Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

"Confiança no povo como principal actor da história"

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Senhora Presidente,
Senhor Primeiro-ministro,
Senhores membros do governo,
Senhoras e senhores deputados,

Realizamos o presente debate sobre o estado da Nação quando se aproxima do fim uma legislatura que corresponde ao período mais sombrio da nossa vida democrática.

Uma legislatura determinada pelas opções do Pacto de Agressão formatadas pela política de direita de PS, PSD e CDS-PP e pelos arranjos e acordos que entre si promoveram com a troika estrangeira do FMI, União Europeia e Banco Central Europeu.

O estado da Nação que hoje aqui debatemos é o estado de declínio, retrocesso, dependência, empobrecimento em que o País está e este governo do PSD/CDS o deixa.

O estado de um País saqueado no seu património e das suas gentes.

O estado de um País com um milhão e duzentos mil desempregados e quase um terço dos seus trabalhadores na precariedade.

Um País crescentemente fragilizado que viu partir nos últimos cinco anos 500 mil portugueses para emigração.

Um País que não sai de uma situação de marasmo económico e que viu nos últimos cinco anos recuar o PIB 6,6% em termos reais e o encerramento e a falência de milhares de empresas.

Um País com uma dívida insustentável e um serviço da dívida sufocante que se aproxima dos nove mil milhões de euros .

O estado de um País onde campeia uma profunda injustiça fiscal, agravada pelo maior aumento dos impostos sobre os rendimentos do trabalho que há memória e uma crescente degradação dos rendimentos do trabalho e das famílias.

O estado da Nação é o estado deplorável em que este governo deixa o País com mais de dois milhões e setecentos mil pessoas a viver abaixo do limiar da pobreza.

O estado da Nação é o estado de retrocesso social e civilizacional da negação dos direitos sociais dos portugueses, nomeadamente à saúde, à educação, à segurança social, à cultura.

O estado de um País onde o domínio do poder económico sobre o poder político se mantém e se desenvolvem as teias de promiscuidade entre cargos públicos e interesses privados, novos casos de corrupção e de fraude económica e financeira.

Ao fim destes quatro anos de políticas ditas de austeridade, mas efetivamente de empobrecimento exploração, a generalidade dos portugueses sabe que a sua vida piorou e muito.

Não, nem o país “está melhor”, nem os “sacrifícios valeram a pena” como apregoa o Governo.

Só um governo que tem a percepção da derrota no horizonte é que pode querer vender essa ilusão, falando em cofres cheios, quando sabe que são cofres cheios dívidas.

Só porque sabem que a sua derrota é o mais que certo desenlace que ousam afirmar que o País está a dar a volta, quando sabem que economia continua no fundo e o desemprego no topo da gravidade dos problemas nacionais.

Só porque pressentem que o povo português não perdoará tanta malfeitoria é que repetem e repetem que não somos a Grécia, tentando ocultar a gravidade dos problemas que deixam ao país e justificar a política de sacríficos que impuseram e tão sujeito como antes à especulação dos mercados quanto eles assim o decidam!

Os programas dos partidos que conduziram o País à crise não têm nenhuma resposta para os problemas do País e insistem na mesma política de assalto aos rendimentos do povo e de entrega de recursos nacionais.

São programas de cega obediência às imposições e instrumentos da União Europeia que só significarão mais destruição de direitos, mais sacrifícios em vão.
São programas para manter Portugal amarrado a uma dívida insustentável e de subordinação e entrega ao capital monopolista de sectores e empresas estratégicas que só conduzirão a mais saída de dividendos, a mais dependência económica.

Senhora Presidente,
Senhor Primeiro-ministro,
Senhores membros do governo,
Senhoras e senhores deputados,

Não será com a mesma política que nos conduziu à crise que se resolverão os problemas do País.
Portugal não está condenado. O País tem saída e futuro. Há alternativa.

Há uma outra política, patriótica e de esquerda, capaz de assegurar o desenvolvimento do País e a elevação das condições de vida dos trabalhadores e do povo.

Uma política em ruptura com as receitas e caminhos que afundaram o País.

Uma política não só indispensável e inadiável, como possível e realizável.

Realizável com a força e a luta dos trabalhadores e do povo português, com a inscrição como factor decisivo e estratégico o crescimento económico, com a afirmação determinada e firme do direito do País a um desenvolvimento soberano, assente na ruptura com as políticas e orientações do União Económica e Monetária, do Euro e dos seus constrangimentos, do Tratado Orçamental, da Governação Económica da União Europeia.

Realizável pela mobilização de recursos que a renegociação da dívida permite libertar, com a redução dos seus montantes e juros.

Realizável com os recursos que a política fiscal que propomos, por via da devida tributação sobre os dividendos, a especulação financeira, o património mobiliário e as grandes fortunas.

Realizável com a recuperação de importantes montantes hoje enterrados nos negócios das PPP e nos contratos swap.

Uma politica que tem no desenvolvimento da produção nacional o motor da dinamização económica, da criação de emprego e do pleno aproveitamento dos recursos nacionais, a resposta para a dinamização do mercado interno e o incremento das exportações de maior valor acrescentado.

Uma política de afirmação do papel do Estado na economia com a reversão das privatizações e a recuperação para o sector público dos sectores básicos estratégicos, no quadro de uma economia mista com um forte apoio às micro, pequenas e médias empresas.

Uma política que assume a valorização do trabalho e dos trabalhadores como eixo essencial de uma política alternativa e que assume sem rodeios os objectivos de valorizar os salários e os seus direitos.

Uma política dirigida ao bem-estar e à qualidade de vida de todos. Desde logo pela garantia do direito à saúde, objectivo inseparável do reforço do SNS ; a defesa e valorização do Sistema de Segurança Social – público, solidário e universal –, elevando a protecção social dos trabalhadores, assegurando o direito à reforma e a uma pensão dignas.

Uma política que assume na educação esse objectivo maior de formação integral das crianças e jovens com afirmação de uma Escola Pública, gratuita, de qualidade e inclusiva onde seja assegurado a todos o direito ao conhecimento e a igualdade de oportunidades.

Uma política que garante as funções culturais do Estado e assume o conhecimento científico e técnico como força produtiva directa, indispensável ao desenvolvimento económico sustentado.

Uma política que garanta os direitos dos cidadãos, o acesso à justiça, combata decididamente a corrupção, assegure a segurança e tranquilidade dos cidadãos, afirme uma política de Defesa Nacional centrada nos princípios constitucionais.

Uma política patriótica e de esquerda que assume a afirmação de um Portugal livre e soberano num mundo e numa Europa de paz e cooperação entre Estados iguais em direitos.

Uma política alternativa que dê resposta com medidas concretas a urgentes problemas que, nomeadamente, respondam uma efectiva protecção aos desempregados com o alargamento dos critérios de acesso e prolongamento do período de atribuição do subsídio de desemprego; promova o aumento do Salário Mínimo Nacional para 600 euros no inicio de 2016 e o fim dos cortes salariais e a reposição integral dos salários, subsídios e pensões retirados na Administração Pública; a reposição de justiça e equidade nos critérios de cálculo e na actualização das reformas e a melhoria das pensões e reformas e a salvaguarda do direito à reforma aos 65 anos; a revogação imediata das taxas moderadoras nos serviços de saúde e assegurar médico de família a todos os portugueses num período não superior a dois anos.

Medidas concretas imediatas de apoio aos sectores produtivos com criação de um estatuto específico para a agricultura familiar e a manutenção de sistemas de quotas leiteiras; a garantia de todos os combustíveis a custo bonificado para todos os segmentos da frota pesqueira; o estabelecimento de um regime de preços máximos nos combustíveis e na electricidade e a reversão da taxa do IVA para 6% na electricidade e gás natural; a eliminação do pagamento especial por conta para as micro, pequenas e médias empresas, e redução da taxa do IVA na restauração a 13%.

Uma política alternativa que exige um governo que a concretize. Um governo capaz de romper com o circulo vicioso que se instalou no país de alternância sem alternativa.

Senhora Presidente,
Senhor Primeiro-ministro,
Senhores membros do governo,
Senhoras e senhores deputados,

Com um sentimento contraditório de inquietação e esperança, o PCP reafirma a sua confiança no povo português como principal actor da história e obreiro do seu próprio devir colectivo!

É nesse povo que confiamos e é à sua força que apelamos para construir o futuro!

Disse.

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