Nota da Comissão Coordenadora da Área da Educação, Ciência e Tecnologia do PCP

Financiamento Público de Instituições e Actividades de I&DE

A apreciação na generalidade do tratamento dado no Orçamento do Estado para 1998 às actividades de C&T (Ciência e Tecnologia), assente na comparação dos valores iniciais orçamentados, para 1997 e para 1998, conduz à verificação de que, no fundamental, se mantêm ao nível de anos anteriores – já de si muito baixo – os recursos financeiros postos à disposição dos agentes executores de actividades de I&DE (Investigação e Desenvolvimento Experimental).

Analisando separadamente a evolução das despesas de funcionamento previstas e a evolução do investimento (PIDDAC Tradicional e PIDDAC Apoios), e analisando, por um lado, a evolução dos montantes orçamentados para os chamados grandes laboratórios do Estado e, por outro, a evolução dos montantes a despender pelos organismos financiadores de actividades de I&DE tutelados pelo MCT (Ministério da Ciência e da Tecnologia) – verbas a injectar no Sistema Científico e Tecnológico (SCT) – é forçoso reconhecer que não existem sinais claros de se estar a avançar no sentido de mudanças significativas na situação do SCT, situação que é reconhecidamente má, quer no plano dos recursos humanos e materiais – equipamentos e instalações – escassos e envelhecidos, quer no que respeita à organização e gestão desses mesmos recursos. Nada permite afirmar, antes pelo contrário, que se esteja objectivamente a caminho de transformar o frágil e desarticulado SCT nacional num sistema científico e tecnológico comparável ao de outros países europeus medianamente desenvolvidos.

Ao mesmo tempo, confirma-se que para o Governo, a legislação em vigor, obrigando à elaboração de um OC&T e à sua apresentação anual ao Parlamento para apreciação, com o Orçamento de Estado, continua letra morta, parecendo confundir-se OC&T com orçamento do MCT quando na realidade este último não chega a ser metade do total da despesa do País com I&DE.

A análise dos números do OE mostra que o orçamento inicial para 1998 dos chamados grandes laboratórios, é cerca de 8,5% superior ao de 1997, a preços constantes deste último ano, atingindo quase 35 milhões de contos. As despesas de funcionamento sobem 3% a preços correntes, o que traduzirá, se a execução corresponder ao orçamentado, uma efectiva estagnação, com a agravante de que, prevendo-se um aumento sensível (13,6%) das despesas com o pessoal vinculado, as transferências de fundos do OE não acompanham esse aumento, fazendo descer, no conjunto dos laboratórios, a taxa de cobertura das primeiras pelas segundas em cerca de 8 pontos percentuais (de 88% para 80%). Significa este estado de coisas que os laboratórios disporão em 1998 de menos dinheiro para pagar a aquisição de bens e serviços correntes necessários ao seu funcionamento (menos 10,5% em termos reais) e para fazer algumas despesas de capital (menos 24%), constituindo estas, cronicamente, uma fracção muito pequena do orçamento de funcionamento (4%, em 1998). De notar que a previsão do aumento das despesas com pessoal vinculado contida nos valores orçamentados, deverá, no fundamental, ser consequência dos processos de integração nos quadros do numeroso pessoal que se mantinha em situação precária há diversos anos, designadamente, daquele com a designação de "bolseiro", o que por si não corresponde, evidentemente, a qualquer crescimento real do SCT.

Olhando agora para as dotações do PIDDAC, verifica-se a subida, no conjunto dos laboratórios, de cerca de 5,1 milhões de contos, em 1997, para cerca de 7,3 milhões de contos, em 1998. Este crescimento, notável em comparação com anos anteriores, decorre em grande parte do crescimento verificado nas dotações do PIDDAC do INETI, que passam de cerca de 800 mil contos, em 1997, para 3 milhões e 100 mil, em 1998. Importa assinalar, todavia, que este salto no financiamento do INETI decorre da atribuição de fundos do PEDIP (mais 2,2 milhões de contos) em grande parte destinados não ao INETI mas à construção de infraestruturas do Pólo Tecnológico do Lumiar (1,5 milhões de contos). Tendo em conta esta nota, verifica-se que o orçamento total dos laboratórios cresce apenas ligeiramente acima da taxa de inflação (+2,3% em termos reais).

Vejamos agora como se apresenta a situação no que toca aos organismos financiadores tutelados pelo MCT e que são, no nosso sistema, a principal fonte de financiamentos abertos. No Orçamento de Estado para 1998, os fundos destinados a ser injectados no SCT e que vão, na prática, beneficiar sobretudo os grupos universitários, encontram-se, no fundamental, inscritos no PIDDAC da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (25,5 milhões de contos) e do Instituto para a Cooperação Científica e Tecnológica Internacional (3,2 milhões de contos). Em 1997, apareciam ainda no PIDDAC da extinta JNICT. Feita a comparação dos números, verifica-se um crescimento dos valores iniciais orçamentados de 20,3 % entre 1997 e 1998 (mais 4,8 milhões de contos). Para este crescimento é determinante a evolução da verba inscrita para o programa PRAXIS XXI, que recebe mais 3,9 milhões de contos (dos quais 2,7 milhões de fundos europeus). Todos os outros programas vêem as suas dotações ser reduzidas ou, nalguns casos, manter-se. Assim, o Programa de Formação e Mobilidade de Recursos Humanos é reduzido, a preços correntes, em 50% enquanto o Programa Base de Investigação Científica e Tecnológica cai para 1,5 milhões de contos (menos 18%). O Programa de Cooperação Internacional em C&T mantém-se com cerca de 3 milhões de contos, dos quais 2 milhões se destinam a ser transferidos para o estrangeiro, principalmente para pagamento de quotizações em organismos internacionais. O Fundo de Apoio à Comunidade Científica é reduzido em 17%, sempre a preços correntes.

Há assim um reforço da concentração de recursos financeiros no programa PRAXIS XXI, onde se concentram também os fundos estruturais europeus. No interior deste programa verifica-se uma quebra de 1,8 milhões de contos na dotação para "bolsas" que passa para 8,4 milhões de contos, e um substancial reforço dos dinheiros a transferir para o financiamento de actividades de I&DE em instituições particulares (de 1 para 3 milhões de contos) e sobretudo em instituições públicas (de 3,8 para 7,9 milhões de contos). A importância do crescimento destes números tem, naturalmente, que ser vista em termos absolutos e confrontada com a sua pequenez. E, no caso das transferências para instituições públicas, tem o significado de substituição de financiamentos não assegurados pelos ministérios da respectiva tutela.

Importa ainda referir a dotação de um milhão e 500 mil contos consignada ao "apoio à reforma de instituições públicas ou de interesse público de investigação" que aparece inscrita no orçamento da Fundação para a Ciência e a Tecnologia. O montante desta dotação, cuja finalidade não está clara, contribui para tornar mais evidente a pequenez das restantes dotações, afinal destinadas a alimentar um sistema que se admite estar em funcionamento.

Finalmente, anota-se o facto de as despesas com o pessoal dos três organismos que sucederam à JNICT, crescerem globalmente 50% em relação à correspondente despesa orçamentada em 1997 para este último organismo (1,1 milhões de contos em 1998 contra 700 mil no ano que terminou).

O quadro orçamental acima descrito mostra que não há razões para esperar que em 1998 possam ter lugar alterações significativas da situação do SCT nacional. Como noutra ocasião foi sublinhado não é possível transformar ou dar início a uma transformação do sistema que vise a efectiva melhoria do seu desempenho enquanto não se manifestar vontade política de aumentar progressiva mas significativamente o investimento no sistema dando-lhe o tratamento de excepção correspondente à sua importância estratégica. A título de referência, seria significativo um aumento global de 20 milhões de contos, dos quais 10 milhões como dotações directas nos orçamentos de funcionamento dos laboratórios e outros 10 milhões a injectar no sistema através da Fundação para a Ciência e a Tecnologia. Só assim será possível fazer com que vivam, em lugar de vegetar, linhas de investigação e projectos que se arrastam penosamente ano após ano em regime de sub - financiamento crónico.

O indispensável incremento dos recursos financeiros a disponibilizar para fazer funcionar o sistema, e rentabilizar o dinheiro gasto, deverá ser acompanhado de novas regras de gestão, a aplicar por gestores competentes. Importa destacar, como particularmente importante, o estabelecimento de novas carreiras de pessoal técnico; a possibilidade de recrutamento de pessoal dentro das disponibilidades orçamentais e a possibilidade de realização de outras despesas correntes sem necessidade de classificação económica a priori.

Nada disto depende ou sequer tem a ver com a mirífica reforma das instituições públicas de investigação cujo parto, difícil, está prometido para 1998 pelo MCT, depois de ter estado garantido em 1997: "em 1998, será consagrada a reforma do sistema de ciência e de tecnologia, a par da expansão e qualificação das instituições e das condições de formação e de emprego científico". Falar em consagração de qualquer coisa, sobremaneira polémica e da qual nenhuma concretização viu ainda a luz do dia, é, apesar de tudo, menos grave do que a "expansão e qualificação" que se promete a seguir de qualquer coisa mal definida numa frase em que o português escorreito que se desejaria ler se atrapalha numa construção duvidosa.

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