Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República, Reunião Plenária

Nas contas certas do governo PS, não cabem os problemas dos trabalhadores

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Senhor Presidente, Senhores Deputados, Senhores membros do Governo,

Realizamos esta Interpelação ao Governo, para debater o agravamento das condições de vida, o combate às desigualdades e injustiças sociais, e a degradação do acesso a serviços públicos que asseguram o cumprimento de direitos fundamentais. Porque é preciso confrontar o Governo com as suas opções políticas, desde logo com a falta de resposta aos problemas que se agravam todos os dias no País. 

Enquanto salários e pensões perdem valor real e ficam cada vez mais longe do fim do mês, vemos o contraste com a acumulação de lucros obscenos pelos grupos económicos e em tantas multinacionais instaladas no nosso País. É ver a ostentação na banca e nos seguros, na energia, nas telecomunicações.

Nos bancos, aí estão 2,6 mil milhões de euros de lucros em 2022, 71 por cento de aumento face a 2021. Um crescimento brutal da margem financeira, nove vezes e meia superior à média europeia. Na Galp, o lucro alcança uns extraordinários 1,1 mil milhões de euros, um aumento de 84 por cento face ao ano anterior. E, enquanto isso, a Galp é descapitalizada, com dividendos aos acionistas mais uma vez acima dos lucros!

O Governo faz a festa com o crescimento da economia, sabendo que a riqueza criada está a ser concentrada a um nível sem paralelo. Pretendem fazer crer que os lucros nada têm que ver com salários, nem com os preços das mercadorias e serviços que a força de trabalho produz.

Pois bem, foi o próprio FMI que esta semana afirmou que os crescentes lucros das grandes empresas foram o principal fator para a inflação na Europa nos últimos dois anos, com as companhias a aumentar os preços acima da alta de preços da energia. Foi precisamente o que sucedeu em Portugal! 

E o que diz o Governo PS? “Devemos remover” imposto aos lucros excessivos para “não penalizar” as empresas! Penalize-se o Povo, pois claro, penalize-se os trabalhadores, que isto do crescimento da economia não é para todos – e alguém tem de o pagar!

Não, senhores ministros, o que é urgente é assegurar a justiça fiscal e cumprir a Constituição, em que os impostos devem servir “uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza”. 

É urgente o aumento geral dos salários e das pensões, pôr fim à especulação que beneficia os grandes grupos económicos, controlar e reduzir os preços de bens e serviços essenciais, taxar os lucros das grandes empresas e alterar o rumo da política que tem vindo a ser seguida e que empurra um número crescente de trabalhadores para a pobreza.

É preciso uma política alternativa, que distribua a riqueza de forma justa, que respeite e valorize o trabalho e os trabalhadores, que defenda e invista nos serviços públicos e nas funções sociais do Estado.

Agendámos para hoje este debate porque é preciso confrontar o Governo com as crescentes dificuldades das populações no acesso a serviços públicos que garantam, com qualidade e em condições de igualdade, a efetivação de direitos sociais fundamentais constitucionalmente consagrados. Dificuldades no acesso à saúde por falta de investimento no SNS e no acesso à habitação por falta de políticas que verdadeiramente o promovam – responsabilidade do Governo, que não pode deixar de as assumir!

A situação na Habitação é de verdadeira emergência social! É real o receio de muitas famílias, face ao aumento dos custos com a habitação, de não conseguir suportar esses encargos, correndo o risco de ficar sem casa. Mas, nas "contas certas" do Governo PS, não há solução para estas pessoas.

Os preços das casas não param de aumentar, os valores das rendas não param de aumentar, as taxas de juro não param de aumentar. E mesmo a propaganda sobre a “redução em cadeia de 2,5 por cento da mediana das rendas” (!) não apaga o aumento de quase dez por cento face ao ano anterior!

As medidas apontadas pelo Governo, não só não dão uma resposta cabal para resolver os problemas existentes, como podem até criar novos e mais graves problemas. A opção do Governo foi favorecer aqueles que têm ganho e muito com a especulação da habitação: a banca, os fundos imobiliários e os grandes proprietários, atribuindo-lhes novos benefícios e borlas fiscais.
 
Perante o gravíssimo problema na Habitação que o País enfrenta, o Governo, para não afrontar a especulação imobiliária, anunciou apoios extraordinários para pagamento da renda e da prestação de contratos de crédito. Quando fez as contas e viu que iria custar muito mais do que o previsto, decidiu mudar as regras, incumprir a legislação que ele próprio aprovou – e cortar nesta medida de apoio que já era insuficiente! Entretanto, apresentou já uma proposta na especialidade para alterar o diploma… e introduzir na lei o corte que impôs por despacho!

É preciso que a Habitação seja assumida como um direito e não uma mercadoria! A habitação cumpre uma função social e é um bem essencial. É a base para a organização da vida pessoal e familiar.

Há dias, fomos confrontados com um novo aumento (o oitavo!) das taxas de juro decididas pelo BCE e a União Europeia. Indiferentes ao drama do que isto representa para mais de um milhão de famílias, já se anunciam novos aumentos. As dificuldades de muitos são os lucros de uns poucos. Enquanto milhares correm o risco de perder as suas casas, o Governo vai fazer o quê, afinal?!

Vai o Governo assistir calado e de braços caídos ao drama que está a ser imposto a milhões de pessoas? E não digam que nada podem fazer, porque isso é a confissão de que o Banco de Portugal é uma mera sucursal do BCE; a confissão de quem manda em Portugal e nos portugueses é a UE!

O Governo vai continuar a recusar enfrentar os interesses da banca e os seus lucros? Vai continuar a esconder-se atrás da Sra. Lagarde para não fazer ouvir a voz e os interesses do país? Nós não precisamos que o BCE venha explicar-nos essa política monetária: precisamos é de nos ver livres dela!

É preciso intervir no sector financeiro – desde logo através da Caixa! É preciso chamar os bancos a contribuir, e pô-los a pagar estes aumentos nos juros que tanto dinheiro lhes dão a ganhar! É preciso ter coragem política e escolher as pessoas e as suas vidas, e não os bancos e os seus lucros!

No Serviço Nacional de Saúde, em cima dos inúmeros e gravíssimos problemas que utentes e profissionais enfrentam todos os dias, avança, pela mão do Governo, o processo de amputação da capacidade de resposta dos hospitais públicos. 

A coberto da decisão supostamente técnica e com o pretexto da realização de obras, prepara-se o encerramento da urgência de obstetrícia e o bloco de partos do Hospital de Santa Maria (um dos maiores serviços desta especialidade), na melhor das hipóteses até ao início de 2025.

O encerramento de blocos de partos nada tem a ver com a realização de obras, que só se iniciarão daqui a muitos meses. O Governo continua a não tomar medidas para trazer e manter no SNS os profissionais de saúde, e aponta afinal para mais uma restrição da resposta pública, abrindo ainda mais o caminho aos interesses privados nesta área. 

Sabe muito bem do que fala o presidente da Associação da Hospitalização Privada, quando afirma que “é uma nova luz que se abre na relação público privado”. Podem-nos dizer que é a privatização da saúde mais à esquerda de sempre – mas não é assim que se defende a saúde nem o SNS!

Senhor Presidente, Senhores Deputados, Senhores membros do Governo,

O dia de hoje é um dia de luta pelo aumento dos salários e das pensões, contra o aumento do custo de vida, pelos direitos, pela defesa dos serviços públicos. 

De norte a sul do País, nas empresas e locais de trabalho, em múltiplos pontos de encontro ao longo do dia, e desde logo esta tarde, aqui em Lisboa, os trabalhadores fazem ouvir a sua voz para dizer basta, contra as desigualdades e as injustiças, na exigência de mudança de rumo. 

Saudamos os trabalhadores que se mobilizam nesta jornada de luta, e daqui reafirmamos a solidariedade de classe do Partido Comunista Português, dando voz a essa luta na exigência de uma mudança de políticas e na apresentação de propostas para a concretizar.

Continuaremos a avançar na luta na proposta pelo aumento dos salários e das pensões, repondo o poder de compra perdido; pela regulação dos preços dos bens e serviços essenciais; pelo combate à especulação; pela tributação dos lucros dos grandes grupos económicos em prol da promoção do desenvolvimento e do progresso social; pela dinamização da produção nacional; pelo reforço dos serviços públicos e pela garantia de direitos constitucionais.
Para esse caminho, podem continuar a contar com o PCP.

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