Nota à Comunicação Social

Sobre a situação que levou à nacionalização do BPN e sobre a Supervisão Bancária inerente

Na semana passada, a Comissão de Inquérito ao BPN tomou conhecimento que o Banco de Portugal continuava a negar o levantamento do segredo bancário que lhe havia sido requerido com base num parecer solicitado pela Assembleia da República ao Professor Nuno Piçarra. A este parecer, o Banco de Portugal contrapôs um outro (da autoria do Professor Sérvulo Correia), adiantando igualmente na sua resposta que só entregaria os documentos e informações solicitadas mediante sentença transitada em julgado.

Face a esta posição, a Comissão de Inquérito reuniu os seus coordenadores por três vezes, para decidir como reagir perante mais este obstáculo colocado pelo Banco de Portugal ao funcionamento da Comissão.

A decisão tomada pela maioria merece a nossa frontal oposição.

Na verdade, a Comissão de Inquérito decidiu não fazer nada. Vai aceitar, sem reagir como podia e deveria fazer, que o Banco de Portugal continue a impedir que a Comissão de Inquérito tenha acesso a documentação importante para comprovar factos que não estão totalmente apurados.

Em matéria tão significativa como a da recusa em levantar o segredo profissional e bancário, no fundo, numa questão que se prende com a recusa em colaborar de forma adequada com os trabalhos da Comissão de Inquérito, o PCP entende que não são suficientes as declarações de boas intenções. Na realidade, não basta haver disponibilidade para, eventualmente, incluir nas conclusões da actual Comissão de Inquérito o repúdio por esta posição do Banco de Portugal ou a recomendação para que, numa futura legislatura, seja revisto Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares por forma a dotar as futuras Comissões de Inquérito de capacidade efectiva para impor o levantamento do sigilo bancário e profissional.

A Comissão tinha e tem o dever e a obrigação de proceder doutra forma.

Tinha e tem a estrita obrigação de agir de forma consequente com as declarações produzidas logo no início dos trabalhos da Comissão de Inquérito pelos representantes de todos os partidos, que se manifestaram empenhados em fazer tudo para levantar o sigilo bancário e profissional. Afinal, parece haver partidos mais empenhados que outros em levar este propósito até às suas últimas consequências

Tinha e tem a Comissão de Inquérito a estrita obrigação e dever de usar até ao fim todas as vias possíveis para obrigar o Banco de Portugal a abandonar a sua posição não colaborante.

Tinha a Comissão de Inquérito a estrita obrigação e dever de requerer ao Tribunal da Relação o levantamento do sigilo invocado pelo Banco de Portugal, tal como continua a apontar toda a jurisprudência conhecida até ao momento (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 195/94, de 1 de Março - in Acórdão do TC, 27.º Volume, Lisboa, 1994 -; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 2/2008, publicado no DR I Série, de 31 de Março de 2008; e Pareceres da Procuradoria Geral da República n.º 56/94 e n.º 38/95 - in Pareceres da Procuradoria Geral da República, Volume VI, Lisboa, 1997). Jurisprudência que, ironicamente, é no fundamental invocada nos próprios pareceres jurídicos remetidos pelo Banco de Portugal e pelo Banco Português de Negócios para sustentar e manter a rejeição ao acesso à documentação solicitada pela Comissão de Inquérito.

Foi esta a proposta que apresentamos há mais de três meses e que, perante o impasse criado, reapresentamos nas reuniões de coordenadores atrás referidas. Foi esta a proposta que aí recolheu um largo apoio partidário, porém, insuficiente face à oposição do PS.

Fizemos esta proposta convictos que, finalmente, o Tribunal da Relação obrigaria o Banco de Portugal a levantar, ainda em tempo útil, o segredo bancário e profissional. Fizemos esta proposta para defender a Comissão de Inquérito e a Assembleia da República, para dar coerência plena aos seus trabalhos e declarações públicas, para fazer tudo o que a actual Lei permite para aceder às informações sonegadas pelo Banco de Portugal. Fizemos também esta proposta, conscientes da possibilidade da existência de recursos ou de expedientes dilatórios do Banco de Portugal ou, inclusivamente, conscientes da possibilidade de uma eventual decisão negativa do Tribunal, casos em que, também o defendemos, a Comissão de Inquérito deveria prosseguir e finalizar os seus trabalhos nas condições existentes.

Demonstra-se, mais de três meses passados, que o PCP tinha razão. Sempre defendemos que o recurso para o Tribunal da Relação deveria ser a via a usar pela Comissão de Inquérito. Pode mesmo dizer-se que a Comissão perdeu tempo, dinheiro e energias numa via que acaba por esbarrar numa mais que esperável contradição entre pareceres, a qual, ainda por cima, leva à paralisia da Comissão de Inquérito que, inexplicavelmente opta por travar o processo e assim permitir submeter um Órgão de Soberania aos majestáticos ditames e imposições do Banco de Portugal.

Mas, em última análise, tem ainda a Comissão a estrita obrigação e dever de, no mínimo, dar seguimento ao caminho que o Professor Nuno Piçarra deixara entreaberto.

Uma vez que o Parecer de Nuno Piçarra parte do princípio que a Comissão de Inquérito Parlamentar dispõe de competências "para decidir a prestação de testemunhos e ter acesso a documentos e informações, designadamente com quebra do segredo profissional", então a Comissão de Inquérito deve entender a nova recusa do Banco de Portugal como estando sob a alçada do Artigo 19.º do Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares (Lei 15/2007, de 3 de Abril), relativo a desobediência qualificada. Desta forma, a Comissão de Inquérito deve comunicar esta "desobediência qualificada" ao Presidente da Assembleia "com os elementos indispensáveis à instrução do processo para efeito de participação" ao Ministério Público. Acresce ainda, que no âmbito do direito à coadjuvação por parte dos tribunais, de que as Comissões de Inquérito dispõem por imperativo constitucional, deve, de imediato, ser também solicitado ao Ministério Público a apreensão dos documentos solicitados pela Comissão de Inquérito cujo sigilo é invocado pelo responsável do Banco de Portugal.

É esta a nova proposta que vamos apresentar à Comissão de Inquérito Parlamentar de Inquérito "sobre a situação que levou à nacionalização do BPN e sobre a supervisão bancária inerente".

A sua aprovação constitui, em nossa opinião, a última oportunidade para que à Assembleia da República não seja imposta a visão redutora e não colaborante do Banco de Portugal. A sua aprovação constitui a última oportunidade para que, em matéria de derrogação do sigilo bancário e profissional, não se vá repetir, na Comissão de Inquérito ao BPN, exactamente o mesmo que já sucedera na Comissão de Inquérito ao caso BCP: a recusa da Assembleia em assumir de forma consequente o confronto com o Banco de Portugal, permitindo mais uma vez que a supervisão impeça o acesso a informações bancárias sob segredo, deixando mais uma vez manietar-se pela recusa de colaboração da Supervisão Bancária.

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