Declaração de Paula Santos, Presidente do Grupo Parlamentar e membro do Comité Central, Conferência de Imprensa

Sobre a proposta de Orçamento do Estado para 2022

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Como o PCP foi sublinhando ao longo dos anos, inclusive na discussão da proposta de Orçamento do Estado para 2022 que se realizou no final do ano passado, a dimensão dos problemas com que o País está confrontado exige uma resposta ampla e profunda na qual o Orçamento se deve inserir.

Resposta que o Governo recusou em Outubro de 2021 e que, com a proposta hoje apresentada, continua a recusar, persistindo num caminho que aprofundará estrangulamentos, injustiças e desigualdades que marcam a vida do País.

A proposta de Orçamento é no fundamental a proposta que foi rejeitada em Outubro de 2021 e continua a recusar o conjunto de soluções pelas quais o PCP se bateu. Uma proposta que já era desajustada há 5 meses e mais desajustada é hoje, tendo em conta a degradação da situação nacional e internacional a que se assistiu.

O Governo continua a recusar as soluções defendidas pelo PCP para o aumento dos salários de todos os trabalhadores, o aumento geral das pensões, o reforço dos serviços públicos, designadamente o reforço dos profissionais do SNS, um regime de dedicação exclusiva, a valorização das carreiras, continua a recusar a defesa do direito à habitação, o travão aos despejos e ao aumento das rendas, o investimento na criação de uma rede pública de creches e de equipamentos sociais, o apoio à produção nacional e às MPME.

Essas soluções defendidas pelo PCP para alguns dos problemas mais imediatos do povo e do País faltaram há 5 meses e continuam a faltar nesta proposta.

Uma proposta prisioneira da submissão às imposições do Euro, que coloca a redução do défice como objectivo primeiro da política orçamental, em detrimento da resposta aos problemas do País e da melhoria das condições de vida dos trabalhadores, do povo português. O objetivo de atingir um défice de 1,9%, muito abaixo da previsão que constava da primeira proposta de OE (3,2%), mostra que, mais uma vez, o Governo opta por canalizar qualquer margem orçamental para a obsessão pelo défice em vez de a utilizar na resposta aos problemas nacionais.

Uma proposta que recusa o aumento geral dos salários como uma emergência nacional. Que não promove a valorização das profissões e das carreiras, tal como das pensões. E que ignora o agravamento do custo de vida, que já se pressentia no final de 2021, subestimando os valores da inflacção e transferindo para cima dos trabalhadores, dos reformados e das MPME os custos do aumento dos preços de bens e serviços essenciais, com o exemplo gritante da recusa em controlar e fixar preços dos combustíveis.

Uma proposta que assume um aumento extraordinário das reformas que de extraordinário só lhe sobra o nome, uma vez que não só continua a deixar de fora centenas de milhar de pensionistas (todos acima dos 2,5 IAS), como desconsidera que os 10€ agora admitidos já foram consumidos pelo aumento dos preços designadamente nos bens energéticos e alimentares.

Uma proposta que se molda aos interesses do grande capital, que se aproveitou e aproveita da epidemia, e agora da guerra e das sanções, e a quem este Governo destina generosos apoios públicos – fiscais, fundos comunitários e outros – ao mesmo tempo que garante lucros elevados, seja pela contenção dos salários, seja pela recusa à regulação de preços.

Uma proposta que não promove a valorização dos serviços públicos e que passa ao lado dos impactos da epidemia que perduram na vida do País, seja nas debilidades e no assalto que está a ser feito ao Serviço Nacional de saúde, seja na ausência de medidas de recuperação e superação dos impactos causados na escola pública, ou em sectores como a cultura e o desporto.

Uma proposta que finge não ver que o País está confrontado com um problema na habitação, com o aumento incessante dos preços no arrendamento e com a ameaça de subida das taxas de juro que penalizaram quem foi empurrado para a compra de casa.

Uma proposta que é conivente com a injustiça fiscal, que não responde ao sentido de uma maior tributação dos lucros e do património de elevado valor, incluindo os lucros claramente especulativos alcançados nos últimos tempos, que prevê novas “borlas fiscais” aos grupos económicos mas não admite sequer reduzir a tributação sobre o consumo, designadamente sobre a electricidade e o gás, passando o IVA de 23% para 6%.

Uma proposta que continua a negar a importância do investimento público que chega a ser menor em 2022 do que foi em 2021 se descontado o valor do PRR. Investimento que deixa de fora uma rede de creches públicas e de equipamentos sociais como lares e outros, o alargamento significativo de oferta pública de habitação, equipamentos de saúde e ensino – empurrados para as autarquias-, vias de comunicação e infraestruturas e, sobretudo, o reforço do aparelho produtivo nacional num momento em que mais uma vez fica clara a necessidade de uma política de substituição de importações por produção nacional.

Como é sabido, nos últimos anos, foi possível, seja pela intervenção do PCP, seja pela luta dos trabalhadores e das populações, inscrever medidas quer dentro, quer fora do Orçamento, que contrariaram opções da política de direita e se traduziram em avanços para os trabalhadores e o Povo português. O PS, com o aplauso e o apoio do grande capital, sente-se hoje em melhores condições de fazer a política que sempre desejou. E a prova aí está, com uma proposta de Orçamento que contrasta com opções que teve de assumir nos últimos anos face à influência decisiva do PCP nas decisões nacionais.

Perante a percepção generalizada de que este Orçamento, bem como o próprio programa do Governo, não respondem aos problemas do País, o Governo desdobra-se em acções de propaganda – o novo anúncio de extinção do PEC que foi concretizado em 2020 é apenas um exemplo – e, sob aplauso do PSD, da IL e do Chega, recusa o aumento dos salários em nome de uma pretensa espiral inflacionista. As respostas do Governo à evolução dos últimos meses passam por dizer que a “culpa é da guerra” ignorando as consequências das sanções que em seu nome o governo apoia e promove e, no fundamental, por utilizar receita fiscal para assegurar que os lucros dos grupos económicos se mantêm intocáveis, sacrificando recursos públicos que faltarão noutras dimensões.

A maioria absoluta do PS garante a aprovação do Orçamento do Estado mas agrava os problemas com que o País está confrontado.

O povo e o país precisam de uma resposta à altura dos problemas e das necessidades que enfrenta, mobilizando todas as possibilidades que hoje existem. Respostas que não se podem submeter, como aconteceu desde a adesão ao Euro, às imposições da UE. Respostas que não podem ser dadas se se mantiverem intocáveis os lucros e os privilégios do grande capital.

O País tem recursos e possibilidades para enfrentar a actual situação. Garantida que está a discussão na especialidade desta proposta de Orçamento, o PCP não deixará de intervir para garantir soluções que integrem a resposta global aos problemas nacionais, caminho indispensável para a vida do País.

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