Intervenção de

Incêndios Florestais<br />Intervenção de Agostinho Lopes

Senhor Presidente, Senhores Deputados, A 11 de Agosto quando era já uma constatação evidente a brutal dimensão dos incêndios florestais, quando o Governo ainda falava do seu sucesso no combate ao flagelo e permanecia amarrado à subestimação do problema, o PCP propôs uma Comissão Parlamentar Eventual de Avaliação, Monitorização e Acompanhamento da Concretização das Medidas para a Prevenção, Vigilância, Detecção e Combate aos Incêndios Florestais. As razões de tal projecto são evidentes. As medidas necessárias para fazer frente à tragédia dos incêndios florestais são conhecidas, merecem em geral um grande consenso nacional e sem embargo do seu possível e inevitável aperfeiçoamento, resultaram de análises, debates e propostas feitas na base das dramáticas experiências ocorridas nos últimos 20 anos, e estão vertidas em inúmeras resoluções e normativos legislativos e regulamentares. Hoje, o problema principal e central que se coloca à sociedade portuguesa, em primeiro lugar aos poderes políticos é, a par de uma profunda alteração das políticas agro-florestais, a concretização daquelas medidas. A não concretização dessas medidas ao longo dos últimos anos é da inteira responsabilidade de sucessivos executivos governamentais. E a incapacidade e impotência dos poderes políticos em os debelar, corrói e desacredita o regime democrático. O que aconteceu neste ano de 2005, apesar de todas as justificações que decorrem naturalmente das difíceis condições meteorológicas, é completamente inaceitável, após a dolorosa e enorme tragédia dos 420 mil hectares ardidos no Verão de 2003, e só acontece porque durante dois anos não foram concretizadas com a urgência devida e os recursos financeiros adequados, as necessárias e suficientes medidas. A proposta do PCP é, assim de uma lógica irrefutável. Procurar que, sem prejuízo de outras iniciativas julgadas necessárias, e da necessária intervenção do Governo, a Assembleia da República, através de uma Comissão Parlamentar Eventual, avalie, monitorize e acompanhe com regularidade a concretização das medidas decididas aos diversos níveis e órgãos do Estado. Verificamos com agrado que o Governo na passada 3ª feira, 6 de Setembro através do Sr. Ministro da Administração Interna avalia positivamente a criação dessa Comissão e que o Grupo Parlamentar do PS apresentou na passada 4ª feira, 8 de Setembro um Projecto de Resolução no mesmo sentido. Apresentamos ontem um novo Projecto de Resolução – Medidas imediatas de reparação de prejuízos e avaliação dos incêndios de 2005 - propondo um conjunto de recomendações ao Governo visando 3 objectivos:

1) meios financeiros e condições para uma reparação suficiente dos danos; 2) retirar todas as ilações dos acontecimentos do presente ano; 3) acautelar possíveis problemas com chuvas intensas nos próximos meses. De facto, são exíguas e desgarradas as medidas conhecidas, decididas pelo Governo, bem longe das reclamadas pelo PS após o Verão de 2003, quando era oposição, e das estabelecidas então, mesmo se insuficientes e de tardia concretização. Por outro lado, é necessário evitar respostas precipitadas e pouco reflectidas. É ainda necessário ter desde já em conta os impactos das madeiras ardidas ou cortadas nas linhas de água e do desnudamento de extensas áreas de coberto vegetal.

Tendo muitos pontos semelhantes, os outros projectos de resolução, e mesmo considerando que reproduzem propostas de medidas já constantes de resoluções desta Assembleia da República e de legislação diversa, ou que há questões pontuais de que discordamos, têm na generalidade a nossa aprovação. Uma nota final. O desejo que os projectos de resolução apresentados e qualquer que seja o seu destino, não obscureçam a questão central e decisiva: a responsabilidade das políticas prosseguidas nos últimos anos (e dos partidos que as assumiram PS, PSD e CDS/PP) no complexo de causas que permitiram que os incêndios florestais, tivessem, mais uma vez, as consequências trágicas conhecidas. Não poderemos certamente eliminá-los, mas poderemos reduzir significativamente, como fizeram outros países, a dimensão dos seus impactos. Mas sem aquela clarificação de responsabilidades não teremos respostas. Ou teremos más respostas, como as que o Governo apressadamente e de forma pouco reflectida, no seu afã de branquear uma imagem bastante chamuscada, apresentou na semana passada. Ou, como as que levou um governo passado, a dar o problema por resolvido! É necessário que o poder político não continue a atirar para cima de terceiros, bodes expiatórios de políticas e governações, a pequena propriedade florestal, as autarquias, e mesmo o clima e os pirómanos, as suas culpas e responsabilidades. Permitam-me que ilustre estas afirmações, com o exemplo concreto do que aconteceu no Baldio de S. Vicente da Raia, freguesia do concelho de Chaves, lá bem no extremo norte do País. Em 2002 um incêndio chegou às portas da freguesia. A Junta de Freguesia preocupada resolveu agir e, a 6 de Maio desse ano, escreveu uma carta: “Exmo. Senhor Director de Serviços das Florestas, Vila Real Esta Junta de Freguesia de S. Vicente de Raia, na qualidade de co-gestora do baldio de S. Vicente, vem desta forma solicitar a atenção de V. Exa. para algumas preocupações que temos:

  • Os caminhos florestais estão muito sujos de mato e quase intransitáveis. Estamos a aguardar que a máquina estacionada na aldeia vizinha (há cerca de meio ano) nos venha fazer este trabalho, conforme nos foi prometido pelo técnico local;
  • Temos uma área com pinhal adulto bastante grande e no qual há muito tempo se não faz qualquer corte. Por um lado a aldeia é pobre e necessita de meios para fazer obras, por outro os pinheiros não crescem como deviam por não se cortar os que estão a mais e o mais grave é que é vulgar ouvir o povo dizer que os serviços só cortam quando ardem.

Esta Junta tem sérios receios do que se possa vir a passar e alertamos V. Ex.a para isso. Pedimos pois a V. Exa. que da forma mais urgente possível mande satisfazer estes nossos pedidos da maneira que, estamos certos, os vossos técnicos saberão fazer capazmente.» Passou um ano sem qualquer resposta. Em 18 de Junho de 2003, vendo o que se ia passando no País, insistiu.

“Não tendo recebido qualquer resposta à nossa carta de 6 de Maio do ano passado, vimos novamente lembrar a V. Exa. a urgência que há em satisfazer o nosso pedido no que respeita ao corte do pinhal adulto existente na área de S. Vicente. Não assumimos qualquer responsabilidade pelo que de mal venha a acontecer ao referido pinhal, visto termos diligenciado no sentido de evitar a perda total dum bem que a Natureza criou e os homens tentam destruir.»

Em 7 de Agosto desse ano, receberam uma resposta da DRATM:

«Sobre o assunto, somos a informar V. Exa. que o mesmo está em fase de análise pelo que, oportunamente, será dado a conhecer a V. Exa. o enquadramento que o mesmo mereceu por parte destes Serviços.»

Verificando que nada se resolvia, o Presidente da Junta, resolveu em Setembro/Outubro desse ano, insistir com a Técnica dos Serviços Florestais, em Chaves. Que respondeu com evasivas: estavam a tratar das madeiras ardidas, falta de gente dos Serviços que fosse marcar os pinheiros, etc.. E assim, tudo permaneceu, até ao dia 18 de Agosto de 2005. Nesse dia ardeu o Baldio de S. Vicente da Raia. Não é certamente necessário tirar a moral da estória! Disse.

  • Segurança das Populações
  • Assembleia da República
  • Intervenções