Intervenção de João Ferreira, Membro do Sector Intelectual de Lisboa e da DORL, XVII Congresso do PCP

A actual arrumação das classes

Camaradas:

Numa rápida radiografia do tecido social português, podemos dividir a população, e antes de mais a população activa, do ponto de vista do seu posicionamento de classe, em quatro sectores fundamentais:
– a classe operária;
– as camadas intermédias assalariadas, basicamente constituídas pelos assalariados não operários;
– as camadas intermédias não assalariadas, constituídas pela pequena-burguesia e o pequeno patronato;
– e a burguesia (excluindo o pequeno patronato e acrescentando-lhe os seus auxiliares directos).

Do seu estudo aprofundado podem-se extrair, muito sinteticamente, importantes conclusões:

1ª. A sociedade portuguesa apresenta-se, em termos de classe, fortemente polarizada, tendo vindo a acentuar ainda mais essa polarização.
Num pólo, a classe operária, a que se agregam os assalariados. De 1991 a 2001, a classe operária e as camadas intermédias assalariadas aumentaram o seu peso na população activa de 75% para 80%.

No outro pólo, a burguesia monopolista, uma ínfima minoria que comanda o sistema de exploração, que aglutina em torno de si as camadas superiores da burguesia. A burguesia e seus auxiliares directos, sem o pequeno patronato, aumentou de 1,9% para 2,5%.

No meio, as camadas intermédias não assalariadas. Que diminuíram de 21% para 16%.

(Sobra um resíduo de situações real ou estatisticamente indefinidas).

2ª. A burguesia monopolista reforçou a sua influência e poder. Ao mesmo tempo, agrava o seu conflito com as outras fracções da burguesia e o conjunto da sociedade e aprofunda a sua integração, em posições de subalternidade e dependência, com o grande capital transnacional. Daqui decorre que a luta contra a burguesia monopolista é simultaneamente uma luta pela independência e soberania nacionais, susceptível de chamar à acção comum uma vasta frente social, incluindo sectores da própria burguesia.

3ª. No que respeita às camadas intermédias, assalariadas e não assalariadas, a evolução da situação económica e social desde os inícios dos anos 90, por um lado, confirmou a instabilidade social da pequena-burguesia. Por outro lado, revelou o enorme crescimento das camadas intermédias assalariadas, de meio milhão entre os censos, pelo que a disputa da sua representação política será um factor de relevo acrescido das influências sociais e expressões eleitorais dos partidos.

A percentagem de operários nos assalariados diminuiu, apesar de em termos numéricos terem aumentado um pouco. Essa diminuição deveu-se ao crescimento da massa assalariada sobretudo em funções não produtivas, tendência geral do capitalismo desenvolvido, agravada pela desindustrialização e a liquidação de sectores produtivos nacionais.

4ª. O trabalho produtivo moderno atravessa os serviços e abrange uma parte crescente do trabalho intelectual, aumentando a complexidade da composição da classe operária. Agravam-se, nalguns casos, contradições no seu interior, que dificultam a sua coesão e a formação da consciência de classe. Mas a classe operária não esgotou o seu potencial revolucionário. Mantém uma forte presença numérica na sociedade, de que se mantém o principal destacamento. O seu peso deve também ser avaliado pelo seu papel decisivo na produção de riqueza, pelo seu confronto objectivo com o mecanismo constitutivo da acumulação capitalista – a extracção de mais-valia –, e pela sua intervenção na luta social e política.

5ª. A evolução da situação social, com o enorme crescimento das camadas intermédias assalariadas, o assinalável crescimento dos intelectuais e quadros técnicos na população activa e na massa assalariada, contrastando com a diminuição e envelhecimento do campesinato, não põe em causa o sistema consagrado das alianças da classe operária, mas obriga necessariamente a reequacionar os pesos das suas componentes. Reforça-se a importância da aliança da classe operária com os intelectuais e outras camadas intermédias.

A análise da pertença objectiva de classe deve ser complementada com a análise dos mecanismos que promovem ou dificultam a formação da consciência de classe, para que possamos, como partido da classe operária e de todos os trabalhadores, intervir à altura das nossas responsabilidades no exigente e entusiasmante processo de transformação da sociedade.

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