Projecto de Lei N.º 19/XV/1.ª

Alarga o acesso à tarifa regulada de electricidade e elimina o seu carácter transitório

Exposição de motivos

Tendo sido prolongada a vigência da Tarifa de Venda a Clientes Finais (TVCF), permitindo a transição para esta tarifa regulada a consumidores que, estando no mercado liberalizado, o desejem, mantém-se o impedimento injustificado de celebrar novos contratos (de raiz) em tarifa regulada (TVCF).

Portugal tem facturas energéticas das mais elevadas da Europa, designadamente quanto à electricidade, em resultado da segmentação e privatização das empresas estratégicas de produção, transporte e distribuição, da liberalização artificial, da existência de um mercado grossista anacrónico, de uma actuação regulatória insuficiente e, ainda, em função das rendas excessivas repercutidas nas tarifas reguladas através dos CIEG, além da precificação fiscal e mercantilização do carbono. A tudo isto, acresce a aplicação da taxa de IVA de 23%, que os governos minoritários do PS recusaram repor na taxa reduzida de 6%, proposta diversas vezes pelo PCP.

São décadas de política de direita protagonizada por PS, PSD e CDS que se reflectem nas tarifas e nos preços.

Neste contexto, a existência de tarifas reguladas de electricidade, imprescindíveis e incontornáveis devido ao caracter monopolista do sector, tem também contribuído para garantir, embora de forma insuficiente, o indispensável controlo sobre os preços da eletricidade.

As diversas tarifas reguladas intermédias, estimadas, aprovadas e publicadas pela ERSE, reflectem-se sempre, embora por diversas vias, no preço pago pelos consumidores, tanto os abrangidos pela TVCF-Tarifa de Venda a Consumidores Finais (Mercado Regulado), como pelos que estão no Mercado Liberalizado. No caso dos consumidores que se encontram no Mercado Regulado, a TVCF incorpora também a Tarifa de Energia e a Tarifa de Comercialização, ambas reguladas.

A existência da TVCF não se justifica apenas, ou no fundamental, pelos consumidores finais economicamente vulneráveis porque, para esses, existe a tarifa social. De facto, a TVCF praticada em referencial regulado é uma importante referência de contenção num mercado liberalizado onde a condição oligopolista é muito notória, e, portanto, onde se impõe a sua existência para evitar o comandado hegemónico por parte dos grandes grupos económicos. Foi-lhe, num determinado contexto, atribuída.

Embora tenha sido considerado como instrumento regulatório transitório, a experiência real vivenciada nos mercados energéticos vem indicando a necessidade de o tornar perene, sendo esse o objectivo central da presente proposta. De forma coerente e complementar é necessário vir a permitir a celebração de novos contratos em mercado regulado (TVCF), bem como a eliminação dos injustificados fatores de agravamento artificiais da TVCF, que têm como finalidade forçar a adesão dos consumidores ao mercado liberalizado. Com estas medidas, pretende-se eliminar fatores não equitativos que, onerando ainda mais a TVCF têm, também, um impacto negativo nos preços praticados no mercado liberalizado.

O PCP reapresenta estas medidas, para que se possa fazer frente, de forma eficaz, aos aumentos frequentes, descontrolados e inflacionados por factores muitas vezes pouco transparentes, que estão a trazer crescentes dificuldades às famílias e às empresas em geral, e, em particular, às micro, pequenas e médias empresas.

Perante a necessidade de fazer baixar o enorme custo com a energia eléctrica suportado pelos consumidores domésticos (famílias) e pelas empresas, muito em particular as micro, pequenas e médias, impõe-se estas e outras medidas urgentes.

Os recentes desenvolvimentos da situação internacional, com a intensificação da guerra na Ucrânia e a aplicação de sanções com impactos de carácter global, colocam mais uma vez em evidência a necessidade de inverter a política seguida durante décadas no sector da energia. O aumento do custo de vida, que já se sentia antes desta nova situação, passa em larga medida por aumentos de índole especulativa que servem interesses injustificados de agentes económicos.

As medidas até agora adotadas e anunciadas pelo Governo são limitadas, insuficientes e incapazes de inverter esta situação muito negativa. É, por isso, necessário adotar um conjunto alargado e estruturante de medidas que aumentem o poder de compra das famílias e retirem o garrote que se aperta a milhares de MPME.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à alteração do Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro, no sentido de permitir a celebração de novos contratos de eletricidade com tarifa regulada e de eliminar o fator de agravamento sobre a tarifa regulada.

Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro

Os artigos 138.º, 140.º, 182.º, 186.º e 289.º do Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 138.º

[Atividade de comercializador de último recurso]

  1. A atividade de comercializador de último recurso consiste na prestação de serviço público universal de fornecimento de eletricidade a clientes abastecidos em BT normal, com potências contratadas iguais ou inferiores a 41,4 kVA.
  2. Podem ser celebrados com o comercializador de último recurso novos contratos de venda de eletricidade a clientes finais com consumos em BTN com aplicação das tarifas reguladas de venda de eletricidade.
  3. (anterior n.º 2)
  4. (anterior n.º 3)

(…)

Artigo 140.º

[Direitos e deveres do comercializador de último recurso]

  1. (…)
  2. (…)
  3. (…)
    1. Prestar o serviço público universal de fornecimento de eletricidade;
    2. (...)
    3. Assegurar o fornecimento de eletricidade em locais onde não exista oferta dos comercializadores de eletricidade em regime de mercado.
    4. (…)
  4. Nas situações previstas nas alíneas c) e d) do número anterior, o Comercializador de último recurso aplica o estipulado quanto às tarifas reguladas.

(…)

Artigo 182.º

[Direito à informação]

  1. (…)
    1. As condições de acesso e transição para contratos de venda de eletricidade a clientes finais nos termos do artigo 138.º.
  2. (…)

(…)

Artigo 186.º

[Direito à informação]

  1. (…)
    1. (…)
    2. Ao fornecimento de eletricidade pelo Comercializador de último recurso mediante tarifa definida pela ERSE, caso o pretendam.
  2. (…)

Artigo 289.º

[Extinção das tarifas transitórias de venda a clientes finais]

(eliminar) »

Artigo 3.º

Salvaguarda dos preços da energia

  1. Até 31 de maio de 2022, o Governo apura, a partir dos elementos referidos no número seguinte, medidas de controlo do sector elétrico, de transparência relativamente ao mercado grossista e de salvaguarda dos preços da eletricidade, tendo em conta a situação económica e social que o país enfrenta.
  2. Em articulação com a ERSE, são identificados:
    1. Os ganhos resultantes da adesão por eletroprodutores eólicos ao regime remuneratório;
    2. Os ganhos resultantes da metodologia marginalista usada na oferta, no mercado grossista, que determina que o preço final diário seja o da última unidade entrada na rede, independentemente de a maior parte da eletricidade admitida na rede corresponder a produções com custos de muito inferiores;
    3. Relativamente às centrais hidroelétricas, os ganhos injustificados em mercado grossista relacionados com custos do CO2 que estas não emitem.
  3. As medidas e os elementos identificados nos números anteriores são reportados à Assembleia da República.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

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