Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

"A solução na defesa dos interesses nacionais é a da nacionalização do Novo Banco"

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Sr. Presidente, peço à minha bancada para aplaudir mas não se levantar, que não é caso para tanto!
Risos do PCP.
(…)
Sr. Primeiro-Ministro, apresentou hoje aqui as linhas gerais da proposta do Governo para o debate do Programa Nacional de Reformas. Não vamos aqui trabalhar à peça, até porque haverá, nas próximas semanas, vários agendamentos que permitirão que na Assembleia da República se possa aprofundar este debate.
Trata-se de um debate que não poderá deixar de ser realizado também em articulação com o previsto Programa de Estabilidade. Um e outro, é bom não esquecermos, são programas que na sua origem têm a intenção de a União Europeia assegurar as suas imposições, no âmbito do chamado Semestre Europeu — instrumento de aberta interferência e ingerência na definição das políticas macroeconómicas dos Estados —, imposição que tem sido em grande medida a origem dos graves problemas económicos e sociais que o País enfrenta e de que o Governo anterior, do PSD e do CDS, foi um entusiasta executor.
O relatório da Comissão Europeia para 2016 contém já motivos de séria preocupação e percebe-se que o rumo que a Comissão Europeia desejaria continuar a impor é o mesmo que nos trouxe os problemas que hoje enfrentamos e, por isso, o rumo contrário àquele que o País necessita, o de respostas a problemas estruturais que o atingem, particularmente no plano económico e social.
Tendo presente a posição que temos afirmado quanto a todo o enquadramento do Programa Nacional de Reformas e do Programa de Estabilidade, a sua natureza e objetivo, reafirmamos que, na perspetiva do PCP, o que antes de mais se coloca é a garantia do desenvolvimento soberano com uma política liberta de imposições externas, a recuperação dos instrumentos de controlo público de setores essenciais, a promoção do desenvolvimento nacional e que seja capaz de pôr Portugal a produzir a ritmos que não podem ser os da última década e meia.
Uma política que dê resposta aos problemas do desemprego, da precariedade, da pobreza, da dependência externa do País e que encontre respostas para a contínua transferência anual de milhares de milhões de euros em juros da dívida pública, libertando meios e recursos financeiros que possam ser dirigidos ao investimento público e produtivo, ao apoio aos setores produtivos e ao desenvolvimento social.
Essas são questões que, julgamos, devem continuar a merecer a prioridade das nossas preocupações e devem ser centrais nesse debate. Por isso, gostaríamos de saber qual a perspetiva que o Governo tem sobre elas e como as enquadra no debate que hoje aqui fazemos.
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Conforta ouvi-lo dizer isso. E, de facto, é verdade; o retrato que ali está, desta política de exploração e empobrecimento a que os portugueses assistiram e foram vítimas, particularmente, nestes últimos quatro anos, é dramático.
Mas aquilo que não nos descansa é a conclusão da Comissão Europeia que, depois de fazer esse diagnóstico, diz que a receita é a mesma e que vai ter de continuar a ser aplicada. Ora, há aqui uma contradição que, com certeza, vai ser clarificada, mais cedo do que tarde.
Sr. Primeiro-Ministro, uma outra questão tem a ver com o seguinte: já várias vezes trouxemos a estes debates os problemas da banca e já anteriormente ficou demonstrado que a gestão da banca se tem caracterizado por uma estratégia que visa a distribuição máxima e rápida dos dividendos pelos grandes acionistas. Em consequência, os bancos privados estão cada vez menos virados para o apoio à economia e à sociedade e cada vez mais orientados para a evasão fiscal e o branqueamento de capitais, continuando a especular e delapidando a utilidade social das poupanças dos cidadãos.
Muitos portugueses interrogam-se sobre quantas mais falências de bancos terão de ocorrer, quantos mais milhares de milhões de euros é preciso o Estado português injetar nesses bancos, até que se tomem medidas sérias e eficazes para que este instrumento fundamental para o desenvolvimento do País seja colocado, de vez, ao serviço da economia nacional e das famílias portuguesas.
Entretanto, insiste-se na defesa de uma solução que, sabe-se, não resolve nenhum problema, antes pelo contrário, apenas cria condições para que surjam novos e mais graves problemas.
A questão que quero colocar-lhe tem a ver com o facto de insistirem, mais uma vez, em vender um banco nacional, estando anunciada para amanhã uma primeira ronda de contactos em Nova Iorque, visando a venda do Novo Banco.
Esta decisão, como sabemos, não está desligada do quadro da submissão às imposições da Comissão Europeia e do BCE, que defendem a concentração do chamado «mercado financeiro europeu» nas mãos de meia-dúzia de megabancos europeus.
No desenvolvimento desse processo, assume particular atualidade o conjunto das questões para as quais o PCP chamou a atenção, aquando da criação do Mecanismo Único de Resolução, isto é, as consequências da concretização da gigantesca operação de concentração e centralização do setor bancário na União Europeia e a perda pelos Estados dos poucos ou quase nenhuns poderes de controlo, de regulação e de intervenção sobre a banca, que ainda detinham.
O que se prepara com mais esta operação da venda do Novo Banco é mais um passo no sentido da concentração bancária nas mãos de grupos estrangeiros, o que põe em causa a soberania do País.
Mantém-se o problema, já anunciado pela atual administração, do despedimento dos trabalhadores, cujos interesses vão ser atingidos porque perdem os seus postos de trabalho, mas também se dificulta o desenvolvimento da atividade de um banco sob o controlo público do Estado português.
Sr. Primeiro-Ministro, como temos afirmado, a vida tem vindo a confirmar que não haverá banca nacional se não for pública. E não o dizemos para registo de memória futura, pois ainda há tempo e solução. Para nós, a solução que vai ao encontro da defesa dos interesses nacionais é a da concretização da nacionalização, em definitivo, do Novo Banco.

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