1921/2021100 anos de luta
Fundado a 6 de Março de 1921, o Partido Comunista Português cumpre agora 100 anos de vida.
Assinalando o acontecimento, edita-se a obra intitulada «100 anos de luta ao serviço do povo e da pátria pela Democracia e o Socialismo», que constitui um importante documento de registo de alguns momentos e acontecimentos marcantes da vida do PCP e da sua história.
Assinalam-se também traços específicos de caracterização das múltiplas dimensões desta intensa intervenção.
Não foi possível, naturalmente, incluir nela todos os elementos da luta popular e da história do PCP ao longo de 100 anos. Houve necessidade de seleccionar documentos e momentos, que, embora não resultando de um levantamento definitivo, representam um valioso e significativo contributo para o conhecimento desse riquíssimo período da nossa história nacional.
Optou-se por uma periodização balizada por acontecimentos marcantes na vida do PCP, entre 1921 e 2021.
Na abordagem, quer cronológica quer temática, adoptaram-se os critérios que presidiram à elaboração da obra editada aquando do 60.º aniversário do PCP, incluindo uma síntese do texto referente ao período de 1921 a 1981.
De qualquer modo, não se trata de fazer a história do PCP. Trata-se, isso sim, de uma compilação de elementos significativos da sua vida, indissociável da luta dos trabalhadores e do povo português e da afirmação do seu ideal e projecto.
19211926 A formação do PCP
A fundação do PCP, em 6 de Março de 1921, não foi fruto do acaso nem de uma decisão arbitrária. Foi a expressão de uma necessidade histórica da sociedade portuguesa. Foi o resultado da evolução do movimento operário português ao atingir um determinado estádio de desenvolvimento. Foi também a expressão nacional das grandes conquistas teóricas e práticas do movimento operário mundial na época da liquidação do sistema capitalista e da transição revolucionária para o socialismo.
A história do PCP tem as suas raízes na história do povo português e é parte integrante e fundamental dessa história.
Capitalismo e proletariado
A formação do proletariado português está ligada ao desenvolvimento do capitalismo, impulsionado com as vitórias da burguesia na revolução liberal de 1820 e na guerra civil de 1832/35.
A partir de meados do século XIX, e apesar do atraso das estruturas económicas e sociais, o desenvolvimento do capitalismo processa-se a um ritmo crescente ao longo de todo este século. Os bancos ganham importância (1); surgem os primeiros grupos capitalistas e os primeiros complexos industriais (2); criam-se grandes concentrações capitalistas com forte participação de capital estrangeiro.
Cada passo no desenvolvimento do capitalismo faz nascer novas e maiores camadas de trabalhadores (3). É elevadíssima a percentagem de mulheres e de menores nas fábricas. O nível dos salários rasa a miséria. Os horários de trabalho atingem 16 e mais horas diárias.
São enormes as taxas de mortalidade, os acidentes, a tuberculose, a prostituição. O analfabetismo atinge os 90%. É no meio dos sofrimentos gerados pela acumu lação capitalista primitiva que nasce a nova classe social – o proletariado –, a única força capaz de construir uma vida melhor para todos os portugueses.
Nasce o movimento operário
Os operários sentem na miséria e na fome a mão pesada da exploração e unem-se num movimento operário organizado que tem, na segunda metade do século XIX, forte expressão. Os acontecimentos da Comuna de Paris de 1871 dão-lhe novo alento.
Em 1872 é fundada em Lisboa a Associação Fraternidade Operária, que nesse mesmo ano abre uma secção no Porto (4). No mesmo ano, ocorrem as primeiras greves operárias (5) e, em 1875, é criado o Partido Socialista Operário Português. A imprensa operária tem já então ampla divulgação e importante papel (6).
A questão colonial
Com a independência do Brasil (1820) Portugal vê-se, pela primeira vez depois do século XVI, perante o desafio de contar principalmente com os seus próprios recursos. Uma corrente da burguesia nacional, com Mouzinho da Silveira, tenta solucionar o problema reformando e desenvolvendo a economia.
As classes dominantes procuram em África um substituto para a perda do Brasil. O colonialismo torna-se um dos factores do lento desenvolvimento económico português.
Ao longo da segunda metade do século XIX intensifica-se o processo de partilha do continente africano pelas grandes potências. Portugal entra em conflito com a Inglaterra, Alemanha, França e Bélgica (7).
Imposta a submissão dos interesses coloniais portugueses aos das grandes potências europeias, a burguesia portuguesa, confinada no essencial a Angola e Moçambique, leva então a cabo guerras sanguinárias para esmagar a resistência dos povos africanos e «pacificar» o Império que lhe restou da partilha colonial (8).
O movimento republicano
Na década de 70 do século XIX aparece em força um movimento republicano de oposição à monarquia (9). Em 1873 é fundado o Centro Republicano, em 1876 o Partido Republicano e dois anos depois é eleito o primeiro deputado republicano. Em 31 de Janeiro de 1891 dá-se, no Porto, a primeira revolta republicana e, apesar da repressão, o movimento republicano prosseguiu a sua expansão, realizando grandes acções de massas. Nas eleições de Agosto de 1910 os republicanos obtêm a maioria em Lisboa (com 10 deputados) e mais 4 deputados por outros círculos.
Este longo processo de luta contra a monarquia e a sua política ultrapassada e corrupta culmina na revolta militar e civil iniciada em 4 de Outubro, que alastra a todo o país. A República é implantada em Portugal no dia seguinte.
A República
A implantação da República dá um forte impulso à intervenção popular, desenvolvendo-se rapidamente o movimento operário e sindical. Apesar de medidas de modernização e democratização da sociedade (descanso semanal obrigatório, leis sobre a liberdade de imprensa, família, divórcio, inquilinato, reforma do ensino e separação da Igreja do Estado), a acção dos governos republicanos não corresponde às esperanças, entusiasmo e apoio que as massas trabalhadoras deram à República (10). Algumas medidas só são alcançadas após grandes lutas operárias; outras, não são tomadas; e várias não são respeitadas pelo patronato nem a este impostas pelos governos republicanos que, por outro lado, tomam medidas repressivas contra os trabalhadores (11).
O ascenso do movimento operário
Um forte e combativo movimento operário regista 247 movimentos grevistas até ao final de 1911. O Congresso Sindical de Tomar (1912) assinala uma viragem no movimento operário com a vitória do sindicalismo revolucionário sobre o reformista. Em 1914 é criada a União Operária Nacional que edita o quinzenário União Operária e a União das Juventudes Sindicalistas que edita O Despertar. No movimento operário português desaparece a influência do Partido Socialista, que desenvolve uma acção predominantemente parlamentarista, prega a conciliação de classes e é continuamente agitado por conflitos internos.
Contra a guerra e a ditadura
Apesar do movimento operário português se ter pronunciado contra a participação de Portugal na guerra imperialista (Tomar, 1914), em 1916 Portugal entra na Grande Guerra. Sobe o custo de vida e recrudescem as lutas operárias contra a carestia e contra a ditadura de Sidónio Pais (greve geral de Novembro de 1918, que reprime) (12). Vítimado Sidónio Pais num atentado, o seu regime desagrega-se.
Surto revolucionário
Em Setembro de 1919, as organizações sindicais reforçam a sua organização com a criação da Confederação Geral do Trabalho (CGT). Começa a publicar-se o jornal A Batalha. No mesmo ano, e nos seguintes, os trabalhadores rurais lutam vigorosamente pela jornada de 8 horas. Em Junho, realiza-se uma greve geral pela liberdade de associação e em Novembro nova greve geral de 48 horas contra a carestia. Em 1920 ocorrem duas greves gerais, contra a carestia e a repressão.
Apesar dos progressos realizados neste período, falta à classe operária um partido revolucionário de classe, que defina com clareza a sua missão histórica, congregue todos os explorados e oprimidos à sua volta e transforme o descontentamento popular em acção política consequente.
A Revolução de Outubro
Também em Portugal a Revolução Socialista de Outubro encontra eco entre os sectores mais esclarecidos da classe operária, que lhe prestam apoio solidário. Em 1919 é fundado o Conselho de Propaganda Social, para a defesa e propaganda da Revolução de Outubro.
Aparecem as primeiras publicações portuguesas de divulgação e defesa das conquistas da Revolução, nomeadamente a Bandeira Vermelha, publicada pela recém-criada Federação Maximalista, que pela sua acção de di vulgação dos objectivos e realizações da Revolução de Outubro contribuiu para o início duma nova etapa do movimento operário português. Em 1921 é criada a Associação dos Amigos da Rússia. A classe operária toma a vanguarda nas lutas revolucionárias que abalam a sociedade portuguesa no pós-guerra.
Formação do PCP e primeiros passos na luta
É neste contexto que se forma o Partido Comunista Português: a 6 de Março de 1921 realiza-se a Assembleia que elege a sua direcção (13). Com a fundação do PCP, a classe operária portuguesa encontra a sua firme e segura vanguarda (14).
Logo após a sua constituição, a «Junta Nacional» do PCP (designação então dada ao seu organismo dirigente) realiza uma série de reuniões. Em pouco tempo atinge-se o milhar de filiados.
Num Manifesto em que faz a sua apresentação pública, o PCP publica os 21 pontos da Internacional Comunista, que constituem a sua base política, afirmando assim também a sua adesão ao Movimento Comunista Internacional (15).
Pouco depois forma-se também a Juventude Comunista.
Em fins de 1921, numa reunião conjunta do Partido e da Juventude, assenta-se no início da edição dos primeiros órgãos comunistas em Portugal.
Ainda em 1921, inicia-se a publicação de O Comunista, órgão do Partido, e, em 1922, de O Jovem Comunista, órgão da Juventude.
Uma das mais importantes frentes de acção dos comunistas neste período é a sua luta dentro das organizações sindicais para dar uma justa orientação à luta dos trabalhadores e para a adesão do movimento sindical português à Internacional Sindical Vermelha (ISV).
Sob a condução dos comunistas organizam-se núcleos sindicalistas revolucionários, com uma correcta posição de classe que obtém a adesão de muitos sindicatos.
Com a criação e acção do PCP acelera-se a necessária clarificação das tendências do movimento operário (16). É dado um importante impulso à consciencialização e desenvolvimento político das massas trabalhadoras. Mas as dificuldades desta luta são grandes. O nível de preparação política, teórica e prática, dos militantes é ainda baixo.
Falta ainda ao Partido uma formação marxista-leninista e uma direcção de militantes politicamente experientes.
O perigo do fascismo
O perigo do fascismo espreita. Entre 1921 e 1923 o imperialismo inicia uma forte ofensiva contra as conquistas alcançadas pelos trabalhadores em vários países sob a influência da Revolução de Outubro. Ainda em 1923, e no ano seguinte, surgem em Portugal as primeiras organizações fascistas (17). Os sucessivos governos, dominados pelas forças reaccionárias, investem numa repressão brutal contra os trabalhadores, que resistem com greves e outras lutas (18).
Mas apesar da luta dos trabalhadores e do esforço do PCP, a CGT, dominada pelos anarco-sindicalistas e em perda de influência, recusa a tentativa do Partido de criar uma frente de unidade contra o fascismo, que acaba por cair por terra (19).
I Congresso
O I Congresso do PCP realizou-se nos dias 10, 11 e 12 de Novembro de 1923, em Lisboa. Participaram cerca de 90 delegados, representando 27 organizações. José Carlos Rates, Secretário-Geral, apresentou o relatório do Comité Executivo.
Para o Congresso foram elaboradas Teses, previamente publicadas em O Comunista e discutidas nas organizações. O Congresso discutiu e aprovou uma resolução sobre a organização do Partido e os seus Estatutos, o Programa de Acção e uma Resolução sobre a Questão Agrária.
Esta última questão é longamente debatida pelo Congresso.
Após um amplo levantamento dos problemas referentes à propriedade agrícola, o Congresso avança a reivindicação de que «o camponês detenha a terra que possa fazer frutificar com o seu braço». As condições de trabalho dos operários agrícolas são igualmente debatidas, sendo aprovada a seguinte moção: «Estando em vigor actualmente a lei de 8 horas de trabalho para a classe operária e sendo os trabalhadores rurais também assalariados, propomos que se reclame desde já ao governo burguês o cumprimento dessa lei para os rurais» .
O perigo do fascismo é já apontado pelos delegados; são analisadas as suas causas, é sublinhada a necessidade da unidade da classe operária como condição indispensável para que o fascismo seja derrotado (20).
O Congresso também denuncia a repressão lançada pelo governo republicano contra os militantes operários e sindicais. Os delegados escutam a leitura de saudações de militantes comunistas e sindicais presos, e manifestam-lhes a sua solidariedade.
O I Congresso do PCP, no qual esteve presente um representante da Internacional Comunista (a cujos princípios o Congresso declarou a sua adesão), encerrou os seus trabalhos com vivas ao PCP, à Internacional Comunista, à Internacional Sindical Vermelha, aos trabalhadores, aos camponeses, aos trabalhadores de todo o mundo, à classe operária portuguesa, à frente única dos trabalhadores e à revolução proletária.
II Congresso
No começo de 1924, o PCP, defendendo a necessidade de uma sólida unidade de acção dos trabalhadores perante o perigo que avançava, tenta estabelecer com a CGT uma frente de unidade sindical contra o fascismo. Chega a realizar-se uma reunião com esse fim, mas a tentativa falha devido às posições anticomunistas dos anarco-sindicalistas, que dominam a CGT.
Em 1925 o Partido participa nas eleições parlamentares formando um bloco com as chamadas forças democráticas de esquerda.
Mas a unidade da classe operária em torno de uma bandeira revolucionária continua a ser uma aspiração. É neste quadro que se realiza o II Congresso do PCP.
O II Congresso do PCP é convocado para 29 de Maio de 1926, em Lisboa.
Comparecem mais de 100 delegados. Mas o Congresso resolve interromper os seus trabalhos, pois, entretanto, no dia 28, a reacção dá o golpe militar e instaura a ditadura.
O golpe de Estado e a instauração da ditadura fascista ocorre num período em que o PCP, dada a debilidade da sua organização e dos seus quadros, a sua ainda reduzida influência, não está em condições de organizar a resistência.
Começa a repressão aos comunistas. Em 1927 a sede do PCP é definitivamente encerrada, seguindo-se a sua ilegalização.
A instauração do fascismo
Face ao desenvolvimento do movimento operário, à sua crescente combatividade e ao apuramento da sua consciência política, os grandes capitalistas e agrários sentem ameaçado o seu poder. A sua resposta é a instauração da ditadura fascista, que se vai dotando de todos os instrumentos para esmagar toda a oposição, toda a voz discordante, e em primeiro lugar o movimento operário. Para isso foi organizado e executado o golpe de Estado militar de 28 de Maio de 1926.
A ditadura fascista era um fenómeno novo em Portugal.
Veio pôr à prova as concepções e as estratégias e tácticas de todas as forças políticas existentes. Obrigou a forjar novas armas, adequadas para a luta revolucionária nas novas condições. De todos os partidos e de todas as correntes à data existentes no movimento operário, só um partido se mostraria capaz de realizar esta tarefa – o Partido Comunista Português.
O 28 de Maio
Em 28 de Maio de 1926, um golpe militar encabeçado pelo general Gomes da Costa, longamente preparado pelas forças reaccionárias do grande capital para colocar o Estado ao seu serviço e travar o movimento operário, impõe a ditadura em Portugal. Foi a resposta dos grandes capitalistas e agrários à ameaça ao seu poder pelo movimento operário e à sua tomada de consciência política. É dissolvido o Parlamento e imposta a censura prévia à imprensa. São demitidas as vereações municipais. Inicia-se a perseguição policial terrorista às organizações e militantes democráticos e sindicais.
A tipografia do órgão da CGT, A Batalha, é assaltada e destruída. Centenas de dirigentes operários são presos. As sedes da CGT e do PCP são encerradas.
Era o início da noite fascista.
Primeiras lutas contra a ditadura
A luta contra a ditadura inicia-se imediatamente após a sua implantação.
Forma-se uma Junta de Salvação Pública. Em 7 de Fevereiro de 1927 surge a primeira revolta armada. O movimento tem início no Porto e logo se estende a Lisboa, apoiado por unidades do Exército e da Marinha e por milhares de populares. A repressão brutal desencadeada pela ditadura provoca centenas de mortos, feridos e deportados.
Em 1928 revolta-se o Batalhão de Caçadores 7 e em Abril de 1931 rebenta a Revolta na Madeira (21). Seguem-se revoltas de deportados políticos na Ilha Terceira, em S. Tomé, na Guiné e em Cabo Verde.
Afastados e perseguidos os militares democratas e republicanos, a ditadura consegue o controlo das Forças Armadas. Colocando à sua frente comandos submissos, o fascismo transformou-as num dos pilares da sua ditadura terrorista.
A fascização do Estado
A fascização do Estado avança, tomando como modelo o fascismo de Mussolini e mais tarde o nazismo de Hitler.
São criados todos os instrumentos necessários para esmagar a oposição e todos os que da ditadura discordam.
São lançados os demagógicos «plano de estradas» e a «campanha do trigo», é progressivamente abolido o horário de trabalho de 8 horas e as cooperativas camponesas são fechadas. É suprimido o direito à greve, não há liberdade de imprensa, de reunião, de expressão, de organização e de pensamento. Os que discordam da ditadura são perseguidos no emprego, frequentemente despedidos, muitas vezes presos e torturados.
O «Acto Colonial» de 1930 proclama os princípios coloniais fascistas e institui o trabalho forçado («obrigatório») nas colónias.
No mesmo ano é criado o partido único, a «União Nacional», não havendo «acordos, nem transacções, nem transigências possíveis», como afirmou Salazar. Sob o princípio fascista «Tudo pela Nação. Nada contra a Nação», a institucionalização do fascismo impõe-se, mascarada pelo nacionalismo. As lutas reivindicativas são brutalmente reprimidas.
Em 1932 Salazar formula a concepção do «Estado forte», consistindo num reforço dos poderes do governo, na abolição dos partidos políticos e na interdição dos sindicatos, na manutenção da censura, no reforço da polícia e das Forças Armadas, na modernização da Polícia de Informação. A repressão fascista toma agora rosto e nome: Polícia de Vigilância e Defesa do Estado (PVDE).
Nos anos seguintes, Salazar continua a tomar medidas de fortalecimento do Estado. A 19 de Março de 1933 proclama a Constituição fascista (22) e no ano seguinte o Estatuto do Trabalho Nacional, que institui a fascização dos sindicatos. Em 1935 os funcionários públicos passam a ser obrigados a assinar uma declaração anticomunista (23) e em 1936 são criadas a Mocidade Portuguesa e a Legião Portuguesa.
Ao mesmo tempo, desenvolve-se a concentração capitalista. Criam-se fortes grupos bancários (24). As sociedades anónimas, que representam apenas 4,3% do total das sociedades portuguesas, detêm já 52,5% de todo o capital.
O desenvolvimento do capitalismo monopolista é acompanhado do agravamento da exploração e da miséria das massas.
A criação do Tarrafal
Espelho do regime fascista, o Campo de Concentração do Tarrafal é criado em 23 de Abril de 1936, no lugar da Achada Grande do Tarrafal, na Ilha de Santiago, numa das piores zonas climáticas de Cabo Verde.
Iria servir o intuito do regime fascista de assassinar os antifascistas e democratas mais combativos. De facto, no Tarrafal foram assassinados 32 antifascistas, entre os quais Bento Gonçalves, Secretário-Geral do PCP. «Quem vem para o Tarrafal vem para morrer!», dizia Manuel dos Reis, director do campo – o Campo da Morte Lenta – a quem ali chegava (25).
19261940 O Partido da classe operária e da resistência
De todos os partidos políticos existentes à data da instauração do fascismo, o Partido Comunista Português foi o único que soube resistir e forjar-se na luta (26).
Em 1929, o PCP começa a organizar-se nas condições de clandestinidade que lhe são impostas. Bento Gonçalves, jovem operário do Arsenal, activista sindical, vai ter um papel decisivo no combate às concepções anarquistas, na ligação do Partido à classe operária, na sua transformação num partido de tipo leninista. Criam-se organizações partidárias e de massas, desenvolve-se uma diversificada imprensa clandestina. Multiplicam-se as lutas contra a exploração, a fome, o desemprego e o fascismo, desenvolve-se o movimento de solidariedade.
No centro de todo este esforço está o PCP, que ganha definitivamente a confiança da classe operária, torna-se a sua força política dirigente e o partido fundamental da resistência antifascista.
O PCP organiza-se na clandestinidade
Em Abril de 1929, Manuel Pilar, membro do Comité Central do PCP, convoca uma conferência que irá marcar a viragem para a reorganização do Partido na clandestinidade. Nesta Conferência Bento Gonçalves é designado Secretário-Geral do Partido. São principalmente operários da célula do PCP no Arsenal da Marinha que participam na Conferência. Vindos da luta sindical, agregam outros militantes operários forjados na luta, e partindo quase do zero no que toca ao trabalho partidário clandestino, irão fazer do PCP um partido revolucionário marxista-leninista, capaz de lutar e resistir nas condições da clandestinidade.
A orientação seguida na reorganização vira-se fundamentalmente para a formação de organizações para a formação ideológica e para o trabalho sindical (27). Combatendo as tendências para a colaboração de classes e o anarco-sindicalismo, lutando incansavelmente pelas reivindicações económicas dos trabalhadores, o Partido procura activamente a unidade da classe operária. Entre os resultados desta intensa actividade contam-se a condução de greves e lutas contra o desemprego e a reorganização dos sindicatos mais importantes.
Paralelamente são criadas várias organizações partidárias e unitárias animadas por comunistas, como a Organização Revolucionária da Armada e a secção portuguesa do Socorro Vermelho Internacional, a Liga dos Amigos da URSS, a Liga Contra a Guerra e o Fascismo, a Organização Revolucionária do Exército, desenvolvendo-se simultaneamente o trabalho entre a juventude com a criação da Federação das Juventudes Comunistas Portuguesas e os Grupos de Defesa Académica. Nos anos de 1936 a 1938, o PCP trabalha para a constituição de uma Frente Popular antifascista.
Bento Gonçalves
Nascido em Montalegre em 1902, Bento Gonçalves, filho de camponeses, operário arsenalista e dirigente sindical, foi Secretário-Geral do PCP entre 21 de Abril de 1929 e 11 de Setem bro de 1942, quando morreu, vítima do fascismo, no Campo de Concentração do Tarrafal.
Em 1927, realizou uma viagem à União Soviética encabeçando uma delegação de operários arsenalistas convidada para o 10.º aniversário da Revolução de Outubro. No regresso ingressou nas fileiras do PCP. Foi ele o principal obreiro da viragem do Partido e da sua consolidação como o partido político da classe operária portuguesa.
A sua intensa actividade dirige-se para a reorganização do Partido, para a sua orientação num sentido marxista-leninista, para o combate às concepções do anarco-sindicalismo e do «reviralhismo». Em 11 de Novembro de 1935 (28) é detido, após ter regressado de Moscovo onde participou no VII Congresso da Internacional Comunista. É conduzido para a Fortaleza de Angra do Heroísmo e mais tarde para o Campo de Concentração do Tarrafal, onde viria a sucumbir às mãos da ditadura fascista.
A sua morte foi um duro golpe para o movimento operário português. O seu exemplo ajudou a consolidar o Partido, que se transformou numa organização forte e combativa, única esperança dos trabalhadores portugueses na prolongada resistência ao fascismo.
O PCP no centro das lutas
Torna-se evidente que o regime fascista, apoiando-se nas forças militares e policiais, só poderia ser derrubado por um forte movimento popular, dotado de uma firme e combativa direcção política. É nesse sentido que se orientam os esforços do PCP.
O PCP vai colocar-se à frente das massas e dirigir importantes lutas reivindicativas, como as lutas de desempregados (29), a greve marítima de Setúbal (30), a greve dos fragateiros e as greves dos estudantes (31).
As grandes manifestações do 1.º de Maio de 1931, com o envolvimento do Partido, em Lisboa e no Porto, for temente marcadas por palavras de ordem contra a ditadura, são objecto de violenta repressão. Os manifestantes são atacados a tiro pela polícia, seguindo-se-lhes muitas prisões.
A influência ideológica do PCP cresce em directa relação com a sua intervenção nas lutas dos trabalhadores.
A frente sindical e uma nova imprensa operária
Uma das mais importantes frentes de luta do PCP após a Conferência de Abril de 1929 é a frente sindical. É criada a Comissão Inter-Sindical. São organizados ou reorganizados vários sindicatos (32). As organizações sindicais dirigem grandes lutas reivindicativas da classe operária. Sob a orientação das organizações sindicais surge uma nova imprensa operária, caracterizada pela sua combatividade e pela clareza das suas posições de classe. No 1.º de Maio de 1929 publica-se no Porto o primeiro número de O Proletário e em 15 de Fevereiro de 1931 é publicado o primeiro número do Avante!, um estímulo ao reforço das organizações do Partido, alargando e expandindo a influência do PCP (33). Em 1935, são editados mensalmente, para além do Avante!, O Jovem, o Solidariedade, O Marinheiro Vermelho e O Militante.
O 18 de Janeiro
A 18 de Janeiro de 1934 desenvolve-se em vários pontos do país uma greve de características insurreccionais. Tinha entrado em vigor o Estatuto do Trabalho Nacional (inspirado na Carta Del Lavoro de Mussolini), que decretava a ilegalização dos sindicatos livres. A classe operária reage de imediato. Estas manifestações e acções grevistas tiveram lugar um pouco por todo o país mas é na Marinha Grande que estas acções alcançam maiores proporções (34).
A greve encabeçada por militantes comunistas como José Gregório, António Guerra e outros teve a adesão maciça dos trabalhadores, que ocuparam a vila durante várias horas, até ser duramente reprimida pelas forças fascistas.
A partir de 18 de Janeiro, o PCP afirmar-se-á definitivamente como o partido da classe operária, como o grande dinamizador da luta antifascista.
A revolta dos marinheiros
Em 1936, o fascismo, já institucionalizado em Portugal, corta relações com a República Espanhola e declara o seu apoio à sublevação fascista de Franco.
Em Setembro do mesmo ano, em luta contra a depuração fascista na Marinha de Guerra, revoltam-se os marinheiros dos navios de guerra Dão, Bartolomeu Dias e Afonso de Albuquerque, organizados pela Organização Revolucionária da Armada (ORA), tendo sido mortos 10 marinheiros e 60 condenados e deportados para o Tarrafal (35).
O PCP alvo da repressão fascista
Em 1935, são já 400 os membros do PCP que, com amplas ligações às massas populares, se torna uma organização nacional, embora ainda débil. É nesta época também que o PCP reforça as suas ligações ao movimento comunista internacional. O PCP participa no VII Congresso da Internacional Comunista (IC), cujas conclusões têm reflexos importantes nas orientações definidas pelo Partido. Nesse Congresso, Bento Gonçalves faz o balanço da actividade do Partido e dá conta da influência conseguida junto do proletariado e do movimento sindical, a sua implantação no campesinato, a forte organização dos marinheiros, a influência junto dos intelectuais e dos estudantes, a imprensa clandestina implantada e assegurada, bem como o amplo trabalho desenvolvido pelo Socorro Vermelho Internacional.
O PCP cresce e alarga a sua influência, sendo por isso obviamente contra ele que as forças do fascismo apontam as suas armas e fazem do anticomunismo a sua bandeira ideológica. Bento Gonçalves, José de Sousa e Júlio Fogaça, membros do Secretariado, são presos, afectando fortemente a actividade do Partido nos anos seguintes (36). Apesar desse duro golpe, em 1936 o Partido de monstra a sua vitalidade e as suas ramificações, redobrando os esforços de organização e de influência, constituindo-se um Comité Central ao qual ficam a pertencer, entre outros, Alberto Araújo e Manuel Rodrigues da Silva (eleitos para o Secretariado), Álvaro Cunhal e Pires Jorge, e conseguindo manter a publicação semanal do Avante! até 1938. Milhares de portugueses vão combater nas fileiras do exército republicano espanhol. Muitos membros do Partido e da FJCP morrerão nesse combate pela liberdade.
A intensificação da repressão fascista com Salazar a recorrer a formas extremas de repressão e violência, num quadro internacional em que o nazi-fascismo (37) desencadeia a Segunda Guerra Mundial e esmaga a República espanhola, impõe ao PCP uma nova concepção do trabalho na clandestinidade.
Com a reorganização de 1940/1941, o PCP desenvolver-se-á de novo rapidamente, em bases mais sólidas, transformando-se então, e para sempre, num grande Partido nacional.
A vida clandestina
A clandestinidade não foi uma escolha dos comunistas.
Foi uma situação que lhes foi imposta pela ditadura fascista.
O regime fascista negava todas as possibilidades de qualquer actividade política democrática. Reprimia ferozmente a mais pequena manifestação de protesto. Decretava «ilegais» as mais modestas reclamações. Nas condições do terror fascista, aceitar as «leis» fascistas significava capitular, abandonar a luta. Continuar a desenvolver a luta era «ilegal». E qualquer organização política que quisesse prosseguir na luta só podia fazê-lo na clandestinidade, ou seja, sem conhecimento da polícia fascista.
O PCP seguiu o duro caminho da clandestinidade para lutar pela liberdade. Contra todas as calúnias e mentiras, contra as perseguições e o terror, o PCP permaneceu na luta, estruturou-se na clandestinidade, tornou-se na «ilegalidade» a principal força de oposição ao fascismo.
A vida clandestina exigiu muito a centenas e centenas de quadros, homens e mulheres, que se formaram nas condições de clandestinidade e deram o melhor de si próprios. Publicam-se mais fotos e referem-se mais nomes de alguns entre tantos que, ao longo de 48 anos, asseguraram o papel único do PCP
A clandestinidade imposta pelo fascismo
A clandestinidade não se destinava a esconder do povo a actividade do PCP, mas sim a defender os militantes da repressão. A ditadura fascista impôs aos comunistas a dura vida da clandestinidade.
Nas células do Partido (formadas nas fábricas, nas empresas, nas aldeias, nas escolas, nos quartéis) os militantes comunistas viviam como os seus companheiros de trabalho, que eles organizavam e dirigiam nas lutas diárias pelo pão e pela liberdade e junto dos quais desenvolviam permanentes esforços de esclarecimento político. Actuavam na «legalidade» (como então se dizia). Só as actividades políticas eram clandestinas – pois o fascismo não as proibia apenas, persegui-as ferozmente, para desmantelar a ligação do Partido às massas populares.
O PCP estruturou-se na clandestinidade e, lutando contra as perseguições ferozes e o terror que o regime fascista impunha, tornou-se a principal força da oposição ao fascismo.
O aparelho clandestino do Partido e a sua organização clandestina, assente num reduzido mas sólido quadro de funcionários inteiramente dedicados à luta revolucionária, vivendo e trabalhando totalmente na clandestinidade (38), foram a espinha dorsal e o principal motor da luta antifascista(39).
As casas clandestinas
Por vezes com aspecto confortável, outras vezes modestas, ou mesmo mais que modestas habitações, as casas clandestinas do Partido abrigavam dentro das suas paredes os funcionários que conduziam e eram o suporte da luta popular. Não eram escolhidas pelas suas qualidades habitacionais, pelo seu conforto, mas pela segurança que ofereciam aos seus heróicos habitantes.
A ligação às massas, feita por militantes nas células do Partido, tinha que ser salvaguardada. As necessidades da luta e a defesa dos militantes já muito marcados pela polícia impuseram ao Partido a criação de estruturas totalmente clandestinas que não dessem à polícia qualquer pista sobre a sua identificação e localização. Foram centenas as instalações (casas, tipografias) do Partido por todo o país. As casas eram o abrigo seguro dos funcionários, defendidas com uma arte adquirida ao longo de anos de necessidade e experiência.
Cuidados conspirativos
Os funcionários do PCP desenvolveram uma extraordinária capacidade de acção conspirativa ao longo dos anos.
Só assim conseguiam dirigir as lutas, iludindo a vigilância policial. Os cuidados conspirativos eram essenciais. A defesa das casas clandestinas, a escolha dos locais de encontro e reunião, a forma de tomar apontamentos e transmitir mensagens, os disfarces, os complexos processos de deslocação... nenhuma regra podia ser violada sem grave risco. Mas estas regras conspirativas não eram suficientes, era necessário também lucidez, ousadia, sangue-frio, inventiva e muita prudência. Para não revelar a sua identidade nos contactos partidários, os clandestinos substituíam os seus nomes por pseudónimos, possuíam documentação falsificada e muitas vezes alteravam o seu aspecto físico e documentação. A alguns desses pseudónimos – por exemplo, Duarte (Álvaro Cunhal), Amílcar (Sérgio Vilarigues), Paiva (Georgette Ferreira), Gomes (Pires Jorge), Rubina (Maria Machado), Alberto (José Gregório), Melo (Octávio Pato), João (Dias Lourenço), Samuel (Sofia Ferreira), Alex (Alfredo Diniz) – estão ligados momentos e aspectos da maior importância na história do PCP.
Quadros forjados na luta
Procurados pelo regime e pelas suas forças repressivas, os funcionários clandestinos tinham de viver uma vida aparentemente normal. Mudavam de nome e estavam sempre sujeitos a abandonar tudo à menor suspeita de vigilância policial. A vida clandestina impunha uma grande disciplina e um rigoroso respeito pelas regras conspirativas. A renúncia às condições normais de vida exigia deles coragem, tenacidade, criatividade, um heroísmo diário e anónimo.
Estes comunistas abandonavam as famílias que amavam, os amigos, as suas profissões, as suas vidas, para se dedicarem inteiramente à luta contra o regime, para um Portugal libertado do fascismo. Pesava sobre estes clandestinos a iminência da prisão e da tortura, longos anos de condenação, o assassinato, desde que deixavam a sua vida normal para entrar na clandestinidade. Por exemplo, entre os anos de 1957 e 1965 foram assaltadas 40 casas clandestinas e presos 122 funcionários do PCP.
Os funcionários clandestinos eram a espinha dorsal da acção clandestina. À custa de muitos sacrifícios de inúmeros clandestinos, o PCP construiu uma forte organização de homens e mulheres revolucionários, inteiramente dedicados à actividade partidária que a repressão atingia mas nunca destruiu.
19401949 Um
grande
Partido
nacional
Numa situação caracterizada, no plano internacional, pelo desencadeamento da Segunda Guerra Mundial e, no plano interno, pela intensificação e refinamento da repressão fascista, cujo alvo principal são os comunistas, o PCP empreende a «reorganização de 1940/1941».
O seu objectivo é, com base nas lições do passado, criar uma organização clandestina capaz de iludir a acção policial e dar continuidade e estabilidade ao trabalho de direcção e de organização do Partido e de mobilização das massas populares. Este objectivo foi alcançado (40). Entre 1941 e 1949 o Partido encabeça grandes lutas das massas operárias e camponesas, adquire grande prestígio junto da intelectualidade, impulsiona grandes movimentações unitárias.
Em resultado de todos estes êxitos, o PCP torna-se um grande partido nacional.
A guerra
Em Março de 1939, os exércitos fascistas esmagam a liberdade do povo espanhol.
Em Setembro de 1939, a Alemanha nazi inicia a Segunda Guerra Mundial (41) e, em Junho de 1941, Hitler desencadeia a agressão contra a URSS.
Por trás de uma capa de «neutralidade», o governo de Salazar esconde uma efectiva colaboração com Hitler.
A situação económica e social dos portugueses agrava-se brutalmente com a guerra. Contra essa situação, o PCP apela à luta do povo contra o fascismo salazarista e contra o nazismo (42).
A reorganização de 1940/41
Em 1940, com a libertação de um grande número de militantes, entre os quais Álvaro Cunhal, Militão Ribeiro, Sérgio Vilarigues, Pires Jorge, José Gregório, Pedro Soares, Manuel Guedes e Júlio Fogaça, inicia-se a «reorganização de 1940-1941», que permitiu que o PCP desse rapidamente grandes passos em frente na sua actividade, transformando-se num grande partido nacional, organizador da luta popular e impulsionador da unidade antifascista (43).
A classe operária toma a vanguarda
Com a guerra e a política salazarista de colaboração com a Alemanha nazi, a situação das massas trabalhadoras torna-se desesperada. Os salários são baixíssimos, faltam os produtos mais essenciais, o açambarcamento generaliza-se, a fome alastra. As massas trabalhadoras lançam-se na luta. Têm lugar as conhecidas «Marchas da fome» organizadas pelas populações.
Nos fins de 1941 têm lugar greves na Covilhã. Nessa mesma altura, desencadeiam-se importantes lutas estudantis. Em 1942 rebentam lutas camponesas contra o envio de géneros para a Alemanha e no final deste ano há uma grande vaga de greves em Lisboa e arredores.
Em Julho-Agosto de 1943 o movimento grevista atinge grandes proporções.
Sob a direcção do PCP, participam no movimento 50 mil trabalhadores, a quase totalidade dos operários industriais de Lisboa e Margem Sul do Tejo.
Apesar da repressão, em Maio de 1944, a classe operária responde ao apelo do Secretariado do PCP para que se desencadeiem novas greves e manifestações pelo pão e outros géneros de primeira necessidade, com grandes lutas na região de Lisboa e Baixo Ribatejo.
No período de 1941-1944, a classe operária surge em força na cena política nacional, ocupando a vanguarda na luta política antifascista. À sua frente, mobilizando, insuflando ânimo, dirigindo, projectando a luta sempre para a frente, sempre para objectivos mais vastos, está o PCP.
Pela unidade antifascista
A histórica vitória do Exército Vermelho em Stalinegrado (Fevereiro de 1943) e o desenvolvimento da luta da classe operária em Portugal, dão novo ânimo a todos os antifascistas, estimulando-os a unirem-se.
Por esta altura existem já algumas organizações unitárias como a Associação Portuguesa Feminina para a Paz, o Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas ou o Socorro Vermelho Internacional, mas é em Janeiro de 1944, com a formação do Conselho Nacional de Unidade Antifascista – órgão dirigente do MUNAF – em que colaboram comunistas, socialistas, republicanos, católicos, monárquicos, liberais e outros antifascistas – que se dá o histórico passo em frente na unidade antifascista e na luta do povo português contra o fascismo (44).
A derrota do nazi-fascismo
Em Maio de 1945 a Segunda Guerra Mundial termina com a vitória da coligação antifascista. Milhões de homens e mulheres em todo o mundo festejam a derrota do nazi-fascismo.
A União Soviética, que suportou mais do que qualquer outro país o fardo da guerra, que mais do que qualquer outro país contribuiu para a libertação da Europa da peste nazi, adquire com a vitória um enorme prestígio. A Segunda Guerra Mundial, que tinha como um dos seus principais objectivos a liquidação do socialismo na URSS, termina com a vitória da URSS e de todas as forças democráticas.
As jornadas da vitória
Em Portugal, as lutas do povo contra o fascismo durante a guerra culminaram com as jornadas da vitória. Milhares de pessoas inundam as ruas de Lisboa e na Baixa lisboeta reclama-se «eleições livres!», a «libertação dos presos políticos» e a «extinção do Tarrafal!». Em Almada, na Cova da Piedade e no Barreiro outros milhares desfilam pelas ruas gritando palavras de ordem. Setúbal, Évora, Santarém, Alenquer e Almeirim são também palco de grandes manifestações. Em toda a Margem Sul há grandes paralisações de trabalho. Na Moita, Amora, Torre da Marinha, Alhos Vedros e Seixal, muitos milhares de pessoas saem para as ruas.
Esta ampla mobilização de massas é acompanhada pela paralisação da maioria das fábricas, pelo abandono das aulas por milhares de estudantes e por uma grande manifestação em frente da Assembleia Nacional.
No Porto, os manifestantes desfilam em frente da sede da PVDE e festejam com palavras de ordem combativas a derrota do nazi-fascismo. É notório o desejo de liberdade e de profunda transformação política no seio das massas (45).
Uma nova situação mundial
A situação mundial altera-se profundamente com a derrota do nazi-fascismo. O socialismo torna-se um sistema mundial, abrangendo diversos países europeus e asiáticos e, mais tarde, Cuba e o Vietname. Libertados da exploração do homem pelo homem, esses povos, com a URSS à frente, empreendem uma espectacular reconstrução e, num período histórico relativamente curto, transformam-se numa força económica, política e militar com um peso determinante na salvaguarda da paz e do progresso da Humanidade.
Na Europa Ocidental e na América a classe operária e as forças progressis tas alcançam importantes vitórias. Os comunistas participam em governos de vários países e são criadas a Federação Sindical Mundial, a Federação Mundial da Juventude Democrática e a Federação Democrática Internacional das Mulheres.
Em África e na Ásia, um número cada vez maior de países alcança a independência. O sistema colonial do imperialismo entra em derrocada. O imperialismo reage desencadeando a guerra fria. Mas com as novas conquistas alcançadas, o mundo tem a partir de então uma nova imagem.
Novas frentes de luta
Em Portugal, o fascismo salazarista é obrigado a recuar perante a pressão exercida pelas forças democráticas, com o PCP na vanguarda. O governo salazarista abranda a repressão libertando do Campo de Concentração do Tarrafal destacados dirigentes comunistas como Militão Ribeiro, Manuel Rodrigues da Silva, Francisco Miguel e Pedro Soares e outros resistentes antifascistas.
A unidade da classe operária reforça-se e, na sequência das jornadas da vitória, os trabalhadores conseguem impor a realização de eleições sindicais.
As listas de confiança dos trabalhadores vencem em cerca de cinco dezenas de sindicatos. Também os estudantes iniciam um importante processo de luta, exigindo a autonomia das suas associações e a sua gestão democrática.
A oposição democrática luta à luz do dia
É criado o primeiro movimento legal de oposição democrática à ditadura salazarista, o MUD – Movimento de Unidade Democrática, suportado pela acção clandestina dirigida pelo Conselho Nacional de Unidade Antifascista onde se encontram representados os principais partidos e forças da oposição, incluindo o PCP.
Em poucos meses criam-se por todo o país centenas de comissões do MUD, integradas por comunistas, socialistas, republicanos, monárquicos, católicos e outros, homens e mulheres sem partido, cujo único objectivo era o combate organizado e eficaz ao fascismo. O MUD revela uma poderosa unidade das forças democráticas e nem a forte repressão que se abate sobre os seus dirigentes destrói a sua acção. A ampla movimentação democrática da juventude leva à criação do MUD Juvenil em 1946, unindo e mobilizando os sectores mais combativos da juventude portuguesa.
De norte a sul do país formam-se comissões do MUD Juvenil e, ao fim de pou cos meses de actividade, o MUD Juvenil conta com um efectivo de 20 mil aderentes, tendo os jovens comunistas um papel de vanguarda (46).
A campanha de Norton de Matos
Em 1949, o PCP desempenhou um papel de primeiro plano na campanha eleitoral do General Norton de Matos à Presidência da República. Foi o motor da mobilização popular, inspirador da unidade, a principal força política organizada da campanha. Em torno desta candidatura as forças democráticas realizaram uma grande campanha política pela liberdade, com comícios e grandes acções de agitação e propaganda.
O fascismo pretendia dar um aspecto democrático ao seu regime de terror com estas «eleições» e a Oposição aproveitou-as para desmascarar esta manobra, aceitando a batalha. As forças democráticas reivindicam do regime a satisfação de três condições para ir às urnas: liberdade de propaganda, recenseamento honesto e fiscalização do voto pela Oposição. Apesar dos protestos populares, o regime fascista recusou-se a satisfazer estas condições. Norton de Matos desiste à boca das urnas. As forças democráticas desmascaram esta burla eleitoral, alcançando assim uma extraordinária vitória política.
III Congresso
Realizado vitoriosamente de 10 a 13 de Novembro de 1943, num momento em que os exércitos nazis ainda dominavam a Europa e a ditadura salazarista sufocava o País com métodos extremos de privação da liberdade, o III Congresso (I Ilegal) marcou a grande viragem da história do Partido, que abriu uma nova fase da sua actividade e fez dele um grande partido nacional.
O Congresso estudou as principais lições das grandes lutas de 1942 e 1943, tomou medidas decisivas para a unidade nacional antifascista, nomeadamente com a criação do Conselho Nacional de Unidade Antifascista, e apontou o levantamento nacional armado como via para o derrubamento do fascismo.
Apesar das ferozes arremetidas da repressão e dos duros golpes sofridos, o PCP conseguiu a partir deste Congresso garantir a estabilidade e a continuidade do seu trabalho de direcção, o que constituiu uma das fontes dos seus êxitos, da sua capacidade e experiência política, da sua actuação e orientação.
Com este Congresso o Partido afirmou também o princípio, desde então rigorosamente cumprido, de garantir, mesmo com as limitações e dificuldades impostas pela clandestinidade, o máximo respeito pelos métodos democráticos na sua vida interna. Ao anunciar a realização do Congresso, o Avante! podia com justeza afirmar: «No I Congresso demonstrou-se que o Partido Comunista é já hoje a verdadeira vanguarda da classe operária, do povo laborioso, é já hoje uma grande força política portuguesa.» No III Congresso são eleitos para o Comité Central do Partido, entre outros, Álvaro Cunhal, José Gregório, Manuel Guedes, Pires Jorge, Sérgio Vilarigues, Alfredo Dinis, Dias Lourenço.
O Secretariado do Comité Central fica constituído por Álvaro Cunhal, José Gregório e Manuel Guedes.
IV Congresso
O IV Congresso (II Ilegal) do PCP realiza-se em Julho de 1946, num momento de grande ascenso das lutas da classe operária e das massas trabalhadoras, de grandes progressos no desenvolvimento das organizações e lutas unitárias. A organização do Partido cresce rapidamente. No período decorrido entre o III e o IV Congressos (menos de três anos), o número de militantes comunistas aumentou seis vezes, e o número de organizações locais cinco vezes. Aumentou o número de organizações de empresas.
A tiragem do Avante! quadruplicou.
No IV Congresso, o PCP define as linhas fundamentais da via para o derrubamento do fascismo. Dá expressão política à rica experiência das lutas deste período e faz uma análise consequente da situação política nacional. Aponta o levantamento da nação portuguesa contra a ditadura fascista como o caminho a seguir para a defesa dos interesses nacionais. Com este Congresso o PCP reafirma a sua política de unidade nacional antifascista.
No IV Congresso o Partido define também os princípios orgânicos do centralismo democrático, que orientam a sua organização e estão na base dos seus Estatutos.
No seguimento deste Congresso, e marcando os grandes passos dados no trabalho de direcção e de organização, realizam-se, nos anos seguintes, várias importantes reuniões do Comité Central do Partido, que consolidam o seu trabalho colectivo.
No IV Congresso são eleitos para o Comité Central do PCP, entre outros: Álvaro Cunhal, José Gregório, Manuel Guedes, Militão Ribeiro, Pires Jorge, Sérgio Vilarigues, Dias Lourenço, Júlio Fogaça, Francisco Miguel, Manuel Rodrigues da Silva.
O Secretariado do CC fica formado por Álvaro Cunhal, José Gregório, Manuel Guedes, Militão Ribeiro.
Mártires caídos na luta
Dezenas de militantes comunistas, homens e mulheres filhos do povo trabalhador, intelectuais e artistas, caíram na luta assassinados pela ditadura fascista.
Lutaram pela defesa dos interesses da classe operária e de todo o povo.
Lutaram contra a opressão e o terror e pela liberdade de todos os portugueses.
Mártires antifascistas. Legaram-nos sementes de liberdade.
O seu exemplo e o seu sacrifício jamais serão esquecidos.
E a terra portuguesa foi abundantemente regada pelo sangue de muitos mártires, na sua grande maioria comunistas.
As suas mortes foram crimes repugnantes do regime mais tirânico que o nosso povo sofreu em toda a sua história.
Por isso ocupam justamente, no coração e na memória do povo, o lugar dos heróis da história secular da luta pela libertação do povo português.
19491958 Sempre na vanguarda da luta
Em 4 de Abril de 1949 com o governo de Salazar Portugal torna-se membro fundador da NATO.
Salazar aproveita-se do clima de guerra-fria (47) e da política anti-soviética e antidemocrática desencadeada pelas forças mais reaccionárias do imperialismo.
Já em 1946, no IV Congresso, o PCP alertava para os planos de reagrupamento internacional da reacção e para o papel do fascismo salazarista na campanha anti-soviética.
De facto, as potências da NATO não hesitaram em apoiar o ex-aliado de Hitler.
Salazar paga com novas cedências, que agravam a dependência do País em relação ao estrangeiro.
O PCP, nas difíceis condições criadas pelo clima de guerra-fria e as suas repercussões na vida política portuguesa, mantém-se firmemente no seu posto, levantando a bandeira da paz e da independência nacional que se tornam uma das principais frentes da luta popular.
O imperialismo dá a mão a Salazar
As repercussões do clima de guerra fria, as divisões por ele fomentadas entre as forças democráticas, o reforço do apoio imperialista ao fascismo, a admissão de Portugal na NATO levam a uma quebra na actividade da Oposição, que não consegue manter a amplitude e o vigor dos anteriores movimentos unitários.
O regime retoma abertamente os seus métodos fascistas. Recomeçam as prisões em massa. Em 1947 realiza-se o primeiro grande julgamento político do pós-guerra, conhecido como «o processo dos 109», sendo um dos réus Francisco Miguel, sobrevivente do Campo de Concentração do Tarrafal, para onde é de novo enviado. Em Março de 1949, são presos Álvaro Cunhal, Militão Ribei ro, Sofia Ferreira e outros militantes comunistas. Militão Ribeiro morre na Penitenciária, vítima de maus tratos. Álvaro Cunhal, levado a tribunal, transforma o julgamento numa vigorosa denúncia da política de traição nacional do governo salazarista.
Pela unidade das forças democráticas
Apesar das enormes dificuldades deste período, a luta continua. No campo unitário, o Movimento Nacional Democrático (MND) mantém a afirmação das aspirações democráticas mais consequentes. Em 1951 lança a candidatura, recusada pelo regime, do Prof. Ruy Luís Gomes, um dos seus dirigentes, às «eleições» para a presidência da República.
A campanha decorre sob uma feroz repressão, em que o próprio candidato é brutalmente espancado à saída dum comício. Mas isso não impede que se realizem importantes acções políticas de massas e uma ampla campanha de esclarecimento em torno das palavras de ordem de pão, paz e liberdade.
Em 1955 e 1956 a luta política reanima-se, com a realização de comícios comemorativos do 31 de Janeiro e do 5 de Outubro e o desenvolvimento de campanhas contra a censura, pela abolição das medidas de segurança e pela amnistia. Em 1957 realiza-se o I Congresso Republicano de Aveiro, que foi uma importante manifestação de combatividade das forças democráticas.
A luta pela paz
No início dos anos 50, a luta pela paz é uma das mais importantes frentes de combate antifascista. Em Julho de 1950, cria-se a Comissão Nacional para a Defesa da Paz, em que participam importantes personalidades de diversas correntes políticas. Noticiando esse acontecimento, em Agosto o Avante! es creve: «O PCP, como força de vanguarda na luta pela democracia e a paz, apoia sem reservas a Comissão Nacional para a Defesa da Paz e incita todos os seus militantes e simpatizantes a apoiarem igualmente sem reservas as suas iniciativas.» Pouco tempo depois, a Comissão Nacional da Paz lança a palavra de ordem: «100 000 assinaturas para o Apelo de Estocolmo!». A resposta é uma ampla campanha de recolha de assinaturas em todo o país a favor da paz, em assembleias sindicais e estudantis, em colectividades recreativas e culturais, em clubes desportivos.
Em 1952 travam-se grandes lutas contra o Pacto do Atlântico e pela assinatura de um Pacto de Paz. No ano seguinte, participa no Congresso dos Povos pela Paz em Viena uma delegação de partidários da Paz de Portugal e os professores Ruy Luís Gomes e Manuel Valadares e a escritora Maria Lamas são eleitos para o Conselho Mundial da Paz.
Em 1954, com o caso de Goa, uma outra frente de luta se abre: a luta contra o colonialismo português. Cinco dirigentes do MND publicam uma declaração reclamando negociações com o governo da Índia, pelo que são presos. O PCP define a sua posição: «O Partido Comunista Português está inteiramente ao lado do povo de Goa, Damão e Diu e irmana-se com o sentimento nacional ao combater a acção provocadora do governo fascista contra esse povo e lutará incansavelmente pela libertação de todos os povos oprimidos.»
Pelo pão e pela liberdade
Os anos de 1951, 1953, 1954 e 1955 são anos de grande ascenso das lutas camponesas no Alto e Baixo Alentejo e Ribatejo. Dirigidos pelo PCP, os trabalhadores rurais multiplicam as greves e ma nifestações contra a fome e por melhores jornas. Em 1953 participam na luta 60 mil trabalhadores, fazendo greve 20 mil. É à frente destas lutas que são assassinados Catarina Eufémia e Alfredo Lima, militantes comunistas.
Simultaneamente, a Juventude, organizada no MUD Juvenil, realiza importantes acções: manifestações estudantis em Lisboa e Coimbra pela liberdade de associação e reunião nas universidades, iniciativas como o Festival Nacional do Laranjeiro, em 1955. Delegações de jovens portugueses participam nos Festivais Mundiais da Juventude de Bucareste (1953), Varsóvia (1955) e Moscovo (1957).
A Juventude desempenha também um papel muito destacado em todas as outras frentes de luta, nomeadamente na luta pela paz e contra a repressão.
A ditadura
terrorista
do
capital
monopolista
Conseguindo recompor-se temporariamente depois do abalo das lutas antifascistas do pós-guerra, o regime fascista desenvolve plenamente a sua «missão histórica»: colocar todos os recursos do País nas mãos do grande capital e dos agrários. Para isso, o governo fascista põe todo o aparelho de Estado, todo o aparelho repressivo, as armas, as leis, os tribunais, ao serviço do grande capital. Para isso criou, com a organização corporativa, um gigantesco aparelho de controlo económico.
Para isso criou a PIDE.
Protegidos pela polícia e pelas leis, os grupos monopolistas crescem vertiginosamente, sorvendo riquezas, apoderando-se cada vez mais do País.
A CUF é um exemplo desse crescimento tentacular.
O poder dos monopólios
Os Mello e os outros monopolistas são mais poderosos que os ministros, fazem e desfazem governos. Perante eles, curvam-se, servis, os governantes fascistas, a quem eles distribuem as suas benesses.
A estreita ligação entre o governo de Salazar e os monopólios compreende-se melhor tendo em conta que, em 1958, mais de 42 ministros e ex-ministros salazaristas e oito altos funcionários do regime ocupavam 116 lugares em conselhos de administração das maiores empresas estabelecidas em Portugal e nas colónias portuguesas.
As sociedades anónimas concentram capitais cada vez maiores nas suas mãos. Meia dúzia de grandes grupos monopolistas (os Mello da CUF, Champalimaud, Espírito Santo, Borges & Irmão, Banco Português do Atlântico, Banco Nacional Ultramarino) concentram nos seus cofres os sectores-chave da economia portuguesa. Quinhentos grandes latifundiários detém nas suas mãos mais terra que os 500 000 mais pequenos proprietários do País.
A acumulação da riqueza num reduzido grupo de monopolistas condenou a maioria do povo à mais extrema miséria.
De braço dado com o imperialismo estrangeiro
Não podendo contar com o apoio do povo português, o fascismo salazarista procura no estrangeiro os apoios para se manter.
Depois de se ter ligado aos regimes fascistas de Hitler, Mussolini e Franco, aproveita a «guerra fria» para vender os seus serviços aos imperialistas da NATO e aos monopolistas do «Mercado» europeu. Os imperialistas e os seus monopólios aproveitam-se da situação para fazer de Portugal uma base militar de apoio e alargar a exploração do povo português. Os EUA ocupam a base das Lajes, a RFA a de Beja, a França a das Flores. Entre 1960 e 1970, um milhão de trabalhadores portugueses são forçados a emigrar, enquanto o capital estrangeiro detém a terça parte dos investimentos feitos em Portugal.
No relatório ao Comité Central Rumo à Vitória, Álvaro Cunhal caracteriza deste modo a situação: «Em toda a parte, os imperialistas estrangeiros nos tiram os bens, nos exploram o trabalho, nos impõem os artigos, nos obrigam a pedir licença para vender ou não vender o que é nosso, e ainda por cima vexam e insultam. Na vida diária dos portugueses, a presença da exploração imperialista é constante, apesar de que muitos disso se não apercebem. Eles exploram, eles fabricam, eles vendem. Ao estrangeiro se paga a luz e a lâmpada que nos ilumina, o petróleo que consumimos, o sabão e o sabonete com que nos lavamos, a margarina que comemos, o leite condensado ou refrigerante que bebemos, muitas portuguesíssimas sardinhas que petiscamos, a louça de que nos servimos, o fósforo que acendemos, o cigarro que fumamos, o bilhete de eléctrico em que nos transportamos, o telefonema que fazemos. Há vilas e regiões inteiras que mais parecem colónias do que terra de um país independente.»
«A fraqueza militar e o atraso económico de Portugal não lhe dão voto efectivo no bloco da OTAN. Na OTAN quem manda são os grandes. Portugal na OTAN é pouco mais que “território” ao serviço das grandes potências imperialistas. Para a OTAN, Portugal significa fundamentalmente as bases que há e aquelas que pode haver […].
«Pelo que já hoje significa e pelo que pode representar no futuro, a participação na OTAN e, em particular, a existência de bases militares no nosso território, é contrária à liberdade, à in dependência e à segurança da nação portuguesa.» (48)
A imprensa
clandestina
A imprensa clandestina do PCP entronca na sólida árvore da imprensa do movimento operário português, reflexo vibrante das suas lutas, das suas vicissitudes, das suas contradições e do seu desenvolvimento.
A clandestinidade impunha condições extremamente desfavoráveis para a elaboração e difusão da imprensa.
Mas a abnegação e o espírito criador dos comunistas permitiram encontrar as respostas adequadas à situação.
A imprensa do PCP esteve à altura do Partido que servia, correspondeu às necessidades da luta do nosso povo, cuja história reflecte nas suas páginas. Durante dezenas de anos ela foi uma afirmação vigorosa do exercício do direito à informação num país dominado pela férrea censura fascista.
A publicação do Avante!
O golpe fascista de 28 de Maio de 1926 e a instauração da ditadura tinha alterado por completo as condições em que era produzida e difundida a imprensa comunista portuguesa. Contudo, a necessidade de difundir as palavras de ordem do Partido e mobilizar os trabalhadores para a luta, aplicando os ensinamentos de Lénine sobre o papel da imprensa na organização do Partido, deu origem a uma nova imprensa comunista, de que o Avante! é o resultado mais brilhante.
O primeiro número do Avante! saiu em 15 de Fevereiro de 1931, uma das consequências da reorganização do Partido de 1929, dirigida por Bento Gonçalves. Os primeiros dez anos da sua existência são extremamente dificultados pela repressão fascista, por um lado, e pela insuficiente preparação do Partido para enfrentar com êxito as ofensivas repressivas (49).
Só dez anos depois do seu aparecimento, em 1940/1941 e como consequência da reorganização do Partido destes anos, se conseguiu estabilizar a publicação do Avante! e desde Agosto de 1941 até ao 25 de Abril de 1974, jamais se deixou de publicar regularmente, composto e impresso no interior do país. É considerado internacionalmente o jornal que durante mais tempo resistiu à clandestinidade (50).
Como órgão central do PCP, o Avante! desempenhou um importantíssimo papel de agitação e propaganda, de formação ideológica, de organização, de esclarecimento e difusão dos objectivos do Partido. Como jornal operário, foi o grande órgão de mobilização, de consciencialização e unificação dos esforços de todos os trabalhadores portugueses. Como jornal antifascista, foi um combatente incansável pela unidade de todos quantos se opunham à ditadura (51).
Os obreiros do Avante! foram militantes comunistas como José Dias Coelho, Maria Machado, Joaquim Rafael, José Moreira e muitos outros, que com a sua dedicação sem limites, a sua coragem e abnegação, a firmeza revolucionária e dedicação a este trabalho, permitiram o funcionamento do aparelho de imprensa clandestina do Partido (52).
O papel de O Militante
Ao lado do Avante!, O Militante é a publicação do PCP com maior período de vida e regularidade de publicação. Começou a ser publicado em 1933 e foi também com a reorganização de 1940/1941 que a sua publicação se tornou regular, saindo o último O Militante clandestino em Fevereiro de 1974. O Militante teve igualmente um importantíssimo papel nomeadamente na aquisição de uma compreensão justa dos problemas de organização, da luta de massas e da organização do movimento popular, na defesa do Partido e na educação moral dos comunistas, tal como na luta contra a política e o terror fascistas, tornando-se indissociável de todo o trabalho de construção e fortalecimento do Partido.
Jornais de classe e órgãos de unidade
A preocupação do Partido de abranger, promover e defender a unidade de todos os sectores e camadas antimonopolistas, de todos os antifascistas, concretizou-se também na publicação de outros jornais como O Camponês, O Corticeiro, O Têxtil, A Voz do Soldado, O Marinheiro Vermelho. Estes jornais, onde os comunistas empenharam os seus esforços, a sua experiência e os seus meios técnicos, demonstram bem a amplitude da luta popular contra o fascismo.
Presença em todas as frentes de luta
No entanto, dos prelos clandestinos saíram não apenas jornais mas também uma grande variedade de textos impressos. Clássicos do marxismo-leninismo, obras teóricas dos dirigentes do Partido, documentos do Comité Central e muitos milhares de manifestos, tarjetas, volantes, sempre com o objectivo de satisfazer e esclarecer as necessidades teóricas, de agitação e propaganda da luta do povo, dirigidos à preparação e ao desenvolvimento de lutas concretas dos trabalhadores e das forças antifascistas. A imprensa clandestina do PCP desempenhou um valioso papel de agitação e mobilização na luta antifascista. Os próprios boletins prisionais desempenharam um importante papel no interior das prisões fascistas (53).
As tipografias clandestinas eram, exteriormente, casas de habitação como as outras, onde vivia uma família como outra qualquer. No entanto, era no interior dessas casas que os tipógrafos trabalhavam afincadamente, muitas vezes durante dias e noites, imprimindo no mais curto espaço de tempo os textos que recebiam dactilografados ou manuscritos, para que rapidamente fossem entregues ao aparelho de distribuição. Era um trabalho duro e cheio de perigos. Apesar das dificuldades próprias desta tarefa e apesar das tipografias serem um dos alvos preferenciais da repressão fascista, a imprensa clandestina do PCP funcionou ininterruptamente desde a reorganização de 1940/1941 (54).
A Rádio Portugal Livre
Mas nem só no papel se divulgavam as lutas, se denunciavam a exploração e a opressão fascistas. Em 12 de Março de 1962, a Rádio Portugal Livre (RPL) iniciava as suas emissões. Durante os seus 12 anos de actividade, a RPL transmitiu milhares de programas em emissões quotidianas, mobilizando as massas populares para o combate, dando a conhecer as notícias e informações sobre Portugal e o mundo e que a censura fascista proibia.
A luta contra o obscurantismo fascista
Para prolongar a opressão sobre o povo português, para tentar perpetuar a desenfreada exploração dos trabalhadores, o fascismo conduzia uma política obscurantista, de intensa e diversificada repressão cultural.
Através do trabalho criador e da luta dos intelectuais(55), da acção das colectividades populares e de outras associações de difusão cultural, numa expressão da amplitude e da profundidade do movimento democrático e revolucionário, o povo português resistiu tenazmente à repressão cultural.
Insistentemente, o PCP mostrou que a guerra à cultura e ao ensino conduzida pelos governos fascistas era uma forma da sua repressão sobre o movimento democrático nacional, e que quaisquer transformações sérias na vida económica, política e social teriam de ser acompanhadas por uma modificação radical do panorama do ensino e da cultura.
A censura e a luta pela liberdade de expressão
A política obscurantista, de intensa e diversificada repressão cultural, a guerra à cultura e ao ensino, conduzidas pelo governo fascista, eram maneiras de prolongar a opressão sobre o povo português, formas de repressão sobre o movimento democrático nacional.
Sob formas mais grosseiras ou mais subtis, abertamente política, mas revestindo também formas de coacção e discriminação económica, a censura foi uma arma utilizada contra todas as formas de manifestação do pensamento, de criatividade literária, artística e científica.
A censura visava não só a repressão mas também a intimidação e a autocensura.
Pelas mais diversas formas, a censura (56) foi desmascarada e combatida. Através de múltiplos protestos, desde as tomadas de posição e iniciativas individuais e de grupos profissionais às acções mais amplas, com carácter de massas, o combate contra a censura foi permanente, acompanhado pela luta muitas vezes imaginativa, hábil e corajosa para ludibriar os censores, para informar e criar.
A luta pela democratização do ensino e da cultura (57)
A política do regime em relação ao ensino, desde o seu início marcada pela anulação de medidas positivas tomadas durante a República democrática, caracterizou-se pela tentativa de imposição ideológica dos valores reaccionários do fascismo e pela manutenção de elevadas taxas de analfabetismo; por baixíssimas despesas com a educação e a ciência; por um aparelho escolar marcado por uma forte selectividade de classe; por um enorme atraso científico e pedagógico, pela tentativa de controlo político e ideológico de professores e estudantes, pela repressão e expulsão do ensino de muitos deles e pela repressão sobre as suas organizações.
O desenvolvimento cultural do povo constituía uma ameaça que o regime temia e perseguia ferozmente. Inúmeras manifestações da cultura popular foram ignoradas, desprezadas, proibidas ou destruídas.
Para além das reivindicações e das pro postas programáticas apresentadas pelos comunistas e outros democratas, a luta contra o obscurantismo fascista exprimiu-se fortemente na iniciativa cultural popular, a partir das co lectividades de cultura e recreio e de outras organizações populares. A acção dessas associações, figuras como as de Bento de Jesus Caraça, iniciativas como a Universidade Popular, a Biblioteca Cosmos e o Coro Lopes-Graça, são testemunhos do longo combate democrático pela educação e pela cultura popular.
Igualmente as artes, desde a literatura ao cinema, passando pelas artes plásticas, o teatro e a música, todas sofreram as imposições ideológicas, a dis criminação política e a repressão cultural do fascismo.
A literatura e as artes plásticas
O fascismo não só não teve consigo, como teve contra si, a grande maioria dos escritores portugueses, muitas das maiores figuras da literatura portuguesa do século XX (58).
Expressão da amplitude e da profundidade do movimento democrático do povo português e testemunhando a recusa da opressão social, cultural e política, a literatura dá voz, de múltiplas formas, à realidade do país, mistificada pela propaganda fascista, e à luta popular.
A literatura portuguesa, e em particular a sua corrente neo-realista, exprimiu a insubmissão do povo português, revelando a face anticultural do regime, foi testemunho e factor do crescente isolamento do regime fascista, foi expressão da recusa da opressão social, cultural e política dos portugueses.
Também as artes plásticas sofreram as imposições ideológicas, a discriminação política e a repressão cultural do fascismo e resistiram. Uma iniciativa como as Exposições Gerais de Artes Plásticas, que ao longo dos anos foi sendo realizada, revelou o empenhamen to colectivo dos artistas plásticos na afirmação da sua independência face ao poder fascista, na procura dos meios que possibilitassem o acesso das mais largas camadas do nosso povo ao seu trabalho artístico.
O cinema, o teatro e a música
Também a música, o cinema e o teatro sofreram a perseguição movida pelo regime fascista. No entanto, compositores e intérpretes, tanto da música dita erudita como da música popular, e nomeadamente da canção de protesto e de intervenção política, cineastas, dramaturgos e actores, lutaram ao lado do povo pela liberdade de criação artística, por uma sociedade liberta do obscurantismo e da exploração do homem pelo homem.
Quer no quadro das colectividades po pulares, quer através da criação de cineclubes e grupos de teatro, milhares de artistas portugueses deram o seu válido contributo para o desenvolvimento da nossa cultura e participaram activamente na luta de todo o povo.
19581965 As forças revolucionárias abalam o regime
Nos anos de 1958-1962 realizam-se algumas das mais grandiosas acções de massas de toda a história da luta antifascista. Na campanha «eleitoral» de 1958 centenas de milhares de portugueses manifestam-se nas ruas, em todo o país, contra o regime fascista e pela democracia. As lutas reivindicativas dos trabalhadores multiplicam-se e radicalizam-se. As lutas estudantis sofrem um grande impulso. O início da luta armada de libertação nacional nas colónias portuguesas cria novas dificuldades ao regime e provoca a abertura de uma nova frente de luta, nomeadamente nos quartéis.
A grande combatividade popular permite o desencadeamento de grande lutas políticas abertas, que são impostas ao fascismo mesmo fora dos períodos «eleitorais».
O regime responde com a repressão. Mas, abalado até aos alicerces pelo combate das forças revolucionárias, não consegue recompor-se. A ideia do levantamento nacional como única via para a vitória sobre o fascismo ganha os trabalhadores e amplas camadas do povo português.
Uma grande campanha popular pela liberdade
Nas «eleições» de 1958 para a Presidência da República, o salazarismo não consegue impedir a concorrência da oposição. O PCP defende que a farsa eleitoral se transforme numa grande batalha pela liberdade e tem um papel destacado no aproveitamento destas «eleições». Em torno da campanha realizam-se por todo o país enormes acções de massas contra o fascismo, os sentimentos democráticos do povo expressam-se em vastas manifestações de apoio aos dois candidatos da Oposição, o General Humberto Delgado e o democrata Arlindo Vicente.
O governo fascista vê-se obrigado a autorizar mais de 60 sessões públicas (59). Por toda a parte o povo reclama pelas liberdades democráticas, a libertação dos presos políticos e a demissão do governo de Salazar. Apesar das proibições, das prisões e da violência repressiva de que resultam numerosos mortos e feridos, centenas de milhares de pessoas participam nestas acções em Lisboa e no Porto, bem como dezenas de milhares em localidades mais pequenas como Beja, Aveiro, Viseu, Barreiro e Castelo Branco. Em Maio entram em greve 50 mil trabalhadores e em Lisboa são presos 700 operários (60).
Nos últimos dias da campanha, um comunicado conjunto sela a unidade popular afirmada em torno das duas candidaturas, terminando com a Oposição Democrática unida em apoio da candidatura do General Humberto Delgado.
A unidade de todas as forças da democracia permitiu dar uma nova dimensão à luta. A Oposição prossegue a luta até às urnas, e apesar do governo falsificar os resultados, o autêntico plebiscito pela democracia já tinha sido feito através das gigantescas manifestações de rua. A burla eleitoral fascista levanta uma poderosa vaga de protestos, encabeçada pela classe operária, com cerca de 60 mil trabalhadores em greve e centenas de milhares de pessoas reclamando a demissão de Salazar e do seu lugar-tenente Santos Costa.
O ascenso da luta de massas em 1961-1962
O fascismo desencadeia uma forte repressão, prendendo muitos democratas, perseguindo e forçando outros a exilar-se criando dificuldades de organização e pondo vários sectores da Oposição descrentes nas possibilidades da luta. No entanto, as lutas de 1958 revelaram existir no povo enormes reservas de combatividade e uma incontí vel aspiração à liberdade, que era necessário estimular, organizar e dirigir no rumo certo. A partir de 1960, o PCP lança ombros a esta tarefa e impulsionou a luta política, aproveitando as «eleições» para deputados de 1961 (61). Os resultados não se fazem esperar e nos anos de 1961-1962 a luta entra numa nova fase (62).
Em Novembro de 1961, aproveitando a farsa eleitoral fascista, os comunistas desencadeiam importantes acções que culminam em grandes manifestações de rua em Almada (63), Lisboa, Grândola, Coimbra, Covilhã e outras localidades. Nos primeiros meses de 1962, a par das lutas reivindicativas, intensificam-se importantes acções políticas de massas.
O 31 de Janeiro no Porto foi uma grandiosa manifestação de massas (50 mil pessoas gritaram «Liberdade» e «Amnistia»! (64). Os estudantes colocam-se nas primeiras linhas da luta antifascista: em Março realiza-se o Encontro Nacional de Estudantes em Coimbra. Face à proibição do Dia do Estudante decretada pelo governo desenvolve-se em todo o País, mas particularmente em Lisboa, uma prolongada luta com greves e «luto académico».
O 1.º de Maio de 1962
As grandes jornadas do 1.º de Maio levam 100 mil pessoas a manifestar-se nas ruas de Lisboa, que ficam ocupadas pelos manifestantes durante longas horas (65). Os manifestantes res pondem heroicamente às cargas brutais da polícia. É morto o jovem operário comunista Estêvão Giro (66). No Porto, em Almada, no Barreiro, no Couço e em tantas outras terras, dezenas de milhares de pessoas manifestam-se no 1.º de Maio; no 1.º de Maio; no litoral alentejano, cerca de 50 mil trabalhadores param o trabalho; no Ribatejo, Alto Alentejo, arredores de Lisboa e noutras regiões, há greves e manifestações e praticamente ninguém trabalha no 1.º de Maio. São milhares de pessoas que enfrentam a violência brutal das forças repressivas mas que não deixam de se manifestar neste Dia do Trabalhador. A 8 de Maio, dezenas de milhares de pessoas manifestam-se novamente em Lisboa, comemorando a derrota do nazismo, contra o salazarismo e pela paz. Em Alpiarça, no Porto, em Baleizão e outras localidades sucedem-se as greves e manifestações.
As grandes jornadas de 1 e 8 de Maio de 1962 são o culminar do ascenso das lutas revolucionárias do início da década de 60. Através delas, a luta política aberta imposta mesmo fora dos períodos «eleitorais» torna-se a forma mais importante de luta. A classe operária suplanta todas as outras classes e sectores sociais na luta contra o fascismo. O PCP afirma o seu papel de guia incontestável da classe operária e de todo o povo português.
Os trabalhadores rurais conquistam a jornada de 8 horas
As lutas do 1.º de Maio têm continuidade durante todo o mês nas greves dos assalariados rurais do Sul pela jornada de trabalho de 8 horas. Luta antiga que, em Maio de 1962, culmina numa reivindicação comum e geral. Os assalariados rurais do Alentejo Litoral põem em prática o novo horário, seguidos dos trabalhadores do Alto Alentejo, Setúbal e Ribatejo (67). A luta não é fácil, os agrários e os fascistas procuram resistir. A GNR é atirada contra os trabalhadores, há prisões em massa, espancamentos e agressões. O Alentejo está praticamente em estado de sítio, mas no Sul do Tejo, a jornada de trabalho de 8 horas é conquistada e defendida, em pleno fascismo e contra ele (68).
Só depois de concentrações, muitas paralisações e greves, a vitória é alcançada. A conquista da jornada de trabalho de 8 horas torna-se um marco fundamental na luta do proletariado português pela sua libertação.
Nas lutas de 1962, foram lançadas nas terras do Alentejo e do Ribatejo muitas sementes que, 12 anos mais tarde, com o 25 de Abril, viriam a florir na Reforma Agrária.
A luta de libertação das colónias portuguesas
O início da guerra colonial traz ao povo português mais sofrimentos. Todavia, enfraquece o regime e abre uma nova frente de luta (69).
A 4 de Fevereiro de 1961, inicia-se a insurreição do povo de Angola sob a direcção do MPLA.
Em Dezembro do mesmo ano, Salazar é derrotado em Goa, Damão e Diu.
Em Janeiro de 1963, o PAIGC dá início à luta armada na Guiné e, no ano seguinte, a FRELIMO inicia a luta armada em Moçambique.
Contra os interesses nacionais, Salazar lança Portugal nas criminosas guerras coloniais, numa tentativa de retardar o irreversível movimento de libertação nacional. Dezenas de milhares de jovens ficam com a vida cortada por 13 longos anos de guerra colonial. Cerca de 10 mil perderam a vida e à volta de 30 mil voltaram mutilados.
O luto e a dor entram nos lares portugueses. O custo das guerras coloniais arruína ainda mais o país, obrigando o governo fascista a pedir o apoio das grandes potências imperialistas da NATO, pagando-o com novas e cada vez maiores concessões ao capital estrangeiro.
As guerras coloniais desencadeiam uma grande vaga de lutas no país. Os soldados protestam e resistem ao embarque para África com o apoio dos seus familiares. Há manifestações e lutas nos cais de embarque. É uma nova frente de luta que se abre: a luta nas Forças Armadas.
«Aguentar, aguentar!»
As grandiosas lutas de massas de 1958-1962 e o início da luta armada de libertação nacional das colónias portuguesas marcam o início da derrocada do regime fascista. As suas contradições internas agudizam-se e a situação económica degrada-se. A total incapacidade para resolver os problemas nacionais e principalmente o problema colonial é notória.
A palavra de ordem de Salazar é «Aguentar, Aguentar!», para prolongar a todo o custo a sobrevivência do regime. Intensifica-se brutalmente a repressão e, em sucessivas levas, centenas de patriotas e destacados quadros do PCP são presos e cruelmente torturados (70). José Dias Coelho é assassinado pela PIDE.
Contudo, o regime fascista, abalado até aos alicerces pela acção das forças revolucionárias, não consegue recompor-se.
A repressão
Para defender os interesses de classe dos monopolistas e agrários, o fascismo foi a repressão institucionalizada e generalizada. Assumia quer a forma de repressão em massa, nas ruas, nas fábricas, nas escolas, quer de repressão selectiva, voltada particularmente contra os comunistas e os democratas mais consequentes e combativos.
A repressão utilizava todos os meios: a pressão económica e a chantagem, as prisões, os espancamentos, a tortura, o assassinato. Com a sua violência e o seu carácter sistemático, visava paralisar e aniquilar fisicamente os opositores ao regime e abafar o protesto popular no terror e no medo.
A repressão fascista deixou um longo rasto de vítimas.
Mas não salvou o regime. A solidariedade nunca morreu.
Os antifascistas nem na prisão paravam o combate.
Os mortos tornavam-se heróis chamando novos combatentes à luta.
A PIDE: o mais alto poder do Estado fascista
Polícia de informações, PVDE, PIDE, DGS: através de 48 anos de ditadura, com vários nomes, a polícia política foi a máquina de repressão por excelência do regime fascista. Com o apoio de todas as estruturas do Estado fascista e dos patrões de inúmeras empresas, baseada numa extensa rede de agentes e informadores, a actividade criminosa da PIDE foi sentida em todos os sectores da vida nacional até ao 25 de Abril (71).
Nesta data, a PIDE, dirigida pelo major Silva Pais, era um corpo de 2626 agentes e perto de 400 bufos remunerados (em geral provocadores infiltrados em organizações democráticas). Porém, ao longo de 48 anos de fascismo, a polícia política contou com a colaboração de dezenas de milhares de informadores.
A violação do domicílio e da correspondência, a escuta telefónica, a prisão sem culpa formada e sem julgamento, a provocação política, o espancamento, a tortura e o assassinato foram prática comum da PIDE.
Também no seio dos serviços secretos do imperialismo, a PIDE desempenhou eficazmente o seu papel, mantendo óptimas relações com a GESTAPO de Hitler e a CIA norte-americana, com a DGS de Franco, com o SDECE francês.
Mesmo no seu estertor, no dia 25 de Abril de 1974, a PIDE assassinou a tiro quatro manifestantes antifascistas em frente da sua sede em Lisboa.
O povo inteiro sob a repressão
Com o seu aparelho especializado, a PIDE realizava a repressão selectiva baseada em minuciosas investigações policiais e na tortura para arrancar denúncias, voltada essencialmente para o PCP e o seu aparelho clandestino. Mas não eram os comunistas os únicos alvos da repressão: o povo inteiro estava sob a repressão.
Durante os 48 anos de ditadura, milhares de funcionários públicos foram despedidos pelas suas ideias democráticas e muitos estudantes e professores foram expulsos das universidades. Muitos oficiais foram afastados das Forças Armadas e muitos soldados prestaram o seu serviço militar em destacamentos disciplinares.
A repressão fascista estava em toda a parte e assumia todas as formas (72).
Os cárceres fascistas
Os cárceres fascistas (Aljube, PIDE do Porto, Peniche, Caxias, Angra do Heroísmo, Tarrafal) e o regime prisional foram concebidos e mantidos com o propósito de um lento aniquilamento dos presos políticos – celas com menos de 2 metros por 2 metros e meio e sem janelas para os presos incomunicáveis, o «segredo», o sistemático isolamento dos presos, a vigilância e provocações permanentes, um regime alimentar desgastador, a privação de exercício físico, as restrições arbitrárias de contactos com a família, as constantes ameaças, espancamentos, castigos e maus tratos, a correspondência censurada (73).
A resistência à tortura
A tortura era o «método de investigação» mais usado pela PIDE. Pelo espancamento, pela «estátua», pela tortura do sono e pela incomunicabilidade, os torturadores procuravam quebrar, humilhar e vencer. Golpeiam com matracas, com tábuas, a soco e pontapé. Obrigam o preso a ficar de pé dias e semanas a fio, impedindo-o de dormir. Por vezes chegam as alucinações, o esgotamento, o desfalecimento. Por vezes os torcionários matam. Mas muitos e muitos são os que não quebram. A brutalidade é vencida pela força moral, pela confiança no Partido, na classe operária, nos trabalhadores, na justeza da luta. O combate continua sob a barbaridade da tortura.
A vida e a luta nas prisões
Só uma elevada resistência moral e uma profunda entrega à luta revolucionária permitiu que os presos políticos mantivessem a sua dignidade e espírito de luta. Iludindo a vigilância dos carcereiros (74), nunca esquecendo os cuidados conspirativos, imaginando, in ventando e aperfeiçoando métodos, os presos conseguem comunicar entre si e com o exterior, sendo passadas para dentro e fora das prisões milhares de pequenas folhas manuscritas que testemunhavam a permanência, mesmo dentro da prisão, da organização do Partido (75).
Nos tribunais plenários a defesa acusa
Os tribunais plenários, que julgavam os democratas acusados de «crimes políticos», foram um dos instrumentos da máquina repressiva da ditadura. Os juízes submetiam-se às orientações da PIDE em relação às condenações que ditavam ou ao prolongamento das medidas de segurança (76).
Enfrentando, corajosa e firmemente, os tribunais fascistas, muitos foram os comunistas que passaram de acusados a acusadores, denunciando a farsa do julgamento, acusando o regime pelos seus crimes, condenando a política de opressão e exploração, afirmando o carácter democrático e patrió tico da luta do PCP e a sua in que brantável decisão de a continuar.
A solidariedade manifesta-se
A luta contra a repressão foi uma das mais importantes frentes de luta contra a ditadura, mobilizando milhares de democratas no repúdio e na denúncia da brutalidade fascista.
Ao longo dos tempos, essa solidariedade assumiu formas diferenciadas. Lutando por uma ampla amnistia, divulgando as terríveis condições prisionais, exigindo a libertação de presos através da edição de materiais de propaganda, de manifestações, protestos no País e junto de organismos internacionais, formaram-se diversas comissões de luta contra a repressão e de apoio aos presos políticos, ajudando a isolar interna e externamente o regime.
As fugas
Várias foram as fugas, colectivas e individuais, dos diferentes cárceres fascistas – do Aljube, de Caxias, de Peniche, da PIDE do Porto. O êxito destas evasões deve-se ao apego dos militantes à luta constante e diária ao serviço da sua classe, do seu povo e do seu país, e à sua firme disposição de reconquistar a liberdade para regressar ao posto de combate. Esse apego e essa disposição ajudam a compreender a coragem e a audácia reveladas para arrostar com os perigos que os separavam da liberdade.
Fugindo e reocupando o seu lugar na luta, os militantes comunistas derrotavam o aparelho repressivo do fascismo, reforçavam o Partido e o seu combate.
A fuga de Peniche
A fuga de Peniche a 3 de Janeiro de 1960 foi uma das evasões mais espectaculares de toda a história do fascismo. Primeiro por se tratar de um numeroso grupo de destacados dirigentes e quadros do PCP – Álvaro Cunhal, Jaime Serra, Joaquim Gomes, Francisco Miguel, Guilherme da Costa Carvalho, Pedro Soares, Carlos Costa, Francisco Martins Rodrigues (77), Rogério de Carvalho, José Carlos – e, depois, porque estes fugitivos conseguiram escapar de um dos mais seguros cárceres fascistas, o Forte de Peniche.
A fuga de Peniche foi saudada com imensa alegria pelo nosso povo. Foi uma grande vitória para o PCP, que, ao recuperar um elevado número de valiosos dirigentes, desencadearia e dirigiria nos anos seguintes algumas das mais importantes lutas contra a ditadura, as lutas políticas de massas de 1961-1962 (78).
A fuga de Caxias
Outra audaciosa fuga ocorreu a 4 de Dezembro de 1961, do Forte de Caxias, de onde se evadiram Francisco Miguel, José Magro e Guilherme da Costa Carvalho, do Comité Central, e outros destacados militantes como António Gervásio, Domingos Abrantes, Ilídio Esteves, António Tereso e Rolando Verdial (79).
Também esta evasão foi minuciosa e longamente estudada e organizada e pressupôs uma rigorosa compartimentação de tarefas.
Depois da fuga de Peniche, realizada no ano anterior, o Partido alcançava mais uma esplêndida vitória sobre o inimigo fascista e o seu aparelho repressivo. Vários militantes activos e responsáveis regressam à luta. Por exemplo, José Magro terá um papel destacado na organização das grandes jornadas do 1.º de Maio de 1962 na região de Lisboa; António Gervásio será um dos principais organizadores das grandes lutas do proletariado agrícola alentejano pela jornada de 8 horas, em 1962.
Outras fugas: inventiva, coragem, solidariedade
Além das heróicas fugas colectivas de Peniche e de Caxias, muitas outras evasões de militantes comunistas ficaram a assinalar a sua coragem, tenacidade e apego à luta.
Francisco Miguel, para além de ter participado nas fugas de Caxias e de Peniche, evadiu-se mais duas vezes: em Março de 1939, de Caxias, e em Novembro de 1950, de Peniche. Jaime Serra, para além de ter participado na fuga de Peniche, evadiu-se mais duas vezes: uma de Peniche em 1950 e outra de Caxias em 1956. Pedro Soares e Joaquim Gomes fugiram da prisão da PIDE do Porto em Outubro de 1954. Tiveram que abrir um buraco no tecto da sala, saltar para o forro e daí para o telhado, depois de partirem os vidros de uma clarabóia.
Depois caminharam pelos telhados, saltaram para um quintal e escaparam-se por um cemitério.
Em Maio de 1957 fugiram da cadeia do Aljube vários militantes comunistas.
Blanqui Teixeira escapou-se em Fevereiro de 1958 do Hospital de S. José para onde tinha sido levado para tratamento à semelhança do que Joaquim Pires Jorge tinha feito anos antes. Em 1950, fugiu do Hospital dos Capuchos, onde se encontrava sob prisão, Geogette Ferreira; em 1959 Diniz Miranda fugiu da Colónia Penal de Paços de Ferreira. António Dias Lourenço evadiu-se do «se gredo» de Peniche em 13 de Maio de 1943 numa espectacular e perigosa fuga.
Para o êxito das fugas colectivas desempenhou um papel determinante a sua preparação no exterior pela direcção do Partido, como no caso da fuga de Peniche, nomeadamente na resolução de diversos problemas.
Para além disso, e em todos os casos, a solidariedade popular foi sempre um factor de peso no êxito das fugas. António Dias Lourenço, por exemplo, após fugir do Forte e ao atingir uma praia de pescadores, declarou-se comunista e fugitivo do Forte, e encontrou junto das gentes do povo o auxílio que necessitava: foi transportado para longe de Peniche numa camioneta de distribuição de peixe. A fuga de Peniche foi presenciada por várias pessoas mas nem uma boca se abriu para avisar os guardas. O povo estava com os antifascistas e a fuga destes da prisão era uma vitória popular (80).
A via para o derrubamento do fascismo
Para além dos aspectos de mobilização e organização da luta popular, uma das preocupações fundamentais das forças antifascistas e, em particular, do PCP, era a definição de uma orientação correcta para a luta, a determinação da via que permitiria derrubar a ditadura fascista e conquistar a liberdade. Os congressos, as reuniões do Comité Central, os estudos realizados por dirigentes do PCP deram um enorme contributo para a análise destas questões teóricas, de cuja solução científica dependia o êxito da luta.
Em fins dos anos 50 e na primeira metade dos anos 60 estes problemas ganharam uma importância particular.
Nesses anos o PCP desenvolveu um grande trabalho ideológico e teórico, no qual participou todo o Partido e que se alargou mesmo a todo o campo antifascista.
Desse grande debate nacional surgiu uma caracterização rigorosa da ditadura fascista e da via para o seu derrubamento, que guiou todos os combatentes e as massas populares até à vitória.
V Congresso
O V Congresso do PCP realizou-se em Setembro de 1957, depois do período difícil que, com a guerra-fria, a entrada de Portugal na NATO e a divisão das forças democráticas, permitira ao regime fascista, após os abalos sofridos no pós-guerra, recompor-se temporariamente, concentrar a sua violência repressiva contra o PCP e restringir o campo de acção da Oposição. Destacados dirigentes e militantes do PCP, como Álvaro Cunhal, estavam presos; outros, como Militão Ribeiro, tinham sido assassinados.
O V Congresso aprovou uma orientação sobre a estratégia e a táctica para o derrubamento do fascismo, traduzindo um desvio de direita, que viria posteriormente a ser corrigido a partir de um amplo debate no Partido nos anos de 1960-61.
Mérito histórico do V Congresso foi ter discutido o problema colonial no quadro da nova situação internacional, tomando posição pública pelo reconhecimento do direito dos povos das colónias portuguesas à imediata independência. O V Congresso do PCP deu também um novo passo para a normalização da vida partidária, com a aprovação dos primeiros Estatutos e Programa do Partido.
Foi também o primeiro congresso em que o PCP recebeu saudações de partidos irmãos, reflectindo o sucesso dos esforços feitos para o desenvolvimento das relações com o movimento comunista internacional.
O V Congresso expressou a vitalidade, solidez e larga influência do PCP.
Pouco depois da sua realização, o povo português travou uma das suas maiores batalhas contra a ditadura fascista, com a candidatura do general Humberto Delgado na farsa eleitoral de 1958.
O V Congresso elegeu para o Comité Central, entre outros, Sérgio Vilarigues, Pires Jorge, Octávio Pato, Júlio Fogaça, Jaime Serra, Dias Lourenço, José Gregório, Pedro Soares, Joaquim Gomes, Blanqui Teixeira, Georgette Ferreira, Sofia Ferreira, Maria Alda Nogueira, Afonso Gregório, Manuel da Silva, Américo de Sousa, Gui Lourenço.
O Secretariado ficou constituído por Sérgio Vilarigues, Pires Jorge, Octávio Pato e Júlio Fogaça.
Ordem de Trabalhos
1. Informe político sobre as actividades do Comité Central. Relator: Júlio Fogaça (Ramiro).
2. Discussão e aprovação do Programa.
3. Informe sobre os problemas de organização e os Estatutos do Partido. Relator: Dias Lourenço (João).
4. Discussão e aprovação dos Estatutos.
5. Eleição do Comité Central.
Um grande debate ideológico
No ano de 1959 regista-se um sério refluxo no movimento antifascista, resultante da repressão mas também de ilusões legalistas e golpistas, da ideia de que se poderia instaurar um regime democrático por desagregação automática do fascismo. Subestima-se a necessidade de forjar um forte exército político com uma perspectiva revolucionária.
Quebra-se o ímpeto combativo das massas. Tomam-se posições de expectativa que entravam o cumprimento, pelo PCP, da sua função de guia da classe operária e das massas populares.
Nos anos de 1960-1961, após a fuga de Peniche (de que resulta um sério reforço do trabalho de direcção do PCP), desenvolve-se no Partido uma profunda discussão sobre a clarificação da via para o derrubamento do fascismo e um conjunto de questões abrangendo a defesa do Partido, a política de quadros, o trabalho de organização e de direcção e, finalmente, problemas fundamentais de táctica e orientação do Partido. Este trabalho culmina na reunião do Comité Central de Março de 1961. Nesta importante reunião, o Comité Central faz uma profunda análise do seu trabalho nos anos anteriores e submete a uma severa crítica o desvio de direita que se verificara em diferentes campos da sua actuação no período de 1956-1959. É traçada uma nova orientação, define-se a via para o derrubamento do fascismo e para a conquista das liberdades políticas. Álvaro Cunhal é eleito Secretário-Ge ral do Partido.
A orientação definida pelo Comité Central em Março de 1961 foi desde logo sujeita à discussão de todos os militantes e encontrou a sua entusiástica adesão.
Posteriormente é aprovada no VI Congresso do Partido com novos desenvolvimentos. Ao mesmo tempo foram combatidas tendências dogmáticas, sectárias e esquerdistas influenciadas pela cisão no movimento comunista internacional provocada pelos dirigentes chineses (81).
Em Abril de 1964, numa nova reunião do Comité Central, é debatido e aprovado o relatório Rumo à Vitória de Álvaro Cunhal, que dará uma contribuição decisiva para a preparação do Programa do PCP aprovado no VI Congresso em Setembro de 1965.
A luta contra a ditadura fascista de Salazar é a luta contra os monopólios e os grandes senhores da terra, a luta contra o domínio imperialista e pela completa independência de Portugal, a luta pelo bem-estar do povo português, a luta pelo reconhecimento do direito dos povos coloniais à autodeterminação e à independência, a luta pela paz e a luta pela liberdade política. Em todas estas direcções se deve desenvolver e intensificar no momento presente a luta das forças democráticas , sendo entretanto a luta pelo derrubamento da ditadura e a conquista da liberdade política a tarefa central de todos os democratas e patriotas por tugueses, aquela em que todos estão unidos e aquela que é condição fundamental para a vitória pelos restantes objectivos.
(…) Nas condições presentes, o levantamento em massa da Nação para o derrubamento da ditadura fascista é a perspectiva para a qual se devem ganhar as amplas massas do povo português. O levantamento nacional, em que a greve geral política pode desempenhar importante papel, terá de transformar-se numa acção armada, com a participação ou neutralização de grande parte das forças militares, caso o governo fascista continue a resistir com a violência e o terror à acção popular.»
A Via para o Derrubamento da Ditadura Fascista e para a Conquista das Liberdades Políticas
VI Congresso
O VI Congresso do PCP, o último realizado na clandestinidade, em Setembro de 1965, teve uma influência determinante para a revolução portuguesa.
A orientação traçada no VI Congresso para o desenvolvimento da luta popular e para o reforço da unidade da classe operária, das massas trabalhadoras, de todas as forças antifascistas, esteve na base das grandiosas vagas de lutas que abalaram os últimos anos do fascismo, e prepararam o seu derrubamento.
Não menos importante foi a perspectiva apontada à táctica do Partido e à acção das massas populares com a definição da via para o derrubamento do fascismo: «O fascismo mantém-se no poder pela força, só pela força poderá ser derrotado.»
Significado histórico para a revolução portuguesa teve o Programa para a Revolução Democrática e Nacional, aprovado no VI Congresso. Partindo de uma profunda análise das realidades portuguesas, das suas características económicas, sociais e políticas, da influência dos factores externos, o Programa definiu os objectivos essenciais da Revolução Portuguesa. Demonstrou que não bastava derrotar o governo fascista e instaurar as liberdades para que a democracia portuguesa se tornasse viável. Tendo em conta a natureza do regime fascista – uma ditadura terrorista dos monopolistas, associados ao imperialismo estrangeiro, e dos latifundiários – o Programa do PCP indicou ser indispensável liquidar não apenas o poder político mas também o poder económico dos monopólios e latifundiários, pôr fim não apenas às guerras coloniais mas também ao colonialismo, mudar não só o regime político mas também destruir as bases de apoio da reacção e do fascismo.
Para alcançar estes objectivos, o Programa do PCP defendeu a conquista do poder por uma vasta aliança das forças sociais portuguesas, englobando o proletariado (operários industriais e assalariados rurais), o campesinato (pequenos e médios agricultores), os empregados, os intelectuais, a pequena burguesia urbana e sectores da média burguesia.
O carácter antimonopolista, antilatifundista e anti-imperialista da Revolução Portuguesa marcou toda a acção do PCP na luta pela liquidação da ditadura fascista e pela conquista de um Portugal democrático.
O VI Congresso elegeu para o Comité Central, entre outros, Álvaro Cunhal, Sérgio Vilarigues, Octávio Pato, Joaquim Gomes, Pires Jorge, Dias Lourenço, Carlos Costa, Jaime Serra, Blanqui Teixeira, Pedro Soares, Francisco Miguel, Sofia Ferreira, Georgette Ferreira, Alda Nogueira, ngelo Veloso, Alexandre Castanheira.
19651974 Rumo à Vitória
A partir de meados dos anos 60 a crise do regime agrava-se. As contradições próprias da sua natureza de classe impedem-no de resolver qualquer um dos grandes problemas nacionais.
A exploração intensifica-se, ao mesmo tempo que se desenvolve a concentração do poder económico nas mãos dos grandes monopólios. A guerra colonial absorve enormes riquezas e inúmeras vidas humanas. O regime fica cada vez mais isolado, aprofundando-se as divisões dentro do seu próprio campo.
Simultaneamente, verifica-se um ascenso constante da luta popular. Multiplicam-se as acções em torno dos mais variados objectivos, manifestando-se a tendência para a sua unificação numa única torrente revolucionária, dirigida contra o próprio regime no seu conjunto. Sectores cada vez mais amplos da população são atraídos para a luta.
O fascismo entra na sua agonia. Como afirmou Álvaro Cunhal no VIII Congresso do PCP, «o derrubamento da ditadura fascista tornava-se uma necessidade imperiosa e entrava na ordem do dia».
O ascenso da luta popular
Nos anos de 1967, 1968 e 1969 verifica-se um crescimento contínuo das lutas reivindicativas e políticas. A classe operária desencadeia as acções mais importantes e tiveram particular significado a «greve da mala» (82) dos cobra dores da Carris de Lisboa acompanhados pelos restantes trabalhadores da empresa com trabalho lento e concentrações (em 1968), as greves sucessivas dos pescadores de Matosinhos e outros portos pesqueiros (1967, 1968 e 1969) e, nos mesmos anos, as lutas dos ferroviários.
Também o movimento estudantil ganha novo vigor e, em 1969, há grandes movimentações académicas nas três academias, que se estendem aos liceus e às escolas técnicas. Desenvolvem-se as lutas de pequenos camponeses, nomeadamente pela conquista dos baldios. Realizam-se acções contra a carestia e a luta contra a guerra colonial começa a ser travada à luz do dia, no quadro da acção política legal.
Nos últimos anos da ditadura, as acções de protesto e luta de todos os sectores sociais antimonopolistas fazem com que o regime perca rapidamente a sua já escassa base de apoio.
A crise do regime fascista
A crise do regime fascista manifesta-se no agravamento da situação económica, na incapacidade de encontrar uma saída para a guerra colonial, no seu crescente isolamento nacional e internacional.
Expressão do agravamento da situação económica são a descida da taxa de crescimento, o aumento do ritmo da inflação, o agravamento do desemprego, a descida dos salários reais, a especulação bolsista, o crescimento da emigração, os défices orçamentais e das balanças comercial e de pagamentos.
No plano colonial, de ano para ano, somam-se derrotas militares, políticas e diplomáticas. Cresce o isolamento interno do regime com o surgimento de divisões na hierarquia das Forças Armadas, na Assembleia Nacional e na hierarquia da Igreja e, no plano externo, o regime sofre sucessivas derrotas na ONU e é fortemente condenado pela opinião pública internacional (83).
Salazarismo sem Salazar
É neste quadro que surge o afastamento de Salazar do Governo em 1968, que vem agravar ainda mais as dificuldades do regime. Marcelo Caetano, escolhido pelos monopólios para lhe suceder, tenta evitar a derrocada total do regime lançando a manobra «liberalizante». No fundo, pretendia alargar as bases de apoio ao regime e os apoios internacionais, mostrar que os fascistas podiam dar um novo rumo à vida nacional e atrair os sectores mais vacilantes da Oposição, isolar o PCP e deter o desenvolvimento das lutas populares, sem nada alterar da política de Salazar.
Alguns sectores da Oposição, nomeadamente socialistas, declaram-se esperançados na manobra e prontos a colaborar nela. Certos grupos esquerdistas proclamam que o fascismo acabara e que o regime ia transformar-se numa democracia parlamentar. Outros insistem em que nada mudara. Só o PCP adoptou uma posição cuja justeza os factos iriam demonstrar. Denunciou a manobra como uma expressão do real agravamento da crise do regime que pretendia esconder a sua natureza terrorista, apontou aos trabalhadores e aos antifascistas as novas possibilidades da luta criadas pelo agravamento da crise. Reafirmou que só o derrubamento do regime, a conquista das liberdades e a liquidação do poder dos monopólios e dos latifundiários, poderiam satisfazer os anseios das massas.
A manobra «liberalizante» foi desmascarada e derrotada fundamentalmente pela luta popular. E essa derrota afundou ainda mais o regime.
A classe operária na vanguarda
No momento em que o fascismo procurava semear ilusões e criar a passividade, a classe operária avança na luta, ajuda a consciencializar e a mobilizar ou tros sectores. É a classe operária que, guiada pelo seu partido, o PCP, ocupa o lugar de força dirigente da luta popular, reunindo à sua volta sectores cada vez mais amplos do nosso povo. As lutas rei vindicativas nas empresas isoladas começam a unificar-se, abrangendo sectores profissionais inteiros, como os metalúrgicos, os operários têxteis e os lanifícios da Covilhã. Algumas acções grevistas têm grande repercussão como as greves dos marmoristas de Pêro Pinheiro, as lutas na TAP, na Lisnave, na CUF e noutras grandes empresas. Simultaneamente, dão-se grandes avanços no aproveitamento dos sindicatos fascistas. Várias dezenas de direcções sindicais são conquistadas pelos trabalhadores, começando a ser criadas estruturas nacionais de coordenação do movimento sindical. Em 1970 forma-se a Intersindical (84).
Movimento democrático: nova dinâmica
Nos anos de 1968 e 1969, o movimento da Oposição Democrática intensifica a sua actividade. A burguesia liberal, que até então tivera um papel importante na luta «eleitoral», apaga-se. Cresce o peso e a influência da classe operária.
Por outro lado, são derrotadas as posições quer daqueles que pretendiam espartilhar o movimento democrático dentro do quadro legal imposto pelo fascismo, dando-lhe, além disso, um carácter anticomunista, quer dos que defendiam o abandono das acções políticas legais e a sua substituição por uma fraseologia pseudo-revolucionária.
O PCP defende a mobilização das massas em grandes acções políticas abertas, uma «unidade renovada na acção e para a acção», assente na unidade da classe operária e das massas populares, materializada em organizações de base de funcionamento democrático, que deslocasse a direcção do movimento das «personalidades» isoladas das massas para os activistas estreitamente ligados a elas.
Com o Congresso Republicano de Aveiro a iniciativa passa definitivamente para os sectores unitários e é neste cenário que o movimento democrático se desenvolve organicamente e se cria a CDE, passando por cima das interdições e da legalidade fascistas, fazendo frente às ameaças e resistindo à repressão, ladeando a censura, lançando-se na luta por objectivos imediatos.
As batalhas eleitorais são grandes acções de esclarecimento e de luta contra o fascismo e fundem-se com o desenvolvimento da luta dos trabalhadores.
A luta contra a guerra colonial
A guerra colonial torna-se o principal factor da crise do regime: nos últimos anos, mobiliza permanentemente 120 mil homens e para a manter o regime atribui-lhe 40% de todos os gastos do Estado.
No plano militar, o fascismo soma derrotas consecutivas em todas as frentes da guerra. O MPLA, a FRELIMO e o PAIGC avançam no terreno. Em 1973, Amílcar Cabral é assassinado em Janeiro e em Setembro é proclamada unilateralmente a República da Guiné-Bissau, com amplo reconhecimento em todo o mundo.
Também no plano internacional, a política colonial sofre estrondosas derrotas com sucessivas condenações do colonialismo português na ONU, partilhadas mesmo por alguns países da NATO (85). O papa recebe os representantes dos movimentos de libertação.
Nas Forças Armadas desenvolve-se rapidamente a luta contra a guerra. O movimento democrático, forçando a legalidade fascista, realiza acções políticas abertas reclamando o fim da guerra.
Em 25 de Outubro de 1971 uma acção de sabotagem imobiliza em Lisboa o navio Cunene que deveria transportar armamento para as colónias. Esta acção da ARA (86) e outras que se lhe seguiram são uma expressão do movimento popular e das suas reivindicações, dando um importante contributo para a liquidação do fascismo e do colonialismo português (87).
Uma torrente de lutas
O ano de 1973 é marcado por grandes lutas em várias frentes, nas empresas e nos sindicatos, nas escolas e locais de trabalho. Realizam-se inúmeras acções reivindicativas, desenvolvem-se os movimentos de socorro aos presos políticos e de luta pela liberdade de expressão. Surgem acções de solidariedade com o povo do Vietname. O III Congresso da Opo sição Democrática realizado em Abril em Aveiro, com a participação de 1500 democratas (88) e onde são apresentadas 200 teses (89), que termina com uma manifestação brutalmente reprimida, afirma-se como uma brilhante expressão da implantação e da combatividade do mo vimento democrático.
Para a ofensiva final
Em Julho de 1973, o Comité Central do PCP reúne para analisar a situação e desta reunião sai um vigoroso apelo para a intensificação da luta, apontando como objectivo imediato o desencadeamento de uma grande ofensiva em todas as frentes contra o fascismo, fazendo convergir todas as lutas numa única e forte torrente de combate.
Aproveitando a farsa das «eleições» para a Assembleia Nacional fascista, dois meses depois desenvolve-se em todo o país uma grande campanha política de massas onde milhares de portugueses desafiam a repressão para apresentar publicamente as suas reivindicações de liberdades democráticas e do fim da guerra colonial. Esta grandio sa campanha política, à frente da qual se encontrava a classe operária e o PCP, é seguida pelas greves de Outubro de 1973 e de Fevereiro de 1974, acompanhadas de amplas movimentações sindicais. Milhares de trabalhadores estão em luta, imprimindo vigorosos golpes no regime fascista que se debate numa crise que o levará à derrota.
Derrubamento do fascismo
Assaltado pelas sucessivas vagas da luta popular, o regime está cada vez mais isolado. É neste clima que cresce entre os militares o descontentamento e a oposição à guerra colonial e ao regime que a mantém. Surge o Movimento dos Capitães que rapidamente se trans forma num movimento político.
Em Março, a Comissão Executiva do Comité Central do PCP proclama: «Pôr fim às guerras coloniais e conquistar as liberdades é uma exigência nacional» (90). É na madrugada de 25 de Abril de 1974 que o Movimento dos Capitães derruba a ditadura fascista, acção rapidamente seguida por um levantamento popular incontível. É a liberdade, depois de 48 anos de ditadura.
19741975 Revolução de Abril
Culminando décadas de resistência e luta popular contra o fascismo, os heróicos capitães do MFA dirigem o levantamento militar que derruba o governo fascista e abre a estrada para a conquista da liberdade, da paz e da democracia.
O amplo, decidido e imediato levantamento popular que secunda a iniciativa militar dos capitães de Abril é o factor decisivo para a consolidação da vitória sobre a ditadura fascista. Apoiando e estimulando os militares patriotas, mobilizando-se e intervindo directamente na realização das mais urgentes tarefas de democratização da vida nacional, o povo fundiu a sua acção com o MFA num mesmo combate, numa mesma vontade, numa mesma aspiração.
Abre-se uma nova época da vida nacional.
Num processo irregular e numa áspera luta, o povo português inicia a caminhada exaltante para a realização das suas mais profundas esperanças e aspirações.
Povo e MFA liquidam o fascismo
Em poucos dias, semanas e meses, vencendo resistências e dificuldades, a acção das massas populares, em estreita e fraterna aliança com o MFA, obtém êxitos de alcance e consequências históricas.
Os orgãos do poder fascista são dissolvidos. A PIDE, a Legião Portuguesa, a Mocidade Portuguesa, a Acção Nacional Popular (91) e as comissões de censu ra são extintas.
Os presos políticos são libertados (92).
Em inúmeras localidades, a administração fascista é substituída por uma administração democrática. As liberdades democráticas (de reunião e manifestação, de expressão, de constituição, organização e actividade dos partidos políticos, as liberdades e direitos sindicais) são conquistadas através do seu exercício activo muito antes da sua consagração legal.
Nas empresas e no plano sindical, os trabalhadores constituem e desenvolvem rapidamente fortes estruturas e organizações de defesa dos seus interesses.
Assiste-se por todo o país ao florescimento das mais variadas iniciativas e formas de intervenção popular. Cessam as operações militares na guerra colonial, estabelece-se a paz, o processo de descolonização dá os primeiros passos (93).
Portugal estabelece relações diplomáticas com os países socialistas, no âmbito de uma nova política de amizade com todos os povos do mundo.
São tomadas numerosas medidas positivas de carácter económico e social, correspondendo a instantes reivindicações e anseios das massas populares. Institui-se o salário mínimo nacional, que beneficia 50% dos trabalhadores. A parte do rendimento nacional que cabe aos trabalhadores sobe de 48% em 1973 para 56,9% em 1975 (94). A subida dos preços é controlada. Os salários reais sobem entre 7,6% e 25,8% no período de Abril de 1974 a Dezembro de 1975. São aumentadas e alargadas as pensões e reformas, é aberto o acesso aos serviços de saúde, são criados os passes sociais, entre tantas outras medidas.
A determinação e energia criadora das massas em movimento impulsiona a evolução do processo de democratização da vida nacional (95).
«O momento exige que se reforce na acção diária a unidade da classe operária, a unidade das massas populares – força motora das grandes transformações sociais; que se alargue e reforce na acção diária a unidade de todos os democratas e patriotas e se desenvolva impetuosamente a sua força organizada; que se reforce a aliança, a cooperação, a solidariedade recíproca entre as massas populares e os oficiais, sargentos, soldados e marinheiros de sentimentos democráticos e liberais.»
Álvaro Cunhal, na chegada a Lisboa, 30 de Abril de 1974 (96)
O 1.º de Maio consagra, com grandiosas manifestações populares em todo o País, a mudança alcançada no 25 de Abril
O movimento operário e popular
O movimento operário e popular afirma-se como uma poderosa realidade da vida nacional e como uma força determinante no curso da revolução portuguesa.
Integrando numerosos movimentos, estruturas e formas organizativas (o movimento sindical unitário, as comissões de trabalhadores, o movimento camponês, os movimentos da juventude, das mulheres, dos intelectuais e quadros técnicos, dos reformados, dos deficientes, dos pequenos e médios comerciantes e industriais, as organizações populares de base, comissões de moradores, associações culturais e desportivas, etc.), o movimento operário e popular desempenha um papel decisivo no processo de realização das grandes conquistas da revolução e na sua defesa.
O desenvolvimento, a combatividade, a implantação nacional e os êxitos históricos do movimento operário e popular são inseparáveis da inabalável orientação do PCP no sentido do constante reforço da unidade da classe operária e de todos os trabalhadores e da constituição de uma ampla frente social e política empenhada na defesa da democracia e das conquistas de Abril e da acção abnegada dos comunistas nas mais diversas estruturas e frentes de luta do movimento popular (97).
«O factor determinante das transformações democráticas e revolucionárias levadas a cabo e das decisões progressistas do poder político foi a luta das massas populares. A luta de massas antecedeu sempre as decisões do poder. A iniciativa partiu sempre de baixo.
A classe operária, as massas populares, os militares revolucionários, avançando à frente dos governos, transformaram a vida nacional e criaram novas realidades, muitas das quais o poder acabou por aceitar e consagrar legalmente, até que finalmente a própria Constituição as consagrou também como parte integrante do regime democrático instituído.
As conquistas e transformações revolucionárias foram produto da combatividade, heroísmo, persistência, decisão e audácia dos trabalhadores e democratas em lutas grandiosas em que participaram milhões de portugueses.
Sem a acção revolucionária das massas, não só não se teriam efectuado as transformações profundas da vida política e económica, como as próprias liberdades e a democracia teriam sido liquidadas num curto prazo.»
Álvaro Cunhal, A Revolução Portuguesa O Passado e o Futuro (98)
«[...] a derrota dos três golpes [golpes Palma Carlos, 28 de Setembro e 11 de Março] foi possível pela determinação da luta da classe operária e do povo português, pelas gigantescas mobilizações de massas, pela firme posição dos capitães do 25 de Abril e pela aliança real, na acção, na luta, do movimento popular com o MFA.
Foram três grandes vitórias do povo e do MFA, de que resultou a salvaguarda e o fortalecimento da democracia e o progresso do processo democrático.»
Álvaro Cunhal, A Revolução Portuguesa. O Passado e o Futuro (99)
Em estreita e fraterna aliança com o MFA, a classe operária, os trabalhadores, o movimento popular, em gigantescas mobilizações de massas, contribuem decisivamente para a derrota das tentativas de golpes reaccionários (particularmente no 28 de Setembro e no 11 de Março), que procuram esmagar as liberdades e direitos conquistados, reprimir as forças revolucionárias, afastar e liquidar o MFA, contrariar e sabotar o processo de descolonização, impedir a plena democratização da vida nacional.
Desmascarando prontamente e dando combate consequente às manobras e golpes da reacção, o PCP está corajosamente na vanguarda da luta em defesa da liberdade e pelo prosseguimento e de senvolvimento do processo democrático (100).
«[...] as soluções inicialmente avançadas pelos órgãos do poder, que estavam voltadas para o neocolonialismo, tiveram todas elas de ser revistas, profundamente alteradas e finalmente completamente ultrapassadas pela luta conjunta e reciprocamente solidária das forças revolucionárias portuguesas e dos povos submetidos ao colonialismo português.»
Álvaro Cunhal, A Revolução Portuguesa. O Passado e o Futuro ( 101)
«[...] as tendências existentes nas forças armadas, segundo as quais estas deveriam conter os movimentos de libertação e servir para impor soluções neocolonialistas, foram ultrapassadas pelo MFA e por todos os sectores militares que entendiam que as forças armadas deveriam agir para concretizar a independência dos povos.»
Álvaro Cunhal, A Revolução Portuguesa. O Passado e o Futuro ( 102)
VII Congresso (extraordinário)
O VII Congresso (extraordinário) do PCP realiza-se em 20 de Outubro de 1974, nas novas condições criadas pelo 25 de Abril, em que o PCP, se transforma rapidamente de um forte partido clandestino de quadros num grande partido de massas. Em 7 de Outubro de 1974 estavam inscritos no PCP cerca de 30 000 comunistas, número que sete meses depois sobe para 100 000. O número de organizações do Partido subia também rapidamente, sendo de 6000 em Maio de 1975.
Nos primeiros meses da revolução o PCP realiza um gigantesco trabalho de esclarecimento e mobilização. Milhares de comunistas são eleitos para órgãos de direcção do movimento popular, são-lhes confiados pelo povo postos importantes no aparelho administrativo e em todas as frentes da luta pela liberdade. Os comunistas participam nos governos provisórios.
A classe operária e vastos sectores do nosso povo vêem no PCP o mais firme defensor dos seus interesses, o mais fiel intérprete das suas aspirações.
Neste quadro, o principal objectivo do VII Congresso foi traçar um balanço da luta do povo português pelo derrubamento do fascismo e pela conquista das liberdades democráticas e definir as novas tarefas e responsabilidades do PCP na vida nacional. Considerando que vários objectivos da revolução democrática e nacional, definidos no Programa aprovado no VI Congresso (1965), tinham sido já realizados ou se encontravam em fase de realização prática, o VII Congresso aprovou alterações aos Estatutos e ao Programa do Partido, incluindo neste uma plataforma de emergência apontando três direcções capitais da luta pela instauração de um regime democrático: o reforço do Estado democrático e a defesa das liberdades; a defesa da estabilidade económica e financeira com vista ao desenvolvimento; o prosseguimento da descolonização. Tendo presente a sabotagem económica do grande capital e dos agrários e a sua conspiração permanente contra a nova situação democrática, o Congresso confirmou a tese fundamental formulada pelo Partido no sentido de que a defesa da liberdade e a construção da democracia exigiam a completa liquidação do poder económico dos monopolistas e latifundiários.
Tratando-se de um Congresso extraordinário, da sua ordem de trabalhos não fazia parte a eleição de novos órgãos de direcção do Partido.
No entanto, foi dada a conhecer pela primeira vez a composição do Comité Central e dos seus principais organismos. O Comité Central do PCP era constituído por 36 membros, efectivos e suplentes, que no seu todo resumiam a história de heroísmo e abnegação do PCP, a sua ligação indissolúvel com a classe operária e os trabalhadores portugueses: 75% eram operários ou empregados; no total passaram 755 anos na clandestinidade, incluindo 308 anos nos cárceres fascistas.
As conquistas da Revolução
As nacionalizações, a Reforma Agrária e o controlo de gestão, as outras realizações da revolução portuguesa, representam conquistas históricas dos trabalhadores e do povo português na sua longa luta contra a opressão e a exploração, apontando à democracia portuguesa o caminho do progresso social e do socialismo.
As grandes conquistas da revolução, que foram consagradas na Constituição, são resultado da luta e do trabalho criador da classe operária e de todo o povo pela realização de profundas transformações nas estruturas económicas e sociais de modo a garantir o funcionamento da economia nacional e a desarticular as bases fundamentais da conspiração dos monopolistas e latifundiários contra a democracia. Como afirmou Álvaro Cunhal no VIII Congresso do PCP, «se não tivesse sido estabelecido o controlo operário e não tivessem sido tomadas as medidas revolucionárias das nacionalizações e da Reforma Agrária, a economia portuguesa teria sofrido um completo colapso e as liberdades teriam sido liquidadas num curto espaço de tempo».
A luta pela defesa e consolidação das grandes conquistas da revolução assumiu-se como elemento, determinante e indissociável da defesa da liberdade e da consolidação da democracia.
As nacionalizações
As nacionalizações são uma conquista histórica da revolução portuguesa, alcançada pela iniciativa e pela luta das classes trabalhadoras e das forças revolucionárias contra a resistência tenaz do capital financeiro, dos grupos monopolistas e das forças reaccionárias e conservadoras.
A nacionalização dos sectores básicos e de outros importantes sectores e empresas da economia portuguesa – banca, seguros, electricidade, petróleo e petroquímica, siderurgia, pirites, adubos, construção e reparação naval, transportes terrestres, marítimos e aéreos, cimentos, vidro plano, celulose, tabacos, cerveja – liquidou os grupos monopolistas que dominavam toda a economia nacional e alterou radicalmente as estruturas económicas do país (103).
Inscritas e consagradas na Constituição como conquistas irreversíveis das classes trabalhadoras, as nacionalizações, pelo seu peso e importância na vida económica nacional, constituíram uma condição essencial e insubstituível para a recuperação e o desenvolvimento económico em benefício do povo e do país. Combatendo tenazmente as tentativas para a sua liquidação, os trabalhadores deram uma alta contribuição para a defesa do regime democrático e para a salvaguarda dos interesses nacionais.
A reforma agrária
A Reforma Agrária foi outra grande conquista da revolução, parte integrante do regime democrático e justo motivo de orgulho da revolução portuguesa (104).
Foi obra dos trabalhadores agrícolas do Alentejo e Ribatejo, tendo na vanguarda da sua luta e organização o Partido Comunista Português (105). A Reforma Agrária realizou-se apesar de não existir um poder e um governo revolucionários, mas um poder e um governo que se debatiam com conflitos internos. Se, apesar disso, se realizou com tanta rapidez e obteve tanto êxito, tal ficou a dever-se ao facto de corresponder inteiramente aos anseios dos trabalhadores, ser a coroação lógica da sua luta secular e a resposta mais eficaz para os problemas da produção e do emprego (106).
Com a ocupação e expropriação de 1 140 000 hectares de terra na posse dos agrários e a constituição de mais de 500 Unidades Colectivas de Produção e Cooperativas, a Reforma Agrária alterou radicalmente as estruturas agrárias nos campos do Sul, dando um golpe profundo no latifúndio.
Desbravando terras abandonadas, aumentando a produção agrícola e o efectivo pecuário, introduzindo novas culturas, construindo barragens, au mentando os postos de trabalho e eliminando o desemprego crónico típico dos latifúndios, adquirindo milhares de máquinas e fazendo vultuosos investimentos à custa de enormes sacrifícios, construindo creches e outros equipamentos sociais para a infância e a terceira idade, alcançando importantes regalias sociais, os trabalhadores rurais do Alentejo e Ribatejo, enfrentando violências, boicotes e enormes dificuldades, lançaram as bases de uma agricultura moderna e florescente ao serviço do pro gresso do país, e iniciaram a construção de uma nova vida alicerçada na liquidação da exploração, na justiça social, na garantia do pão, do trabalho e de um futuro melhor.
O regime democrático
O regime democrático português é uma das grandes conquistas da revolução. Tal como as nacionalizações e a Reforma Agrária, não resultou automaticamente do derrube do regime nem foi oferecido ao povo, mas conquistado e imposto através da luta.
Logo no próprio dia 25 de Abril a liber dade de reunião e manifestação, as liberdades sindicais, a liberdade dos partidos políticos, a liberdade de imprensa passam a ser amplamente exercidas pelas massas populares (108). O direito à greve e os restantes direitos e liberdades são igualmente conquistados logo nos primeiros dias da revolução. O desmantelamento do regime e dos seus órgãos repressivos, o afastamento de muitos dos seus servidores do aparelho de Estado, a liquidação da administração local fascista e a sua substituição por uma administração democrática foram igualmente resultado da luta revolucionária de massas. Portugal, sobretudo graças à criação de uma situação democrática e à descolonização, passa a desempenhar um papel novo no mundo (109).
As forças reaccionárias tentaram por todos os meios impedir que a situação democrática criada pela luta das massas, em aliança com o MFA, desse origem à criação de um regime democrático. Lançaram violentas campanhas contra os militares do MFA nos órgãos de poder. Exigiram a liquidação do Conselho da Revolução. Puseram em causa a Constituição e a sua entrada em vigor (110). Tentaram impedir a realização das eleições para a Assembleia da República. Lançaram-se à conquista do poder económico e político. Mas não foram capazes de impedir a consagração, num regime democrático, das amplas liberdades conquistadas, tal como foram consignadas na Constituição, que definiu os direitos e liberdades dos cidadãos, estabeleceu as garantias económicas e sociais desses direitos com base nas transformações estruturais da sociedade portuguesa, apontando ao socialismo, e instituiu um sistema original e equilibrado de órgãos de poder. A Constituição é uma conquista da revolução e a sua defesa contra os que a querem destruir na prática ou alterar através de revisões inconstitucionais foi assumida como uma das principais frentes de luta para a defesa do regime democrático (111).
As ofensivas da reacção
As grandes conquistas da revolução foram alcançadas no quadro de uma áspera luta, que se tornou ainda mais aguda quando, depois do 11 de Março, a revolução dá grandes passos em frente e define o socialismo como a sua meta. A própria aspereza da luta, atiçada e agravada por provocações esquerdistas e reaccionárias, provoca o aparecimento de divisões, conflitos e rupturas que caracterizaram a crise político-militar do Verão e do Outono de 1975 (112) e que culminaram com os acontecimentos de 25 de Novembro (113). O PCP chamou repetidamente a atenção para os perigos que as divisões e a liquidação do MFA e a ruptura da sua aliança com o povo representavam para a democracia (114). Mas, apesar de todos os esforços realizados, não foi possível evitar a agudização dos conflitos, que acabou por conduzir à derrota e afastamento da Esquerda Militar e a uma nova correlação de forças, favorável à direita, nos órgãos do poder. A partir de então a defesa das conquistas da revolução torna-se a palavra de ordem central das forças democráticas.
Com o apoio do imperialismo, as forças reaccionárias procuram, através de uma política de violação sistemática e ostensiva da legalidade democrática e da Constituição, destruir as novas realidades do Portugal de Abril, impedir a expressão da vontade popular em condições democráticas, preparar a revisão inconstitucional da Constituição e, finalmente, conseguir a concentração total dos órgãos do poder político nas suas mãos com vista à instauração de uma nova ditadura.
O povo defende as suas conquistas
Contra a política da reacção ergue-se o movimento operário e popular. Quer através de grandes jornadas de massas ou de inúmeras lutas nas fábricas e empresas, nos campos e nas escolas, quer através do trabalho criador, da acção nas autarquias, do estudo e apresentação de soluções construtivas para os problemas, os trabalhadores actuam para derrotar os planos da reacção, para unir todos os democratas em torno de uma plataforma de salvação das grandes conquistas populares e, entre elas, do regime democrático.
O PCP desempenha um papel fundamental no combate à ofensiva global da reacção e, com os trabalhadores e o movimento popular, prossegue a luta por uma viragem democrática na política nacional (116).
O PCP na Revolução
O 25 de Abril, abrindo o processo de realização da revolução portuguesa, inicia uma fase inteiramente nova na vida e na história do PCP.
Com a conquista da liberdade, o PCP transforma-se rapidamente de um forte partido clandestino num grande partido de massas. Actuando em estreita ligação com os trabalhadores e o povo, desenvolve uma intervenção decisiva para a realização das grandes transformações democráticas.
Alguns dos pontos essenciais do Programa do PCP para a Revolução Democrática e Nacional são realizados.
O PCP surge perante o povo português como uma força indispensável para assegurar a vida e o futuro do Portugal democrático, na perspectiva do socialismo.
O PCP na Revolução
O PCP dirige os seus esforços fundamentalmente para a organização, unidade e mobilização dos trabalhadores e do povo, quer para a luta em defesa dos seus interesses, quer para a resolução dos mais diversos problemas. É daí que vem a sua força.
Estas mesmas preocupações marcaram a acção do PCP nos órgãos de poder. Vencendo resistências e manobras das forças reaccionárias e pressões do imperialismo, a participação do PCP nos governos provisórios (117) constituiu uma poderosa afirmação de independência nacional e revelou-se um factor da mais alta importância para a defesa da democracia e para a adopção de medidas correspondentes às reivindicações e aspirações históricas, obtidas pela luta revolucionária dos trabalhadores.
Na Assembleia da República, tal como o demonstraram na Assembleia Constituinte, os deputados comunistas honraram o compromisso assumido perante o eleitorado de serem os mais firmes defensores dos interesses dos trabalhadores e das conquistas de Abril (118).
Em Junho de 1976, realizam-se eleições para Presidente da República. O PCP apoia a candidatura de Octávio Pato, que conduz uma batalha política de esclarecimento mobilizando amplas massas em defesa das conquistas da revolução e pela consolidação e prosseguimento da democracia portuguesa. O general Ramalho Eanes é eleito Presidente da República.
Também nos órgãos do poder local a participação dos comunistas constituiu um exemplo de acção construtiva, que permitiu a milhões de portugueses obter satisfação de muitas das suas aspirações (119).
A participação do PCP nos órgãos de poder a todos os níveis comprovou aos olhos de amplas massas que, na acção reivindicativa ou exercendo as mais altas responsabilidades públicas, os comunistas colocam coerentemente as suas energias ao serviço dos interesses do povo e do progresso do país.
Acção construtiva na vida nacional
O PCP luta contra a exploração dos trabalhadores, contra os ataques a liberdades e direitos, contra os planos de destruição do regime democrático. Mas o PCP não é apenas um partido que luta «contra», que se opõe ao que está errado na sociedade portuguesa.
O PCP apresentou ao mesmo tempo propostas concretas e viáveis para a resolução dos problemas políticos, económicos, sociais e culturais.
Disso são exemplo as conferências nacionais e encontros promovidos pelo PCP sobre grandes problemas e sectores da vida nacional. Caracterizados por uma intensa preparação e pela profundidade dos trabalhos, debates e estudos preparatórios em que participaram activamente milhares de militantes do Partido, contando com o contributo de democratas de outras tendências, contando com a opinião de grandes colectivos de trabalhadores, quadros técnicos e especialistas, as conferências e encontros realizados pelo PCP confirmaram a indiscutível superioridade dos processos de trabalho colectivo e da intervenção dos trabalhadores e das massas na discussão e na solução dos problemas do país.
Os documentos dessas conferências e encontros traduzem uma rica acumulação de conhecimentos por parte do PCP, inseparável da sua forte organização, intensa vida democrática e profunda inserção na realidade nacional, e constituem um património único de estudos e propostas.
Profundas raízes no povo
Ao mesmo tempo que cumpriram as suas tarefas de força de vanguarda do movimento operário e popular, os comunistas dedicaram uma grande atenção ao reforço do seu partido, o PCP, pois era dele que dependia, de maneira decisiva, a defesa com êxito das conquistas da revolução e o avanço rumo ao socialismo.
«A definição de uma linha política justa, a firmeza inabalável na prossecução de objectivos essenciais e em questões de princípio, a grande maleabilidade na táctica, a fidelidade ideológica e a atenção às experiências inovadoras, a capacidade de enfrentar com êxito situações extremamente complexas e súbitas mudanças de correlação de forças, a obtenção de grandes vitórias – constituem um êxito histórico do Partido.»
Álvaro Cunhal, A Revolução Portuguesa. O Passado e o Futuro (120)
O constante ultrapassar das metas propostas, tanto nas campanhas centrais como nas de nível regional ou local, e qualquer que fosse a frente de trabalho – iniciativas de fundos, de recrutamento, de organização, de construção de novos centros de trabalho, etc. –, foi o produto da imaginação e do esforço, da criatividade e do empenhamento dos militantes e simpatizantes comunistas e do apoio popular do PCP, que no Portugal de Abril mantiveram e reforçaram a imagem do Partido – um Partido com um lugar incomparável e características inconfundíveis na vida política portuguesa.
O partido da juventude
A União da Juventude Comunista (UJC), criada em 1975, que agrupava jovens operários, empregados e camponeses, e a União dos Estudantes Comunistas (UEC), criada em 1972, em cujas organizações combatiam, desde a clandestinidade, os estudantes comunistas – organizações que apareciam na continuidade da organização da juventude comunista desde a formação da FJCP, ainda antes do golpe militar fascista de 28 de Maio de 1926 –, mobilizaram a juventude para a luta em defesa do Portugal de Abril, contra o desemprego e pela segurança no trabalho, por um ensino democrático, pela ocupação dos tempos livres, pela salvaguarda da paz e pelo combate ao imperialismo.
A UJC e a UEC, defendendo os interesses específicos da juventude trabalhadora e dos estudantes, deram contributos valiosos no processo da Reforma Agrária, em acções culturais, desportivas e recreativas, nomeadamente com a realização de dezenas de Festivais de Canto Livre, e participaram activamente nas eleições para a Assembleia Constituinte (1975) e para a Assembleia da República (1976).
Os estudantes comunistas participaram também nas campanhas de alfabetização de 1974 e, no Verão de 1976, na segunda campanha de alfabetização, através da constituição do Movimento Alfa que simultaneamente contribuiu com acções culturais, educação sanitária e primeiros socorros junto das populações.
Os Pioneiros de Portugal testemunham a preocupação do PCP com a nova geração nascida já no Portugal de Abril. Com a sua actividade recreativa e formativa, exprime a preocupação dos comunistas em dar às crianças condições para que cresçam sem a ameaça da miséria e da opressão e que conheçam a alegria da vida livre e solidária.
O partido da alegria e da fraternidade
Multiplicaram-se por todo o País as muitas festas regionais e locais realizadas pelo PCP, que são outros tantos exemplos do que são e como trabalham os comunistas, do espírito de alegria e luta que prenuncia o futuro melhor que o povo conquistará.
Para além de iniciativas de carácter periódico, várias outras realizações de carácter artístico e cultural se ficaram a dever ao PCP.
Em todas estas iniciativas, e muitas outras nos mais diversos campos de actividade, o PCP mostrou que quando intervém é para actuar construtivamente, é para resolver os problemas, é para concretizar as grandes aspirações do nosso povo.
Um partido democrático, coeso e fraternal
A intensa vida democrática interna e o seu estilo de trabalho próprio, com a participação activa dos militantes na vida do Partido, foram razões para a justeza da orientação do PCP, da sua combatividade e da sua coesão.
Em milhares de organismos, os militantes do PCP discutem colectivamente a orientação mais justa e a distribuição de tarefas mais adequada.
A discussão franca e fraterna, a livre crítica e a autocrítica foram encorajadas.
Aprendeu-se a respeitar a opinião de cada um e promoveu-se a participação de todos na elaboração das decisões. Os direitos e deveres são iguais para todos.
Os organismos dirigentes do PCP são eleitos democraticamente e prestam contas da sua actividade. Todo o trabalho de direcção é colectivo, o que não elimina, antes pressupõe e estimula, a responsabilidade individual e o espírito de iniciativa de cada militante.
Entre os militantes estabeleceram-se profundos laços de solidariedade e fraternidade forjados pelos ideais que os unem, pelas dificuldades, perigos e alegrias vividos em comum.
Um grande partido de massas
Com o 25 de Abril, o PCP transformou-se rapidamente de um forte partido clandestino num grande partido de massas. Esta rápida transformação, acompanhando o desenvolvimento impetuoso do movimento popular, realizou-se sem pôr em causa o carácter revolucionário dos princípios do PCP e aumentou fortemente a sua capacidade de intervenção.
O número de militantes do PCP cresceu continuamente, mesmo nos períodos mais difíceis da Revolução. O partido procurou permanentemente reforçar a sua organização e estruturação, manteve o seu carácter de classe, alargou a sua influência nas várias classes e camadas sociais.
O PCP é uma grande força organizada de massas. Nas suas fileiras pulsa o sangue aguerrido e criador da classe operária e das massas trabalhadoras.
Pelos seus efectivos e pela sua organização, pela sua combatividade e capacidade de intervenção, o PCP surgiu, aos olhos das largas massas do povo português, como um instrumento eficaz para a luta pelos seus interesses, direitos e aspirações. O PCP é um sólido motivo de confiança na vitalidade e no futuro desenvolvimento do regime democrático, na caminhada do povo português em direcção à sua plena emancipação, em direcção ao socialismo.
Partido da solidariedade internacionalista
Uma das razões que fazem do PCP um partido revolucionário, um partido que aponta o futuro, consiste na sua intensa actividade no movimento comunista internacional e no facto de estar ligado às forças mais progressistas da humanidade, às forças que, em todo o mundo, defendem os mais nobres ideais e são portadoras do futuro.
O PCP une a sua actividade em defesa da emancipação social do povo e da pátria portuguesa à solidariedade com os trabalhadores e os povos de todo o mundo. Ao mesmo tempo, a acção do PCP e o seu prestígio internacional reforçaram o apoio e a solidariedade que o povo português recebeu dos povos e forças progressistas do mundo inteiro.
Foi assim durante a dura luta contra o regime fascista. Foi assim na revolução portuguesa.
As posições internacionalistas do PCP são expressão da sua independência. Foram tomadas por sua própria decisão, sem quaisquer ingerências ou pressões externas, e correspondem aos interesses da classe operária e do povo português solidário com todas as forças revolucionárias e progressistas do mundo: com a URSS e os outros países socialistas, com o movimento operário dos países capitalistas, com o movimento de libertação nacional, com os novos países independentes e progressistas.
Na sua actividade internacional, o PCP combate lado a lado com as forças revolucionárias mais avançadas do mundo e beneficia das suas realizações, experiências e vitórias. Por outro lado, com a sua própria luta ao serviço do Povo e da Pátria, o PCP contribuiu para o prosseguimento das grandes e exaltantes batalhas pelo futuro da humanidade.
«Partido, classe e massas são três realidades distintas, que desempenham funções distintas e papéis distintos no processo revolucionário e na transformação da sociedade. Mas, se os limites entre estas três realidades se traduzem por grandes distâncias, por afastamento e por barreiras, isso significa que nem o partido e a classe desempenham o seu papel de vanguarda nem as massas podem desempenhar o seu.»
Álvaro Cunhal. O Partido com Paredes de Vidro (121)
VIII Congresso
O VIII Congresso do PCP, que decorreu de 11 a 14 de Novembro de 1976, em Lisboa, sob o lema «Com a Democracia para o Socialismo», foi o Congresso do balanço da revolução. Nele foram analisados os últimos anos da ditadura fascista, seu derrubamento pela heróica acção dos capitães de Abril, o papel do movimento operário e popular e da aliança do povo com o MFA no desenvolvimento do processo revolucionário, as conquistas alcançadas e os perigos que as ameaçavam. O Congresso caracterizou o novo regime democrático nascido da revolução, definiu a política necessária para o consolidar e desenvolver rumo ao socialismo, e o papel desempenhado e a desempenhar pelo PCP no processo revolucionário.
O Congresso acentuou que a consolidação da democracia, a melhoria das condições de vida do povo, a solução dos graves problemas económicos e financeiros, a salvaguarda da independência nacional exigiam não uma política de recuperação capitalista, agrária e imperialista, mas uma política baseada no respeito pelas transformações económicas e sociais realizadas pela revolução.
O principal documento do trabalho preparatório do Congresso, elaborado por Álvaro Cunhal e intitulado A Revolução Portuguesa. O Passado e o Futuro, de que o Relatório do Comité Central ao Congresso é uma síntese, constitui uma exaustiva análise do processo revolucionário, representa uma contribuição teórica para a compreensão do processo de liquidação do fascismo e de criação de um novo regime democrático; destaca as principais forças motoras da revolução e as que procuram destruí-la e restaurar o passado fascista; aponta a via e os meios de luta que permitirão aos trabalhadores e ao povo consolidar as suas conquistas e impulsionar a revolução rumo ao socialismo.
Precedido dum amplo trabalho preparatório em que participaram mais de 40 mil comunistas, o VIII Congresso aprovou alterações aos Estatutos do Partido, o Relatório de Actividade do Comité Central, uma Resolução Política e um documento propondo um amplo conjunto de «medidas para a defesa e consolidação da democracia e da independência nacional», elegeu o Comité Central do Partido, com 90 membros (54 efectivos e 36 suplentes), o qual elegeu a Comissão Política, o Secretariado e, como Secretário-Geral, Álvaro Cunhal.
No VIII Congresso participaram 1282 delegados (48,5% operários, 26,5% empregados, 19% técnicos e intelectuais).
Assistiram aos trabalhos do Congresso 62 delegações de partidos comunistas e operários, movimentos de libertação e outros partidos revolucionários e democráticos, o que constituiu uma brilhante manifestação de solidariedade internacionalista para com a luta da classe operária e dos trabalhadores portugueses, expressão do prestígio do PCP em todo o mundo.
O VIII Congresso do PCP constitui um marco importante na história do Partido.
Com ele o PCP deu novos passos para melhorar e intensificar a sua actividade ao serviço dos trabalhadores e do povo, na defesa, consolidação e desenvolvimento do Portugal democrático, a caminho do socialismo.
19761985 Contra-revolução, ofensiva e resistência
O processo contra-revolucionário no período entre 1976 e 1985 desenvolveu-se em vários planos escalonados no tempo com vista à criação dos instrumentos de poder e um sistema de alianças destinados a liquidar as grandes conquistas democráticas e a reverter a natureza do regime democrático que as sustentaram, através do recurso a acções terroristas; saneamento de forças progressistas e de esquerda – civis e militares – do aparelho de Estado e da comunicação social; acção divisionista no movimento operário, no MFA, nas forças democráticas; recuperação de figuras gradas do regime fascista; reagrupamento de forças reaccionárias em aliança com o PS; limitação de direitos e liberdades; repressão e violência; política de recuperação capitalista e latifundista.
I Governo Constitucional
A tomada do poder político e a subversão do regime democrático consagrado na Constituição foram objectivos centrais da contra-revolução, paulatinamente realizados a partir do I Governo Constitucional (Julho de 1976) – governo do PS sozinho mas aliado de facto à direita. Esta aliança é reforçada com a entrada de Mota Pinto para o governo (Março de 1977), seguindo-se-lhe um ano depois a formação do II Governo Constitucional (PS/Mário Soares-CDS/Freitas do Amaral).
Nos órgãos de poder, a direita procurou aprofundar o domínio do aparelho de Estado e os ataques ao regime democrático, que assim enfrentou uma conjuntura extremamente perigosa (122).
Poder local democrático
A gestão democrática dos órgãos de poder local foi uma importante conquista da Revolução de Abril.
Logo nos primeiros dias após o 25 de Abril, o movimento popular afastou em muitos concelhos a vereação fascista, instalando-se Comissões Administrativas na base do conhecimento da acção antifascista de muitos democratas.
Mas foi com as primeiras eleições para os órgãos do poder local, em Dezembro de 1976, já num período de ofensiva antidemocrática, que se instalaram órgãos eleitos em todos os mu nicípios e freguesias.
O PCP concorreu no quadro da Frente Eleitoral Povo Unido (FEPU) constituída com o MDP/CDE e a FSP, registando uma subida de 14,6% para 18,1% em relação aos resultados obtidos, meses antes, para a Assembleia da República.
Alcançou a presidência de 37 Câmaras Municipais, sendo bastante significativos os resultados alcançados na zona da Reforma Agrária.
Sempre em ligação com as populações, os eleitos comunistas contribuíram para a satisfação de aspectos prementes das populações, nomeadamente saneamento básico e electrificação que estavam ausentes da maioria das aldeias do nosso país.
Com a Aliança Povo Unido (APU) e os valores do trabalho, honestidade e competência, os eleitos comunistas permitiram que dezenas de milhar de portugueses vissem satisfeitas aspirações básicas para uma vida saudável que, associadas à fruição cultural também conquistada, alteraram significativamente a vida dos portugueses.
Governos de iniciativa presidencial
Os governos ditos de iniciativa presidencial (de Ramalho Eanes), entre 1978 e 1979 – Nobre da Costa, Mota Pinto e Maria de Lourdes Pintasilgo –, foram soluções de recurso devido à dificuldade de acordos na Assembleia da República.
Todos estes governos agravaram os problemas nacionais e as condições de vida dos trabalhadores, e depararam-se com a luta consequente das massas populares e a tenaz resistência do PCP.
Freitas do Amaral (Abril de 1979), quando a direita já domina importantes alavancas do poder, apela à criação de uma Frente Democrática Eleitoral com vista a ampliar o assalto aos órgãos de poder. Forma-se a Aliança Democrática (PPD-CDS-PPM), que em Janeiro de 1980 viria a constituir governo.
Contra as conquistas de Abril
A recuperação capitalista e latifundista fez-se acompanhar de um crescendo da repressão e violência contra os trabalhadores. A par de uma forte ofensiva ideológica, a adopção de medidas contra as nacionalizações, o controlo operário e a Reforma Agrária assume extrema gravidade, conduzindo a um agravamento das condições de vida dos trabalhadores.
Há cargas policiais sobre trabalhadores em luta para defender as empresas. No 1.º de Maio de 1982, no Porto, dois trabalhadores são assassinados (123).
A promulgação da «Lei Barreto» (em Setembro de 1977) dá suporte legal à ofensiva contra a Reforma Agrária. Na zona da Reforma Agrária, a GNR é de novo colocada ao serviço dos latifundiários. Em Setembro de 1979, são assassinados pela GNR, em Montemor-o-Novo, os trabalhadores comunistas Geraldo Caravela e António Casquinha, que participavam numa acção em defesa da Reforma Agrária.
A acção para dividir e enfraquecer o movimento sindical – um dos grandes objectivos da contra-revolução – alarga-se com a chamada «Carta Aberta», primeiro passo para a criação, em Outubro de 1978, da UGT, principal instrumento social da aliança contra-revolucionária do PS, PPD e CDS e patronato contra o movimento sindical (124). A chamada «Lei Gonelha» (Julho de 1979) constitui um grave avanço na escalada do poder contra a liberdade, o movimento sindical unitário e sobretudo a CGTP-IN, que se agravará com a institucionalização da Concertação Social.
IX Congresso
O IX Congresso do PCP realizou-se no Barreiro em 31 de Maio e 1, 2 e 3 de Junho de 1979, sob o lema «Com Portugal, pela Democracia».
A preparação do Congresso pelas organizações do Partido caracterizou-se por uma reflexão profunda e um debate vivo e interessado que mobilizou cerca de 56 000 militantes do Partido, em cerca de 3000 reuniões e assembleias para discussão das Teses apresentadas pelo Comité Central e para a eleição dos delegados.
O Congresso examinou a actividade do PCP e a luta heróica dos trabalhadores e do povo português durante três anos de prolongada ofensiva da política de recuperação capitalista, agrária e imperialista. Testemunhando uma inabalável confiança na capacidade do povo português para fazer frente e derrotar a ofensiva global da reacção contra a democracia portuguesa, o Congresso aprovou um conjunto coerente de propostas e linhas de acção indispensáveis para defender a democracia, melhorar as condições de vida do povo, promover a recuperação económica e o desenvolvimento de Portugal com base nas conquistas de Abril, assegurar a independência nacional. O Congresso aprovou o Relatório de Actividade do Comité Central – Avante com Abril! – apresentado por Álvaro Cunhal e elegeu o Comité Central do Partido, composto por 133 membros (72 efectivos e 61 suplentes).
Participaram no IX Congresso 1749 delegados (48,3% operários, 25,8% empregados, 13,8% técnicos e intelectuais, 2,1% camponeses; 15,3% dos congressistas eram mulheres e 38% tinham menos de 30 anos).
O IX Congresso constituiu uma poderosa afirmação da influência e autoridade política, da presença viva do PCP na sociedade portuguesa, do seu carácter de grande partido revolucionário e de massas, democrático e nacional, força determinante na democracia portuguesa.
Na sua primeira reunião, o Comité Central eleito no IX Congresso do PCP elegeu os organismos executivos e como Secretário-Geral: Álvaro Cunhal.
Aliança Democrática (AD)
A Aliança Democrática (PPD, CDS e PPM), vence as eleições legislativas intercalares de Dezembro de 1979 e forma o VI Governo (Janeiro de 1980).
Sá Carneiro é primeiro-ministro. Em Outubro de 1980 a AD volta a ganhar as eleições legislativas e forma o VII Governo (Janeiro de 1981). O seu objectivo é sintetizado na fórmula «uma maioria, um Governo, um Presidente». Este plano sofreu um rude golpe com a reeleição do general Ramalho Eanes em Dezembro de 1980. Num momento de perigo iminente para a democracia, o PCP apresenta a candidatura de Carlos Brito que realiza uma campanha de esclarecimento, desistindo à boca das urnas, contribuindo assim para a derrota do candidato da AD – o general fascista Soares Carneiro – e do seu plano golpista de liquidação do regime democrático.
Apesar desta importante derrota, o novo Governo AD/Pinto Balsemão (VIII Governo, Setembro de 1981) intensifica a ofensiva.
Coroando a longa e intensa luta contra as políticas da AD, o VIII Governo AD/Pinto Balsemão cai (Dezembro de 1982), seguindo-se a derrota eleitoral em Abril de 1983.
Governo PS/PSD
O objectivo da luta popular – a defesa do regime democrático – é mais uma vez frustrado com a decisão do PS (o partido mais votado nas eleições) de formar governo com o PSD, quando havia na AR uma maioria democrática. O «Bloco Central» acelera e aprofunda a política de recuperação capitalista, lalifundista e imperialista e de restauração monopolista – expressa na austeridade, na abertura ao capital privado de sectores básicos nacionalizados, na intensificação da destruição da Reforma Agrária –, acentuada com a chegada do FMI (125).
A política seguida pelo Governo PS-PSD não só não resolveu como agravou a situação económica e social do País.
A direita exige cada vez mais o acelerar da contra-revolução. O PSD propõe a revisão da plataforma que acordou com o PS, exigindo a revisão da Lei de Defesa Nacional (126), e em Julho lança um ultimato para forçar alterações profundas no sistema político e económico.
Mário Soares, por sua vez, declara a sua oposição à nacionalização dos sectores básicos da economia, tornando-se assim o «pai» da reconstituição dos grandes grupos económicos e financeiros, dos salários em atraso, da precariedade do mercado do trabalho, do «estender da passadeira» ao reforço do poder da direita, a qual entende ser altura de se livrar do PS (127).
A resistência à contra-revolução
A tenaz resistência operária e popular à contra-revolução traduz-se em grandes acções de massas (por vezes brutalmente reprimidas) em defesa das conquistas da revolução, das condições de vida, do regime democrático. É essa resistência tenaz que trava o triunfo definitivo da contra-revolução e garante a defesa de importantes conquistas democráticas: as lutas em defesa da Reforma Agrária e contra a Lei Barreto, em particular a grande jornada de Lisboa (Junho de 1977); o Congresso de Todos os Sindicatos (Janeiro de 1977); as grandiosas manifestações de Lisboa e Porto em defesa do regime democrático (Novembro de 1977); a primeira greve geral da Função Pública desde 1926 (Março de 1978); as grandes manifestações contra a Lei Gonelha (Junho de 1979) e contra o assalto à comunicação social e pela liberdade de informação (Maio de 1980); as grandiosas ma nifestações do 1.º de Maio; a greve geral organizada pela CGTP (Fevereiro de 1982); a marcha nacional contra o desemprego; as greves e manifestações contra os salários em atraso, contra as privatizações (Julho de 1983); a luta dos vidreiros da Marinha Grande, que levou à ocupação daquela localidade por forças policiais (Agosto de 1983); as greves contra o roubo do 13.º mês (Outubro/Novembro de 1983); a manifestação nacional pela demissão do governo da AD (Julho de 1982).
O PCP na defesa das conquistas de Abril
O PCP desempenha um papel fundamental no combate à ofensiva global da reacção, dá uma contribuição de importância capital para a derrota da AD em 7 de Dezembro de 1980 e, com os trabalhadores e o movimento popular, prossegue a luta por uma viragem democrática na política nacional.
Só um Partido com profundas raízes na classe operária e no povo conseguiria fortalecer-se e agir em defesa das conquistas de Abril, travando o avanço da contra-revolução e apresentando propostas para a solução dos mais diversos problemas com que o País e o povo português se viu confrontado.
Disso são exemplo o grande impulso que dá à luta de massas e as conferências e encontros que promove. São de mencionar: as nove Conferências da Reforma Agrária realizadas neste período com a participação do PCP; a Conferência Nacional do PCP – As Eleições para a Assembleia Legislativa (Março de 1976); a Conferência Nacional do PCP para a Recuperação Económica (Junho de 1977); a Conferência das Organizações do PCP para a Defesa e Dinamização do Sector Nacionalizado da Economia (Março de 1978); o Encontro das Organizações do PCP para os Problemas da Educação e o Ensino (Abril de 1978); o Encontro Nacional das Organizações do PCP sobre Cultura Física e Desporto (Março de 1979); o Encontro Nacional sobre os Problemas dos Quadros Técnicos (Março de 1979); Conferência Nacional do PCP sobre as Eleições para a Assembleia da República e Autarquias (Outubro de 1979); o Encontro Nacional de Saúde do PCP (Maio de 1980); a Conferência do PCP – Portugal e o Mercado Comum (Maio de 1980); a Conferência do PCP sobre o Poder Local (Outubro de 1981); a Conferência Nacional do PCP sobre as Eleições para a Assembleia da República (Março de 1983); e a Conferência Nacional do PCP sobre o Poder Local e as Eleições Autárquicas (Maio de 1985).
No plano do reforço do Partido, destaca-se a realização de muitas assembleias de organização e as campanhas dos 50 mil contos (1977) para «fazer face às crescentes despesas e responsabilidades do Partido e assegurar a construção ou compra de uma sede central» (128), que atingiu 70 mil contos em poucos meses, e a «Promoção das conquistas de Abril» que tinha como meta 10 mil recrutamentos, e atingiu quase os 30 mil.
Expressão do reforço e da influência do Partido foram também as Festas Locais e Regionais e, em particular, a grande realização político-cultural que é a Festa do Avante! com a sua primeira edição em 1976 e dez edições realizadas no período de 1976 a 1985.
Importantes foram igualmente os inúmeros comícios e sessões de esclarecimento que contribuíram amplamente para a mobilização popular em defesa da Constituição.
As duas organizações da juventude – UJC e UEC –, a 10 de Novembro de 1979, dão origem à JCP, unificando-se, dando assim continuidade à luta das organizações da juventude comunista desde a década de 20 do século XX. A JCP realiza o seu I Congresso a 24 e 25 de Maio de 1980 num ambiente de grande alegria e confiança no futuro.
Considerando que a solidariedade internacionalista e a tarefa comum da defesa da paz estão no centro da sua actividade internacional, o PCP não só recebe em Portugal numerosas delegações, como delegações do PCP se deslocaram a países de todos os continentes.
Como grande realização de carácter político, histórico, cultural e artístico, destaca-se a Exposição Comemorativa do 60.º Aniversário do PCP (129).
X Congresso
O X Congresso do PCP realizou-se no Porto de 15 a 18 de Dezembro de 1983, sob o lema «Com o PCP continuar Abril», e teve lugar num quadro particularmente complexo da situação internacional e nacional, o que originou um vivo e profundo debate em torno das Teses apresentadas pelo Comité Central.
O Congresso debruçou-se sobre o agravamento da situação mundial caracterizada pela política de intervenção, agressão e desenfreada corrida aos armamentos, conduzida pelo imperialismo norte-americano com a instalação de mísseis na Europa apontados à URSS e outros países socialistas. E examinou aprofundadamente o prosseguimento do processo contra-revolucionário em Portugal que, através da recuperação capitalista, dos ataques à Reforma Agrária e contra as liberdades, direitos e conquistas dos trabalhadores, contrariava a dinâmica produtiva, provocando a recessão e a dependência externa.
O Congresso aprovou um conjunto de orientações para a saída da crise, relativas à estabilidade institucional, organização económica, melhoria das condições de vida, respeito pelas liberdades e a garantia da independência nacional. Apontou como alternativa a necessidade da construção dum governo democrático de salvação nacional, baseado na análise de que havia condições objectivas essenciais para a criação de novos partidos. E ao avaliar o quadro em que se realizaria a eleição para Presidente da República em 1985 (130) decidiu excluir qualquer apoio a Mário Soares como candidato a esse órgão de soberania.
Participaram no X Congresso 2114 delegados (49,6% operários, 22,3% empregados, 2,4% agricultores, 15,2% intelectuais e quadros técnicos, 10,5% de profissões diversas; 19,3% dos congressistas eram mulheres) representando os mais de 200 mil membros do Partido (200 753).
O X Congresso procedeu ainda a alterações aos Estatutos, necessárias quer pela evolução da situação política quer pela rica experiência acumulada no que diz respeito à vida interna do Partido.
Constituindo uma vigorosa afirmação do caracter patriótico e internacionalista do PCP (estiveram 61 delegações estrangeiras presentes), de força revolucionária e indispensável à democracia, o Congresso aprovou o alargamento do Comité Central que passou de 133 para 165 membros (91 efectivos e 74 suplentes).
Na sua primeira reunião o Comité Central elegeu os seus organismos executivos – Comissão Política e Secretariado – e aprovou a constituição dum novo organismo executivo, o Secretariado Político Permanente. Álvaro Cunhal foi eleito por unanimidade Secretário-Geral do PCP.
O processo contra-revolucionário
A contra-revolução acompanhou todo o processo revolucionário, determinando a arrumação de forças políticas e sociais em dois campos, por Abril e contra Abril.
O terrorismo contra organizações populares, sindicais e partidos de esquerda assumiu papel significativo nas acções contra-revolucionárias.
A aprovação e promulgação da Constituição (2 de Abril de 1976) representou importante derrota para as forças contra-revolucionárias ao constitucionalizar as grandes conquistas da Revolução – nacionalizações, Reforma Agrária, controlo operário – e o objectivo do socialismo, fixando como definitiva a liquidação do poder político e económico do fascismo, ao consagrar um regime democrático de amplas liberdades no qual os direitos dos trabalhadores e a sua intervenção em todas as esferas da vida nacional eram parte integrante do regime democrático, dando ao 25 de Abril um carácter libertador e emancipador.
Ofensiva contra-revolucionária global
O ano de 1976 marca o início de uma poderosa ofensiva global contra-revolucionária a partir da formação do Primeiro Governo Constitucional (PS/Mário Soares, aliado de facto à direita), apostado em liquidar as grandes conquistas da revolução, restaurar o domínio dos grandes grupos económicos e financeiros, amarrar Portugal ao «carro» imperialista, reconfigurar o poder do Estado e desfigurar o regime democrático consagrado na Constituição.
A aliança político-militar de forças reaccionárias liderada pelo PS passa a dispor, então, do aparelho de Estado como importante alavanca para acelerar e intensificar o processo contra-revolucionário.
As eleições legislativas de Abril de 1976 resultam numa folgada maioria de comunistas e socialistas na Assembleia da República (131), significando uma derrota dos projectos da direita de utilizar o poder como alavanca do processo contra-revolucionário. Mas com o primeiro Governo Constitucional, e os que se lhe seguiram – PS/CDS (Mário Soares/Freitas do Amaral), PS/PSD (Mário Soares/Mota Pinto) –, o PS assume como orientação estratégica a ruptura com as forças de esquerda (político-militares) e a aliança com os partidos de direita.
O aparelho de Estado é utilizado não como executor de políticas de desenvolvimento e de defesa da revolução, como determinava a Constituição, mas de políticas de recuperação capitalista, latifundista e imperialista de hipoteca da independência nacional pela via da integração de Portugal na CEE e de maior envolvimento na política belicista da NATO: opções assumidas como factores de pressão para liquidar as estruturas sócio-económicas «filhas» da acção revolucionária das massas e pôr fim ao regime democrático sem monopólios e à intervenção dos trabalhadores nas diferentes áreas da vida nacional. A integração nas estruturas do imperialismo deveria constituir ainda um escudo protector contra eventuais «recidivas» revolucionárias.
A aliança do PS com a direita assentava igualmente numa plataforma ideológica anticomunista, anti-PCP e contra o MFA.
Recuperação capitalista, latifundista e imperialista
A política de recuperação capitalista, os ataques à Reforma Agrária e às nacionalizações, a desintervenção de empresas, o revanchismo patronal e as imposições do FMI provocam uma grave crise económica e social, o abaixamento da produção, o aumento do desemprego, a degradação das condições de vida da população, e em particular dos trabalhadores. Os salários em atraso atingem mais de 100 mil trabalhadores. As alterações à legislação laboral fomentam a precariedade, a intensificação da exploração e a arbitrariedade patronal.
A recuperação capitalista e latifundista fez-se acompanhar das limitações às liberdades sindicais e da repressão violenta das forças policiais sobre trabalhadores em luta, bem expressa nos assassinatos na zona da Reforma Agrária em 27 de Setembro de 1979 e no 1.º de Maio de 1982, no Porto.
A ascensão ao poder dos partidos de direita, pela mão do PS, abriu caminho ao seu domínio, com os governos do PS e da AD (PSD, CDS e PPM), e os governos de Cavaco Silva, que colocaram abertamente como objectivo a ruptura com o 25 de Abril, o rasgar da Constituição, a alteração do regime político.
Esta aliança visava ainda a divisão e enfraquecimento do movimento sindical e das organizações de classe e a criação de organizações fantoches como braços sociais do patronato e do governo como condição para os avanços da contra-revolução. Constituiu, igualmente, um seu objectivo a tomada de assalto da comunicação social, o saneamento de elementos de esquerda no aparelho de Estado, um sistema de partilha das pastas e postos pelo PS e os partidos de direita, o afastamento dos militares do MFA das áreas do poder e da intervenção política.
Constitucionalizar a contra-revolução
A revisão da Constituição de 1982 (132) (e as que se lhe seguiram), na base da aliança PS, PSD e CDS, teve como objectivo constitucionalizar a contra-revolução, criar as condições «legais» para o seu prosseguimento, procedendo à reconfiguração do sistema de poder com a extinção do Conselho da Revolução, a eliminação da participação dos militares do MFA na vida política e do seu papel como garantes da defesa da revolução.
Sob a capa de libertar a Constituição da «ganga ideológica» revia-se o carácter emancipador e libertador de Abril.
Luta tenaz e heróica em defesa de Abril
A vida política nacional foi profundamente marcada por uma luta entre as forças da contra-revolução – que não se conformavam com as grandes conquistas democráticas que a Constituição consagrava – e as forças democráticas e populares que travaram uma luta tenaz e heróica em defesa de Abril. Uma luta que tem no PCP – a única grande força política vinculada aos valores de Abril – o seu principal defensor e organizador.
A luta pela democratização da cultura
Vencendo o obscurantismo fascista, e lutando por uma «política cultural que assegure o acesso generalizado à livre criação e fruição culturais», foi um Povo inteiro que se redescobriu com a Revolução de Abril. Uma revolução que abriu portas em todas as esferas da vida cultural e trouxe consigo profundos avanços e conquistas que se firmaram e projectam no futuro de Portugal. Nesses anos, como hoje e no futuro, foi do Povo que nasceram os mais brilhantes criadores. E foram muitos os intelectuais que, dedicando o melhor das suas energias à cultura, à arte e à ciência, reconheceram a necessidade de lutar ao lado do Povo reforçando as fileiras do PCP.
A cultura no Portugal de Abril
O fascismo condenou o País ao atraso em todas as esferas da vida. Procurou manter sob seu controlo a escola, a ciência, a arte, o património, as próprias tradições populares – no fundo, toda a cultura nacional. Dessa forma, procurava impedir a participação consciente na vida política de grande parte do povo.
As profundas transformações provocadas pela Revolução de Abril conduziram à elevação do nível cultural das massas, ao permitir o acesso ao ensino, à instrução e à cultura, ao salvaguardar o património cultural, ao estimular a actividade criadora das massas. As mais diversas manifestações culturais – a literatura e a ciência, a música e o teatro, o cinema e as artes plásticas, a dança e arquitectura – foram até onde antes não tinham podido ir. A construir a revolução, como já antes a resistir ao fascismo, estavam no meio do povo intelectuais, artistas, cientistas.
Todas estas transformações confirmam a interligação e interdependência das quatro vertentes da democracia – a política, a económica, a social e a cultural.
Todos os passos dados para a democratização cultural resultaram de (e resultaram em) avanços nas outras ver tentes da democracia. Por isso, o processo contra-revolucionário, além da limitação de direitos políticos, económicos e sociais, traz consigo a promoção e reposição de valores obscurantistas e retrógrados no domínio da cultura, das mentalidades e da ideologia.
Os comunistas e a cultura
Ao longo dos seus cem anos de vida e de luta, o Partido Comunista Português contou com a militância, o trabalho, o pensamento e a criação artística de milhares de intelectuais que marcaram indelevelmente a história das artes e das ciências e que perceberam a importância da sua acção na dinamização da vida cultural nacional.
Na resistência antifascista, na revolução de Abril e na defesa das suas con quistas, na luta de hoje por melhores condições de vida, pela ruptura com a política de direita e por uma alternativa patriótica e de esquerda, parte integrante de uma Democracia Avançada inspirada nos valores de Abril e indissociável da luta pelo socialismo e o comunismo, os intelectuais comunistas destacam-se não apenas por consagrarem a sua vida à cultura, mas também por se colocarem ao lado daqueles que lutam pela libertação da humanidade da exploração e da opressão.
Armados pelo seu esforço e entusiasmo, amparados pela intervenção determinada das mais amplas camadas da população, os comunistas, ao lado de muitos outros democratas e patriotas, lutam para massificar a cultura em todas as frentes. Do movimento sindical ao poder local democrático, das colectividades ao movimento associativo juvenil e estudantil, dos cineclubes às universidades populares, desempenham um papel fulcral na dinamização da vida cultural portuguesa e na defesa da sua identidade.
Cultura do povo, ao serviço do povo
No seu Programa, o PCP expõe as razões que o levam a considerar a democracia cultural como uma das cinco componentes da Democracia Avançada que propõe ao povo português: «A democracia cultural é um factor da democracia política cujas potencialidades só se podem desenvolver com o alargamento e a elevação da formação e da vida cultural das populações. É um factor da democracia económica e do desenvolvimento, porque representa a qualificação da principal força produtiva: o trabalho humano. É um factor da democracia social porque é um vector de intervenção crescente na vida da sociedade, por parte dos trabalhadores, das classes e grupos sociais mais vitalmente interessados na democracia. É um factor de soberania nacional, porque coopera na formação da identidade nacional, num processo aberto e activo e de interacção com a cultura mundial.»
Na luta pelo socialismo incorpora-se a luta em defesa da democratização da cultura e por uma política cultural ao serviço do povo e do País. Uma tal política cultural exige o efectivo acesso das massas populares à criação e fruição da cultura e a liberdade e apoio à produção cultural, reivindica a valorização da função social de todos os trabalhadores culturais, impõe a defesa do património cultural nacional, regional e local, erudito e popular, tradicional e actual, como forma de salvaguarda da identidade e da independência nacionais.
Assim entendida, a democratização da cultura é factor de emancipação, é democratização de toda a vida, é a liberdade de sonhar e criar, é construir no presente um outro futuro.
19851989 Em defesa das conquistas de Abril
Se o 25 de Abril assumiu o carácter de afirmação da soberania e independência nacionais, a política contra-revolucionária retomou a submissão ao imperialismo e abdicou da defesa dos interesses nacionais, representando o ano de 1985 um marco significativo neste processo com a assinatura do Tratado de Adesão à CEE (12 de Junho/1985) e a integração a 1 de Janeiro de 1986.
A revisão da Constituição de 1989, pondo fim à irreversibilidade das nacionalizações, abriu as portas ao domínio de sectores estratégicos da nossa economia pelo capital estrangeiro.
Actuando em estreita ligação com os trabalhadores e o povo, o PCP propõe uma política capaz de solucionar os problemas nacionais, cujas orientações virão a ser integradas no seu Programa – «Uma Democracia Avançada no Limiar do Século XXI».
A via para vencer a crise
Avaliando a política de recuperação capitalista e latifundista do governo PS-PSD que conduziu o país a uma crise económica e social, o PCP realiza a Conferência Nacional «A Via de Desenvolvimento para Vencer a Crise», que aponta como principais factores da situação a desorganização do processo produtivo, o endividamento das empresas e do país, a situação de pré-ruptura do sistema financeiro e a degradação constante da vida do povo.
A Conferência alertou para as consequências do plano de integração de Portugal no Mercado Comum, considerando-o como parte integrante da contra-revolução e pôs em evidência que só na base duma política nacional e patriótica, baseada na defesa da independência nacional, seria possível interromper o processo contra-revolucionário e defender as conquistas de Abril (133).
A adesão à CEE
A adesão à CEE e o respectivo Tratado – determinados por razões políticas, de suporte aos processos restauracionistas, de modificação das estruturas resultantes da Revolução de Abril – tinham-se tornado o grande objectivo da aliança PS, PSD e CDS, que, num quadro político de grande instabilidade, com a coligação PS-PSD derrotada, conseguiram aprová-los na Assembleia da República (134). O governo PS-PSD primeiro e o governo PSD a seguir, durante o processo de integração, desprezando a vulnerabilidade da economia portuguesa, fizeram concessões altamente gravosas para Portugal.
Os alertas do PCP para os perigos que a integração comportaria, com significativas perdas de soberania e de decisão, e que ficaram bem explícitos na Conferência «Portugal e o Mercado Comum» (Maio de 1980), viriam rapidamente a confirmar-se com a destruição de importantes sectores produtivos da nossa economia (135).
Eleições legislativas antecipadas
A urgência em interromper uma política responsável pelo desemprego em massa e pela chaga dos salários em atra so e que se propunha acabar com as em presas públicas, no primeiro semestre de 1985, colocava como objectivo central a demissão de Mário Soares e do seu governo e a convocação de eleições antecipadas, que seriam realizadas a 6 de Outubro de 1985 (136).
O PSD foi o partido mais votado, mas o resultado eleitoral no seu conjunto apontava para a possibilidade de afastar a direita do poder. A significativa votação do Partido Renovador Democrático (PRD), recém-constituído, elegendo 45 deputados, juntamente com a votação do PCP e seus aliados (38 deputados) e do PS (57 deputados) tornavam possível institucionalmente a formação de um governo apoiado na maioria dos partidos democráticos na AR. Mas o certo é que tal solução não foi aceite pelo PS e pelo PRD (137).
Defender o regime democrático
Num quadro complexo de arrumação de forças, com um governo minoritário do PSD e a direita revanchista a querer ocupar os três principais órgãos de soberania – Assembleia da República, Governo e Presidência da República – as eleições presidenciais de Janeiro de 1986 assumiam uma enorme importância. Perante o resultado da primeira volta e com Freitas do Amaral e Mário Soares a disputarem a segunda volta, o PCP, tendo como prioritária a defesa da democracia, convoca um Congresso extraordinário para decidir o seu voto na segunda volta das eleições.
A derrota de Freitas do Amaral permitiu evitar a liquidação do regime democrático e manter as condições para prosseguir a luta pela demissão do governo PSD de Cavaco Silva.
A par da intensa luta de massas contra as consequências do processo de restauração capitalista e a destruição da Reforma Agrária, em Abril de 1987, o PCP defende a demissão do governo e a constituição dum governo democrático com base na composição da Assembleia da República.
O PRD tomou a iniciativa da apresentação de uma moção de censura ao governo que, aprovada por todos os partidos democráticos, provocou a sua queda. O Presidente da República, Mário Soares, contrariando o que os partidos democráticos tinham expressado, incluindo o PS, dissolveu a Assembleia da República e convocou eleições antecipadas, mantendo além disso em funções o governo do PSD, o que permitiu a este organizar as eleições em condições para si grandemente favoráveis utilizando os meios do Poder e a comunicação social. A direita conseguiu assim alcançar nas eleições de 19 de Julho de 1987 uma grande vitória que se traduziu num novo e perigoso avanço da contra-revolução (138).
XI Congresso (extraordinário)
O XI Congresso (extraordinário) realizou-se no dia 2 de Fevereiro de 1986 na Amadora.
Convocado pelo Comité Central, apenas quatro dias antes, teve como único objectivo definir a «atitude do PCP na 2.ª volta das eleições presidenciais».
O Comité Central tinha considerado, na sua reunião de 28 de Janeiro, que o resultado da 1.ª volta das eleições – em que foram afastados da 2.ª volta os candidatos democráticos (Salgado Zenha e Maria de Lourdes Pintasilgo) e passaram os candidatos de direita (Mário Soares e Freitas do Amaral) – criara uma situação extremamente perigosa para a democracia. E tendo em conta a Resolução Política do X Congresso, que excluía qualquer apoio ou indicação de voto em Mário Soares, a atitude a tomar na 2.ª volta exigia uma reflexão e uma decisão com uma ampla participação do colectivo partidário só possível com o Congresso.
A preparação do Congresso no curtíssimo espaço de quatro dias – em que se realizaram mais de 800 reuniões e plenários, com a participação de mais de 30 mil membros do Partido, pôs em evidência a elevada militância dos comunistas portugueses e o carácter democrático do PCP.
O objectivo central do PCP para estas eleições era a derrota dos candidatos de direita e a eleição dum candidato democrático, considerando necessário fazer convergir os votos num só candidato das forças democráticas.
Assim, o candidato que o PCP apresentou – Ângelo Veloso – interveio no sentido da convergência democrática se concretizar na votação em Salgado Zenha, logo na 1.ª volta, como o único candidato democrático em condições de derrotar os candidatos de direita.
O XI Congresso, examinando as causas que conduziram à derrota de Zenha, apontou como determinante a dispersão e perda de votos em Maria de Lourdes Pintassilgo, que não tinha quaisquer condições de passar à 2.ª volta e muito menos de ganhar as eleições. Considerou ainda que a candidatura de Zenha foi lançada tardiamente e que se defrontou com uma comunicação social que recorreu à intoxicação da opinião pública.
O XI Congresso alertou para a grave ameaça que uma eventual vitória de Freitas do Amaral representaria para a democracia, ao mesmo tempo que existia um governo PSD com Cavaco Silva como primeiro-ministro.
Com base na análise concreta da situação, o Congresso afirmou que não apoiava Soares mas considerou que o único voto possível para derrotar Freitas do Amaral e as suas posições ultra-reaccionárias era o voto em Mário Soares.
Após um debate muito vivo, quer na fase preparatória quer no Congresso, a Resolução Política do XI Congresso do PCP foi aprovada com dois votos contra.
Participaram neste Congresso 944 delegados com a seguinte composição social: 41,7% operários; 28% empregados; 15,7% intelectuais e quadros técnicos; 5,2% agricultores; 9,4% de vários sectores e actividades industriais.
O XI Congresso (extraordinário) foi uma forte afirmação da unidade do PCP e uma extraordinária comprovação do seu papel como uma força indispensável à democracia portuguesa.
Acção institucional ímpar
A redução de representação parlamentar na Assembleia da República não condicionou o empenho dos deputados comunistas na defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do país, na luta contra a reacção e os governos de direita e em defesa do regime democrático.
Por outro lado, no Parlamento Europeu, os três deputados comunistas eleitos em Julho de 1987 trabalharam intensamente em defesa dos interesses nacionais. Nas eleições de Junho de 1989 para o Parlamento Europeu, a CDU elegeu quatro deputados.
Nas Autarquias Locais, a participação do PCP, desde 1976 no quadro da FEPU – Frente Eleitoral Povo Unido (PCP, MDP/CDE, FSP) e, a partir de 1979, na APU – Aliança Povo Unido (PCP, MDP) (139), permitiu a solução de prementes problemas das populações.
A segunda revisão da Constituição
O processo desta revisão da Constituição foi iniciado pelo governo do PSD através dum conjunto de leis inconstitucionais que ficaram designadas por «pacotes»: laboral, das privatizações, e outros para a saúde, a segurança social, o ensino, iniciativas que visavam a subversão do regime.
Não dispondo duma maioria de dois terços para uma revisão, o PSD entende-se com o PS na assinatura dum acordo político de revisão constitucional que visava sérias amputações e distorções na Constituição de Abril.
O PCP encarou a situação como uma importante batalha política em defesa da Constituição e das conquistas de Abril (140).
Intensa actividade internacional
Num período em que se desenvolviam processos contraditórios na luta dos trabalhadores e dos povos, o PCP desenvolveu uma intensa actividade internacional, considerando que a situação exigia a solidariedade e a acção comum das forças democráticas, de emancipação nacional e social e da paz.
Várias delegações, dirigidas pelo Secretário-Geral do Partido, Álvaro Cunhal, e vários outros dirigentes visitaram alguns países socialistas – URSS, RDA, Bulgária, Vietname e China – assim como a Espanha e a França, enquanto em Portugal o PCP recebeu diversas delegações, realizando vários comícios de solidariedade.
A defesa da paz, pelo desarmamento, nomeadamente o nuclear, tornou-se uma questão central da situação internacional. A Marcha da Paz, em Lisboa em Junho de 1986 (141), foi um expressivo testemunho da necessidade do desanuviamento e do desarmamento geral e controlado.
A luta de massas
A luta de massas foi um factor determinante para a defesa de direitos e conquistas de Abril e na evolução da situação nacional. Numerosas lutas por objectivos imediatos conseguiram limitar as consequências negativas da política de direita. O recurso à greve foi decisivo nos conflitos em numerosas empresas e em 1988 os trabalhadores recorreram à greve geral em defesa das suas condições de vida e de trabalho, com a CGTP-IN a dirigir estas acções e muitas outras que envolveram sectores muito diversificados da sociedade portuguesa (142).
As manifestações do 25 de Abril e do 1.º de Maio deram importantes contributos para isolar os partidos responsáveis pelas medidas contra-revolucionárias, designadamente reivindicando a demissão dos governos do «Bloco Central» e do PSD.
O partido e o seu reforço
Sempre com os trabalhadores e o povo na defesa dos seus interesses e direitos, o PCP teve uma intensa intervenção na vida nacional, envolvendo a participação dos militantes em decisões e na execução das iniciativas e tarefas que se lhe colocaram. É no quadro desta intensa intervenção que, em Novembro de 1986, realiza no Pavilhão dos Desportos em Lisboa a Conferência «A emancipação da mulher no Portugal de Abril» (143).
Entretanto, enfrentando uma violenta campanha ideológica centrada na «renovação» do PCP, foi na acção concreta que se concentraram os esforços e energias na concretização da orientação traçada, na base da concepção do trabalho colectivo. Com a realização do XII Congresso e a aprovação do Programa «Uma Democracia Avançada no Limiar do Século XXI», o PCP reforçou a sua coesão e capacidade de intervenção.
XII Congresso
O XII Congresso realizou-se no Porto, de 1 a 4 de Dezembro de 1988, sob o lema «Com o PCP por uma Democracia Avançada no Limiar do Século XXI», num quadro de significativas mudanças na evolução da situação mundial.
O Congresso debateu aspectos da construção do socialismo, assim como as contradições do capitalismo com a sua incapacidade de resolver os problemas dos trabalhadores e dos povos.
O Congresso considerou que os complexos problemas em desenvolvimento nos países socialistas resultavam de graves atrasos, erros e deformações que se impunha corrigir para conduzir à sua superação.
O Congresso examinou o avanço do processo contra-revolucionário em Portugal, em que a política de recuperação capitalista, latifundista e imperialista do governo PS-PSD e, na altura, do governo maioritário do PSD, degradava as condições de vida da generalidade das camadas não monopolistas e subvertia o regime democrático com a preparação da segunda revisão da Constituição. Simultaneamente, o Congresso enalteceu a luta dos trabalhadores e das massas populares contra a política de direita, realçando a amplitude da greve geral de 28 de Março de 1988.
Quanto à CEE, o Congresso considerou particularmente nocivas para Portugal as consequência do processo de integração capitalista europeu e alertou para a necessidade de reforçar a luta em defesa dos interesses e da soberania nacionais.
O novo Programa aprovado «Uma Democracia Avançada no Limiar do Século XXI» foi debatido em todo o Partido e contou com a valiosa contribuição das organizações e dos militantes. As alterações aos Estatutos aprovados visaram quer adaptar os artigos ao novo Programa quer consagrar experiências positivas de organização e funcionamento. Explicitaram definições mais rigorosas do marxismo-leninismo e do centralismo democrático e aprofundaram aspectos relativos aos direitos e deveres dos membros do Partido.
O XII Congresso foi preparado debaixo duma violenta campanha de desinformação, de mentiras e calúnias contra o PCP veiculada pela comunicação social, que inseriu opiniões e divulgou actividades de membros do Partido que, com as suas acções em confronto com os Estatutos, se constituíram em grupo fraccionário, defendendo o direito de tendência, visando descaracterizar o PCP.
Participaram no Congresso 2090 delegados em que 71,2% eram operários e empregados, 16,1% intelectuais e quadros técnicos, 1,2% agricultores, 1,2% pescadores, 2,5% pequenos e médios comerciantes e industriais, e 7,8% correspondiam a outras situações.
O Congresso aprovou a Resolução Política e elegeu o Comité Central que, por sua vez, elegeu os organismos executivos e Álvaro Cunhal como Secretário-Geral.
O XII Congresso deu um valioso contributo para a coesão do PCP e para a sua acção em defesa do regime democrático e do futuro progressista e independente de Portugal.
Soberania e independência nacionais
Partido patriótico e internacionalista, o PCP esteve sempre, ao longo dos 100 anos da sua existência, na primeira linha da luta do povo português em defesa da soberania e da independência nacionais.
Portugal era simultaneamente um país colonizador e colonizado e o PCP considerou sempre a sua luta para pôr fim ao domínio do imperialismo sobre a sua pátria inseparável da solidariedade militante com os povos das colónias portuguesas na sua luta pela independência.
A Revolução de Abril deu passos no sentido da soberania e independência nacionais que o processo contra-revolucionário comprometeu.
A soberania e independência nacionais, indissociáveis da cooperação e amizade com outros países e povos, são um objectivo essencial do PCP.
Contra o domínio imperialista
A tradicional submissão das classes dominantes ao estrangeiro, nomeadamente à Inglaterra, agravou-se ainda mais com a ditadura fascista, «a ditadura terrorista dos monopólios (associados ao imperialismo) e dos latifundiários».
Para defender o seu poder e os interesses das classes que representavam, combater a resistência do povo português e dos povos das colónias, os governos de Salazar e Caetano estreitaram ainda mais os laços de dependência externa. A libertação de Portugal do domínio económico, político e militar do imperialismo tornou-se um objectivo central da luta pelo derrubamento do fascismo, pela liberdade e a democracia, objectivo que o PCP teve sempre presente na sua intervenção revolucionária e que defendeu firmemente na sua política de unidade democrática. Orientação inscrita na linha política aprovada nos seus Congressos e no seu Programa para a Revolução Democrática e Nacional.
A luta contra o domínio do capital estrangeiro sobre a economia portuguesa, contra a participação de Portugal na NATO e pela sua dissolução, contra a adesão à EFTA e a quaisquer processos de integração capitalista europeia, contra o envolvimento na política de guerra e agressão das grandes potências capitalistas, foi uma constante na intervenção e luta do PCP. Luta que se traduziu em importantes acções de carácter legal, semilegal e ilegal, adquirindo mesmo expressão de massas nomeadamente na luta contra as criminosas guerras coloniais. Luta em que os comunistas tiveram de dar um combate sem tréguas a ilusões e posições oportunistas no campo da oposição democrática de sectores que, aspirando a conciliar a conquista da liberdade com a continuação do domínio dos monopólios e do imperialismo, incluindo mesmo posições de cariz colonial, dificultavam e sabotavam a unidade antifascista.
Afirmação de soberania
A Revolução de Abril foi em si mesma uma extraordinária afirmação de soberania. O novo Portugal democrático ganhou grande prestígio e autoridade no concerto das nações e abriu-se finalmente a possibilidade de realização de uma política externa e de defesa autónoma, de brio patriótico, de terminada pelos interesses do povo português e pelos valores da paz, da cooperação e da amizade entre todos os povos. Porém, embora fortemente abalados pela Revolução de Abril, os laços de dependência externa não foram rompidos.
Essa foi uma das grandes limitações dessa revolução inacabada.
Por um Portugal com futuro
O poderoso movimento popular de massas teve força para destruir os monopólios e os latifúndios e conquistar as nacionalizações, a Reforma Agrária e outras profundas transformações, mas não conseguiu construir um poder revolucionário e pôr em prática a corajosa política patriótica exigida pela consolidação da revolução. A aberta intervenção do imperialismo norte-americano e da social-democracia europeia contra a revolução portuguesa contou com a activa e ulteriormente confessada colaboração do PS, PSD e CDS, conduzindo à consequente recuperação do domínio do imperialismo sobre Portugal.
A subordinação de Portugal à NATO e aos seus objectivos, bem como os acordos com os EUA, a entrada para a CEE e ulteriormente para a União Europeia e para o Euro (144), o domínio de sec tores básicos da economia nacional pelo grande capital estrangeiro, inscrevem-se como gravíssimas limitações à soberania e à independência nacionais com que é necessário romper para alcançar a alternativa patriótica e de esquerda necessária a um Portugal com futuro.
A defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do país é inseparável da luta em defesa dos direitos e liberdades democráticas que a Constituição da República Portuguesa conserva e de que é elemento constitutivo fundamental a soberania da nação, o direito do povo português a decidir sem ingerências externas do seu próprio destino. Por isso, a democracia avançada que o PCP aponta no seu Programa como parte integrante e inseparável da luta pelo socialismo e o comunismo coloca entre as suas componentes ou objectivos fundamentais «uma pátria independente e soberana com uma política de paz, amizade e cooperação com todos os povos».
A emancipação da mulher
A luta das mulheres nos últimos 100 anos contou com o PCP como o mais firme e coerente defensor das suas profundas aspirações e reivindicações emancipadoras.
A emancipação da mulher significa, por um lado, a emancipação da trabalhadora da opressão capitalista e, por outro, a emancipação das mulheres em geral das discriminações, desigualdades e injustiças a que estão sujeitas por razões de sexo. É uma causa e um projecto plenos de actualidade, que tem expressão na luta das mulheres pela resolução dos seus problemas concretos, pelos seus direitos específicos, que não pode ser separada da luta mais geral dos trabalhadores e do povo contra todas as formas de exploração e de opressão.
O capitalismo não defende os direitos das mulheres que explora, oprime e violenta.
A emancipação da mulher e o socialismo são exigência da actualidade e do futuro.
Uma causa pela qual vale a pena lutar
É com a fundação do PCP que a emancipação da mulher passa a ser colocada como parte indivisível da emancipação social dos trabalhadores e do povo português.
O PCP sempre assumiu a importância decisiva da luta das mulheres em defesa dos seus direitos – como mulher, trabalhadora, cidadã e mãe –, por objectivos políticos, económicos, sociais e culturais.
A resistência ao fascismo
As mulheres estiveram em todas as frentes de oposição ao fascismo, no período de desenvolvimento geral da luta pela democracia, na criação de organizações de mulheres, legais, ilegais e semilegais, nos movimentos unitários antifascistas, e integraram a batalha da Oposição no terreno eleitoral da ditadura.
Os perigos da clandestinidade não con dicionaram a intervenção das mulheres comunistas e do seu Partido na organização de grandes acções de massas contra o fascismo. Nas mais adversas condições de clandestinidade, elas deram provas do seu valor revolucionário no trabalho de organização e na acção política. Quando no nosso país foi comemorada a Jornada Internacional da Mulher com uma acção de massas – 8 de Março de 1962 (145) – mais de 20 mil mulheres e homens encheram as ruas do Porto, com as reivindicações: Amnistia! Paz, sim; Guerra, não! Viva a Liberdade!
Abril e os direitos das mulheres
Com a Revolução de Abril os direitos das mulheres foram inscritos entre as grandes conquistas do povo português. Acabou a ausência de direitos imposta pela ditadura fascista, e foram reconhecidas as aspirações e reivindicações pelas quais as mulheres lutaram ao longo de muitas décadas.
Foi a liberdade assumida na palavra e na acção, exercendo na vida os direitos conquistados, com uma intervenção massiva das mulheres, designadamente na participação política e sindical, na gestão de escolas e cooperativas, no acesso a novas profissões e carreiras.
Com as profundas transformações políticas, económicas, sociais e culturais – processo que contou com a sua participação – e com a consagração legal da igualdade de direitos em todos os domínios, foram criadas as condições para uma profunda transformação do estatuto das mulheres na lei e na vida.
Fazer frente ao retrocesso social
As mulheres persistiram na luta organizada de resistência à contra-revolução de destruição das conquistas de Abril e à política de direita aprofundada com a integração capitalista de Portugal na CEE/UE, que constitui um sério obstáculo ao seu processo emancipador.
No mesmo sentido, a política de direita é responsável pelo reiterado incumprimento dos direitos das mulheres, consagrados na Constituição e em legislação diversa, conquistados com a sua luta e a destacada intervenção do PCP e que políticas de «igualdade de género» adoptadas por sucessivos governos do PS, PSD e CDS sempre ocultaram.
O papel do PCP
A acção do PCP pela resolução dos problemas concretos contra a exploração, desigualdades, discriminações e violências a que as mulheres estão sujeitas no quadro do sistema capitalista tem sido incansável.
Assume especial alcance político e ideológico a realização da Conferência Nacional do PCP «A emancipação da mulher no Portugal de Abril» (1986) (146).
Com ela se aprofundou a reflexão sobre o processo emancipador da mulher ao longo da história, a luta das mulheres em Portugal durante o fascismo e na Revolução de Abril.
O PCP assumiu iniciativas legislativas distintas, afrontando concepções obscurantistas e conservadoras, nomeadamente para pôr fim ao aborto clandestino (147), pela prevenção e combate às violências (violência doméstica e exploração na prostituição) ou para prevenir as consequências da política de direita, designadamente no domínio laboral. Iniciativas que contaram com a sistemática rejeição de PS, PSD e CDS, impedindo assim medidas que representariam avanços no combate à dupla exploração das trabalhadoras, à desregulação dos horários assegurando o seu direito ao tempo de trabalho, ao tempo para si e para a família.
A luta organizada das mulheres
A luta organizada das mulheres pelos seus direitos e pela participação em igualdade mantém plena actualidade. Ela é inseparável da luta pela construção de um Portugal de progresso social e soberano, que exige a ruptura com a política de direita e a concretização da alternativa patriótica e de esquerda. O prosseguimento do processo emancipador da mulher está profundamente ligado à democracia avançada que o PCP propõe no seu programa Uma Democracia Avançada – Os Valores de Abril no Futuro de Portugal, que preconiza o direito das mulheres à igualdade, intimamente ligado à sua luta emancipadora (148). É, aliás, condição para a democratização e humanização da sociedade, e para o livre desenvolvimento das capacidades criativas e produtivas das mulheres, em igualdade e em todas as esferas da vida. Luta que não é dissociável da construção de uma sociedade sem exploração do homem pelo homem.
Luta emancipadora, em que as mulheres contam com o PCP. E o PCP conta com as mulheres.
19891992 Reafirmação do ideal e do projecto comunistas
As derrotas no campo socialista e a desagregação da URSS tiveram profundas repercussões na situação mundial. A contra-ofensiva do imperialismo é particularmente arrogante e ambiciosa.
No plano ideológico surgem as teses do «fim da História», da «morte do comunismo», do «declínio irreversível» dos partidos comunistas, que o PCP rejeita com firmeza. À violentíssima campanha visando atingir o seu prestígio e a sua unidade, responde afirmando e confirmando a sua identidade comunista, reforçando a sua coesão e enriquecendo as suas análises nos XIII e XIV Congressos.
Em defesa do regime democrático
Com o papel determinante dos governos do PSD, a par das graves responsabilidades do PS – quer através da privatização de empresas fundamentais, quer da atribuição ao grande capital do essencial dos recursos financeiros oriundos dos fundos comunitários (PEDIP, FSE, fundos agrícolas), quer de indemnizações e de substanciais benefícios fiscais, quer das políticas macroeconómicas, nomeadamente monetária, cambial e de «rendimentos e preços» – acelera-se o processo de reestruturação e restauração do capitalismo monopolista e do seu domínio sobre a economia portuguesa.
Trata-se de um processo facilitado pela revisão da Constituição de 1989 (149), com graves consequências no aprofundamento da exploração dos trabalhadores, no ataque aos seus direitos e salários, no ataque aos serviços públicos, em particular o SNS, e na asfixia das pequenas e médias empresas.
É contra esta ofensiva e em defesa do regime democrático que se desenvolve uma torrente de lutas. Entre muitas outras, os surtos grevistas em Janeiro, Abril, Julho e Outubro de 1989, Fevereiro, Setembro, Outubro e Dezembro de 1990, Janeiro de 1991, todo o primeiro trimestre de 1992, as jornadas da CGTP-IN contra o «pacote laboral» em 1989 e em 1991/1992, e a jornada pelas 40 horas e outras reivindicações em Junho de 1990, abrangendo 500 mil trabalhadores, as concentrações e manifestações de agricultores em 1990, 1991 e 1992, as acções dos profissionais da PSP de Abril de 1989, Junho de 1991 e de 1992, as jornadas do 25 de Abril e do 1.º de Maio, além das muitas lutas travadas nas empresas, locais de trabalho e sectores, por objectivos reivindicativos específicos.
Foram lutas que em muitos casos conseguiram sucessos parciais e, noutros, limitar objectivos mais gravosos ou mesmo adiar a sua aplicação. Foram lutas decisivas na resistência à política do Governo PSD, contribuindo para o aprofundamento do seu isolamento social e ulterior derrota política e eleitoral (150).
Novo programa do PCP
Em 1989, aplicando as decisões do XII Congresso (Dezembro de 1988), o PCP divulga o novo Programa do Partido «Uma Democracia Avançada no Limiar do Século XXI» num contexto internacional de acontecimentos tumultuosos nos países socialistas no Leste da Europa.
A situação nacional é marcada pela segunda revisão constitucional, acordada entre o PSD e o PS, que põe fim ao princípio da irreversibilidade das nacionalizações e acelera o processo de restauração do capitalismo monopolista.
Numa conjuntura particularmente adversa, o Partido confirma o seu papel determinante na luta dos trabalhadores e das massas e revela grande capacidade de resistência nas eleições para o Parlamento Europeu (18 de Junho), em que avança de 3 para 4 deputados, e para as Autarquias Locais (17 de Dezembro), eleições em que a coligação «Por Lisboa» (PCP-PS) (151), fruto da persistência e da influência do PCP, inflige uma importante derrota à coligação de direita PSD-CDS, há muitos anos à frente da Câmara Municipal de Lisboa.
Coesão, iniciativa e confiança
Perante profundas alterações da situação nacional e internacional, «exigindo do Partido novas análises e novas orientações e decisões, incluindo as respeitantes ao seu próprio reforço político e orgânico» que deviam envolver todo o colectivo partidário, o Comité Central decide convocar, em Janeiro de 1990, o XIII Congresso (extraordinário) que se irá realizar de 18 a 20 de Maio de 1990, em Loures. No quadro de uma intensa intervenção social e política e na sequência de um profundo debate, procede a uma primeira análise das causas e consequências das derrotas em países socialistas, valoriza a decisiva contribuição da Revolução de Outubro e do sistema mundial do socialismo para as grandes transformações revolucionárias que marcam o século XX, rejeita as campanhas sobre a «morte do comunismo» e o «declínio irreversível» dos partidos comunistas, afirma e confirma com convicção a sua identidade comunista. O XIII Congresso constituiu uma magnífica e exaltante realização dos comunistas portugueses.
Perante uma brutal campanha anticomunista o colectivo partidário dá provas de coesão, iniciativa e confiança nas massas. A audaciosa campanha dos 150 000 contos para a compra de um terreno para a Festa do Avante! (152) assim o comprovou, constituindo uma grande vitória do Partido.
Em 7, 8 e 9 de Setembro de 1990, a Festa do Avante!, a maior iniciativa político-cultural realizou-se pela primeira vez num espaço próprio do PCP, a Quinta da Atalaia, em ambiente de grande alegria e numa afirmação de grande confiança no Partido e no projecto comunista.
XIII Congresso (extraordinário)
O XIII Congresso (extraordinário) realizou-se, em Loures, nos dias 18, 19 e 20 de Maio de 1990, sob o lema «Um Partido para o Nosso Tempo».
Convocado para apreciar os acontecimentos nos países socialistas, a situação e evolução na URSS, o rápido avanço do processo de restauração do capitalismo monopolista em Portugal, o ideal comunista e a identidade do PCP, o Congresso tinha como objectivo o reforço da sua capacidade de intervenção na vida nacional.
Preparado sob uma intensa campanha anticomunista, o Congresso suscitou um grande debate interno, em que se manifestaram opiniões diferentes e mesmo divergentes. Realizaram-se 2564 assembleias e reuniões e numerosas iniciativas em que participaram mais de 40 mil membros do Partido.
Coincidindo com a realização do Congresso teve lugar uma reunião do Comité Central que elegeu o Secretário-Geral – Álvaro Cunhal, o Secretário-Geral Adjunto – Carlos Carvalhas e os organismos executivos do Comité Central.
O Congresso debateu as causas internas das crises registadas nos países socialistas do Leste da Europa e apontou os cinco principais traços negativos – centralização do poder político; limitações à democracia política; direcção partidária afastada dos trabalhadores e das massas populares; fusão e confusão das funções do Estado e do Partido; dogmatização do marxismo-leninismo – traços que perfiguravam um «modelo» que se afastou dos princípios e objectivos do ideal comunista.
O Congresso considerou que as graves derrotas para o socialismo que os acontecimentos nos países do Leste da Europa significavam não punham em causa a validade do ideal comunista.
Sobre a reconstituição do capitalismo monopolista em Portugal, através da realização de inúmeras privatizações em sectores-chave da economia, o Congresso aprofundou as consequências deste processo quer quanto ao agravamento das injustiças e desigualdades sociais quer quanto à degradação da democracia política. E apontou para a necessidade do desenvolvimento da luta por uma alternativa democrática visando travar a actuação antidemocrática do governo do PSD.
O Congresso avaliou ainda as características e dimensão da base social cujos interesses eram prejudicados pela reconstituição do capitalismo monopolista, considerando que isso possibilitaria a construção duma alternativa democrática.
No Congresso participaram 2061 delegados dos quais 68,3% eram operários e empregados, 0,7% pescadores, 1,6% agricultores, 9,1% intelectuais, 9,8% quadros técnicos, 3% pequenos e médios empresários, 7,4% correspondiam a outras situações.
Afirmando a sua natureza de classe e a sua identidade comunista, o PCP projectou-se como um partido aberto às novas realidades, situações e fenómenos.
O Manifesto aprovado pelo Congresso, que se realizou debaixo duma forte pressão para que o PCP alterasse as suas características, responde claramente aos objectivos do grande colectivo dos comunistas portugueses – «FOMOS, SOMOS E SEREMOS COMUNISTAS».
Fazer frente ao anticomunismo e ao imperialismo
No plano internacional, os EUA desencadeiam a Guerra do Golfo. Bush proclama a «nova ordem mundial» hegemonizada pelos EUA contra os tra balhadores e contra os povos.
Na URSS o processo de degenerescência da «perestroika» e a escalada contra-revolucionária que a acompanha é cada vez mais inquietante. O chamado «golpe de Agosto» é pretexto para uma violentíssima campanha anticomunista, potenciada pela participação de membros do Partido que, afrontando abertamente os princípios de funcionamento do PCP, atacam publicamente a Direcção e a orientação partidárias.
Nas eleições presidenciais de 13 de Janeiro de 1991, o PCP, afirmando as suas propostas e dando voz à aspiração a uma alternativa democrática, apresentou como candidato Carlos Carvalhas, obtendo 12,9% dos votos.
Em 6 de Outubro realizam-se as eleições para a Assembleia da República. Têm lugar num contexto particularmente difícil. Apesar de uma grande campanha política de massas, a CDU, com 8,8% dos votos, desce 3,4 pontos percentuais em relação às eleições de 1987. A ofensiva visando desacreditar a Direcção e provocar divisões no Partido acentua-se ainda mais. O PCP teve de fazer frente a uma enorme campanha anticomunista e a uma escalada de actividades fraccionárias. Mas o Partido assegurou a sua coesão, manteve intensa actividade numa situação muito difícil, ficou melhor preparado para a luta.
Perante o massacre de Santa Cruz, em 12 de Novembro, em Timor-Leste, e a determinação da Indonésia em esmagar o povo timorense, o PCP, fiel à sua posição programática, levanta a bandeira da luta pela independência de Timor-Leste (153).
Reafirmação da identidade comunista
A assinatura do Tratado de Maastricht (154), em 1992, que impõe condicionamentos ao desenvolvimento do país, tem a firme oposição do PCP, o único partido que desenvolve uma luta consequente em defesa da soberania e da independência nacionais e contra a Europa do grande capital e das grandes potências.
Entretanto, em 4 e 5 de Maio, realiza-se em Lisboa a reunião dos responsáveis internacionais de seis partidos comunistas da Europa. Ao longo dos anos 1988-1992, quer antes quer após o desmantelamento da URSS e da dissolução do PCUS, o PCP desenvolve uma intensa actividade internacional orientada para a defesa, recuperação e unidade do movimento comunista e revolucionário. A firmeza de princípios com que o PCP enfrentou a tempestade contra-re volucionária na URSS e Leste da Europa, gran jearam-lhe grande prestígio internacional.
A 4, 5 e 6 de Dezembro de 1992, realizou-se o XIV Congresso do PCP, em Almada.
XIV Congresso
Sob o lema «Democracia e Socialismo – o Futuro de Portugal», o XIV Congresso decorreu entre 4 e 6 de Dezembro de 1992, em Almada.
Face à profunda alteração da correlação mundial de forças, com o desaparecimento da URSS e as derrotas no campo socialista – que abriu caminho ao imperialismo para tentar impor a sua hegemonia que designou por «nova ordem mundial» –, o Congresso realçou a importância e o significado da Revolução de Outubro como o início duma nova fase da evolução da sociedade, que contou com importantes êxitos, considerando simultaneamente que as derrotas entretanto sofridas não colocam em causa a superioridade do socialismo face ao capitalismo.
Afirmando que «o comunismo não morreu», avaliou as consequências negativas para o Mundo da desagregação da URSS e do desaparecimento do campo socialista que também se repercutiram no movimento comunista internacional, com o enfraquecimento e degenerescência de numerosos partidos comunistas.
No plano nacional, com o avanço da reconstituição do capitalismo monopolista, o Congresso debruçou-se sobre o impacto do investimento estrangeiro em Portugal que o governo maioritário do PSD estimulava, acompanhado da intensificação da exploração dos trabalhadores. Relativamente à CEE, o Congresso denunciou o carácter federalista do Tratado de Maastricht que atingia a autonomia, independência e soberania nacionais.
Como alternativa, o Congresso, valorizando o indispensável papel da luta de massas, apontou a necessidade da convergência das forças democráticas visando o isolamento do governo e a sua derrota.
Perante a ofensiva contra o Partido, em que às pressões externas se associaram as internas, as alterações aos Estatutos incidiram num maior rigor em várias formulações que caracterizam a identidade do PCP. O trabalho colectivo e a direcção colectiva foram considerados princípios orgânicos fundamentais, tendo como objectivo preservar uma única orientação geral e uma única direcção central. Os Estatutos consagraram ainda alterações na estrutura de direcção central, nomeadamente pela criação do Conselho Nacional. As alterações ao Programa visaram o aperfeiçoamento de formulações e uma maior ligação entre o Programa da Revolução Democrática e Nacional e o Programa da Democracia Avançada. Aprovou a Resolução Política e elegeu o Comité Central que, por sua vez, elegeu Carlos Carvalhas como Secretário-Geral e Álvaro Cunhal como Presidente do Conselho Nacional.
Confrontado com uma campanha que apontava para o seu declínio irreversível do PCP, o XIV Congresso, em que participaram 1737 delegados – dos quais 69,4% operários e empregados, 18,1% intelectuais e quadros técnicos, 1,3% agricultores, 3% pequenos e médios empresários, 2,8% estudantes, 5,3% diversos –, revelou que o PCP é «um partido necessário, indispensável e insubstituível para a defesa da democracia e dos interesses do povo e do país».
Identidade Comunista
A experiência histórica do PCP com a configuração da sua identidade comunista própria, assim como a experiência do movimento comunista e revolucionário internacional, indicam como características fundamentais de um partido comunista: a natureza de classe; o marxismo-leninismo como sua base teórica; o projecto de uma sociedade socialista e comunista; uma profunda democracia interna, uma única orientação geral e uma única direcção central baseadas no desenvolvimento criativo do centralismo democrático; uma intervenção permanentemente orientada para a classe operária e para as massas; o patriotismo e o internacionalismo. Estas são as características fundamentais do PCP que o diferenciam de outros partidos e o definem como Partido Comunista.
Força política de vanguarda
A teoria do socialismo científico criada por Marx e Engels que fundamenta o carácter transitório do capitalismo e a missão histórica universal da classe operária como força social dirigente da construção da nova sociedade livre da exploração e da opressão de classe, considera indispensável a criação de uma força política de vanguarda que, pela sua ideologia, organização e programa, afirme a sua independência de classe frente à burguesia e conduza a sua luta pela conquista do poder político, condição necessária para a construção do socialismo e do comunismo.
Do tempo do Manifesto do Partido Comunista(155) aos dias de hoje um longo caminho foi percorrido na concepção e na configuração do partido de vanguarda da classe operária. Com o partido bolchevique de Lénine, que defendendo e desenvolvendo criativamente o marxismo conduziu o proletariado russo à primeira revolução socialista vitoriosa, surgiu finalmente um tal partido, então designado de «partido de novo tipo», que justamente se tornou exemplo e referência para os trabalhadores de todo o mundo e inspirou também a construção do PCP.
Todavia, nascido sob a influência da Revolução de Outubro e do partido de Lénine, o PCP é criação do movimento operário português e resultado do seu amadurecimento revolucionário e foi so bre tudo pela sua aprendizagem prática e tirando lições da própria experiência que, isolado durante muitos anos do movimento comunista internacional, o PCP forjou e apurou as características fundamentais da sua identidade que Álvaro Cunhal põe em evidência em O Partido com Paredes de Vidro (156). Características próprias de que os comunistas portugueses legitimamente se orgulham e que nos seus traços gerais se considera serem também fundamentais num partido verdadeiramente comunista.
Características fundamentais
O PCP sempre considerou que não há «modelos» de revolução e que cada partido comunista define a sua linha táctica e estratégica em função da concreta realidade do seu país. Entretanto, num quadro muito diversificado de situações, seis características fundamentais definem um partido comunista.
A sua natureza de classe como partido da classe operária e de todos os trabalhadores, ideológica e organicamente independente da burguesia, defensor intransigente dos interesses e aspirações dos trabalhadores. Natureza de classe que se traduz no conteúdo de um programa político centrado na defesa dos interesses e aspirações dos trabalhadores, na sua composição social, na sua organização assente prioritariamente em células de empresa e de local de trabalho.
Uma teoria revolucionária, o marxismo-leninismo, concebida como «concepção materialista e dialética do mundo, instrumento científico de análise da realidade e guia para a acção que constantemente se enriquece e se renova dando resposta aos novos fenómenos, situações, processos e tendências de desenvolvimento. Em ligação com a prática e com o incessante progresso dos conhecimentos, esta concepção do mundo é necessariamente criadora e, por isso, contrária à dogmatização assim como à revisão oportunista dos seus princípios e conceitos fundamentais» (artigo 2.º dos Estatutos do PCP).
O projecto de construção de uma nova sociedade, sem exploradores nem explorados, de liberdade, justiça social e paz, assente no efectivo poder dos trabalhadores e na propriedade social dos grandes meios de produção, uma sociedade socialista e comunista, em que finalmente vigore o princípio «de cada um segundo as suas possibilidades, a cada um segundo as suas necessidades».
A democracia interna baseada no desenvolvimento criativo dos princípios do centralismo democrático, com uma única orientação geral e uma única direcção central, onde a crítica e a autocrítica e a mais ampla liberdade de opinião são considerados indispensáveis ao acerto das decisões, e a valorização do colectivo não apaga o mérito e a responsabilidade individual.
Uma intervenção permanentemente orientada para a organização e mobilização dos trabalhadores e das massas populares, na luta pelos seus interesses e aspirações mais sentidos independentemente das pressões, ameaças e da ideologia das forças do capital, o que, combinando todas as formas de luta, faz da luta de massas o motor da acção revolucionária.
O patriotismo e o internacionalismo, em que o amor à Pátria e a intransigente defesa da soberania e da independência nacionais são inseparáveis da solidariedade com os trabalhadores e os povos de todo o mundo.
A experiência histórica mostrou que, nos seus traços gerais, estas são características que distinguem um partido verdadeiramente comunista e que o abandono de qualquer uma delas conduz inevitavelmente à degenerescência oportunista.
Internacionalismo proletário e solidariedade internacionalista
O internacionalismo proletário é um princípio inerente à própria natureza da classe operária e à realização da sua missão histórica de superação revolucionária do capitalismo. Ao contrário da burguesia, a classe operária é por natureza internacionalista. A evolução mundial, com o alargamento do campo anti-imperialista e a diversificação dos processos de emancipação nacional e social, ampliou o conceito de internacionalismo mas a solidariedade de classe, a identidade de interesses dos trabalhadores de todo o mundo continua a ser o núcleo da solidariedade dos comunistas, cimento da unidade do movimento comunista e revolucionário internacional.
«Proletários de todos os países, uni-vos!»
«Proletários de todos os países, uni-vos!», o apelo com que termina O Manifesto do Partido Comunista, mantém nos dias de hoje toda a sua força inspiradora e actualidade. Ela dá expressão mobilizadora a uma tese fundamental, estruturante, do movimento comunista e revolucionário internacional: a identidade de interesses e aspirações da classe operária de todos os países e a necessidade da sua cooperação internacionalista para cumprir a sua missão histórica, ou seja, a conquista do poder político, condição necessária para a superação revolucionária do capitalismo, a reestruturação da sociedade no interesse das grandes massas, a abolição da exploração do homem pelo homem, o socialismo e o comunismo.
Partido patriótico e internacionalista
O PCP, partido da classe operária e de todos os trabalhadores, é um partido patriótico e internacionalista, duas faces inseparáveis constitutivas da sua identidade comunista.
Partido que mergulha fundo as suas raízes no povo e na realidade nacional, o PCP considera que o seu primeiro dever revolucionário é para com a classe operária, os trabalhadores e o povo português. Na presente situação isso traduz-se na luta por uma alternativa patriótica e de esquerda, no combate pela realização do seu Programa «Uma Democracia Avançada – Os Valores de Abril no Futuro de Portugal», parte integrante e inseparável da luta pelo socialismo e o comunismo. Simultaneamente, o PCP considera que a sua luta no terreno nacional se insere no processo universal de emancipação da humanidade de todas as formas de exploração e opressão e é activamente solidário com todos os povos em luta.
«Partido de novo tipo»
Desde que Marx e Engels fundaram o primeiro partido da classe operária, ideológica e organicamente independente da burguesia, e Lénine fundou o «partido de novo tipo» que dirigiu a Revolução de Outubro, a primeira revolução socialista vitoriosa, o movimento operário e comunista internacional percorreu um duro, complexo mas exaltante caminho, e conheceu formas diversas de expressão internacionalista, afirmou-se como a grande força revolucionária contemporânea.
As derrotas do socialismo não apagam a realidade de que os grandes progressos e transformações revolucionárias do século xx são inseparáveis da acção dos comunistas, da existência da URSS e do campo dos países socialistas.
Reforçar o movimento comunista internacional
A experiência mostrou que as revoluções não se exportam nem se copiam e que não há «modelos» de revolução. Na luta revolucionária nada pode substituir-se ao enraizamento na realidade nacional e a melhor contribuição que cada partido pode dar para o reforço do movimento comunista e revolucionário internacional é o fortalecimento da sua influência entre as massas no próprio país. Mas mostrou também os perigos do isolamento e do exagero das particularidades nacionais, a importância de valorizar o que une e não o que divide e a necessidade de cuidar permanentemente dos laços de solidariedade internacionalista. Perante o aprofundamento da crise estrutural do capitalismo e a violenta ofensiva exploradora e agressiva do imperialismo, mais necessária se torna a articulação dos comunistas e demais forças revolucionárias, o reforço da sua acção conjunta ou convergente procurando mesmo caminhar para formas estáveis de intercâmbio e cooperação.
A evolução mundial com o alargamento do campo anti-imperialista e a diversificação dos processos de emancipação nacional e social tornou mais amplo o conceito de internacionalismo.
Esta realidade não pode porém conduzir a que os laços de cooperação entre os comunistas se diluam no quadro de convergências e alianças mais amplas.O internacionalismo proletário, a solidariedade de classe, a identidade de interesses dos trabalhadores de todo o mundo, continua a ser o núcleo das relações de amizade, cooperação e solidariedade entre os partidos comunistas.
É com este espírito e com base nos provados princípios da igualdade, respeito mútuo, soberania e solidariedade recíproca, que o PCP intervém pelo reforço e unidade do movimento comunista e revolucionário internacional e pelo reforço da frente anti-imperialista, desenvolve um amplo leque de relações no plano bilateral, recebe uma ampla participação internacional na Festa do Avante! e promove outras iniciativas de dimensão internacional, participa nos Encontros Internacionais de Partidos Comunistas e Operários como um útil espaço de intercâmbio de experiências, debate franco de opiniões, adopção de posições e de iniciativas comuns.