Intervenção de Fernanda Mateus, membro da Comissão Política do Comité Central, Sessão Pública na passagem do centenário de Maria Alda Nogueira «Uma vida de combate pela igualdade e emancipação social»

Maria Alda é um exemplo de profundo activismo em defesa dos direitos das mulheres. Que continuamos! 

Maria Alda é um exemplo de profundo activismo em defesa dos direitos das mulheres. Que continuamos! 

Camaradas, Amigos e Amigas, 

Assinalamos nesta Sessão o Centenário do nascimento de Maria Alda Nogueira, uma intelectual, militante comunista com um percurso político de enorme riqueza, de muito sacrifício e abnegação, pautado pela determinação da justeza das causas que abraçou ao longo da sua vida.

Um percurso, enquanto mulher e cidadã, que assumiu com determinação o seu contributo à luta do PCP contra o fascismo, pela liberdade e democracia, pela igualdade e emancipação social. 

Foi um combate de amor, que lhe permitiu enfrentar e  afrontar todas as adversidades: o de ser uma mulher inconformada com o destino das mulheres do seu tempo, o de ser militante comunista, que a levou à clandestinidade, e à prisão. 

Mas foi igualmente um combate de esperança que viu finalmente as mudanças por que lutou a terem lugar com a Revolução de Abril. 

Na singela exposição e na brochura que apresentamos nesta Sessão registam-se apontamentos da sua biografia, do seu percurso  político. 

O percurso de Maria Alda ao longo dos seus 75 anos de vida (1923 -1998) está indissoluvelmente ligado à acção do PCP na luta pelo derrube do fascismo, na  Revolução de Abril e no processo revolucionário que se lhe seguiu na defesa das conquistas que tiveram lugar  e na sua intransigente defesa perante o processo de recuperação capitalista iniciado em 1976, alicerçado na política de direita dos governos que a protagonizaram, contra a qual se bateu até ao final da sua vida. 

Em todos eles Maria Alda foi um exemplo de combatividade e  determinação. 

Com Maria Alda Nogueira estiveram tantas outras corajosas mulheres comunistas e outras democratas, que não se conformaram, nem se resignaram perante a feroz repressão imposta pela ditadura fascista sobre os trabalhadores e o povo português e que impôs às mulheres um papel de inferioridade, na lei e na vida. 

Todas estas mulheres foram indispensáveis para a luta antifascista, para a conquista da liberdade, do direito a constituir partidos e organizações sociais, de alcançar direitos para os trabalhadores e o povo e consagrar a igualdade de direitos para as mulheres no trabalho, na família, na vida social e política que só foi possível com a Revolução de Abril. 

Ao recordar Maria Alda Nogueira, como o temos feito com outros destacados dirigentes do Partido, estamos a preservar na memória colectiva das novas gerações, o que foi a dureza da luta travada contra o fascismo, (que alguns procuram branquear), mas igualmente  a projectar para o presente o valor do combate determinado e corajoso contra os  «impossíveis» que no presente estão patentes na tentativa de imposição do pensamento único, de «naturalização» de todas as injustiças sociais, de «normalização» da espiral de sacrifícios e desigualdades que são impostas ao serviço de uma minoria, que todos os dias engorda os seus lucros e a sua riqueza à custa do empobrecimento da grande maioria que todos os dias é confrontada com a degradação das suas condições de vida e de trabalho. 

Um combate determinado e corajoso perante uma ofensiva política e ideológica contra os direitos das mulheres, que se esconde no branqueamento das responsabilidades da política de direita nos retrocessos nas suas  condições de vida e de trabalho e na perpetuação das desigualdades, discriminações e violências que a muitas penalizam, enquanto trabalhadoras, cidadãs e mães.   

Camaradas, Amigos e Amigas, 

Maria Alda Nogueira viveu grande parte da sua vida sob o regime fascista. Oriunda do bairro de Alcântara, com grande implantação operária, teve um contacto muito próximo com a realidade de exploração dos trabalhadores e a forte repressão sobre as suas lutas. 

Tendo tido a oportunidade de estudar (o que não acontecia com a maioria das crianças do seu tempo) e de ter professoras que a despertaram para interesses em diversos domínios, iniciou a sua intervenção política ainda muito jovem. 

Participou nas lutas académicas e inicia a sua militância na Federação da Juventude Comunista. Com 19 anos torna-se militante do PCP (1942). 

Aos 26 anos, já licenciada em físico-química abandonou a possibilidade de uma carreira de investigadora para se dedicar à acção clandestina do PCP. Clandestinidade que não foi uma escolha, foi uma imposição da ditadura fascista que negava as possibilidades de actividade política legal. 

O seu filho António nasceu na clandestinidade e aos quatro anos teve de se separar da sua mãe, que só voltou a ver um ano depois quando tinha sido presa.

Presa aos 36 anos (15.10.1959) acusada de desenvolver «actividades subversivas» é sujeita a torturas psíquicas e morais, sendo a  primeira mulher condenada a oito anos de prisão, que totalizou numa única prisão nove anos e três meses. 

Afirmou, Maria Alda Nogueira, que a prisão lhe retirou os melhores anos  da sua vida. Torturas psíquicas e morais permanentes que assumiram dimensões emocionais extremas quando  se apercebeu que a PIDE tinha interrogado o seu filho, uma criança com apenas seis anos ( o camarada António Vilarigues que se encontra connosco nesta sessão).

A denúncia do clima repressivo da policia política sobre os sentimentos e afectos das mulheres presas levou Maria Alda Nogueira em conjunto com outras mulheres comunistas presas, a dirigir-se em 1961, às organizações femininas e democráticas do Mundo. 

A brutalidade da repressão é descrita por Maria Alda: «Não posso beijar o meu filho de cinco anos e a minha velha mãe de 70 anos. Gestos naturais de carinho têm de ser recalcados, conversas intimas estancadas, porque no parlatório as redes e a distância nos separam da família e um guarda escuta-nos de perto e ostensivamente».

Importa recordar o valor da solidariedade aos presos políticos: a que foi prestada no V Congresso Mundial de Mulheres, realizado pela FDIM (Junho de 1963).

Mas, igualmente as «milhares de mulheres, que ao longo dos 48 anos da ditadura fascista, caminharam para as cadeias, para darem o apoio  que os presos políticos precisavam vivendo enclausurados, em condições desumanas, com alimentação paupérrima e, se a sua saúde perigava, encontrando pela frente médicos-carrasco.» como recorda o Livro da URAP «Elas estiveram nas prisões do fascismo». 

E foram muitas as militantes comunistas que, com outras mulheres estiveram nas prisões do fascismo por motivos políticos, um registo de 1755 mulheres presas que foi apresentado neste livro.  

Maria Alda Nogueira, foi eleita membro suplente do Comité Central do PCP, no V Congresso, em 1957 (tendo deixado esta função em 1988),  desenvolveu uma intensa e diversifica intervenção na organização partidária, na defesa das casas clandestinas, na ligação aos trabalhadores, na batalha ideológica, na promoção da organização das mulheres comunistas e no estimulo à acção das organizações unitárias de mulheres. 

Escreveu para o jornal «Avante», usou o pseudónimo Lídia em o  «Militante» e  «A Voz das Camaradas» dedicado às mulheres das casas do Partido abordando temas de cariz ideológico e de Rosa na Rádio Portugal Livre.

Entre as tarefas que assumiu destaca-se a profunda ligação à luta das mulheres  nas fábricas, nos campos, nas cidades, nas universidades e às organizações de mulheres.

Foi  activista na Associação Feminina Portuguesa para a Paz dissolvida pela PIDE em 1952. 

O fascismo e a guerra assolaram a Europa por vários anos, Salazar apoia o esforço de guerra de Hitler. Os horrores da guerra, as atrocidades cometidas nos campos de concentração, levam Maria Alda Nogueira a abraçar a luta pela Paz. 

Sobre a sua participação nesta Associação refere:  «Quando estava na Faculdade soube que havia perto uma sede da Associação, que enviava géneros para os prisioneiros dos campos de concentração nazis, que lutava pela paz e pelos direitos das mulheres e das crianças e dirige-me para lá. (…) Tornei-me activista da Associação e conheci mulheres fantásticas, combativas, inteligentes (…)  como  Francine Benoit que dirigia o orfeão da Associação, e Manuela Porto, entre outras (...)». 

Foi activista do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, durante a presidência de Maria Lamas, entre 1945 e 1947, ano em que o regime fascista ordenou a sua dissolução. Em Janeiro de 1947 participou como oradora sobre «A mulher e a Ciência» nos debates organizados na Exposição de Livros Escritos por Mulheres, na Sociedade Nacional de Belas Artes. 

Integra mais tarde o Movimento Democrático de Mulheres, tornando-se membro do seu Conselho Nacional após a Revolução de Abril e recebendo a Distinção de Honra atribuída por este movimento. 

Queridos camaradas, Prezados Amigos e Amigas 

Na Revolução de Abril, Maria Alda, tinha então 51 anos, desenvolveu uma intensa actividade em tarefas de organização e fortalecimento do Partido, intervêm em numerosos comícios e reuniões públicas. 

Na Assembleia Constituinte integrou (com o camarada Jerónimo de Sousa  aqui presente) o grupo parlamentar do PCP, tendo sido um dos rostos  que se bateu para que a  Constituição incluísse os princípios e direitos referentes às mulheres. 

Sobre a Constituição da República, recordará em 1977: «O 25 de Abril de 1974, deu ainda às mulheres uma importante arma na sua luta em defesa dos seus direitos como mães, como trabalhadoras, como cidadãs. Essa arma chama-se a Constituição da República de 1976. Antidiscriminatória, da primeira à última linha, consagrando a igualdade do homem e da mulher, no trabalho, na família, na vida social, cultural e política.»

Mas, nunca deixou de frisar que uma coisa era a igualdade na lei outra coisa era a igualdade na vida. Confirma-se plenamente esta sábia afirmação!

Entre  1976 a 1987, Maria Alda integrou o  Grupo Parlamentar do PCP onde interveio sobre múltiplos problemas dos trabalhadores e do povo, continuando a sua intervenção sobre diversos aspectos da situação e dos direitos das mulheres. 

Foi presidente da Comissão da Condição Feminina, em nome da qual produziu diversas intervenções  e em nome da qual apresentou o Relatório sobre a situação das mulheres em 1987 em que se destacava o desfasamento entre a lei portuguesa e a realidade das mulheres. 

Maria Alda, ao longo do seu percurso militante tinha uma profunda certeza do papel do PCP como o mais sólido aliado da luta das mulheres pela sua emancipação e afirmou-o na  Conferência Nacional do PCP  “A emancipação da Mulher no Portugal de Abril”. 

Maria Alda é um exemplo de profundo activismo em defesa dos direitos das mulheres. Que continuamos! 

Maria Alda é um exemplo de luta pela liberdade, pela democracia, pelas conquistas de Abril, pelo socialismo. Que prosseguimos! 

Termino com o poema  redigido na prisão por Maria Alda: 

Nada, nada companheira
Secará o rio que em nossa alma corre
Se a tua mão sobre o meu ombro inteira
Me fala de esperança que não morre
Ninguém nem ontem, nem hoje
Afastará meu ombro do teu, Camarada 

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