Intervenção de Bernardino Soares, Presidente do Grupo Parlamentar

Conclusões das Jornadas Parlamentares do PCP na Guarda

Para estas Jornadas Parlamentares do PCP na Guarda, escolhemos como tema central a política de saúde. É uma das áreas onde a política do Governo mais está a pôr em causa os direitos dos portugueses.

O Governo está a diminuir progressivamente a oferta e a capacidade de serviços públicos de saúde. Sob a falsa capa de uma reorganização que mais não é do que uma concentração de serviços, o Governo vai deixando sucessivamente populações sem o acesso aos cuidados de saúde a que têm direito.

Não há na política de encerramentos sistemáticos qualquer verdadeiro intuito de reorganização e muito menos de requalificação. A redução da rede de serviços de saúde é certamente uma consequência da obsessão de corte cego na despesa pública que orienta este governo, aliás como os anteriores. Mas é também, e afirmamo-lo sem hesitação, uma orientação política articulada com os interesses do sector privado, que tem em aplicação planos concretos de multiplicação das suas unidades, cuja rendibilidade depende do aproveitamento das carências e do encerramento dos serviços públicos.

Entretanto são as populações quem paga o preço desta política, conforme pudemos confirmar nos encontros com as Comissões de Utentes. Vejamos o que acontece neste distrito. Um distrito com uma geografia e uma demografia especialmente exigente, com carências enormes no âmbito dos cuidados de saúde, com populações em muitos casos envelhecidas e em que o Governo pratica uma política de restrição economicista.

É o caso da ameaça de encerramento de sete Serviços de Atendimento Permanente, momentaneamente suspensa, não sabemos se apenas pela contestação das populações e de algumas autarquias, se também por realizarmos estas Jornadas sobre a saúde neste distrito. Este Governo, tal como os anteriores, não tem qualquer preocupação específica com a colocação de profissionais no interior e, no caso específico da medicina geral e familiar, os médicos de família, não tem qualquer política que de forma significativa inverta a grave carência que o país tem nesta especialidade.

Na questão da maternidade da Guarda e em geral das três maternidades da Beira Interior continua a incerteza sobre a sua manutenção. O Governo procura esconder a sua responsabilidade política atirando supostamente a decisão para o centro hospitalar que se prevê constituir com os três hospitais. Mas a verdade é que o encerramento destas maternidades e em concreto da maternidade da Guarda, constituiria um sério revés na garantia dos cuidados de saúde para as populações desta região.

Sobre o Hospital Sousa Martins destaca-se ainda o adiamento da resolução do problema das instalações, que tem levado a uma degradação crescente e ainda recentemente ao encerramento, durante alguns dias, de salas do bloco operatório, onde aliás chove desde a inauguração do edifício em 1998. Neste hospital o trabalho precário assume já um peso considerável, de que é exemplo a existência de 10% de contratos a prazo no pessoal de enfermagem, a maioria com a duração de três meses.

No Centro de Saúde de Gouveia aguarda-se a passagem para as novas instalações ainda por concluir e equipar, desejando-se a existência de outras valências médicas e uma correcta utilização das camas de internamento.

A política do Governo visa igualmente a crescente transferência de custos com a saúde para os utentes. Isso acontece cada vez mais por exemplo no caso das consultas de especialidade cirurgias e tratamentos em que a existência de sérias dificuldades de acesso aos serviços públicos obriga tantos portugueses, muitas vezes com um grande esforço financeiro, a ter de recorrer ao sector privado. A isto se acrescentam as sucessivas diminuições das comparticipações, a insuficiência de utilização dos medicamentos genéricos, a manutenção de preços excessivos, por vezes até em violação das regras legais consentida pelo Governo, a criação de regras que vão encarecer os novos medicamentos e o aumento das taxas moderadoras.

As Jornadas Parlamentares do PCP decidiram assim pela apresentação de três iniciativas legislativas na área da saúde:

- uma iniciativa que prevê a transformação das funções de farmácias hospitalares públicas, de forma a poder dispensar medicamentos aos utentes dos hospitais com preço diminuído ou comparticipação acrescida, aproveitando as possibilidades de compra por preços mais baixos que existem nos hospitais e permitindo uma baixa dos custos quer para o Estado quer para os utentes, proibindo a concessão a privados que o Governo prepara,

- a criação de um fundo de investimento público para investigação científica na área do medicamento, para apoio de projectos públicos e privados, designadamente de instituições e da indústria nacional;

- a proibição da aplicação de taxas moderadoras ou de pagamentos de qualquer tipo no Serviço Nacional de Saúde.

Para além disso as Jornadas Parlamentares do PCP decidiram pela marcação durante o mês de Janeiro de uma Interpelação ao Governo sobre a política de saúde.

O início do próximo ano será novamente marcado por significativos aumentos de preços. A par dos aumentos que ocorrem ciclicamente em Janeiro de cada ano e que atingem os preços de bens de consumo essenciais, diversos outros estão já anunciados, entre os quais os dos transportes públicos (2,1%), com perspectiva de outros aumentos durante o ano e da energia eléctrica (5,9%). No plano dos custos com a saúde com as políticas já definidas, que por exemplo significam um incremento de 24% nos pagamentos de taxas moderadoras. Mas há mais. Por via de uma nova lei das rendas, aprovada pela maioria PS associada à direita, serão de esperar em 2007 aumentos significativos das rendas para a habitação (pelo menos entre 3% e 4%). As portagens em auto-estrada sofrerão um agravamento da ordem dos 3,1%. Tudo isto a juntar aos agravamentos das taxas de juro.

As Jornadas Parlamentares do PCP decidiram por isso propor o agendamento em Janeiro de um debate de interesse relevante sobre o aumento do custo de vida e o agravamento das injustiças sociais que provoca.

O desenvolvimento económico da região está fortemente condicionado, fruto da adopção de políticas que votam o interior do País ao isolamento. As pequenas e médias empresas industriais e agrícolas vêm a sua actividade limitada pela falta de acessibilidades e são as mais afectadas pelas opções económicas de direita dos sucessivos governos.

Os custos cada vez mais insuportáveis da energia, as dificuldades de financiamento e do recurso ao crédito pelos sectores produtivos, as consequências da introdução do Euro e de uma política de moeda forte, os problemas do escoamento e da comercialização de produtos dificultam, com particular gravidade, o desenvolvimento de micro, pequenas e médias empresas nesta região, provocando uma desertificação tão evidente quanto inaceitável.

As visitas à Beira Lã e à Adega Cooperativa Vila Nova de Tázem permitiram confirmar esta realidade.

Na visita à empresa Delphi, que emprega hoje 1024 trabalhadores directos num total de 1240 (empregava 2900 em 1998), foi manifestada a necessidade de defender a continuidade da empresa tendo em conta o seu peso na região e em particular na Cidade da Guarda.

Na reunião realizada com os eleitos da Junta e da Assembleia de Freguesia de Almeida foi particularmente sublinhado, com grande preocupação, o efeito negativo nas zonas transfronteiriças resultante das diferenças existentes no plano fiscal, designadamente de diferença do IVA que conduzem a uma crescente procura de produtos no mercado espanhol com consequências nefastas para a economia local.

Durante os encontros com a União dos Sindicatos foi também evidenciada a situação do Centro Nacional de Arte Rupestre e dos seus trabalhadores, que denuncia as consequências da política economicista do Governo, também na área da cultura que tendo extinto o Instituto Português de Arqueologia deixou agora em desamparo e em situação precária os trabalhadores deste Centro e do Parque Arqueológico do Vale do Côa.

Estas regiões, como outras no interior do País, estão igualmente sujeitas a um decidido e intensivo processo de redução e encerramento de serviços públicos e às consequências extremamente negativas para as populações e a economia da privatização e liberalização e consequentes reestruturações espaciais e orgânicas da EDP, CTT, PT, RN, BRISA, CP, Empresas de Imprensa, Rádio e Televisão) com fecho de delegações e agências locais e regionais e de serviços. Os recentes orçamentos de Estado, de que o acabado de aprovar para 2007 é um exemplo paradigmático, traduzem e traduzir-se-ão na não concretização dos investimentos de que estas regiões necessitam em matéria de infra-estruturas públicas e a dinamização do investimento produtivo.

O Distrito da Guarda, para além das dificuldades e assimetrias que o caracterizam desde há muito, tem sido profundamente marginalizado no processo de investimento público. Para o ano de 2007 conta apenas com 1,63% das verbas do PIDDAC e só aproveita 0,32% do crédito concedido, apesar de ter quase 1,9% da população nacional e 2,2,% dos depósitos a prazo.

Neste quadro o Grupo Parlamentar do PCP decidiu apresentar - através de um Projecto de Resolução - a Proposta de adopção de um Plano Integrado de Desenvolvimento do Distrito da Guarda. Este Plano terá como objectivos:

- O combate à desertificação com o aproveitamento racional dos recursos endógenos e o apoio financeiro e técnico à modernização das micro, pequenas e médias empresas, industriais e comerciais.

- A salvaguarda das indústrias tradicionais (têxteis e calçado, indústria da pedra, madeiras, pequena metalurgia).

- O acompanhamento regular das empresas susceptíveis de deslocalização, nomeadamente as multinacionais, de modo a prevenir eventuais encerramentos e respectivos efeitos sociais.

- A implementação de medidas de apoio diversificado, incluindo de natureza fiscal, de modo a fomentar a fixação e instalação de novas fileiras produtivas e indústrias de média dimensão, não poluentes.

- A concretização de uma Operação Integrada de Desenvolvimento para a Corda Serra, que defenda e apoie a modernização do sector têxtil e promova a criação de mais postos de trabalho.

- A elevação dos salários reais e o combate às práticas económicas baseadas nos baixos salários, na exploração e no trabalho sem direitos.

- A dinamização do mundo rural na sua vertente agrícola e paisagística, económica e cultural, nomeadamente nas áreas do vinho, da pastorícia, dos queijos, do azeite e dos frutos secos.

- A concretização de investimentos estruturantes na rede ferroviária e rodoviária e de uma rede de transportes públicos como complemento importante da actividade económica e instrumento indispensável para vencer o isolamento e as assimetrias internas.

- A definição de prioridades de construção, remodelação e beneficiação da rede viária inter-concelhia e inter-regional (escassa e de má qualidade), decisiva para gerar sinergias e valor induzido nas trocas comerciais, fomentando a coesão social e económica interna.

- A promoção de um Plano de emergência em defesa da actividade económica da região raiana, que aproveite as potencialidades e previna os efeitos negativos que resultam da proximidade a uma economia mais desenvolvida e beneficiada comparativamente em termos fiscais e de apoios estatais e comunitários.

- A implementação, urgente e rigorosa, dos Planos de Ordenamento do Parque Natural da Serra da Estrela, do Douro Internacional e da Serra da Malcata, dando especial atenção à salvaguarda do património natural e ambiental.

- A promoção de um Plano Estratégico de Desenvolvimento Turístico articulando o potencial da Serra da Estrela com o património histórico do Distrito e potenciando as suas riquezas naturais, gastronómicas e culturais.

- A garantia de serviços de qualidade e proximidade e a devolução ao Distrito os serviços que os sucessivos governos lhe vêm retirando, implementando uma discriminação positiva, como instrumento de combate à desertificação.

Os aumentos do IVA decididos pelo Governo PSD/CDS-PP, Durão Barroso e pelo actual Governo PS, José Sócrates provocaram uma situação insustentável para a generalidade dos agentes económicos localizados nas zonas nacionais na fronteira com Espanha. A situação atinge particularmente pequenas e médias empresas do retalho comercial e postos de venda de combustíveis incapazes de vencer em termos de custo da sua actividade, o diferencial médio de IVA de 5 pontos percentuais (21% em Portugal e 16% em Espanha) favorável aos seus concorrentes espanhóis. Os valores mais elevados do IVA nacional agravam os diferenciais também desfavoráveis aos cidadãos portugueses (consumidores e empresários) dos custos mais elevados da energia.

Na resposta a estas questões o Grupo Parlamentar do PCP vai apresentar uma iniciativa de um verdadeiro Plano de Emergência em Defesa da Actividade Económica das Regiões Raianas, com medidas económicas e financeiras que permitam atenuar os diferenciais de competitividade, um programa de investimentos públicos prioritários na fronteira, uma particular atenção às áreas protegidas, a manutenção de uma rede de serviços públicos e a garantia de delegações locais e serviços das empresas de energia, serviço postal, telecomunicações, órgãos de informação e transportes públicos.

O salário mínimo nacional cujo poder de compra foi fortemente diminuído ao longo dos anos precisa de ser significativamente valorizado como factor de justiça social, de combate à pobreza e de elevação do perfil produtivo do país.

Há cerca de um ano a CGTP-IN propôs a fixação do valor do salário mínimo nacional em 500€, em 2010, proposta que foi qualificada pelo Primeiro-Ministro, em 2005, de "absolutamente demagógica e fantasista".

Passou pouco tempo e o governo e as associações patronais foram obrigadas a aceitar o princípio da valorização do salário mínimo nacional com a sua fixação em 403€ em 2007 e a adopção de valores mínimos de 450€ em 2009 e 500€ em 2011.

Constituindo um aumento insuficiente, tendo em conta o agravamento do custo de vida e os 410€ propostos pelo PCP para 2007, os valores decididos representam uma evolução importante que resulta da força da luta dos trabalhadores, designadamente da expressa no protesto geral de 12 de Outubro e na acção nacional de 25 de Novembro.

O PCP insistirá no caminho de valorização do salário mínimo nacional para que sejam assegurados os valores mínimos agora referidos e para que se processe o seu aumento significativo, levando em conta, entre outros factores, o salário médio nacional e a aproximação aos níveis praticados em outros países europeus.

Entretanto o PCP e também os seus Deputados terão um forte empenhamento na campanha para o referendo sobre a despenalização da Interrupção Voluntária da Gravidez, contribuindo para o esclarecimento e para a vitória do SIM, com vista a uma alteração da lei que ponha fim à indigna lei que trata como criminosas e combatendo o grave problema de saúde pública que é o aborto clandestino.

As Jornadas Parlamentares do PCP decidiram apresentar um conjunto de outras iniciativas:

Apresentaremos um Projecto-Lei de alteração ao regime de selecção e recrutamento de docentes da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário actualmente em vigor.

Entre outros aspectos a ter em conta, o PCP considera fundamental a definição de um modelo de concurso de carácter anual, só admitindo a plurianualidade da colocação quando em ligação com o regime de incentivos à fixação de docentes em zonas desfavorecidas ou isoladas. Deve ser garantida a estabilidade do corpo docente, o alargamento dos quadros, adequando-os às necessidades das escolas, e a abertura de vagas, com particular atenção para as exigências da educação especial. O respeito pela graduação profissional nas várias fases do concurso, a previsão de mecanismos adequados e rigorosos para o destacamento e a criação de mecanismos de vinculação dos docentes contratados são igualmente preocupações a ter em conta.

Decidimos apresentar um Projecto de Lei sobre o Estatuto dos Jornalistas que garanta a justa retribuição dos seus direitos de autor, pondo termo à reutilização abusiva dos seus trabalhos por decisão unilateral do patronato, e que salvaguarde direitos, liberdades e garantias dos jornalistas, garantindo designadamente a inviolabilidade do sigilo profissional sobre as fontes de informação.

As recentes noticias e dados oficiais confirmam as preocupações manifestadas pelo PCP desde Julho de 2005. A utilização do nosso espaço aéreo para o sequestro de suspeitos para campos de detenção ilegais e posterior tortura constitui uma acto gravíssimo. Face à sistemática recusa de uma cabal investigação sobre a actividade da CIA em Portugal e face a um comportamento que aponta para a conivência dos Governos, o Grupo Parlamentar do PCP vai apresentar um projecto de resolução que tem como objectivo o total esclarecimento dos factos e o apuramento das responsabilidades políticas, ouvindo nomeadamente o Secretário Geral dos Serviços de Informações.

Tendo analisado a questão energética, o Grupo Parlamentar do PCP apresentará na Assembleia da República um Projecto de Resolução que propõe a subscrição do Protocolo do Esgotamento, que responda às necessidade de regulação da utilização das reservas mundiais de petróleo sob risco de atingir o valor máximo da capacidade de extracção e iniciar uma curva descendente e um Projecto Lei que limita o aumento das tarifas e preços da venda da electricidade aos consumidores domésticos e industriais.

Decidimos também apresentar um Projecto de Lei que garanta mecanismos de efectivo controlo democrático da actividade dos Serviços de Informações em face da inutilidade e ineficácia do actual sistema de fiscalização. Tais mecanismos deverão garantir a possibilidade de a Assembleia da República fiscalizar directamente a actividade dos serviços com garantias de segurança e confidencialidade do acesso a matérias classificadas.

Apresentar um projecto de lei no sentido de consagrar a igualdade no acesso ao regime de subsídio ao preço do bilhete público no transporte aéreo, eliminando as actuais discriminações em função da nacionalidade dos passageiros residentes nas regiões abrangidas (designadamente nas regiões autónomas).

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