Intervenção de Vasco Cardoso, Membro da Comissão Política do Comité Central, Sessão Pública «A situação do país, o Orçamento do Estado e a política alternativa»

«É possível enfrentar a corrupção, os privilégios e a fuga do grande capital ao pagamento de impostos e desagravar a tributação sobre o trabalho e as MPME»

Ver vídeo

''

Estimados amigos, caros camaradas,                                                 

A dimensão e profundidade dos problemas com que o País está confrontado, aqui expostas pelo camarada Ricardo Costa, colocam na ordem do dia a necessidade de medidas urgentes que se integram na política alternativa patriótica e de esquerda pela qual se bate o PCP. 

Uma resposta que esteja comprometida com os valores de Abril, cujo 50º aniversário da Revolução se assinalará em breve e que vise o aprofundamento da democracia nas suas vertentes política, económica, social e cultural, inserindo-se no questionamento do capitalismo e da sua natureza exploradora, opressora, predadora e agressiva. 

Uma resposta que enfrente e rompa com os interesses do grande capital e que assuma a libertação do País da submissão ao Euro e das imposições da UE e que assuma uma estratégia soberana de desenvolvimento e uma política externa assente na paz e na cooperação. 

Uma resposta que passe pela recuperação de instrumentos de soberania; reclame o controlo público dos sectores e empresas estratégicas; aposte na produção nacional como questão decisiva para o emprego, o desenvolvimento, a soberania e a diminuição da dependência e endividamento externos.

Estas são questões centrais de uma política alternativa que se confronta com opções convergentes do PS com o PSD, CDS, Chega e IL.                                          

Como primeira e crucial questão para a resposta não só imediata como estrutural está a necessidade do aumento geral dos salários enquanto emergência nacional. 

Portugal é um País marcado por uma crescente desigualdade entre capital e trabalho. O modelo de baixos salários é um factor de atraso e não de competitividade. É necessário o aumento geral dos salários, para dinamizar o mercado interno, condição para estimular a actividade económica e a produção nacional, garantir a sobrevivência das MPME, assegurar a permanência em Portugal da força de trabalho necessária ao desenvolvimento do País, garantir mais receitas para o Estado e Segurança Social.

A valorização dos salários é necessária para enfrentar o aumento dos preços, e precisa da eliminação das normas gravosas da legislação laboral, designadamente com a revogação da caducidade da contratação colectiva e a reposição do princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador. 

É preciso combater a precariedade, assegurando o princípio de que a um posto de trabalho permanente deve corresponder um contrato efectivo de trabalho.

É preciso que os benefícios decorrentes dos avanços tecnológicos também sejam aplicados na melhoria das condições de trabalho; na redução geral do horário de trabalho para as 35 horas, na eliminação de tarefas penosas e dos ritmos intensivos de trabalho.

Propomos o aumento geral dos salários, com um significativo aumento do salário médio, a valorização das profissões e das carreiras, a elevação do Salário Mínimo Nacional para 850 €, a recuperação do poder de compra perdido pelos trabalhadores da Adm. Pública.

Portugal tem de garantir justiça social aos reformados, pensionistas e idosos, a quem contribuiu para este País com uma vida inteira de trabalho. No imediato, é preciso assegurar aumentos de todas as pensões, incluindo das que estiveram congeladas, assegurando a reposição e valorização do poder de compra. Propomos igualmente que se assegure o direito à reforma para quem tenha 40 anos de descontos, acabar com o famigerado factor de sustentabilidade e voltar a colocar a idade de reforma aos 65 anos, eliminando também as penalizações sobre os pensionistas empurrados para reformas antecipadas.

Questão igualmente urgente é a necessidade de regular e fixar preços, impedindo a escalada especulativa. Regular preços na energia, nos bens alimentares, na habitação, nos serviços de primeira necessidade como são já hoje as telecomunicações.  

O respeito pelos direitos das crianças e pelo seu desenvolvimento integral, a par da inversão da quebra demográfica exige soluções transversais, integradas e duradouras, que garantam estabilidade no emprego, nos horários e na habitação.

Destacamos aqui o objectivo de assegurar a gratuitidade das creches para todas as crianças já em janeiro e a criação de uma rede pública de creches, ou soluções equiparadas, alargando em cem mil o número de vagas. Tal como nas creches, é preciso alargar a resposta às necessidades da população idosa, assegurando a criação de uma rede pública de equipamentos e serviços de apoio à terceira idade e à deficiência.

Camaradas e amigos,

A grave situação do SNS exige respostas imediatas. A saída em larga escala de profissionais – promovida pelo negócio da doença privada - está a reflectir-se no aumento dos utentes sem médico de família, no atraso nas consultas, exames, tratamentos e cirurgias, que põem em causa o direito à saúde dos portugueses. Entre outras medidas, é fundamental instituir a opção de dedicação exclusiva dos médicos e enfermeiros. É preciso também garantir incentivos que tornem atractiva a opção, de médicos e enfermeiros, pela fixação em zonas carenciadas, tal como se impõe a construção de infraestruturas já decididas e programar o conjunto de outras, inclusive obras de reabilitação e requalificação do parque de instalações do SNS.

Na verdade, é preciso assegurar o desenvolvimento de todos os outros serviços públicos, revertendo os processos de transferência de competências para as autarquias, repondo freguesias que foram extintas, reabrindo serviços que foram encerrados e reforçando os existentes, garantindo a cobertura do território nacional, recrutando os milhares de profissionais em falta e a revalorizando as suas carreiras na justiça, na saúde, na segurança social, nas forças e serviços de segurança, e nas restantes funções administrativas e públicas.

Na escola pública, é urgente combater a carência de professores, vinculando todos os professores com três ou mais anos de tempo de serviço e criando incentivos à sua fixação nas áreas que deles mais carecem. Ao mesmo tempo, é preciso avançar para a contratação de mais 6 mil trabalhadores não docentes até 2023.

Num outro plano, é preciso responder aos velhos e novos problemas com que o País está confrontado em matéria de habitação e transportes. Os preços das rendas de casa dispararam, os contratos de arrendamento tornaram-se precários, a oferta pública deixou praticamente de existir e aparece agora a subida das taxas de juro para quem tem empréstimos à habitação

É preciso revogar a Lei do Regime de Arrendamento Urbano e a adopção de um quadro legal que combata a especulação, regule preços e assegure estabilidade nos contratos de arrendamento. É necessário alargar a oferta pública de habitação em mais 50 mil fogos e mobilizar recursos para habitação a custos controlados.

E depois do avanço que constituiu a redução do valor do passe nos transportes públicos, impõe-se um forte investimento público no alargamento da oferta a todo o País, bem como, assegurar a progressiva gratuitidade.

Camaradas e amigos,

As soluções que apresentamos são inseparáveis da avaliação que fazemos de que não só existem os meios necessários, como esses mesmos meios podem ser reforçados.

Com mais justiça fiscal é possível obter mais receita. Consideramos que é possível enfrentar a corrupção, os privilégios e a fuga do grande capital ao pagamento de impostos e desagravar a tributação sobre o trabalho e as MPME. A redução do peso dos impostos indirectos – os mais injustos socialmente – passa, entre outras medidas pela reposição do IVA sobre a electricidade e o gás nos 6%, assegurando a mesma taxa para o Gás de Botija.

Não prescindimos também de políticas na área da energia que assegurem um Plano Energético Nacional, capaz de promover a redução dos preços da energia; a eficiência energética; o maior aproveitamento de recursos endógenos, particularmente das renováveis. 

A situação ambiental do País é marcada pela privatização de sectores fundamentais como a água, a energia ou os resíduos. Ao contrário da instrumentalização que está a ser feita em torno das alterações climáticas, são necessárias medidas que sejam eficazes na mitigação e adaptação a esta realidade. Medidas de ordenamento do território, abarcando várias dimensões, com particular enfoque na floresta – que este ano foi novamente sujeita a grandes fogos -, de limitação dos modos de produção intensiva e superintensiva e tendo em vista a promoção, conservação e recuperação da biodiversidade e o incentivo à produção e consumo locais, no quadro de um estímulo mais geral à produção nacional. A promoção do acesso à àgua, a utilização e salvaguarda dos recursos hídricos, com garantia da sua gestão e propriedade públicas, são igualmente opções que se impõe nesse domínio.                                      

Por fim, uma última palavra sobre as opções que consideramos necessárias a um crescimento e desenvolvimento económico que responda aos desafios que se irão colocar nos anos mais próximos. 

Queremos assegurar um significativo crescimento do investimento público – fixando como referência 5% do PIB ao ano, o que envolve não só uma ajustada e integral execução dos fundos comunitários, mas também a mobilização de outros recursos que garantam esse objectivo. É preciso avançar de facto com a reindustrialização. É preciso substituir importações por produção nacional, aumentar o valor acrescentado nacional e a componente nacional nas exportações; investir na produção nacional designadamente de alimentos, medicamentos e meios de transporte como temos vindo a propor ao longo destes anos.                             

Promover o desenvolvimento da agricultura familiar, da pesca artesanal e costeira e das cooperativas, visando a soberania e segurança alimentares. 

E assegurar o desempenho presente e futuro de empresas estratégicas, com destaque para opções urgentes que o País precisa de tomar, como é o caso da TAP.

Disse.

  • Central
  • OE2023
  • Orçamento de Estado
  • Orçamento do Estado 2023