Intervenção

Trabalho temporário - Intervenção de Odete Santos na AR

Regime jurídico do trabalho temporário (revoga o Decreto-Lei n.º 358/89, de 17 de Outubro, alterado pela Lei n.º 39/96, de 31 de Agosto, e pela Lei n.º 146/99, de 1 de Setembro) - declaração de voto

 

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Penso que, apesar de um murmúrio neste fim de uma tarde bonita, deve assinalar-se que hoje é um dia muito negro para os trabalhadores portugueses, porque, através de um partido que tem no seu nome a palavra «socialista», se consagra a quase completa liberalização da flexibilidade contra os direitos dos trabalhadores. Eu diria mesmo que acabam por conseguir a flexigurança, sem qualquer segurança, porque, de facto, isto é colocar na máxima precarização o vínculo laboral.

E não é verdade, até por razões económicas, que isto seja útil às empresas. A esse respeito, cito, de um livro produzido pela Universidade de Lille, de 2000-2001, só sobre trabalho temporário, as críticas de alguns economistas, como Ramon, da revista Droit Social, pág. 71, e Jacobs, embora numa outra revista, que referem que, de facto, o que interessa para os bons resultados das empresas não é a instabilidade, que é uma particularidade essencial do trabalho temporário, mas a duração do vínculo laboral. E são economistas que o dizem! Desta completa instabilidade, que põe o trabalhador sem emprego a qualquer momento, bem se compreende que daqui não pode resultar qualificação profissional e bem se compreende que daqui até resulta uma maior frequência de acidentes de trabalho.

O projecto de lei do Partido Socialista (n.º 277/X) , que não acompanha estas matérias, como se salienta nesta obra dos professores da Universidade de Lille, a evolução que a regulamentação do trabalho temporário tem tido em França, onde, sempre que chega à presidência da República uma pessoa conotada com a esquerda, tornam-se mais duras as exigências em relação ao trabalho temporário, isto é, restringese a possibilidade de recurso ao trabalho temporário. E eu citaria aquele ano, 1982, salvo erro, em que o contrato de trabalho temporário, que era possível por seis meses, tornou-se possível apenas por três meses, do que resultou, também conforme um relatório, que a duração média, nesses tempos, do trabalho temporário, era de 15 dias, Srs. Deputados! De 15 dias para dois anos, que grande distância!

E como não chegavam 3 minutos para falar da execranda forma que está aqui consagrada, nomeadamente no artigo que acompanha toda a fundamentação da contratação a prazo, para dizer que, nesse caso, pode ser trabalho temporário ...

Se nesse caso pode ser trabalho temporário, então não é preciso haver contratos a prazo: contratam-se todos temporariamente e põem-se na rua em qualquer altura. Inclusivamente, a adopção daquela forma inexistente do contrato por tempo indeterminado, que não é o contrato sem prazo, porque não pode ser, está no artigo 31.º, donde se vê que não é. E não é possível e é inadmissível, segundo salientam os franceses, que o contrato de trabalho temporário tenha esta previsão da indeterminabilidade, precisamente porque este contrato vai contra a vida dos trabalhadores, vai contra a estabilidade do emprego...

Com certeza! Não são vítimas dessa instabilidade, mas são os trabalhadores!

E é por isso mesmo que este diploma, para além de violar a Constituição da República Portuguesa, tem outro vício: viola também as normas da OIT, que tem vindo a pugnar pela consagração de trabalho decente!

E isto que aqui está não é trabalho decente.

O PCP apresentou mais de 40 propostas de alteração, entre as quais se encontravam propostas  que previam importantes restrições à precariedade do emprego.

Nem uma dessas propostas foi aceite pelo Partido Socialista. É melhor tirarem o S do vosso nome, porque não são um partido socialista.

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