Intervenção de Miguel Tiago na Assembleia de República

Tratado de Bolonha

 

Petição solicitando a adopção de medidas para eliminar as desigualdades resultantes do Tratado de Bolonha a nível dos graus académicos concluídos antes e depois do Decreto-Lei n.º 74/2006, de 24 de Março, que aprova o regime jurídico dos graus e diplomas do ensino superior

Sr. Presidente,
 Srs. Deputados:

Em primeiro lugar, uma palavra de apoio, de compreensão e de solidariedade do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português para com as preocupações dos subscritores desta petição (petição n.º 592/X).

 Esta petição, e a situação a que ela se refere, evidencia as injustiças e as assimetrias que vieram a ser introduzidas no sistema de ensino superior através do Processo de Bolonha. Aliás, nesta matéria, o Partido Comunista Português está particularmente à vontade para falar, porque foi o único partido nesta Câmara que, desde o primeiro momento, se posicionou claramente contra o Processo de Bolonha, se posicionou claramente contra os seus princípios, os tais que, muitas vezes, por outros foram apadrinhados. Por isso mesmo, também colocámos as questões que são referidas nesta petição no âmbito do espírito e dos princípios que Bolonha veio trazer, nomeadamente da mercantilização.

Esta situação em que nos encontramos esbarra com a seguinte realidade: ou equiparamos os graus e prejudicamos aqueles que hoje estão no sistema ou que vão ainda ingressar no sistema de ensino superior, porque serão, então, obrigados a frequentar os segundos ciclos, que são pagos a peso de ouro; ou não equiparamos e prejudicamos aqueles que, no passado, já tiraram os seus cursos. E esta situação de prejudicar sempre uns ou outros leva-nos à irrevogável e irrefragável realidade: o Processo de Bolonha tem de retroceder para introduzir justiça nos graus, na atribuição de graus e na comparação entre os graus.

Mas há uma outra dimensão que deve ser associada, que é a do financiamento do ensino superior. Não é possível fazer esta discussão sem fazer também uma discussão em torno do financiamento do ensino superior, porque o embuste do Processo de Bolonha, o Processo de Bolonha propriamente dito, está intimamente relacionado com uma lei do financiamento do ensino superior que vem fazer com que o acesso aos mais elevados graus, nomeadamente ao segundo ciclo, esteja condicionado ao pagamento de propinas exorbitantes e fora do alcance da esmagadora maioria dos portugueses. E este embuste que limitou o acesso dos estudantes portugueses ao ensino superior, que o transformou numa mercadoria, que o aglomerou em blocos mais facilmente privatizáveis, é onde reside, de facto, a injustiça de raiz.

Ainda uma palavra para um outro embuste: o da empregabilidade que nasce milagrosamente do Processo de Bolonha. Srs. Deputados, o Processo de Bolonha não veio trazer mais nenhuma empregabilidade, e a prova disso é que o desemprego juvenil em Portugal atingiu, pela primeira vez desde os últimos 30 anos, valores acima dos 20%. Neste momento, temos um desemprego juvenil da ordem dos 20,5% e temos 42 000 licenciados no desemprego, o que mostra bem que o Processo de Bolonha não veio trazer nenhuma empregabilidade.

Portanto, o que é preciso para recuperar e reconstruir um ensino superior em Portugal que obedeça às reais necessidades da economia, do País e da população é a soberania na área da definição das políticas educativas, nomeadamente no ensino superior, a saída de Portugal desse famigerado Processo de Bolonha e o fim desta lei de financiamento, que reserva apenas para quem pode pagar o segundo ciclo, e o terceiro ciclo ainda mais.

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