Projecto de Lei N.º 965/XV/2

Revoga o regime de caducidade da contratação coletiva

Exposição de motivos

A contratação coletiva deve assumir um papel principal entre as fontes de direito do trabalho. Contudo, desde a primeira versão do Código do Trabalho aprovada em 2003 por um Governo PSD/CDS a dimensão negocial das relações laborais tem vindo a ser desvalorizada, quer através da eliminação do conteúdo fundamental do princípio do tratamento mais favorável do trabalhador quer através da caducidade das convenções coletivas de trabalho por decisão unilateral dos empregadores.

Estas normas lesivas dos direitos dos trabalhadores e do progresso nas condições de trabalho foram introduzidas pelo Governo PSD/CDS em 2003, pioradas pelo Governo PS de maioria absoluta em 2009, agravadas pelo Governo PSD/CDS em 2012, agravamento que foi mantido pelos Governos do PS até à presente data, sempre com o apoio dos partidos de direita.

Desde 2003 que o PCP tem vindo a suscitar na Assembleia da República a discussão dos direitos inscritos na contratação coletiva e o próprio direito de contratação coletiva, com o objetivo de acabar com a caducidade dos contratos coletivos.

É inaceitável que se tenha introduzido a norma da caducidade das convenções coletivas e se tenha permitido o estabelecimento por via da contratação coletiva de condições laborais mais desfavoráveis que as previstas na lei.

A caducidade dos instrumentos de regulação coletiva significa a possibilidade dada às associações patronais de, recusando-se a negociar, fazerem caducar os contratos coletivos de trabalho pondo em causa os direitos que estes consagram. Foi-lhes dada a possibilidade de fazer chantagem sobre os trabalhadores e os seus sindicatos, colocando-os perante a falsa alternativa entre a caducidade ou o acordo para a redução de direitos.

Foi afirmado que estas normas iriam dinamizar a contratação coletiva, mas a realidade é o contrário. Nunca mais a contratação coletiva atingiu os níveis existentes antes da entrada em vigor do Código do Trabalho.

Foi publicada a declaração de caducidade de dezenas de convenções coletivas e as consequências nefastas não ficaram por aí porque em contratos negociados e publicados foram condicionados e amputados direitos dos trabalhadores, e esse não é um problema do passado. É uma situação que perdura no presente.

Hoje persistem tentativas patronais para impor a eliminação de feriados municipais, o corte de pausas essenciais à saúde dos trabalhadores, a redução a um quarto do pagamento do trabalho extraordinário em dias feriados e de folga, o corte para metade do valor do pagamento do trabalho noturno, a fixação generalizada da desregulação dos horários, ou o corte no subsídio de apoio aos filhos que há muito existe no sector têxtil.

A atual redação do Código do Trabalho mantém como causa de caducidade a possibilidade da mesma se verificar aquando da extinção de uma associação sindical ou de uma associação patronal outorgante de uma convenção coletiva, excetuando-se os casos em que a extinção de associação patronal ou de associação sindical seja voluntária e com o intuito de fazer caducar a convenção coletiva. Consequentemente, sempre que se não prove que o intuito da dissolução da associação patronal foi a extinção da convenção coletiva, haverá caducidade desta.

Para além disto, o Código do Trabalho mantém o presente envenenado da arbitragem obrigatória, deixando os direitos dos trabalhadores sujeitos à discricionariedade da decisão de colégios arbitrais. A solução exige o fim da caducidade, a garantia de que um contrato só seja substituído por outro contrato livremente negociado. É isso que o PCP propõe com esta iniciativa legislativa.

Como forma de salvaguardar os direitos dos trabalhadores, o PCP defende que é dever do Estado promover e garantir o direito de contratação coletiva reconhecido às associações sindicais e às associações patronais sendo que a caducidade da contratação coletiva deve ocorrer unicamente por acordo das partes que a outorgaram.

A luta reivindicativa, organizada a partir dos locais de trabalho, está na origem da contratação coletiva. Sobretudo depois da Revolução de Abril, representou um sinal de progresso nas relações laborais, mas também de aprofundamento da democracia participativa. A contratação coletiva tem um papel estruturante na regulação do trabalho, é um instrumento de consagração de direitos conquistados com a luta e simultaneamente condição para o desenvolvimento e progresso do país.

Os direitos dos trabalhadores, a valorização do trabalho e dos trabalhadores, representam uma dimensão essencial para o desenvolvimento e o futuro do país. Se há lição que se tira dos últimos anos é a de que a defesa, reposição e conquista de direitos, indispensável para a melhoria das condições de vida dos trabalhadores e do povo constitui ao mesmo tempo um fator decisivo para o crescimento económico e a criação de emprego.

Se há lição que se pode retirar é que a política de agravamento da exploração e empobrecimento, de cortes de salários, de pensões e de outros direitos sociais foi, não só uma política de injustiça social, mas também de recessão, desemprego e afundamento do País. Urge por isso, a rejeição total desse caminho e a revogação dessas medidas.

Por isso mesmo, neste projeto de lei o PCP propõe a eliminação da caducidade dos contratos coletivos de trabalho.

Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

(Objeto)

A presente lei revoga o regime de caducidade dos instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, procedendo à 20ª alteração ao Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.

Artigo 2.º

Alterações ao Código do Trabalho

Os artigos 500.º, 502.º e 512.º do Código do Trabalho, aprovado em anexo à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, na redação atual, passam a ter a seguinte redação:

Artigo 500º

Denúncia de convenção coletiva

  1. Qualquer das partes pode denunciar a convenção coletiva com efeitos no termo de cada período de vigência, mediante comunicação dirigida à outra parte, acompanhada da respetiva proposta negocial.
  2. (…).
  3. A convenção coletiva mantém-se em vigor até ser substituída por outro instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
  4. (…).

Artigo 502.º

Cessação da vigência de convenção coletiva

  1. A convenção coletiva pode cessar, no todo ou em parte:
    1. (…);
    2. com a entrada em vigor de convenção coletiva que a substitua.
  2. A revogação não prejudica os direitos decorrentes da convenção, continuando o respetivo regime a aplicar-se aos contratos individuais de trabalho anteriormente celebrados e às respetivas renovações, salvo acordo das partes em sentido diverso.

Artigo 512.º

Competência do Conselho Económico e Social

  1. (…).
  2. Compete ao Conselho Económico e Social proceder, em caso de necessidade, ao sorteio de árbitros para efeito de arbitragem obrigatória.
  3. (…).”

Artigo 3.º

Norma revogatória

São revogados os artigos os artigos 497.º, 500.º-A, 501.º, 501.º-A, 510.º, 511.º e 513.º do Código do Trabalho, aprovado em anexo à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, na sua redação atual.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.