Intervenção de Joaquim Judas, Reunião Nacional de Quadros - Sector da Saúde

Um Programa de Emergência para Protecção da Saúde e da Vida dos Portugueses

São objectivos de uma política de Saude:

Aumentar a Esperança de Vida, reduzindo a mortalidade infantil, reduzindo o número de mortes precoces, aumentando a esperança de vida acima dos 65 anos;
Aumentar o número de anos de vida sem doença, promovendo a saúde, através da criação de condições para uma vida saudável, prevenindo as doenças;
Melhorar a qualidade de vida dos doentes, assegurando o diagnóstico precoce e o tratamento adequado das doenças e a reinserção social dos doentes 
 
A efectiva garantia do Direito à Saúde exige:
 
Uma política de desenvolvimento económico com aumento do PIB/capita;
A redução das desigualdades sociais;
A melhoria das condições de vida e de trabalho;
O aumento do poder de compra dos salários e das reformas e pensões;
O pleno exercício dos direitos políticos, económicos, sociais e culturais;
A afirmação da soberania e independência nacional;
Uma clara responsabilização do Estado pela existência e bom funcionamento do Serviço Nacional de Saúde geral, universal e gratuito.
 
Tal como noutros momentos e noutras circunstâncias em que têm sido impostos aos trabalhadores e aos povos políticas recessivas, de espoliação de recursos, de empobrecimento dos cidadãos, de usurpação de direitos e aprofundamento das desigualdades, o bem-estar, a saúde e a própria vida, em particular dos mais vulneráveis, é seriamente ameaçada. Num contexto de recursos ainda mais limitados uma política injusta faz com que as desigualdades se aprofundem com a transferência dos meios existentes para a órbita dos mais abastados.
 
A política das troikas, levada a cabo pelo governo do PSD/CDS, está a ter um impacto gravíssimo na saúde dos portugueses e impõe-se que seja travada.
 
Tendo em conta os inúmeros relatórios e estudos produzidos pela OMS e pelos mais diversos centros de investigação chamados a acompanhar situações semelhantes, são absolutamente pertinentes as apreensões relativas ao acréscimo de mortalidade verificada em Portugal nas últimas semanas. Depois das notícias de idosos que morrem esquecidos, o Diário de Notícias dava conta, a 3 de Março, que nas duas últimas semanas de Fevereiro morreram mais 1400 pessoas do que em igual período de 2011 e o Jornal “I” noticiava, a 9 de Março, que em Fevereiro de 2012 morreram mais 4000 pessoas que a média dos últimos 10 anos. 
 
Na mesma linha de preocupação devem ser lidas as noticias para um aumento do número de dias de baixa por doença já em 2011, muitas por depressão, (DN de 25 de Fevereiro de 2012: um dos números mais altos dos últimos 10 anos) apesar da redução do número de trabalhadores activos e do clima de insegurança gerado pela degradação das relações laborais, que leva a que haja trabalhadores que se mantêm ao serviço apesar de doentes, mesmo, por vezes, com risco de contágio a outos trabalhadores.
Para se perceber melhor a dimensão da ameaça lembro dois casos referidos na literatura médica internacional e citados pela Revista britânica “Lancet”. O primeiro, relativo à Grécia, constata um aumento do número de suicídios em 40% nos primeiros 6 meses de 2011, quando comparado com igual período de 2010, e um aumento de 52% dos casos de infecção por VIH em 2011, quando comparado com 2010. O segundo, dando conta do excesso de mortalidade verificado nos países que integravam a União Soviética nos 5 anos que se seguiram à derrota do socialismo, num número que se estima em 3 milhões de pessoas, numa população que se estimava à data em 285 milhões de habitantes. Este número, transposto para uma população de 10 milhões de habitantes, em 5 anos, apontaria para um excesso mensal médio do número de mortes em cerca de 1800, cerca de metade do número de mortes em excesso apontado pela notícia do Jornal “I” para Portugal no mês de Fevereiro de 2012 (4000).
 
À falta de recursos dos trabalhadores e das suas famílias, facilitadora da instalação da doença, levando a uma acrescida procura de serviços de saúde, responde o governo com cortes brutais ao nível dos serviços públicos, designadamente da saúde, com e o seu sub financiamento e encerramento, que se traduzem numa redução da capacidade de resposta, frequentemente com desperdício da capacidade instalada, por falta de pessoal, de instalações, equipamentos e de produtos essenciais ao desenvolvimento normal da sua actividade.
 
É neste contexto que, no quadro da busca de medidas para defender e reforçar o Serviço Nacional de Saúde como instrumento decisivo do Estado Democrático para assegurar o Direito à Saúde, se torna emergente a adopção de medidas imediatas para garantir:
 
O acesso da população aos serviços de saúde;
Que os serviços de saúde estejam em condições de prestar os cuidados a que se destinam.
 
A efectiva garantia do Direito à Saúde e o alcançar dos objectivos de uma verdadeira política de saúde exigem nas actuais condições do país:
 
Abandonar do Programa de Agressão imposto ao país pelas troikas;
A formação de um governo Patriótico e de Esquerda.
 
Um tal Programa de Emergência para protecção da Saúde e da Vida dos Portugueses requer, antes de mais, para a sua elaboração e aplicação, a mobilização das populações e dos profissionais de saúde na defesa e reforço do Serviço Nacional de Saúde.
 
Para a nossa reflexão colectiva, e sem pretensão de que em torno delas se feche o debate coloco à consideração algumas matérias.
 
Assim, um tal Programa de Emergência deverá integrar:
 
O reforço da dotação financeira para o Serviço Nacional de Saúde, para que este possa atender aos seus compromissos com os doentes na fase crítica em que nos encontramos e assegurar a sua sustentabilidade. Designadamente: suspendendo planos para encerramento de serviços e reabrir, com horários de atendimento conforme com a vontade expressa pelas autarquias locais, serviços encerrados sem que estivesse garantida solução alternativa com igual acessibilidade e capacidade de resposta, em particular Serviços de Atendimento Permanente e as Extensões de Saúde; assegurando o processo de construção das novas instalações já previstas; o fornecimento de produtos e a normal manutenção e funcionamento dos equipamentos e instalações; reforçando a disponibilidade dos profissionais para prestação de serviço público através de estímulos ao nível da remuneração e das condições de trabalho; promovendo as carreiras profissionais como estímulo da formação e elevação constante da resposta técnica e humana na prestação de cuidados;
A eliminação total, geral e universal das taxas moderadoras, designadamente para todas as consultas, Exames Complementares de Diagnóstico e Terapêutica praticados no SNS ou em entidades com ele convencionadas, representando um encargo anual de 200 milhões de € (Publico 30-12-2011);
A redução do valor médio da comparticipação dos doentes nos custos da medicação em ambulatório para um máximo de 30% (em 2011 foi de 36,9%), representando um encargo anual de 145 milhões de € com referência a 2011. Esta medida deverá dar suporte a outras, no sentido de ser retomado um regime de comparticipação especial ou isenção para doentes crónicos e pessoas de mais baixos rendimentos, sem que tal signifique a adopção de um sistema de comparticipação assente no rendimento dos doentes e a entrada em vigor da legislação que prevê a entrega gratuita de medicamentos aos doentes, para 3 dias no momento da alta do internamento e para 5 dias no momento da alta após cirurgias de ambulatório;
Revogação do novo regulamento de transporte de doentes não urgentes, medida que representará um acréscimo de encargos para o Estado de cerca de 9 milhões de € por ano (Jornal “I” 12-03-2012);
Reforçar e capacitar a rede de assistência pré-hospitalar e promover o serviço telefónico de atendimento e encaminhamento de doentes;
Manter e capacitar os serviços de prevenção e atendimento de toxicodependentes;
Criar condições para um efectivo acompanhamento e tratamento ambulatório em saúde mental;
Promover uma linha de efectiva articulação entre os serviços de saúde e de segurança social no apoio a doentes, designadamente dos mais carenciados.
 
De acordo com a alínea b) do ponto 3 do Artigo 64º da Constituição da República “Para assegurar o direito à protecção da saúde, incumbe prioritariamente ao Estado… garantir uma racional e eficiente cobertura médica e hospital de todo o país”. Na presente situação de emergência, a plena responsabilização do Estado por garantir o Direito à Saúde, a manutenção dos ganhos em saúde conseguidos com a criação do SNS, requerem que todos os recursos de saúde sejam postos ao serviço do país e que seja de imediato assegurada a sua gestão integrada. 
 
Assim um Programa de Emergência para protecção da Saúde e da Vida dos Portugueses deverá tomar como medidas indispensáveis ao seu êxito:
 
A renegociação, ou denúncia das parcerias público Privadas e a integração de toda a rede hospitalar no quadro do Sector Público Administrativo, com garantia de uma gestão responsável e participada, pondo fim ao desgoverno originado pela experiencia aventureirista dos Estatutos SA, EPE e de Gestão Privada, que resultaram em claro prejuízo para o país e para os doentes;
Restabelecer os concelhos como base de organização administrativa dos cuidados de saúde primários, por forma a permitir um maior envolvimento das autarquias e das populações no seu acompanhamento e garantir o sucesso dos programas de saúde no plano local;
Assegurar a existência de redes de referenciação adequadas às necessidades das populações e dos doentes, envolvendo os diversos níveis de cuidados;
Dotar o SNS de uma rede eficaz e integrada de informação e comunicação acabando a actual situação de caos, ineficiência e desperdício;
Estabelecer, para um horizonte temporal definido até 2020, convenções com entidades do sector social e privados para assegurar o acesso a consultas, a meios complementares de diagnóstico e terapêutica e a cuidados continuados no domicílio ou em internamento, nas situações em que esta seja a solução para resolver problemas de proximidade ou de incapacidade de resposta do SNS em tempo clinicamente aceitável. Entende-se como tempo clinicamente aceitável nos Cuidados de Saúde Primários, a consulta no próprio dia quando a pedido do doente ou da entidade que o apoia.
 
Certamente muitas questões se levantam sobre o conteúdo e a forma de pôr em prática as medidas que aqui se colocam a debate, mas é nas pessoas, para saúde e bem-estar dos trabalhadores e das populações que estamos virados. Porque só com saúde estaremos à altura das dificuldades que nos são impostas e teremos que vencer. Com os Valores de Abril no Futuro de Portugal, naturalmente.