Intervenção de Armando Farias, membro da Comissão Executiva do Conselho Nacional da CGTP-IN, Seminário «O Euro e a União Económica e Monetária. Constrangimentos e Rupturas»

Romper com a política de direita, continuar a luta pela alternativa política, patriótica e de esquerda

Como o tempo se encarregou de demonstrar, o agravamento dos problemas e contradições dentro da União Europeia resultam, fundamentalmente, da adopção e aprofundamento de uma política que ao assumir como opção estratégica do grande capital o neoliberalismo, o federalismo e o militarismo, aprofundou também as políticas anti-laborais, acentuou as desigualdades económicas e sociais entre os países membros e dentro de cada um dos países, e amputou partes da soberania da grande maioria deles.

Ao manancial de diplomas, directrizes, orientações e recomendações efectuados por Bruxelas, decorrentes de uma arquitectura que tem como eixos a União Económica e Monetária (UEM), a institucionalização dos critérios de convergência nominal no Pacto de Estabilidade e no Tratado Orçamental, a estrita política monetarista levada a cabo pelo Banco Central Europeu (BCE) e a aprovação da Estratégia de Lisboa, entre outros, acrescem novos mecanismos que procuram criar a ilusão de um novo rumo para a Europa, como são, por exemplo, os muito propagandeados “Semestre Europeu”, “Estratégia 2020” ou “Uma melhor Governação Económica”, mas que, afinal, mais não são que novas peças para que o comboio do federalismo prossiga a marcha, sob o comando das políticas económicas determinadas pelas grandes potências da UE.

É neste quadro que a Comissão Europeia tem vindo a promover iniciativas no âmbito do chamado diálogo social, como a Conferência realizada no princípio deste mês de Março, em Bruxelas, designada “Um novo ímpeto para o Diálogo Social”, que sob a aparência de mais diálogo, transparência e democracia, trata-se, afinal, de mais uma operação que apenas tem o objectivo de comprometer os trabalhadores, através das suas Organizações, na aplicação, em cada um dos países, das medidas de exploração e empobrecimento emanadas a partir dos directórios da UE.

Todos estes mecanismos, a que se junta, ainda, a Análise Anual para o Crescimento, entram em rota de colisão com os mais elementares direitos laborais, sociais e económicos. Como traços essenciais da ofensiva em curso, destacam-se: os incentivos à continuação e aceleramento das “reformas estruturais” que apontam para novos ataques e retrocessos na legislação do trabalho; a insistência na “consolidação orçamental” que, sob a capa da chamada “racionalização da administração pública” visa despedir trabalhadores e reduzir e privatizar serviços públicos; a aposta numa política fiscal que isenta o capital e sobrecarrega os trabalhadores e a população em geral, com a promessa de um crescimento que nunca se materializa; os novos ataques à segurança social, procurando transformar a universalidade e a solidariedade em assistencialismo para reduzir a protecção social e perpetuar a pobreza.

É neste contexto, que em Portugal a política de direita prosseguida pelos governos do PS, do PSD e do CDS-PP ao longo dos últimos 38 anos tem conduzido a uma situação insustentável e que o aprofundamento dessa política no período mais recente, quer na versão dos PEC dos Governos do PS quer pela aplicação do “memorando de entendimento” com a troika, um verdadeiro Pacto de Agressão, subscrito pelos mesmos partidos, acentuou a ofensiva exploradora e de empobrecimento, por via de medidas que agravaram todos os problemas dos trabalhadores e do povo.

Neste período, foram destruídos cerca de 500 mil postos de trabalho, elevando o desemprego para mais de 1 milhão e 300 mil desempregados, e obrigou muitas centenas de milhar a emigrar, nomeadamente jovens, não por opçâo, mas por imposição de uma política que lhes nega o futuro no nosso país. O acesso às prestações de desemprego é, também, negado a mais de dois terços dos desempregados, sendo que de entre os mais afectados pela falta de cobertura das prestações de desemprego 70% são mulheres e 85% são jovens com menos de 35 anos de idade.

Quanto aos salários, foi imposta uma redução brutal, por diversas vias, desde o congelamento dos salários e pensões ao roubo dos subsídios de férias e de natal e à diminuição das prestações sociais mas, também, através da alteração da legislação de trabalho para reduzir outras prestações pecuniárias ou aumentar o tempo de trabalho, designadamente com a eliminação de dias feriados, a redução do número de dias de férias, a diminuição do pagamento de trabalho extraordinário em dia útil, em dia de descanso e em dia feriado.

Os trabalhadores do sector público têm sido particularmente visados com o acréscimo de outras medidas, tais como a revisão dos suplementos remuneratórios, visando o congelamento, a diminuição ou até mesmo a eliminação de subsídios, o congelamento de carreiras e progressões, a imposição da tabela salarial única, entre outras reduções de componentes retributivas, para além de manter também a imposição do aumento do horário normal de trabalho das 35 para as 40 horas, o que representa igualmente uma desvalorização salarial, por via da redução do salário-hora.

Trata-se de um autêntico processo de espoliação sobre todos os trabalhadores quer sejam do sector privado, público ou empresarial do Estado, que atinge a avultada soma de 17 mil milhões de euros que foram transferidos dos rendimentos do trabalho para o capital, só nos últimos quatro anos.

Por outro lado, o aumento da jornada e intensificação dos ritmos de trabalho, a desregulamentação dos horários e a redução dos tempos de descanso são, também, aspectos centrais da política de direita, orientados para o embaratecimento do custo do trabalho. O código do trabalho, tal como a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, incluem um vasto cardápio de malfeitorias que os Governos da politica de direita puseram ao dispor dos patrões, incluindo os regimes de adaptabilidade horária, os “bancos de horas” e a adaptabilidade horária individual, que visa pôr o trabalhador a trabalhar mais e a receber menos salário, entre outras regras que configuram um profundo retrocesso social.

A tudo isto acresce, ainda, um brutal aumento dos impostos, a par do agravamento do custo de vida, particularmente do aumento de preços dos produtos e bens de primeira necessidade.

Por sua vez o patronato, sentindo-se protegido pelos Governos que representam o capital, usa e abusa de sofisticados, fraudulentos e brutais métodos repressivos para subverter a seu favor a jornada de trabalho, tornando uma prática cada vez mais corrente o trabalho a tempo parcial; o contrato ao dia e à hora, sem dia de descanso ou férias; o desconto das pausas na contagem do tempo de trabalho; as falsas isenções de horário de trabalho, ou as horas extraordinárias não pagas; o trabalho por objectivos sucessivos, forma moderna da «empreitada»; a contratação da força de trabalho de «falsos trabalhadores por conta própria» (recibos verdes) e, ainda, a repressão que induz ao medo de perder o emprego, não ser promovido ou perder o prémio, que empurram os trabalhadores para aceitarem o prolongamento do horário diário, e a prestação de trabalho aos sábados, feriados e até aos domingos, sem remuneração.

Quanto à contratação colectiva sofreu com a publicação do código do trabalho, em 2003, a introdução de regras que desequilibram a relação de forças a favor do patronato, fragilizando dessa forma o exercício efectivo do direito de negociação colectiva, ao admitirem a caducidade das convenções, a par de outras alterações gravosas, tais como a eliminação do princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador, admitindo a possibilidade de serem negociadas condições de trabalho inferiores à lei; a explicitação da adesão individual às convenções; a arbitragem obrigatória e a redução do direito de greve, através do alargamento dos serviços mínimos a vários sectores de actividade, entre outras disposições que configuram um profundo retrocesso social.

Desde então, várias revisões foram efectuadas, todas no mesmo sentido da eliminação dos direitos individuais e colectivos dos trabalhadores e das suas organizações de classe, especialmente dos sindicatos, procurando pôr em causa a contratação colectiva, afastar os sindicatos do processo de negociação colectiva, limitar quer o direito de greve quer a própria acção sindical nos locais de trabalho, de forma a subverter a protecção constitucional do trabalho na relação com o capital e criar condições para a intensificação da exploração dos trabalhadores.

A transferência da contratação colectiva para o nível de empresa e a tentativa de afastamento dos sindicatos das negociações, previsto na alteração da lei, é um objectivo patronal visando levar os trabalhadores a aceitarem a destruição da sua convenção colectiva, fase intermédia para eliminar obstáculos para a relação individual de trabalho.

O “fim da troika” não representou o fim da ingerência estrangeira em Portugal nem o termo da política de afundamento económico e social do país. O Governo prossegue as mesmas medidas que consubstanciam a política de direita através, nomeadamente, da continuação do programa de privatizações, agora com os processos em curso no sector dos transportes e telecomunicações, mas estando já na mira do capital também a privatização da água pública e dos resíduos, assim como prossegue a ofensiva para reconfigurar o papel do Estado, numa lógica também privatizadora, assitencialista e caritativa, tendo como objectivo explicito transferir ainda mais recursos para o grande capital. Muitas outras medidas anti-laborais estão em curso, atingindo com maior ferocidade os trabalhadores, os desempregados, os reformados e pensionistas.

Neste confronto com o capital, têm-se levantado com muita determinação e coragem a classe operária e os trabalhadores, organizados na sua central de classe a CGTP-IN. A excepcional participação de centenas de milhares de trabalhadores nas lutas reivindicativas nos locais de trabalho e nas ruas, ficou mais uma vez expressa nas grandiosas acções realizadas neste mês de Março, com a Jornada Nacional de Luta descentalizada, no dia 7, a Greve Nacional dos trabalhadores da Administração Públca, uma das maiores já realizadas neste sector, no dia 13, bem como muitas lutas de empresas dos sectores privado e empresarial do Estado.

Ainda neste mês de Março estão convocadas greves em diversas empresas e vai também realizar-se uma Marcha Nacional, com o lema “Juventude em Marcha, Trabalho com Direitos! contra a precariedade e a exploração”, com início nesta segunda-feira, dia 23, e a culminar com uma grande Manifestação em Lisboa, no dia 28 de Março, Dia Nacional da Juventude.

A luta de resistência à ofensiva do capital é dura, mas é travada com determinação e a confiança de que mais cedo que tarde a classe operária, os trabalhadores e o povo hão-de vencer. Mesmo na situação difícil que estamos a viver, tem sido possível obter resultados que mostram que vale a pena lutar, confirmando uma das teses centrais do XIX Congresso do PCP, de que grandes perigos convivem com grandes potencialidades.

Nas vésperar de comemorar o Aniversário da Revolução de Abril e os 125 anos do 1º de Maio, os trabalhadores intensificam a acção nos locais de trabalho e multiplicam as lutas reivindicativas para defender os direitos e melhorar as condições de trabalho, com objectivos concretos, dos quais salientamos: o aumento geral dos salários, incluindo o aumento do salário mínimo para 540 € a partir de 1 de Janeiro e a sua actualização progressiva até atingir os 600 € no início de 2016; a devolução dos salários cortados e a reposição dos feriados ilegitimamente eliminados; a reposição dos valores pagos a título de trabalho suplementar e em dias feriados; respeito e cumprimento dos direitos dos trabalhadores e das condições de trabalho, incluindo a aplicação das 35 horas de trabalho na Administração Pública e a redução progressiva do horário de trabalho semanal para as 35 horas para todos os trabalhadores; a revogação das normas mais gravosas do Código do Trabalho e da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas; o reforço dos direitos individuais e colectivos, nomeadamente dos direitos de organização, acção sindical e contratação colectiva.

Para concretizar estas propostas torna-se premente a ruptura com a política de direita e lutar por uma política alternativa. A política, patriótica e de esquerda que o PCP propõe aos trabalhadores, ao povo e ao país, constitui condição necessária para assegurar um Portugal com Futuro, de Justiça Social e Progresso, um país Independente e Soberano.

Pela Ruptura com a Política de Direita!
Pela Alternativa, Partriótica e de Esquerda!

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