Nota do Gabinete de Imprensa do PCP

Sobre a proposta de Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027 apresentada pela Comissão Europeia

1- A proposta de Quadro Financeiro Plurianual para o período 2021-2027 apresentada pela Comissão Europeia é contrária aos interesses nacionais e às necessidades de desenvolvimento do País. Uma proposta que, a ir por diante, contribuirá para o aprofundamento da divergência de Portugal face a outros países na União Europeia, e não para a diminuição das injustiças e desigualdades na sociedade e assimetrias no território, para a promoção do aparelho produtivo nacional, para a diminuição da dependência externa.

2- O PCP sublinha que o Quadro Financeiro Plurianual (QFP) da União Europeia assume como elementos estratégicos todas as orientações de aprofundamento da integração capitalista, responsável pelo desenvolvimento desigual, injusto e assimétrico entre os diferentes países na União Europeia e que tem acentuado a divergência de Portugal – processo e políticas que têm sempre contado com o apoio de PS, PSD e CDS. O tempo e a vida demonstram que os fundos da União Europeia nunca compensaram (nem podiam compensar) as perdas de soberania, a destruição da produção nacional e o comprometimento de possibilidades de desenvolvimento do País, que resultaram e resultam do mercado único, do Euro e das políticas comuns da UE. As últimas décadas, marcadas pela estagnação e recessão económica, pelo desemprego, pelos baixos salários, pela precariedade, pela emigração em massa, pelo recuo demográfico, pela fragilidade do tecido económico nacional, pelo domínio dos sectores estratégicos nacionais por parte do grande capital estrangeiro, falam por si, no que diz respeito às consequências do processo de integração capitalista da UE para países como Portugal.

Ora, isto mais verdade se torna num momento em que se anuncia um corte no financiamento a atribuir a países que, como Portugal, têm sido mais prejudicados com a submissão ao Euro e às políticas da UE, e um aumento de rubricas – designadamente na área da defesa e indústria militar e em políticas securitárias – que aproveitam sobretudo os maiores beneficiários da integração: as principais potências da UE e os seus grupos económicos e financeiros.

3- A proposta da Comissão Europeia fixa o Orçamento da UE em níveis que não vão além de 1,11% do Rendimento Nacional Bruto (RNB) do conjunto dos Estados-Membros (1,279 biliões de euros). Estamos perante valores que, globalmente considerados, pela sua exiguidade e no quadro das políticas da UE, inviabilizam qualquer perspectiva efectiva de promoção da coesão económica e social. Como a realidade tem vindo a comprovar, mesmo com orçamentos superiores ao agora proposto em rubricas como a coesão, o que sistematicamente prevalece é a divergência e não a convergência entre os Estados-Membros. A exiguidade da dotação global é agravada pelas opções na distribuição das verbas patentes na proposta da Comissão Europeia.

Destaca-se o anúncio da redução em 7% das verbas afectadas à política de coesão – os chamados fundos estruturais e o fundo de coesão – que afectará sobretudo os países, como Portugal. Da mesma forma, a anunciada redução em 5% das verbas da Política Agrícola Comum – PAC, essencialmente liberalizada e em que foram já desmantelados os parcos instrumentos de defesa da produção, terá inevitáveis consequências.

O PCP sublinha ainda que se verifica uma diminuição geral das verbas de gestão nacional e um aumento das verbas de gestão da UE, sujeitas a novos factores de condicionalidade, aprofundando a centralização da execução das verbas do Orçamento da UE, em função dos interesses das grandes potências e do grande capital transnacional, em que a agenda neoliberal da UE com as ditas “reformas estruturais” são parte integrante.

O objectivo assumido de aumento dos chamados “novos recursos próprios” visando o financiamento do Orçamento da UE, incluindo com a criação de impostos à escala da UE, não pode deixar de ser lido como um aprofundamento do federalismo e uma usurpação e transferência de novas parcelas da nossa soberania.

Na verdade, não são os impactos da saída do Reino Unido da UE que ditam os contornos desta proposta, como insistentemente tem sido referido. São as opções, é a orientação neoliberal, federalista e militarista, que definem em última análise o carácter da proposta de Orçamento apresentada. Uma proposta que significa menos recursos para a coesão económica e social, menos recursos para o investimento por cada Estado-membro de acordo com as suas necessidades; mais recursos para o complexo militar-industrial, mais recursos para as multinacionais que absorvem o grosso das verbas dirigidas à investigação e desenvolvimento nas mais diversas áreas, mais recursos para as políticas de controlo e repressão dos migrantes, profundamente desumanas, xenófobas e exploradoras.

4- O PCP reclama do Governo português uma atitude firme e enérgica na defesa dos interesses nacionais. Não basta exigir que não haja redução dos montantes atribuídos ao País. É necessário questionar os critérios, as prioridades, as orientações e políticas que estão em curso na União Europeia. É necessário, tal como o PCP defende, que o País se bata:

- Não só pela recusa de qualquer corte nas verbas de coesão e da agricultura, mas pelo seu reforço no quadro do reforço dos meios financeiros do Orçamento comunitário, a par de uma redistribuição criteriosa e adequada pelos Estados-membros em função dos seus níveis de desenvolvimento económico e social;

- Pelo ajustamento da contribuição de cada Estado-membro proporcionalmente à sua dimensão e grau de desenvolvimento (implicando o aumento da contribuição das grandes potências), tendo por base o respectivo RNB, tendo em conta os níveis de desenvolvimento económico e social dos diversos Estados;

- Pela rejeição das regras de condicionalidade macroeconómica na aplicação dos fundos comunitários;

- Pela rejeição de qualquer tentativa de criação de “impostos europeus”;

- Pela revisão das prioridades e critérios na afectação dos fundos comunitários, centrando-os no combate às desigualdades e assimetrias entre e dentro dos Estados-membros, no combate às injustiças sociais, no combate à concentração monopolista e financeirização da economia, no apoio aos sectores produtivos de base nacional, ao desenvolvimento dos serviços e investimento público;

- Pela recusa de acréscimos de fundos destinados a investimentos ou despesas correntes em rubricas de “defesa” e armamento militar que não correspondam às necessidades nacionais;

- Pela ampliação da capacidade de gestão autónoma e flexível do novo QFP por cada Estado-membro, não aceitando uma maior centralização e burocratização das regras comuns da sua aplicação;

- Pela eliminação da regra da adicionalidade e pela não contabilização como despesa pública, no apuramento das Contas Públicas, dos fundos utilizados em investimento.

5- Portugal não pode aceitar, nem submeter-se às imposições da União Europeia. O PCP chama a atenção para o facto de nenhum Quadro Financeiro Plurianual poder ser aprovado sem o consentimento de todos os Estados-membros. Trata-se de um instrumento do qual o Governo português não só não pode prescindir, como deve utilizar, como factor de salvaguarda dos interesses nacionais.

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