Intervenção de Paulo Loya, Membro da DORL e do Comité Central do PCP

Abertura do Seminário «Combate à Pobreza e Justiça Social»

Camaradas e Amigos
Estamos no final da primeira década do Século XXI, e a pobreza e exclusão social - longe de terem sido erradicadas - aumentam diariamente, não obstante as muitas e variadas promessas feitas.
São disso exemplo, a decisão tomada na Cimeira de Lisboa, realizada em 2000, em tornar a União Europeia, um espaço de mais e melhores empregos, com mais coesão social, e onde foi assumido «(….) O compromisso de produzir um impacto decisivo na erradicação da pobreza e da exclusão». Belas palavras, mas muito longe da realidade.
Todos os indicadores mostram um brutal agravamento das desigualdades sociais com a persistência das situações de pobreza em importantes segmentos da população e o seu alastramento a novas camadas.
Diariamente somos confrontados, com a natureza multidimensional que a pobreza assume, com inúmeras expressões concretas:

  • Encerramento de empresas, um pouco por todo o País e o consequente aumento do desemprego;
  • As muitas situações de precariedade - com particular incidência entre os mais jovens - muitas vezes, ocultada como estágios profissionais. Uma realidade presente, tanto no sector privado, como no sector público ou na área da Acção Social;
  • Os inúmeros casos de Famílias, com destaque para os jovens casais, que ficam com o rendimento auferido com o seu trabalho, esgotado após pagarem a prestação da casa e infantário do filho;
  • O aumento dos casos de endividamento à banca, por não pagamento da prestação da casa ou do carro,
  • Os muitos relatos de crescentes pedidos de redução de mensalidades nas Instituições Sociais. Ou de crianças com fome, e que tomam nas Escolas ou nas Instituições Sociais, a sua única refeição quente do dia, quando não mesmo, a única refeição.

Tudo isto transmitindo, e de forma preocupante, a forte dinâmica do continuado agravamento das condições sociais, verificada no nosso País.
E que está suscitar uma crescente apreensão na sociedade portuguesa, perante esta espiral de insegurança e de instabilidade na vida presente e também face ao futuro.

  • Para onde nos estão a empurrar? O que vai ser da nossa vida? Qual vai ser o futuro dos nossos filhos e netos? Será que terei reforma?

São questões muito frequentes, perante o crescente empobrecimento dos que vivem do seu trabalho ou das suas reformas, e que está a atingir duramente aqueles que estão no desemprego ou em situação de trabalho precário.
E agudiza ainda mais, a já difícil situação, dos principais grupos de risco de pobreza: como as mulheres, onde há uma maior incidência de desemprego, trabalho precário, baixos salários e pensões. Os reformados e pensionistas, que auferem baixas pensões, autenticas pensões de miséria, mas também devido a uma inaceitável quebra do seu rendimento após uma vida de trabalho e de descontos para segurança social. Os imigrantes, as crianças e as famílias monoparentais com filhos a cargo.
Uma realidade que vai produzindo um sentimento de grande injustiça, perante uma profunda desigualdade na distribuição dos rendimentos, e que surge associada a um misto de indignação e mesmo de protesto, perante uma clara política de dois pesos e duas medidas:

  • Grandes apoios e benefícios à banca e aos grandes grupos económicos, que lhes permitem obter chorudos e cada vez maiores lucros. Só em 2009, os 5 maiores bancos obtiveram cerca de 1 milhão de contos/dia em moeda antiga;
  • Enquanto a larga maioria da população portuguesa, é obrigada a gastar cada vez mais. Razão mais do que suficiente, para ouvirmos dizer que os meses tem cada vez mais dias.

Gerando sempre e cada vez mais profundas desigualdades sociais. Basta ver o aumento da Taxa de Pobreza das Famílias com filhos, que passou de 18% em 2007 para 20% em 2008.
A realização deste Seminário subordinado ao tema “Combate à Pobreza e Justiça Social”, pretende prosseguir o aprofundamento permanente da realidade social nas suas diversas expressões, e em simultâneo, alargar a construção dos caminhos para o combate e a luta com eficácia, à pobreza e em defesa da justiça social.
O nosso País, não está condenado à estagnação económica e ao definhamento social, o empobrecimento dos trabalhadores e das camadas populares não são uma fatalidade histórica, e muito menos, os atingidos, tem de se resignar às actuais políticas.
É possível e urgente intervir contra as injustiças sociais e dar, com êxito, combate à pobreza e à exclusão social. «Sim, É possível, Uma Vida Melhor e uma Sociedade mais Justa», é o que afirmamos com convicção.
E isso implica o alicerçar de novos caminhos de combate à pobreza e às desigualdades sociais. Novos caminhos implicam uma necessária ruptura, com as políticas de direita que têm sido desenvolvidas.
Não é possível escamotear que o “carácter persistente da situação de pobreza que o País apresenta, parece não resultar de condicionalismos conjunturais, mas sim da existência de uma correlação significativa entre o processo de desenvolvimento e a desigualdade”, como está inscrito no articulado do próprio Plano Nacional para a Inclusão/PNAI.
E por isso a questão central que se coloca é:
Atenuar as situações extremas de pobreza – todos os dias mais amplas – ou encetar um novo caminho para lhe dar um efectivo combate?
Um efectivo combate, em nossa opinião, implica - A luta pelo Direito a ter Direitos. A melhoria das condições de vida e de trabalho com direitos.
Uma concepção de intervenção junto dos principais grupos de risco de pobreza; que não assente apenas em respostas imediatas e pontuais, baseadas no assistencialismo.
Mas sim, na sua mobilização e consciência de que têm Direitos, os quais devem e têm de ser usados, de modo a garantir a sua autonomia económica e social e para que, sejam criadas as condições para uma vida em igualdade na sociedade e assente na garantia de direitos.
Um efectivo combate que implica uma enorme atenção às reiteradas promessas, que no essencial, visam criar falsas expectativas naqueles que se encontram em situação de pobreza ou junto dos que intervêm no terreno social no sentido de a minorar.
Quando se assinala o Ano Europeu de Combate à Pobreza e Exclusão Social, é importante relembrar o claro insucesso de todas as promessas de combate e de erradicação deste flagelo social até ao final da primeira década deste século.
A realidade actual na União Europeia é bem ilustrativa disso, com mais de 85 milhões de pessoas em situação de pobreza. Significando isto que, mais de 17% da população possui rendimentos inferiores a 60% do rendimento mediano dos respectivos países. Uma realidade que tende a alastrar. Em 2009 mais de 5 milhões de pessoas ficaram desempregadas no espaço da União Europeia.
Estas são consequências concretas das orientações políticas desenvolvidas na União Europeia, mas são também um libelo acusatório, extensivo aos sucessivos Governos que, em Portugal, de um modo seguidista, têm aplicado semelhantes orientações, acentuando as políticas de direita, com destaque para o actual Governo do PS.
O Orçamento de Estado para 2010, o Plano de Estabilidade e Crescimento e as propostas e medidas neles contidas, traduzem bem a matriz essencial do modelo de desenvolvimento económico e social e das políticas de direita, que lhe estão subjacentes:

  • Concentração da riqueza, baixos salários e reformas, subordinação do poder político ao poder económico, ou a redução das funções sociais do Estado, são elementos centrais para a sua concretização.

Um modelo de desenvolvimento económico e social, com graves e bem visíveis resultados:

  • Mais de 2 milhões de portugueses em situação de pobreza;
  • 700 mil desempregados gerando um autentico desastre social e político, com repercussões gravíssimas, para os próprios e para as diversas regiões e para o País;
  • Mais de 1 milhão e 400 mil trabalhadores vivem com a instabilidade e insegurança no trabalho, devido à sua situação de precariedade laboral;
  • Mais de 350 mil pessoas recorrem ao Rendimento Social de Inserção;
  • Uma das Taxas de Pobreza Infantil mais elevada da EU – situada em 23%
  • Milhares de pessoas estão em lista de espera, para equipamentos sociais;
  • Mais de 700 mil pessoas sem médico de família;

Um modelo de desenvolvimento económico e social, que considera a desresponsabilização do Estado, das suas funções sociais, na Saúde, no Ensino, na Segurança Social ou na Justiça, como um dos seus principais pilares.
E assume expressões muito diversificadas: parcerias “Publico – Privado”, brutal ataque ao carácter público da Segurança Social, a intenção de reduzir, ainda mais, o número de trabalhadores da Administração Pública ou a cada vez maior transferência de responsabilidades para o sector privado, para as Autarquias Locais ou para as Instituições Sociais.
São já hoje muitas as consequências destas opções políticas, mas destacava aqui, a imensa falta de técnicos com intervenção na área social, que impede a realização do muito necessário trabalho multidisciplinar, como o acompanhamento das famílias em situação de risco de pobreza.
Ainda com a particularidade de muitos destes técnicos, possuírem um vínculo precário ao Estado.
Em cada vez mais situações as Instituições Sociais são mesmo a única resposta presente no terreno, sendo confrontadas com o aumento acentuado dos problemas, e com a sua própria incapacidade de encontrar respostas para questões que são estruturais. Não sendo certo, que também, elas próprias, não venham também a ser profundamente afectadas pelas consequências do acentuar das desigualdades sociais.
O modelo das “Parcerias” é uma das formas adoptadas para a desresponsabilização do Estado das suas funções sociais. A questão não está no termo ou nas sinergias que podem ser criadas. Mas antes, nos meios que possuem e na concepção de base, que mais não visa do que empurrar para outros, aquilo que incumbe ao Estado tratar e são suas responsabilidades e deveres constitucionais.
A Constituição da Republica consagra importantes direitos e deveres como o direito ao Trabalho e ao Trabalho com direitos, à Segurança Social, à Saúde, à Habitação, à Educação ou à Justiça; que não só se devem manter, como serem utilizados em beneficio do desenvolvimento nacional.
Mas a luta contra a Pobreza e a Exclusão, não pode, nem deve ignorar, a componente ideológica, na medida e que esta é parte estruturante desse novo caminho para lhe dar combate.
Desde logo denunciando e responsabilizando, o sistema capitalista, como a origem das causas que lhe estão na base e que tem no lucro e na subjugação daqueles que trabalham e vivem das suas reformas, um elemento central.
Mas igualmente, rejeitando com firmeza toda e qualquer tentativa de estigmatização, de todos aqueles que se encontram em situação de pobreza.
Ou o desenvolvimento e implementação de diversos conceitos como a “Modernidade”, o “Custo – Beneficio” ou da substituição crescente do termo “Utente” pelo mais empresarial termo de “Cliente”, sempre com o objectivo do “Menos Estado – Melhor Estado”.
O que significará mais aumento das desigualdades sociais e a transformação de Direitos em assistencialismo como politica oficial de Estado. E isso é o que pretende o CDS -PP com o brutal ataque que está em curso contra o Rendimento Social de Inserção.
Novas realidades e situações emergem e dão corpo à pobreza e à exclusão: cerca de 40% das pessoas em situação de pobreza, auferem um salário. Muitos daqueles que estão nessa situação possuem formação universitária.
Crescem os sem abrigo e entre eles, aumenta a presença de mulheres. Aumenta a pobreza encoberta e vivida, de modo doloroso, entre paredes e ou ao final do dia, em busca de uma refeição seja junto de instituições ou das equipas da noite.
À dimensão humana e social da pobreza, associa-se cada vez mais, a dimensão territorial; com o aumento das assimetrias regionais e mesmo entre concelhos.
Não há solução, afirmam alguns. Nós reafirmamos «Sim, É possível, Uma Vida Melhor e uma Sociedade mais Justa». E isso implica clararuptura com a política de direita, que conduza a uma verdadeira mudança na vida nacional, que concretize uma política de esquerda e patriótica, onde os principais actores sejam os trabalhadores e todas as camadas populares duramente afectadas pela política de direita.
Este Seminário inserindo-se na reflexão necessária sobre a natureza multidimensional da pobreza, é igualmente um espaço e um momento de perspectivar a luta e a intervenção para lhe dar combate.
Estamos convictos que será desenvolvido com as características próprias das várias instituições e pessoas que, de uma forma séria e empenhada exigem Justiça Social.
O debate está lançado, aguardando a V/participação, contributo e experiência.
Obrigado.

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