Comunicado do Gabinete de Imprensa dos Deputados do PCP no PE

Um Pacto da União Europeia contrário às Convenções Internacionais em matéria de migração e asilo e dos direitos humanos

Os deputados do PCP no Parlamento Europeu rejeitaram o Acordo Interinstitucional relativo ao chamado “Pacote em matéria de migração e asilo”, aprovado no Parlamento Europeu, com os votos favoráveis dos deputados do PS, PSD e CDS.

1. O denominado “Pacote em matéria de migração e asilo” consolida uma visão que acentua a natureza selectiva, exploradora e desumana das políticas da União Europeia em matéria de migrações e asilo, que são definidas em função de interesses económicos e oportunistas, que pactuam com a negação de direitos sociais e laborais aos trabalhadores migrantes, que ignoram as causas da migração, criminalizam migrantes e deixam os refugiados desprotegidos.

Um “Pacote em matéria de migração e asilo” que é igualmente marcado pela ausência de uma urgente e adequada resposta à dramática situação humanitária que atinge milhares de migrantes e refugiados – com particular expressão no Mediterrâneo – que procuram a vida digna e em segurança a que têm direito, tantas vezes fugindo à fome, à perseguição, à guerra, à morte, e que, ao invés de serem protegidos, ficam expostos às redes de imigração ilegal e às mais desumanas situações de exploração, negação de direitos, violência.

Saliente-se que as políticas de ingerência, de desestabilização, de imposição da exploração de recursos e do domínio económico promovidas e apoiadas pela UE – como no Médio Oriente ou em África – integram os factores que estão na origem de milhares de migrantes e
refugiados.

2. O inalienável direito à vida e à dignidade é um princípio basilar consagrado na Constituição da República Portuguesa, na Carta das Nações Unidas e noutras convenções internacionais, direitos elementares que o “Pacote em matéria de migração e asilo” desrespeita, compromete e viola em aspectos que se relacionam nomeadamente com:

- a normalização e aceleração de procedimentos discricionários para o retorno para o país de origem ou para países terceiros – facilitando a deportação mesmo que comportando riscos para o requerente de asilo, não excluindo famílias com crianças, nem garantindo o acesso a assistência jurídica – ou de suspensão temporária dos procedimentos de asilo, o que poderá colocar em causa os seus direitos, incluindo de crianças e de outras pessoas em situação mais vulnerável;

- o prazo e critérios do procedimento de controlo inicial, que pode transformar-se num período de retenção prolongado nas fronteiras, incluindo de crianças, e a introdução de conceitos que criam incerteza jurídica quanto aos direitos, como a denominada “ficção jurídica de não entrada”, que determina que uma pessoa ainda que fisicamente no território de um Estado possa ser considerada como não tendo dado entrada nesse Estado;

- a consolidação de sistemas de dados pessoais que põem em causa direitos, como o EURODAC – sistema de comparação de impressões digitais dos requerentes de asilo –, que passa a determinar a recolha de dados biométricos em crianças a partir dos 6 anos;

- a reforma do sistema de Dublin, determinando um quadro de reinstalação em função da denominada “solidariedade obrigatória” entre Estados-Membros da UE, que permitirá uma distribuição alheia aos interesses dos migrantes – nomeadamente desconsiderando a reunificação familiar, por exemplo no caso de relações de irmandade, ou a situação de famílias com crianças –, assim como às possibilidades e condições diferenciadas existentes em cada país para o seu acolhimento. Registe-se que este procedimento de reinstalação pode ser evitado, nomeadamente através de um pagamento de 20 mil Euros por cada requerente rejeitado;

- a militarização e a externalização de “fronteiras”, através do estabelecimento de acordos com países terceiros, usados como instrumento de tampão a migrantes e refugiados, consolidando a chamada “Europa fortaleza”.
Refira-se ainda que se trata de um Pacto em flagrante contraste com a Directiva da Protecção Temporária, de 2001, que se mantém, e que tendo sido activada apenas uma vez – no caso de mais de 4,2 milhões de ucranianos –, confere condições de acolhimento dignas para quem procura refugio nos países que integram a UE, não sendo compreensível a sua não activação noutras situações análogas.

3. Os deputados do PCP no Parlamento Europeu salientam a importância de garantir os direitos e a inclusão dos migrantes e dos refugiados, assim como de promover políticas de desenvolvimento que combatam as causas de fundo das migrações. Continuarão, assim, a defender no Parlamento Europeu políticas orientadas, entre outros importantes aspectos, para:

- o respeito da soberania de cada Estado quanto à definição da sua política de migração e asilo, no cumprimento dos direitos e da inclusão dos migrantes e refugiados e das convenções internacionais estabelecidas no âmbito da ONU, tais como, a Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados ou a Convenção sobre a protecção dos direitos de todos os trabalhadores migrantes e membros das suas famílias;

- o respeito pelos direitos, incluindo laborais e sociais, dos trabalhadores migrantes, assim como de todos os trabalhadores, rejeitando e combatendo discriminações, instrumentalizações e a exploração de que são alvo por parte dos grandes interesses económicos;

- a elevação das condições laborais e sociais de todos os trabalhadores, desde logo através do aumento dos salários, da defesa e promoção de serviços públicos de qualidade, gratuitos e universais, na saúde, na educação, na segurança social, o aumento da oferta pública de
creches e lares, o assegurar do direito à habitação, da igualdade na lei e na vida, do combate a todas as formas de violência e discriminação;

- a promoção de uma real política de cooperação e de ajuda ao desenvolvimento, com recursos adequados e baseada numa solidariedade efectiva, que rejeite todas as formas de neocolonialismo, as relações desiguais e a pilhagem de matérias-primas, que combata a fome, a doença, a pobreza, que respeite e garanta o desenvolvimento e a soberania dos povos, contribuindo para a melhoria das suas condições de vida.

Bruxelas, 15 de Abril de 2024

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