Nota da Comissão Política do Comité Central do PCP

Sobre a actual situação política

1. A constituição do VI Governo Provisório foi precedida de discussões políticas que conduziram a uma plataforma governamental. O PCP considerou que esta plataforma era aceitável e que alguns dos seus pontos permitiam a realização duma política progressista.

A composição do VI Governo mereceu desde o início as maiores reservas ao PACP que, declaradamente, manifestou a sua discordância com a inclusão de ministros do PPD e a predominância de elementos que não davam garantias ao cumprimento da plataforma governamental. O facto de não terem sido cumpridos acordos estabelecidos acerca da distribuição de secretarias de estado que caberiam a membros do PCP mais agravou aquelas reservas.

A garantia de exercício das liberdades em todo o território nacional, o combate às actividades contra-revolucionárias, a defesa intransigente dos interesses das classes trabalhadoras e do povo em geral, a defesa da revolução e das suas conquistas, tais são alguns dos pontos básicos do programa do VI Governo, a acção do governo em cerca de dois meses de exercício não corresponde aos objectivos definidos.

A vincada orientação direitista de muitos departamentos governa mentais provocou um crescente descontentamento popular e a redução da base social de apoio do governo, que as concentrações e manifestações de predominância conservadora e reaccionária não conseguem esconder.

As grandiosas paralisações, greves e manifestações dos metalúrgicos, trabalhadores rurais, e operários da construção civil, são grandes exemplos da resistência firme da classe operária e das massas populares à tentativa de viragem à direita.

2. A manifestação do passado domingo em Lisboa pretendeu reeditar à escala nacional as anteriores manifestações do porto e de faro.

Mas, apesar dos vastos recursos utilizados em todo o país, a manifestação não foi nem política nem numericamente o sucesso que anunciaram.

As palavras de ordem, os cartazes, os gritos, os próprios actos provocatórios conferiram à manifestação um carácter não simplesmente direitista, mas claramente reaccionário. Politicamente, ficou mais a nu qual a base social que apoia e em que se apoia a orientação que esta a ser imprimida à actividade do actual governo.

O discurso proferido na ocasião pelo primeiro ministro, em que se equiparam 0s perigos da extrema direita e da esquerda, em que se mistura o ELP com os trabalhadores em luta, em que se anuncia a repressão contra os que se opõem à viragem à direita e em que se faz a defesa de processos tão violentos como o usado para silenciar os emissores da rádio renascença, colheu. Naturalmente, os entusiásticos aplausos daqueles manifestantes.

Nas expressões de desagrado com que os trabalhadores da construção civil receberam o primeiro ministro quando, hoje mesmo, lhes falou, em s. Bento, encontra-se um eco da indignação popular provocada pelas manifestações direitistas do Porto, Faro e Lisboa.

3. Apesar dos cuidados que parece terem sido tomados para a não divulgação do plano económico de emergência, finalmente este passou ao conhecimento público, nestes dias.

Agora os trabalhadores podem apreciar qual a política económica que o VI Governo se propõe realizar. A perspectiva de congelamento de salários e até a sua redução e de subida de preços, a possibilidade de recuperação capitalista das empresas nacionalizadas, a restrição dos consumos das massas populares, a fuga ao controlo da produção por parte dos trabalhadores, a completa ausência de medidas sobre a reforma agrária, a indemnização dos monopolistas e agrários expropriados, indicam que se pretende vencer as actuais dificuldades económicas à custa de mais sacrifícios dos trabalhadores.

Não se compreende como, com um tal plano, se pode realizar um política de defesa intransigente das classes trabalhadoras e do povo em geral, de que fala o programa governamental.

4. O povo angolano proclamou a sua independência, consagrando o MPLA como a sua vanguarda revolucionária e Agostinho Neto como primeiro Presidente da República Popular de Angola.

Agora, ante este histórico acontecimento, definiram-se melhor as posições das diferente forças políticas portuguesas.

Enquanto os partidos, forças e personalidades revolucionárias defendem o reconhecimento do novo estado e das suas estruturas governamentais formadas sob égide do MPLA, outros partidos e individualidades governamentais tudo têm feito para impedir uma verdadeira política de descolonização, única que serve os interesses do nosso povo e do povo angolano.

Argumentos como os de que o reconhecimento do MPLA e do governo por ele formado como governo legítimo de angola prejudica as nossas relações com aliados de Portugal, favorece o desequilíbrio da correlação de forças em África ou compromete a segurança do atlântico sul, recordam a orientação definida pelo fascismo para o prosseguimento das guerras coloniais, traduzem a aceitação do ponto de vista do imperialismo nestas questões e nada têm a ver com a defesa dos interesses do povo português, com o futuro das nossas relações com os povos das antigas colónias e com a causa da liberdade e do progresso dos povos.

A utilização da teoria dos dois imperialismos, a que essas mesmas forças deitam mão. Aparece nitidamente como uma forma de defender e proteger os interesses do único imperialismo, o imperialismo americano e das potências ocidentais.

5. A consolidação das tendências de direita no VI Governo, de que a manifestação de domingo passado em Lisboa, o plano económico de emergência e as posições face à descolonização em Angola, são novas ilustrações, agrava a crise político-militar em que o país se debate e compromete os interesses das massas trabalhadoras e do povo.

O pseudo-revolucionarismo esquerdista encontra terreno fértil para atrair certas camadas da população e conduzi-las a aventuras, prejudicando gravemente o movimento popular de massas. Cada vez mais se torna evidente a necessidade de encontrar corajosamente uma solução para a crise.

Mais uma vez o PCP acentua que essa solução tem de passar pelo reforço das posições de esquerda nas estruturas do poder político e militar, pela unidade se todas as revolucionárias, recomposição do MFA, como força revolucionária, assente num entendimento das suas correntes.

Mais uma vez o PCP apela para todas as massas trabalhadoras e populares, para todas as forças políticas revolucionárias, para todos os militares e civis que defendem a revolução, para vencerem os divisionismos e desentendimentos, para se unirem, para defenderem vigorosamente as liberdades e outras conquistas da revolução e para marcharem decididamente no caminho da construção de um Portugal democrático rumo ao socialismo.

Os partidos e organizações revolucionárias, as massas trabalhadoras e o povo português já deram provas de possuírem capacidade e força bastantes para removerem as dificuldades e prosseguirem vitoriosamente a revolução.

  • 25 de Novembro de 1975
  • Central