Intervenção de António Filipe na Assembleia de República

Sobre o veto presidencial ao Decreto da Assembleia da República (Transportes Públicos do Porto)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
O veto político exercido pelo Sr. Presidente da República ao Decreto, aprovado nesta Assembleia, que determina a natureza pública das empresas concessionárias dos transportes públicos do Grande Porto, suscitou a nossa perplexidade. O Decreto vetado pôs termo a uma negociata ruinosa para as populações e para o erário público, à custa dos transportes públicos do Porto.
O Sr. Presidente da República discorda da opção maioritariamente assumida pelo Parlamento — e manifestou-o através do veto político —, não estando em causa, como o próprio reconhece na mensagem que acompanhou o veto, qualquer questão de constitucionalidade, mas, antes, uma intervenção legislativa que o Sr. Presidente considera que é indesejável. Considera o Sr. Presidente que o regime aprovado representa uma politicamente excessiva intervenção da Assembleia da República no espaço de decisão concreta da Administração Pública, condicionando a futura opção do Governo. Considera que, em homenagem à separação de poderes, o legislador não deve intervir em decisões concretas da Administração Pública. Competiria ao Governo, enquanto órgão superior da Administração Pública, queixar-se de uma eventual intromissão do poder legislativo nas suas atribuições. Mas não só não se queixa, como o texto aprovado na Assembleia da República contou com os votos favoráveis dos Deputados do próprio partido do Governo. O veto presidencial foi, assim, exercido em nome das dores do Governo, que o Governo não tem e de que nem se queixa. Num processo em que o Presidente da República usa o veto político contra uma lei aprovada no Parlamento em nome de razões de queixa do Governo, que o Governo não tem, se alguém aqui falta à homenagem devida à separação de poderes não é, certamente, a Assembleia da República.
Invoca, também, o Sr. Presidente da República a necessidade de respeitar a autonomia do poder local. Não há aqui, porém, nenhum problema que envolva esse princípio constitucional, na medida em que a eventual participação das autarquias na exploração de transportes urbanos decorre exclusivamente de ato legislativo do Governo ou da Assembleia da República. Em todo o caso, em nada nos repugna, e por isso apoiaremos, a inclusão na lei de uma obrigatoriedade de audição das autarquias locais, sempre que esteja em causa qualquer decisão do Governo quanto à subconcessão ou à alienação de participações das empresas concessionárias dos transportes públicos do Porto. Que não seja esse o problema! O que para o PCP é essencial — reafirmamos, sem equívocos — é que os transportes públicos urbanos devem ser garantidos por entidades públicas que estejam exclusivamente ao serviço das populações e que respondam, perante o poder político democrático, pela qualidade do serviço público que prestam. Os transportes públicos devem servir as populações e prosseguir o interesse público, não devem ser um negócio de privados, feito à custa do erário público, da degradação dos serviços prestados, das condições de laboração nas empresas e de aumentos tarifários, a suportar pelos utentes. O dinheiro dos contribuintes deve servir para garantir serviços públicos de qualidade e acessíveis à generalidade da população. Não deve servir, como pretendia o Governo PSD/CDS, para transferir milhões de euros dos contribuintes para aumentar os lucros de empresas privadas que, sendo concessionárias de serviços públicos, mais não visam do que aumentar os lucros dos seus acionistas.

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