Intervenção de Rita Rato, Habitação em Portugal, hoje – A visão e as propostas do PCP

Direito à Habitação, Direito da Juventude, Direito de Abril

A questão da habitação é determinante para a emancipação e independência da juventude, correspondendo desde logo a uma necessidade básica de sobrevivência do ser humano, e a um factor de desenvolvimento individual e colectivo.

A questão da habitação, pela dimensão central que ocupa na vida dos jovens e dos trabalhadores, tem sido uma reivindicação histórica e actual.

O direito à Habitação é um dos objectivos programáticos da nossa lei fundamental, pela importância que representa na vida dos cidadãos, sobretudo dos mais jovens. O art.º 70º da Constituição de Abril afirma que "os jovens gozam de protecção especial para efectivação dos seus direitos económicos, sociais e clturais, nomeadamente: c) No acesso à habitação".

É assim, uma das tarefa primordiais do Estado, criar as condições que garantam o direito a uma habitação digna para os jovens.

Este direito surge plasmado na Constituição como uma necessidade e uma aspiração da juventude, mas que ainda hoje continua por cumprir.

As constantes violações, deturpações, e ataques por parte dos sucessivos governos PS, PSD,e CDS-PP, ao direito à habitação inscrevem-se numa estratégia mais geral e profunda de ataque aos direitos democráticos - económicos, sociais, políticos e culturais - que sustenta uma política de direita, anti-popular e anti-juvenil.

Vale a pena analisar no tempo:

- Em 1992, pela justeza e força da luta dos jovens portugueses é criado um instrumento legislativo de apoio ao arrendamento por jovens - IAJ. Longe de ser a solução-chave para a questão da habitação jovem, representou um passo importante na protecção da efectivação dos direitos económicos e sociais, através da atribuição de um subsídio para suporte das despesas com o arrendamento de casa por jovens até aos 30 anos;

- Em 2000, no Governo PS de António Guterres realizou-se uma baixa da taxa de referência da bonificação no crédito, com reflexo nos aumentos de dez contos ou mais na prestação de muitas casas;

- Passados apenas 2 anos [2002], e com a alternância do Governo PSD-CDS no poder novos e profundos ataques estavam para breve.

Com o argumento do equilíbrio orçamental foi extinto o juro bonificado. Em 1994, foram concedidos 25.083 créditos jovem bonificados, e em 2002 cerca de 41.418. Este significativo aumento não foi contudo razão suficiente para impedir a sua extinção.

Em simultâneo, foi anunciada a liberalização do mercado do arrendamento. Para tal, foi apresentada como solução a possibilidade do alargamento dos critérios e do acesso ao Incentivo de Arrendamento Jovem.

Mas, com a proposta de Orçamento de Estado para 2003 dissiparam-se as dúvidas: fim do crédito bonificado mais um corte de 7 milhões de euros na verba atribuída ao IAJ - corte este, superior a 11% em relação a 2002.

Das cerca de 120 mil candidaturas apresentadas pelos jovens a este apoio, perto de metade eram processos novos, a juntar aos apoios existentes.

Ou seja: perante a perspectiva de um forte aumento da procura a este incentivo, e perante a ausência de alternativas no apoio à aquisição de casa própria, o que fez o Governo? Cortou as verbas a um apoio que havia prometido aumentar!

Bem clara se tornou a opção política de favorecimento dos interesses económicos da banca:

- Retirar o limite de 30 anos ao pagamento do crédito à habitação e alongando-o por mais 2 anos, esteve na realidade a prosseguir os interesses instalados da banca. Uma vez que, ao alargar o prazo do empréstimo pagar-se-iam ainda mais juros, a taxa seria também mais cara, na proporção do aumento daquilo a que a banca chama risco, e para um maior prazo aumentaria, também, aquilo que as seguradoras chamam risco, pagando-se um prémio maior.

O PS ocupando o banco na oposição insurgiu-se contra esta medida, chegando mesmo a afirmar que:

"O Executivo incorreu numa inconstitucionalidade por acção.
(...) o direito à habitação tem «o Estado como único sujeito passivo, cabendo-lhe adoptar os necessários instrumentos de satisfação ou concretização» desse direito fundamental.
(...) «o mesmo Estado não está apenas obrigado a criar mecanismos (para facilitar acesso à aquisição de casa própria), como está obrigado a não abolir os já existentes»."

- Para o Partido Socialista, mestre no jogo do vale tudo para dizer na oposição e logo esquecer quando é governo, bastaram 3 anos para o peixe morrer pela boca.

Em 2005, no dicionário das polítcas de direita do PS, desburocratizar é sinónimo de extinguir, e por esse caminho avançou logo com o Orçamento de Estado para 2007 a prever uma redução de 50% na despesa para o IAJ. O processo de candidatura tornou-se então mais moroso, e menos certo de que haveria resposta afirmativa de acesso ao IAJ para os muitos milhares de jovens candidatos, e resposta de renovação para outros tantos utentes.

- Mais 2 anos volvidos, em 2007 chegava a notícia que confirmava as denúncias do PCP e da JCP da real intenção do Governo de extinção do IAJ, e criação da Porta 65. Este programa transporta a visão retrógrada do governo de um rumo assistencialista, em detrimento da autonomização dos jovens.

Com esta medida, o actual governo PS não inflectiu em nada a politica demagógica, anti-juvenil e anti-democrática levada a cabo pelos anteriores governos. Embora, a questão da Habitação Jovem exija um plano integrado e respostas efectivas de fundo, o IAJ representava um instrumento essencial para a emancipação, autonomia e independência de milhares de jovens portugueses.

Endividamento / elitização

O exorbitante valor das rendas, a rondar os 400/500 euros no mínimo, conduz involuntariamente muitos milhares de jovens ao recurso ao empréstimo bancário para a compra de casa própria. O endividamento por 40/50 anos é para a única solução escolhida, com os dias ao sabor da Euribor.

O centro das grandes cidades tem vindo a perder habitantes, nomeadamente jovens. A recuperação urbana dos centros históricos comporta custos muito elevados, apenas acessível a quem pode pagar bem alto esse preço. A construção de raíz de condomínios de luxo, ou de habitação de alto custo cria uma forte elitização dos bairros que coexistem com situações de miséria e pobreza associada à população mais idosa.

A especulação imobiliária «empurra» os jovens para a periferia, com consequências na degradação das condições de vida: o tempo dispendido em movimentos pendulares, custos acrescidos e agravados pela ineficiência dos transportes públicos.

A aposta na habitação social e incentivos à auto-construção é hoje praticamente residual.

Conclusão

A juventude portuguesa enfrenta nos dias de hoje uma realidade caracterizada por baixos salários, precariedade, falta de direitos laborais, insegurança e instabilidade na sua vida pessoal e profissional.

A luta pela concretização, defesa e garantia do direito à Habitação, como um direito fundamental à emancipação da juventude portuguesa, não é dissociável da luta mais geral pela defesa dos direitos e conquistas democráticas.

Os incumprimentos, desrespeitos e ataques profundos ao direito à habitação por parte dos sucessivos governos PS, PSD/CDS-PP, têm como objectivo criar condições de favorecimento e privilégio dos grandes grupos económicos.

A opção de classe é clara: a favor do grande capital, em detrimento dos trabalhadores, da juventude e do povo português.

Porque a habitação é uma questão estrutural na vida dos jovens, e factor de emancipação, autonomia e independência, a JCP reafirma a necessidade de cumprimento da CRP e concretização efectiva deste direito, como condição determinante para o desenvolvimento e progresso nacional.

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