Projecto de Resolução N.º 163/XII-1ª

A urgente retoma e conclusão do plano integrado do desenvolvimento do Baixo Vouga Lagunar

A urgente retoma e conclusão do plano integrado do desenvolvimento do Baixo Vouga Lagunar

1.UM PROJECTO COM MAIS DE 3 DÉCADAS

Em 26 de Maio de 2010, o Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, através da Direcção Regional de Agricultura e Pescas do Centro, respondeu à Pergunta 2480/XI (1ª) de 21 de Abril do Grupo Parlamentar do PCP, sobre a “Conclusão do dique do Baixo Vouga Lagunar no âmbito do polis da Ria de Aveiro”. O texto da Resposta, que se transcreve, é uma boa síntese da longa e inconclusiva história do Projecto.

“1.Importa, em primeiro lugar, esclarecer a acção da Direcção Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR) e dos organismos que a antecederam no processo do Vouga, a qual pode ser resumida da seguinte forma:

. Em 1975 foi elaborado o plano geral do «Aproveitamento Hidráulico da Bacia do Vouga» realizado pela COBA, o qual abrangia uma área de cerca de 12.000 ha.

. Em 1984 foi criado o Gabinete de Estudos do Baixo Vouga.

. Em 1986 foi efectuada a apresentação pública do Estudo Complementar do Plano Integrado do Desenvolvimento do Baixo Vouga Lagunar.

. A área do projecto foi dividida em 10 blocos, tendo-se considerado prioritária a intervenção no Bloco do Baixo Vouga Lagunar, com aproximadamente 3.000 ha, com o objectivo de evitar a progressiva degradação dos solos agrícolas devido à acção das águas salgadas e poluídas da ria de Aveiro, bem como promover o controlo de cheias e ainda intervir nas redes de drenagem, caminhos e rega, a par de acções de estruturação agrária, tendo em vista assegurar condições para a prática da actividade agrícola em regime extensivo.

. Neste sentido, foram desenvolvidas diversas acções, as quais se iniciaram em 1987, pela instalação de uma unidade experimental designada por «Polder Piloto», passando pelo Estudo de Impacte Ambiental e Sócio-Económico do Projecto, elaborado pela Universidade de Aveiro em 1989 e pelo «Anteprojecto de Desenvolvimento do Baixo Vouga Lagunar - 1ª. Fase - (1991)», terminando em 1992 com a apresentação do «Projecto de execução do dique de protecção contra as marés».

. Daí que, em 1995 tenha sido feita a consignação da empreitada de construção do troço médio do dique de protecção contra as marés, a qual foi concluída em 1999.

. Entretanto, devido a uma queixa apresentada em 1994 na Comunidade Europeia contra o Estado Português, no âmbito da construção desta obra de protecção, o Governo determinou que os projectos de ordenamento fundiário fossem suspensos, aguardando pela defesa da acção interposta e pela conclusão do EIA do Baixo Vouga Lagunar.

. Em 2000 foi concluído o trabalho desenvolvido pelo ex-Instituto de Hidráulica, Engenharia Rural e Ambiente (IHERA) «Anteprojecto dos sistemas primários de defesa e drenagem do Baixo Vouga Lagunar» e contratado um novo EIA à Universidade de Aveiro.

. No âmbito desse estudo foi claramente identificada a intrusão da água salgada como sendo o problema de maior gravidade da zona, ao mesmo tempo que é reconhecida a interdependência entre a conservação da natureza e a actividade agrícola.

. De acordo com o EIA, a manutenção da actual situação de referência é desaconselhável dado que o estado actual das infra-estruturas conduzirá ao abandono dos agricultores do bloco do Baixo Vouga Lagunar, em consequência da intrusão salina, do encharcamento dos solos e das deficientes condições de circulação.

. Em 2002 é emitida a Declaração de Impacte Ambiental com «parecer favorável» condicionado ao cumprimento de medidas mitigadoras e de monitorização propostas no EIA e no parecer da Comissão de Avaliação.

. Em Maio de 2002 o Estado Português solicitou a revisão do pretenso incumprimento da legislação comunitária, convidando a Comissão Europeia a participar na análise das conclusões do EIA.

. Em consequência, em Outubro do mesmo ano, o Estado Português participou numa reunião de trabalho em Bruxelas com a Comissão (DG XI) para apresentação do EIA.

. Após estas diligências, em Julho de 2003, o ex-IDRHa foi informado de que a Comissão Europeia decidira arquivar o processo de queixa nº 95/4554 contra o Estado Português, por pretensa violação das Directivas Comunitárias.

. Em Janeiro de 2004 foram aprovadas as candidaturas à Medida 4 - Gestão de Infra-estruturas Hidroagrícolas - da AGRO relativas, por um lado, aos Sistemas de Monitorização para implementação dos planos de monitorização e gestão da água e do solo e da monitorização da diversidade biológica (fauna e flora) e da paisagem e, por outro lado, ao Projecto de Execução de Infra-estruturas Primárias que consistia no desenvolvimento dos estudos e projectos relativos à conclusão dos sistemas de protecção contra as marés das redes primárias de drenagem e da estrutura verde primária (sebes de compartimentação).

. Neste sentido, foram estabelecidos protocolos/contratos com diversas entidades para implementação dos planos de monitorização e em Julho de 2004 foi lançado o concurso público internacional para a «Elaboração do Projecto de Execução do Sistema Primário de Defesa e Drenagem do Baixo Vouga Lagunar», o qual incluía o projecto da estrutura primária, sendo o respectivo acto público de abertura de propostas realizado em 19 de Outubro de 2004.

. No entanto, devido às reclamações apresentadas por dois concorrentes quanto à adjudicação proposta no relatório final, elaborado em 27 de Maio de 2005, sendo que um deles interpôs recurso para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, a celebração do contrato definitivo ficou suspensa até Março de 2006, data em que a acção interposta foi considerada improcedente.

. Assim, foi retomado o procedimento para celebração do contrato escrito, só que nessa altura o adjudicatário solicitou ajustamentos a cláusulas da minuta de contrato, alterando a proposta apresentada a concurso.

. A pretensão do adjudicatário foi indeferida visto envolver alteração de preço da proposta, tendo sido notificado desse facto.

. Em 31 de Julho de 2006 o adjudicatário foi notificado de que a adjudicação foi considerada sem efeito, em virtude de não ter dado resposta no prazo legal para outorga do contrato.

. Por sua vez, não foi possível efectuar a adjudicação ao concorrente classificado em segundo lugar, situação que a legislação aplicável prevê, uma vez que o preço dessa proposta excedia a verba disponível no projecto de investimento e não havia hipótese de se proceder ao reforço nessa fonte de financiamento.

. Deve-se referir que a Agência Portuguesa do Ambiente entendeu a necessidade da prorrogação do prazo de validade da Declaração de Impacte Ambiental até 4 de Abril de 2011, face às vicissitudes e complexidade deste projecto.

Em face do exposto, deve-se frisar que o Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas reconhece a importância da conclusão dos diques de defesa do Bloco do Baixo Vouga Lagunar (reconstrução do dique de defesa contra efeitos das marés e reforço do dique de defesa contra cheias da margem direita do rio Vouga) para a preservação do ecossistema presente e em particular do que está associado ao «Bocage».

O Bocage, presente na zona central e sul dos campos do Baixo Vouga, é um agro-ecossistema em estrutura de campo fechado, limitado por sebes vivas, plantadas e geridas pelos agricultores, normalmente associadas a valas do complexo sistema hidráulico do bloco. Estas sebes desempenham funções de delimitação da propriedade e protecção contra os efeitos nocivos dos ventos nestas parcelas agrícolas. Todo este reticulado possuiu igualmente um elevado potencial biológico que contribuiu para constituição da Zona de Protecção Especial para as Aves (ZPE - Ria de Aveiro.

Das intervenções preconizadas, considera-se importante a constituição do sistema de diques no limite exterior neste bloco, que integra diversas estruturas hidráulicas nas interfaces com as principais linhas de água (rio Vouga-rio Velho, rio Antuã, esteiros de Barbosa, de Canelas e de Salreu).
Esta acção controla o avanço da cunha salina, minimizando a salinização e degradação dos solos, consequente destruição das sebes e dos terrenos agrícolas e abandono desta área. Também o reforço do dique da margem direita do rio Vouga e reposição de descarregadores de cheias anteriormente existentes constitui uma acção prioritária para a recuperação de áreas agrícolas afectadas pelas cheias que ocorrem recorrentemente.

2. O projecto do Bloco do Baixo Vouga Lagunar, visando o aproveitamento e preservação dos recursos naturais como o factor de competitividade associado à protecção e requalificação das zonas urbanas e da sua envolvente, poderá enquadrar-se na filosofia POLIS, que se afigura como o instrumento privilegiado e pertinente para este tipo de intervenção.

Nesse sentido, foi elaborado pela DGADR/DRAP Centro um documento que serviu de base à proposta de integração do Baixo Vouga Lagunar na candidatura POLIS da Ria de Aveiro.

3. O valor previsível da primeira fase do projecto do Sistema Primário de Defesa e Drenagem do Baixo Vouga Lagunar ascende a cerca de 25 milhões de euros.

Deverá referir-se ainda que não foi elaborado o Projecto de Execução e respectivo Relatório de Conformidade Ambiental (RECAPE).

Este projecto pretende atingir objectivos ambientais porventura mais relevantes do que os agrícolas, pelo que terão que ser envolvidos todos os actores no território e todas as valências presentes, que não exclusivamente o sector agrícola.

Não se exclui ainda, a possibilidade de obtenção de financiamento através de outros instrumentos do QREN, nomeadamente em articulação com o Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território.”

2.RESPONSABILIDADES DO PS,PSD E CDS/PP PELA NÃO CONCRETIZAÇÃO DO PLANO

Ao longo de mais de 30 anos sucessivos governos do PS, PSD e PSD/CDS dispuseram dos meios institucionais e financeiros necessários. Houve decisões políticas para que o Projecto se iniciasse. Os departamentos da Administração Central, nomeadamente do Ministério da Agricultura realizaram os estudos necessários e accionaram os mecanismos institucionais competentes, inclusive a candidatura do Projecto a um Programa de apoio ao investimento agrícola – AGRO (2000/2006). E o Estado português dispôs de vultuosos fundos comunitários ao longo de 3 QCA e dos actuais QREN e PRODER para concretizar o Plano Integrado do Desenvolvimento do Baixo Vouga Lagunar. Nada pode justificar a situação actual do Projecto do Bloco do Baixo Vouga Lagunar, de execução considerada prioritária, que não seja a falta de vontade política, ou melhor, outras opções e prioridades das políticas de direita dos referidos governos. Nomeadamente a pouca importância dada aos projectos hidroagrícolas e a criação de condições infraestruturais para aumentar a produção agro-alimentar.

Os prejuízos para o País e para a Região do Baixo Vouga são imensos. Perdas das mais valias agrícolas que potencialmente decorreriam da exploração de milhares de hectares de terra fértil em cereais e pastagens para produção pecuária. Elevados riscos ambientais provenientes das rupturas nos agro-ecossistemas, nomeadamente do que é denominado Bocage e arrozais. Prejuízos no erário público, causados pela delonga dos sucessivos prazos do Projecto, inclusive pela perda de investimentos entretanto feitos, de que o caso mais emblemático é o da unidade experimental do Polder Piloto (56 hectares)!

3.A INTERVENÇÃO DO PCP EM DEFESA DO PROJECTO

Há muito que o PCP reclama e luta pela concretização do Projecto do Bloco do Baixo Vouga Lagunar, componente e primeira prioridade do projecto mais vasto do Plano Integrado do Desenvolvimento do Baixo Vouga Lagunar. Presente nos Programas Eleitorais regionais do PCP e como proposta do Grupo Parlamentar em sucessivos Orçamentos de Estado.

Na XIª Legislatura o Grupo Parlamentar desencadeou um conjunto de Perguntas ao Governo PS/Sócrates no seguimento dos alertas da Direcção Regional de Agricultura e Pescas do Centro considerando que o Dique do Baixo Vouga Lagunar deveria ser integrado no Polis da Ria, denunciando os riscos de desertificação caso o Projecto não avançasse.

Em 26 de Março de 2010, no âmbito da Campanha “Portugal a Produzir” a DOR de Aveiro do PCP realiza um Encontro em Angeja, onde vários participantes e organizações agrícolas denunciam a paralisia total do Projecto. Em Julho de 2011 uma delegação do PCP realiza uma demorada e desenvolvida visita em toda a zona abrangida pelo Projecto e recebe dos agricultores e outros cidadãos que a acompanharam um precioso conjunto de informações sobre as consequências negativas da não concretização integral do Projecto em todas as suas dimensões e valências, e a reclamação da necessidade da sua urgente finalização.

Partilhando da argumentação de diversas entidades regionais, bem expressa nas considerações dos Serviços Regionais do Ministério da Agricultura de que “a área definida para a intervenção do Projecto no tocante à agricultura depende de infra-estruturas e acessibilidades que, caso não se efectuem, comprometem os sistemas culturais e, por consequência, contribuem para a desertificação da agricultura naquela vasta região, e valorizando a interacção agricultura/ambiente relevam o papel fundamental da agricultura para a manutenção da biodiversidade”, o Grupo Parlamentar do PCP, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, propõe que a Assembleia da República aprove o seguinte conjunto de recomendações ao Governo:

I - UMA RÁPIDA REAVALIAÇÃO DO PLANO E INÍCIO DA SUA EXECUÇÃO PELA CONCRETIZAÇÃO DO SISTEMA PRIMÁRIO DE DEFESA E DRENAGEM DO BAIXO VOUGA LAGUNAR

1.Que por iniciativa e sob coordenação do Ministério da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território (MAMAOT) seja criada uma curta equipa técnica executiva com participação de elementos das áreas da agricultura e do ambiente, um representante de cada um dos municípios abrangidos pelo Projecto (Aveiro, Estarreja e Albergaria-a-Velha) e um responsável do Polis da Ria de Aveiro;

2. Que a Equipa faça um ponto de situação do Projecto do Bloco do Baixo Vouga Lagunar, procedendo, no prazo de 3 meses a uma reavaliação em todas as dimensões do Projecto, determine o valor dos investimentos previsíveis, programe a execução e tome as iniciativas e decisões necessárias para inicio das obras a partir do 2º Semestre de 2012;

3.Que a Equipa apresente ao MAMAOT uma proposta de Comissão de Acompanhamento e Monitorização da execução do Projecto integrando entidades regionais públicas e privadas, directa ou indirectamente interessadas – Universidade de Aveiro, associações agrícolas e empresariais, e outras - que trimestralmente relatará o desenvolvimento do Projecto;

II - DISPONIBILIZAÇÃO DE DOTAÇÃO ORÇAMENTAL (PRODER E QREN) PARA A SUA CONCLUSÃO

4.O MAMAOT procurará de imediato acolher nas disponibilidades orçamentais dos Programas PRODER e QREN e verbas do Ministério para obras hidroagrícolas e projectos ambientais, uma dotação de 25 milhões de euros, valor antes estimado, como previsível para a primeira fase do Projecto do Sistema Primário de Defesa e Drenagem do Baixo Vouga Lagunar, a investir em 2012 e 2013;

III – PROGRAMAÇÃO DAS RESTANTES FASES DO PLANO INTEGRADO DO DESENVOLVIMENTO DO BAIXO VOUGA LAGUNAR
5.O MAMAOT deve tomar as medidas necessárias para a conclusão de todo o Plano Integrado do Desenvolvimento do Baixo Vouga Lagunar, programando as restantes fases, respeitantes aos outros 9 blocos, com a perspectiva do seu enquadramento nos programas de fundos comunitários do novo quadro de apoio a iniciar-se em 2014.

Assembleia da República, em 3 de Janeiro de 2012

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