Senhor Presidente, Senhores Deputados, Senhor Primeiro Ministro, Senhores Membros do Governo,
Ao longo deste debate ficou amplamente demonstrado que esta moção de censura não só é justa, como oportuna, como indispensável.
O estado a que chegou o nosso país, vítima de décadas de políticas de direita e em especial da desastrosa política dos últimos anos assim o exigia. Um país a divergir da União Europeia há quase dez anos; um país com 730 mil desempregados e muito mais de um milhão de precários; um país onde os direitos dos trabalhadores são crescentemente atacados; um país em recessão ou estagnação, em que o investimento público diminuiu brutalmente e a produção nacional se restringiu; um país em que os serviços públicos e a administração pública em geral se desagregam e deterioram continuamente; um país onde os salários e as reformas perdem sistematicamente valor, onde os pobres aumentam a sua pobreza e os ricos aumentam a sua riqueza, é um país que tem de reagir, que tem de lutar contra esta política. Por isso é justa esta Moção de Censura.
E ainda assim o Governo PS, acolitado pelo PSD, quer dar um novo salto na desigualdade, no atraso, na degradação da vida dos portugueses. Quer aplicar medidas que penalizam outra vez os mesmos, os de sempre, os que nunca ganham e perdem sempre com as medidas do Governo. Por isso esta Moção de Censura é oportuna; porque dá resposta a esta ofensiva do Governo, do PSD e da política de direita, uma resposta que antes e depois deste debate, particularmente na manifestação de dia 29 de Maio convocada pela CGTP, continua lá fora, nas empresas e locais de trabalho, nas praças e avenidas do nosso país.
Mas esta Moção de Censura é ainda mais do que isso, é indispensável. É que já se percebeu que a gula do grande capital e a submissão do Governo e do PSD, seus acrisolados seguidores, não tem limites. Já se percebeu que as medidas contra os direitos, contra os salários, contra as reformas, contra o investimento e o desenvolvimento, contra os serviços públicos vão continuar, a não ser que encontre uma forte resposta de todos os portugueses. Esta Moção é por isso indispensável para mostrar ao Governo e ao PSD, para mostrar aos grandes grupos económicos, que há vontade para enfrentar essa ofensiva e para a derrotar no campo político e no campo social.
Esta moção de censura traz ao parlamento a indignação, o protesto e a luta que se sente junto dos trabalhadores e da população face às medidas que têm vindo a ser anunciadas. É a censura de mais de 700 mil desempregados a quem querem cortar o subsídio, dos mais de 5 milhões de trabalhadores que não aceitam o roubo do seu salário, de milhares de reformados com reformas baixas e medicamentos cada vez mais caros, tal como o leite, a carne e de outros bens essenciais, de milhares de micro pequenas e médias empresas que não percebem como é que se pode aumentar outra vez o IVA. É a censura dos enfermeiros que estiveram em greve, dos trabalhadores da administração pública dos profissionais das forças de segurança, dos trabalhadores dos transportes, das populações a quem querem roubar o centro de saúde ou o serviço de urgência. É a censura que tem estado presente em dezenas de greves, paralisações, acções de protesto por todo o país.
Esta Moção de Censura combate o roubo dos salários dos portugueses.
Como se atreve o Governo a vangloriar-se de que não retirou o subsídio de Natal aos trabalhadores se vai retirar rendimento todos os meses e no final do ano nas deduções de quem trabalha ou é reformado?
E vai fazê-lo despudoradamente à pressa para apanhar já os subsídios de férias. Há uma adivinha que se conta às crianças em que se pergunta “qual é coisa qual é ela que antes de o ser já o era”. Já se sabe, é a pescada. Ora este aumento do IRS é a mesma coisa, antes de ser aprovado já está a ser aplicado. Mais: o Governo quer obrigar já em Maio a reter salário dos trabalhadores quando a proposta do Governo e do PSD só é debatida a 2 de Junho.
Quanto ao subsídio de desemprego, o Governo quer elogios por não aplicar a proposta do PSD. Mas foi o Governo que anunciou pretender cortar no subsídio para que os desempregados sejam incentivados a regressar ao mercado de trabalho. Mas onde estão os empregos?
O que o Governo quer é, para satisfazer as grandes associações patronais, baixar progressiva e sistematicamente os salários do portugueses, a quem nega em cada vez maior número o subsídio de desemprego.
E quanto aos sacrifícios dos que lucram sempre, vejamos a questão do IRC. O Governo anuncia uma sobretaxa sobre os lucros tributáveis, mas ao manter os benefícios fiscais à banca, esta vai continuar a pagar muito menos do que as pequenas empresas em geral.
Este caminho não só não é inevitável como é absolutamente errado. É errado porque vai manter e aumentar a crise, manter e aumentar o desemprego, cortando o subsídio, bem como muitas prestações sociais, pressionar para baixo os salários, prejudicar as pequenas empresas e em geral aumentar as desigualdades e afundar o desenvolvimento do país.
Mas é também errado porque nem sequer vai contribuir para uma saudável consolidação das contas públicas. É que, mesmo sabendo que o Governo dá prioridade aos cortes cegos na despesa pública, só com o aumento da receita há contas públicas saudáveis. Não o aumento à custa dos salários e das pensões, nem das pequenas empresas, mas com base no crescimento económico.
Como se consolidam as contas públicas? É com mais receita ou com menos receita? É com mais receita !
E como teremos mais receita sem haver crescimento?
E como teremos crescimento económico se quebra o investimento, se, penalizando os salários e as reformas, o consumo interno não progride?
Para termos uma boa consolidação das contas públicas é preciso termos crescimento económico, é preciso mais investimento, mais salários e melhores reformas. Com as medidas que estão anunciadas o Governo e o PSD deitam fora o crescimento económico e no futuro o País continuará a não ter receita suficiente para ter contas públicas saudáveis.
Esta política não resolve o problema económico nem resolve o problema orçamental.
As medidas que estão apresentadas e outras que certamente o Governo e a direita têm em mente não são só para o presente; visam efeitos estruturais para o futuro. São medidas que querem deixar instituído um país ainda pior. Nem sequer é preciso falar da reaccionária ideia de impor limites ao défice na Constituição. Estas medidas querem instituir a exiguidade do investimento público como regra; querem deixar a administração pública de tal maneira degradada, que lhes permita defender a privatização de largos sectores de serviços essenciais; querem restringir a protecção social ao mínimo e instituir a caridade e a dependência; e como sempre querem ainda menos direitos no trabalho, despedir sem justa causa, ter a precariedade como regra e baixar progressivamente os salários. Essa é a estratégia de fundo que estas medidas trazem consigo.
O Sr. Primeiro-Ministro diz que é irresponsável apresentar uma Moção de Censura porque isso pode deitar abaixo o Governo. Não Sr. Primeiro-Ministro, o que é irresponsável é uma política, que é a sua, que está a deitar abaixo o País.
O Primeiro-Ministro acusa o PCP de ser igual a si próprio. Coerência não é insulto. Mas eu percebo que isso incomode o PS. É que do PS não se pode dizer que esteja igual a si mesmo; o que pode dizer-se é que o PS está cada vez mais igual ao PSD nas políticas que defende e pratica no Governo.
O CDS procura passar um pouco despercebido nesta ofensiva da política de direita, que no fundamental subscreve e até propõe. Quis a sorte que afinal o CDS vá ter, nesta Moção de Censura a mesma posição do PSD, de que tanto se quer demarcar. O certo é que, arrufos à parte, o CDS está de acordo com o fundamental das medidas anunciadas pelo PS e pelo PSD. E se for preciso lá estará para viabilizar a continuação da política de direita, como fez com o Orçamento do Estado ainda há dois meses.
Já o PSD tentou disfarçar o seu total apoio ao Governo e à sua política com a discussão à volta da questão da alta velocidade. Claro, o PSD bem gostaria de que não se percebesse que está de acordo com o Governo na tentativa de baixa dos salários, nos cortes nos subsídios e prestações sociais, nas privatizações, no roubo fiscal dos salários, nos aumentos dos bens essenciais. Mas está. Está de acordo e é responsável por essas medidas.
O PSD bem gostaria de ter mantido a sua cínica posição de deixar o Governo PS continuar e agravar a política de direita, fingindo que nada tem a ver com isso. Não senhores Deputados do PSD. O PSD é um membro de pleno direito da coligação que defende esta política. E hoje isso vai ficar claro. Com a votação desta Moção de Censura o PSD confirma que é um dos progenitores das medidas de ataque aos trabalhadores e ao povo que estão anunciadas; e formaliza a sua aliança com o Governo de José Sócrates. Fica claro que o PSD não é alternativa de política. É parceiro da mesma política, é o aliado do Governo e do PS na sua execução.
O PS e o seu Governo tentaram desvalorizar esta Moção ode Censura. Disseram ao mesmo tempo que era irresponsável porque podia derrubar o Governo e era inútil porque não seria aprovada.
O Sr. Deputado Francisco de Assis discorreu sobre a função histórica útil do PCP. Sr. Deputado olhe antes para a função histórica do PS, que tem sido ao longo destes anos prometer política de esquerda na oposição e fazer política de direita no Governo.
Lá veio o estafado discurso do PS de que quem à esquerda critica os governos PS é aliado da direita. A solução seria por isso deixar o PS fazer a política da direita e nada dizer. Aliado da direita é o Governo e o PS. Selaram há dias um acordo para prejudicar os portugueses, uma aliança que hoje aqui vão confirmar. O PS e o PSD é que vivem em união de facto política e governativa.
E quanto a abrir a porta à direita, o PS sabe bem que quem sempre abriu a porta à direita foram os governos PS e a sua política.
Esta Moção de Censura é um momento de clarificação. Entre quem está com esta política de direita, seja no governo e na oposição e quem combate este rumo de desastre; entre quem não se conforma com as injustiças, e os que as promovem; entre os que defendem os interesses do país e os que aceitam as chantagens dos "mercados"; entre os que assumem os anseios dos trabalhadores e os que assumem os desígnios do grande capital; entre os que escolhem dar resposta às necessidades do povo português e os que preferem as imposições da União Europeia.
A censura não acaba aqui. Podem o PS, o PSD e o CDS chumbar esta Moção de Censura, mas não travarão a luta contra a política de direita. Essa é a luta que continua e continuará, que não desiste, que continua a exigir a mudança de que o País precisa e a que os portugueses têm direito. Que continua a afirmar que é direito dos portugueses terem uma vida melhor e que o que é inevitável não é a desigualdade crescente; o que é inevitável é que mais tarde ou mais cedo os trabalhadores e o povo derrotem a política de direita e imponham um novo rumo, uma política patriótica e de esquerda.
Disse,
Intervenção de Bernardino Soares na Assembleia de República
"Podem o PS, o PSD e o CDS chumbar esta Moção de Censura, mas não travarão a luta contra a política de direita"
Moção de Censura n.º 1/XI ao XVIII Governo
"O futuro do país comprometido pela política de direita"
18 Maio 2010
- O futuro do país comprometido pela política de direita
- "É preferível atirar um governo abaixo do que permitir que um governo atire o País abaixo"
- "Falam para a esquerda mas governam para a direita e à direita"
- "Esta moção de censura traz ao Parlamento a indignação, o protesto e a luta que se sente junto dos trabalhadores e da população"
- "A opulência de alguns é a degradação das condições de vida de quase todos"