Projecto de Resolução N.º 30/XIII/1.ª

Resolução urgente dos problemas ambientais em São Pedro da Cova

Resolução urgente dos problemas ambientais em São Pedro da Cova

Desde 2002 que o PCP e os eleitos locais da CDU, em conjunto com as populações, denunciam e lutam pela remoção dos resíduos perigosos, provenientes da antiga fábrica da Siderurgia Nacional, na Maia, depositados em São Pedro da Cova, com gravíssimas consequências para o ambiente e saúde pública.

Entre 2001 e 2002, após deferimento concedido pela Direcção Regional do Ambiente e Ordenamento do Território (Julho 2001), foram depositadas várias toneladas de resíduos industriais provenientes da extinta fábrica da Maia da Siderurgia Nacional, no chamado Alto do Gódeo (Castanhal), em valas sem qualquer tratamento prévio do solo, designadamente quanto à sua hipermeabilização.

Segundo os responsáveis por esta operação, tais resíduos foram depositados com o objetivo de se proceder a uma “requalificação ambiental e paisagística da escombreira das antigas minas de S. Pedro da Cova”.

Contudo, apesar dos responsáveis argumentarem que estaríamos perante “resíduos inertes”, a verdade é que existiam outros documentos que atestavam exatamente o contrário. De acordo com uma Auditoria Ambiental realizada pela Tecninvest em 1996, e atualizada em 2001, aos pós de despoeiramento existentes nas instalações da Siderurgia Nacional, podemos encontrar a seguinte informação: “os resíduos devem ser considerados como perigosos para deposição em aterro (…) os pós terão de ser previamente inertizados antes de serem depositados num aterro, o qual terá de ser um aterro para resíduos perigosos, mesmo após a operação de inertização (…)”(Pág. 106 do Relatório da referida Auditoria Ambiental).

Entre Dezembro de 2002 e Maio de 2004, o Grupo Parlamentar do PCP dirigiu perguntas ao Governo sobre este problema, para as quais também nunca obteve resposta!

Apesar de à época, as autoridades competentes terem sido várias vezes chamadas à atenção para a perigosidade de tais resíduos, nomeadamente na Assembleia da República, a verdade é nunca se interessaram por este assunto, e apenas o Provedor de Justiça em Maio de 2004 deu “ordem de selagem do depósito e sua hipermeabilização”. Mas mais uma vez nada foi feito.

Foi necessário esperar pela reportagem da TVI, intitulada “O Estado do Crime”, em Junho de 2011, cerca de 10 anos depois do crime ambiental cometido em S. Pedro da Cova, para que as entidades responsáveis, designadamente a CCDR-N e o Ministério do Ambiente, decidissem pela análise aos resíduos depositados em S. Pedro da Cova, mas não deixando de levantar dúvidas sobre a sua perigosidade.

Ao dar parecer favorável à deposição de resíduos tóxicos no Alto do Gódeo – em terreno integrado em área florestal de produção não condicionada prevista na planta de ordenamento do PDM de Gondomar e em área classificada como reserva ecológica nacional na planta de condicionantes do PDM – sem exigir, no mínimo, um estudo de impacte ambiental, a Câmara Municipal de Gondomar agiu de forma leviana e pouco responsável. De resto, tendo anunciado em Julho de 2004 – em resposta a uma tomada de posição da CDU – que já estava “a averiguar junto da CCDRN este assunto” a fim de tomar “medidas adequadas”, é lamentável que, entretanto, a autarquia de Gondomar nada tenha feito, o que demonstra a sua conivência no crime ambiental cometido contra a população de S. Pedro da Cova.

Desde Dezembro de 2001 que a CCDR-N tem conhecimento de análises físico-químicas de uma amostra dos resíduos da Fábrica da Maia da antiga Siderurgia Nacional, elaboradas por um laboratório independente, cujo relatório refere: “os valores de Cádmio (Cd) e Chumbo (Pb) obtidos são muito superiores aos limites máximos” referidos na Portaria nº 176/96, de 3 de Outubro.

Tem na sua posse um ofício da Provedoria da Justiça (entidade credível e acima de qualquer suspeita), datado de Maio de 2004, que refere: “Interveio o Provedor de Justiça no sentido de conhecer a fiscalização exercida sobre a atividade reclamada, por parte da ex-Direcção Regional do Ambiente e Ordenamento do Território do Norte (hoje integrada na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte – CCDR-Norte). E fê-lo até obter dados minimamente satisfatórios”. Refere mais adiante: “Assim, observaram-se valores significativos de crómio e de chumbo nas águas subterrâneas o que justificou ordem de selagem do depósito e sua impermeabilização, em operação que será acompanhada pelos serviços próprios da CCDR-Norte”. O ofício em questão, em jeito de conclusão, refere: “Em face do exposto, entendo cumprida a intervenção do Provedor de Justiça, considerando que as autoridades administrativas vieram a atender – embora tardiamente – as razões apontadas por V. Ex.ª”.

Em Julho de 2004, foram tornadas públicas afirmações da Eng.ª Isabel Vasconcelos, técnica da CCDR-N, que afirma: “Nas últimas análises apresentadas, em Junho, surgiu uma evolução nos parâmetros com alguns metais, o que nos levou a chamar os promotores no sentido de selarem o depósito”. E continua, referindo: “queremos que sejam feitos mais furos para monitorização das águas subterrâneas, processo que iremos acompanhar de perto, além de proceder a análises em todas as casas”. (vide JN de 2004-07-14).

Na nota 48.10 do anexo ao Balanço e Demonstração de Resultados do exercício de 2009 da Baía do Tejo, SA, sociedade integrada no Grupo Parpública, pode ler-se, a propósito das “Instalações siderúrgicas da Maia”: “Em 1998 deu-se início ao processo de descontaminação ambiental dos resíduos da fábrica da Maia, pertencente à SN Longos. Entretanto, na sequência de uma determinação da Direcção Regional do Ambiente e Ordenamento do Território – Norte, foram suspensos os trabalhos de remoção de resíduos, para clarificação de dúvidas relacionadas com as quantidades e classificação dos resíduos removidos e a remover”.

Os responsáveis da CCDR-N não podem ignorar estes factos, pelo que das duas uma: ou trataram o pretenso “esclarecimento” com a ligeireza com que tem sido tratado este grave problema, ao longo dos últimos nove anos, ou querem continuar a enganar a população de S. Pedro da Cova.

Cerca de 8 meses depois dos compromissos assumidos pela Ministra do Ambiente na Assembleia da República, no dia 17 de Março de 2011, ainda sem se conhecerem as conclusões globais deste estudo, a CCDR-N informou o país que os resíduos industriais existentes em S. Pedro da Cova são altamente perigosos.

No dia 15 de Abril de 2011, a CCDR-N publicou no seu sítio oficial o relatório do estudo “Avaliação das Quantificações e Características Físico-Químicas dos Resíduos Depositados nas Antigas Minas de São Pedro da Cova, Gondomar”, elaborado pelo LNEC. Este relatório é claro quanto à caracterização dos resíduos existentes nas escombreiras das minas de carvão de S. Pedro da Cova, considerando a perigosidade ambiental destes resíduos como “muito elevada e, como tal, também os riscos para a saúde pública são muito elevados”. Também nas recomendações o relatório apresentado pelo LNEC define objetivamente as medidas a tomar, designadamente quanto à remoção desses mesmos resíduos, como relativamente às necessárias e urgentes medidas de carácter ambiental que devem ser tomadas.

No dia 6 de Maio de 2011 foi publicado em Diário da República, 2ª série, nº 88, um Despacho (nº 7007/2011), pela então Ministra do Ambiente, datado de 18 de Abril de 2011, que, tendo em conta as conclusões do relatório produzido pelo LNEC “Avaliação das quantidades e das características físico-químicas dos resíduos depositados nas escombreiras das antigas minas de São Pedro da Cova (Gondomar)”, determinava à CCDR-N, enquanto autoridade regional dos resíduos, a responsabilidade de “assegurar o acompanhamento e a fiscalização das intervenções a realizar”, com vista à remoção dos resíduos perigosos existentes em S. Pedro da Cova – intenção apresentada pela própria CCDR-N na apresentação pública das conclusões preliminares do estudo do LNEC, no passado dia 17 de Março de 2011.

O Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território mais determina no referido Despacho a responsabilidade da CCDR-N, “no prazo máximo de 30 dias, proceder à apresentação de uma proposta de calendarização das ações a desenvolver”, bem como “manter este Gabinete informado, com uma periodicidade trimestral, de todas as intervenções e ações desenvolvidas no âmbito deste processo”.

No dia 9 de Dezembro de 2011, na Assembleia da República, todas as bancadas parlamentares votaram favoravelmente um projeto de resolução (PCP, PS,PSD,CDS) que recomenda ao Governo o seguinte:
• “Que, tendo em conta as dotações orçamentais nacionais já oficialmente anunciadas para o efeito, seja lançado um concurso público internacional para a remoção dos resíduos perigosos depositados em 2001 e 2002 nas escombreiras das antigas minas de S. Pedro da Cova, incluindo o seu encaminhamento para destino final adequado às características dos resíduos, e apresentada uma candidatura ao QREN (2007-2013) que permita a participação alargada de fundos comunitários no seu financiamento.”“A urgente monitorização ambiental e piezométrica das águas subterrâneas na zona envolvente ao aterro dos resíduos perigosos e das escombreiras, com vista ao conhecimento e controlo dos impactes associados àquela deposição, bem como à proteção da saúde pública.”“A adoção de medidas para dar continuidade ao esforço de superação do passivo ambiental das escombreiras das antigas minas de S. Pedro da Cova que permitam, em articulação com os órgãos do poder local, a requalificação ambiental e paisagística do local.”

Após um longo processo concursal, com múltiplos episódios públicos, decisões e recursos, em Setembro de 2014 começaram, efetivamente, no terreno, os trabalhos preparatórios de remoção dos resíduos perigosos de São Pedro da Cova.

Este foi o resultado de um demorado processo. Mesmo quando tentaram desacreditar a justa luta travada pela remoção dos resíduos, mesmo quando apelidaram o PCP e a CDU de alarmistas, mesmo quando o PCP e a CDU estiveram sozinhos na apresentação de propostas (na Assembleia de Freguesia, Assembleia Municipal, Assembleia da República, Parlamento Europeu-) que visavam alertar para o crime ambiental em curso e para a necessidade de remoção dos resíduos perigoso, bem como a implementação de outras medidas complementares, o PCP e a CDU nunca desistiram desta luta.

No decorrer do ano de 2015, o Grupo Parlamentar do PCP tomou conhecimento da existência de graves problemas no processo de remoção dos resíduos.

Na verdade, de acordo com documentação que chegou ao Grupo Parlamentar do PCP, há a intenção de se proceder ao reaterro de resíduos e à compactação com os solos de cobertura limpos depositados em contacto com os taludes contaminados. Esta decisão parece merecer contestação de técnicos envolvidos no processo, por parte da empresa responsável pela remoção que, reiteradamente, afirmam que este procedimento é considerado “fortemente desaconselhável”, é “claramente contrário as melhores práticas de gestão de resíduos” e “claramente prejudicial para todos os relevantes interesses em causa”. A empresa responsável pela remoção terá, inclusive, manifestado profundas reservas e ter-se-á recusado a assumir qualquer responsabilidade pelas consequências que possam advir da solução que lhe foi imposta.

Por outro lado, e também tendo em conta documentação recebida, o Grupo Parlamentar do PCP tomou conhecimento da identificação de depósitos de resíduos perigosos fora da área de intervenção e da existência, também, de um deferencial quantitativo dentro dos limites de intervenção. Isto é, foram encontrados resíduos perigosos fora da área de intervenção e, dentro desta, em maior quantidade do que inicialmente previsto.

Ora, com a remoção dos resíduos, iniciada em Setembro de 2014, rapidamente se constatou que os resíduos perigos existentes ultrapassavam as estimativas inicias de 88 mil toneladas, bem como a margem de 20% de erro prevista, tendo sido também detetados resíduos perigosos fora da área de intervenção (em quantidades significativas, mas ainda não totalmente apuradas), que não tinham sido inicialmente detetados.

Mais resulta dos documentos que as soluções encontradas, a prospeção e investigação da totalidade de resíduos, bem como a sua localização estão condicionadas por questões financeiras.

Ora, o PCP entende que estes resíduos e o impacto ambiental daí decorrente, resultam em elevados prejuízos para as populações que urge resolver, pelo que se exige a identificação e remoção da totalidade dos resíduos e a requalificação do espaço afetado.

Por outro lado, o crime ambiental em causa, mais do que justifica uma compensação às populações de São Pedro da Cova, pelos prejuízos ambientais e de saúde pública provocados e pela tardia intervenção para a resolução do problema ambiental.

Por fim, o PCP insiste na necessidade de apuramento de todas as responsabilidades políticas e criminais neste que é, seguramente, um dos piores atentados ambientais do distrito do Porto e do país.

Desde o início deste processo que o PCP e a CDU vêm exigindo o apuramento cabal das responsabilidades políticas e criminais por este atentado ambiental, com consequências também para a saúde pública e graves prejuízos para a população da região.

Já anteriormente, o PCP apresentou uma iniciativa legislativa que traduzia as reivindicações da população e respondia aos problemas identificados, mas que foi reprovada pelo Governo PSD/CDS-PP.

A importância desta problemática e a justeza das reivindicações, que hoje se mantêm, levam-nos a apresentar novamente uma iniciativa parlamentar.

Considerando a confirmação pública de um crime ambiental cometido entre 2001 e 2002, crime este que foi denunciado, mas sobre o qual as entidades competentes nunca nada fizeram no sentido do seu esclarecimento.

Considerando que estamos perante uma situação de características extraordinariamente gravosas e assustadoras para a população local, situação esta que pode assumir efeitos nefastos no presente e no futuro para saúde pública das populações.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Resolução:

Resolução

A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República, considerar como prioritárias no âmbito da resolução dos problemas ambientais em São Pedro da Cova, as seguintes medidas:

1. A remoção integral dos resíduos, bem como a adoção de medidas urgentes no sentido de minimizar a contaminação dos solos e águas subterrâneas, através da monitorização ambiental de toda a área envolvente;

2. A calendarização urgente das medidas necessárias para o apuramento exato da quantidade de resíduos existentes e para a sua integral remoção;

3. O apuramento das responsabilidades por este crime ambiental, bem como das responsabilidades pelos erros na quantificação dos resíduos, para garantir que tal situação não se repita;
4. Um estudo que permita avaliar corretamente o impacto dos resíduos na saúde pública;

5. A urgente recuperação ambiental e cultural de todo o espaço envolvente ao local onde foram depositados os resíduos perigosos, designadamente as antigas instalações do complexo industrial mineiro de São Pedro da Cova, como forma de compensar a população por tão grave situação.

Assembleia da República, em 3 de dezembro de 2015

  • Ambiente
  • Projectos de Resolução
  • ambiente
  • São Pedro da Cova