam já até de que terão sido reivindicados mais apoios ao próprio Governo português.

Este processo de privatização está a provocar a destruição da TAP. A destruição do maior exportador nacional. A destruição do maior contribuinte para a Segurança Social nacional (mais de 100 milhões de euros ano). A destruição de um grupo que paga mais de 600 milhões de euros de salários em Portugal, gerando por essa via mais de 100 milhões de euros de IRS e uma importante dinamização económica. A destruição de uma empresa estratégica, fundamental para o sector do turismo e para o desenvolvimento soberano do país.

As garantias acrescidas dadas pelo Governo, na Resolução do Conselho de Ministros n.º 90/2015, de 23 de outubro, constituem um ato absolutamente inaceitável de um governo de gestão, que compromete o Estado em mais de 500 milhões de euros, e representam a prova final de que estamos perante a oferta da TAP e não perante qualquer venda: na prática, a dívida da companhia continuará no limite a ser responsabilidade do Estado, com este a dar a este grupo económico o aval que recusou à empresa pública.

Este processo tem que ser travado. O mais depressa possível. Abrindo caminho a uma política radicalmente diferente, que apoie a TAP em vez de a desestabilizar e tentar destruir, que promova o emprego de qualidade em Portugal, em vez de promover a deslocalização de atividades e a emigração. É nesse quadro, que respondendo a uma necessidade imperiosa e a um compromisso formal assumido com os trabalhadores e o povo português, que o PCP apresenta este projeto de lei que anula o processo de privatização em curso na TAP.

Travado este processo, é preciso construir ainda o caminho para a resolução dos restantes problemas da TAP. Um caminho assente numa gestão pública vinculada aos interesses nacionais – conforme o PCP propôs na Assembleia da República, com o Projeto de Resolução N.º 1150/XII – tomando medidas para defender e melhorar o funcionamento e operacionalidade da TAP, libertando as empresas públicas das absurdas restrições à gestão atualmente impostas, apoiando a TAP na resolução do problema da ex-VEM, agora designada Manutenção Brasil, investindo na Manutenção da TAP, modernizando-a, alargando os quadros de pessoal e as instalações, acabando com a instabilidade no Handling/Assistência em Escala e reforçando a ligação da SPdH à TAP, resolvendo as necessidades de capitalização da TAP e acabando com o favorecimento e financiamento público às companhias concorrentes à TAP.

Porque não se trata apenas do muito que se coloca em risco com a privatização do Grupo TAP. Trata-se igualmente do muito mais que este pode dar ao país se devidamente apoiado. É urgente inverter uma política fixada no objetivo de privatizar o Grupo TAP, e antes considera-lo como o ativo estratégico que é, e apoiá-la de todas as formas necessárias. A privatização da TAP é um velho objetivo que as multinacionais europeias têm tentado impor ao nosso país, num quadro de concentração monopolista que está a ser imposta aos povos da Europa, num processo mais vasto que é a causa e não a solução dos problemas nacionais. É tempo de mudar de rumo.

Assim, ao abrigo da alínea b) do Artigo 156.º da Constituição da República e da alínea b) do número 1 do Artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º
Objeto
A presente lei determina o cancelamento e a reversão do processo de privatização da empresa TAP, SGPS, SA.

Artigo 2.º
Norma revogatória
São revogados o decreto-lei n.º 181-A/2014, de 24 de dezembro e o decreto-lei n.º 210/2012, de 21 de setembro.

Artigo 3.º
Entrada em vigor

A presente lei entre em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

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