Intervenção de Joaquim Dionísio, Encontro «Os comunistas e o movimento sindical – uma intervenção decisiva para a organização, unidade e luta dos trabalhadores»

A ofensiva contra o Direito do Trabalho e a luta pela reposição dos direitos

A ofensiva contra o Direito do Trabalho e a luta pela reposição dos direitos

É para mim uma satisfação muito grande estar aqui – embora virtualmente – a tratar de uma matéria que é de hoje e de sempre e que se se mantém na agenda a isso se deve a luta constante dos comunistas dentro e fora da CGTP.

O direito do trabalho é o ramo do direito que melhor reflete as posições ideológicas na produção e nas modificações da legislação laboral. Porquanto, de uma política de direita não se pode esperar leis geradoras de direitos de quem trabalha.

Na verdade, nos últimos mais de 40 anos verificou-se um ataque dirigido ao desmantelamento dos direitos alcançados com o 25 de abril. A intensidade do ataque é que foi variando refletindo a luta dos Trabalhadores.

Desde 1976 que o direito do trabalho e a contratação coletiva são alvos de um ataque continuado visando mudar a sua natureza protetora aproximando-o do direito civil. O ataque foi sempre dissimulado por expressões como flexibilidade, adaptabilidade, modernização, promoção da contratação coletiva, conciliação da atividade profissional com a vida familiar, etc. O objetivo da dissimulação foi sempre o de desfocar a discussão e o de gerar uma ideia de que o que se queria fazer não era retirar direitos, mas modernizar o direito do trabalho.

Entretanto a comunicação social dominante, foi passando a mensagem de que as leis do trabalho eram rígidas, eram inimigas do emprego, do desenvolvimento das empresas e da competitividade do país. E que a receita estava num direito do trabalho flexível e pela caducidade da contratação coletiva, que “estava velha e estava ultrapassada”. O resultado já o conhecemos.

O ataque aos direitos dos trabalhadores também não é uma coisa de 40 anos e não se confina ao território português. O ataque existe desde a formação do direito do trabalho.

O direito do trabalho é um produto das lutas dos trabalhadores, em especial das lutas operárias desenvolvidas desde a revolução industrial, pela melhoria das condições de vida e de trabalho, pela dignidade, contra a exploração e pelo equilíbrio nas relações de trabalho nas empresas. E esse é que é o pecado original do direito do trabalho.

É um ramo do direito que atribui direitos ao trabalhador como fim de limitar o poder patronal: de despedir, mediante a introdução da proibição de despedir sem justa causa; de fixar horários como muito bem entende; de impor a atividade organizada em sindicatos no interior das empresas; da obrigação de negociar os salários e condições de trabalho por via da contratação coletiva, etc.

Um direito do trabalho assim, não cai nas graças de um poder cuja natureza e existência depende da exploração e da submissão e que, por isso mesmo, nunca se conformará com ele porque o vê e o sente como um obstáculo real ao seu poder absoluto.

O desequilíbrio gerado pelas crises tem dado uma grande ajuda à fragilização e à eliminação de direitos dos trabalhadores com a introdução de um conjunto de normas gravosas que o Partido e o CGTP têm combatido com grade determinação através da mobilização dos trabalhadores.

Os Códigos do trabalho de 2003 (na vigência de um governo do PSD) e o de 2006 (já com um governo PS) e as alterações feitas pelo governo PSD/CDS no período da Troica, significaram momentos de confronto que deixaram marcas profundas na legislação laboral, mediante a inclusão dessas normas gravosas, que os governos PS se têm recusado a eliminar aliando-se à direita nas votações na Assembleia da República e ao patronato e à UGT na Concertação Social. A reposição dos direitos é uma necessidade urgente e é condição do desenvolvimento social, mas também económico, porque não é concebível um estado desenvolvido com ausência de direitos. Não se concebe uma democracia avançada e participada quando os trabalhadores são limitados e até subtraídos dos seus direitos individuais e coletivos fundamentais.

É urgente repor esses direitos, designadamente: o princípio do tratamento mais favorável, porque ele é o “coração e a alma do direito do trabalho”; o princípio da livre negociação coletiva, com a revogação das normas que impõem a caducidade dos contratos coletivos e do principio de que uma convenção coletiva só é substituível por outra, na mesma unidade de negociação; a eliminação da norma que atribui aos trabalhadores não sindicalizados escolher “á la carte” a convenção coletiva que mais lhe interessa enquanto os sindicalizados estão obrigados a aceitar a convenção negociada pelo seu sindicato. Esta é uma norma miserável, que apela à dessindicalização e à não sindicalização dos trabalhadores e que foi incluída no código do trabalho por proposta da UGT e que diz tudo sobre o papel dessa organização.

É necessário inverter o caminho que tem conduzido à desorganização da vida pessoal e familiar dos trabalhadores, mediante a alteração das normas relativas aos bancos de horas, nomeadamente o banco de horas grupal e a adaptabilidade individual.

É necessário atacar a precariedade, revogando as normas que admitem a contratação a termo de curta duração sem motivo justificativo, bem como a que permite a contratação de trabalhadores á procura do 1.º emprego.

A reposição das indemnizações por despedimento e por caducidade dos contratos a termo, de modo a conter os despedimentos arbitrários e a precariedade.

Mas também é preciso por a Inspeção de Trabalho a funcionar porque o que se passa com ela é inqualificável.

Também uma palavra sobre os tribunais de trabalho, enquanto órgão de aplicação da legislação do trabalho, onde os juízes que vão chegando trazem uma formação neoliberal – sabem tudo sobre as normas, mas sabem pouco ou nada sobre a vida laboral – e que tendem a ver as empresas como vítimas dos
trabalhadores que lá se dirigem para fazer valer os seus direitos. É um tema que tem estado fora da agenda, mas merece muita atenção.

E, sobretudo, não esquecer que nenhuma destas mudanças será feita sem a luta firme e continuada dos trabalhadores.

Porque, como sabemos, estas coisas não são oferecidas.

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