Declaração de Bruno Dias, Deputado e Membro do Comité Central, Conferência de Imprensa

Sobre os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP

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1. No momento em que se iniciam os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP, o PCP promove esta Conferência de Imprensa para apresentar publicamente as suas prioridades para o trabalho desta Comissão, seja em relação à lista de personalidades a ouvir, seja quanto aos documentos que considera essenciais serem compilados para análise, seja ainda quanto a outras diligências de diferente natureza.

Antecipando o que a seguir se vai expor, o PCP entende que os recentes dados vindos a público – seja a compra da TAP com dinheiro da própria TAP, seja a remuneração à margem da lei de diversos administradores – exigem alargar esta comissão de inquérito à última privatização da TAP. É isso que iremos propor novamente.

Queremos apurar tudo quanto há apurar sobre os 500 mil euros de Alexandra Reis. Mas não podem ficar por apurar as responsabilidades sobre um processo de privatização que provocou um rombo na TAP de centenas de milhões de euros, sobretudo quando se prepara nova privatização. Requeremos a apresentação de documentação sobre os negócios da compra de aviões, sobre as remunerações de gestores nos últimos dez anos, sobre os negócios que o accionista privado fez com TAP beneficiando a Atlantic Gatetway. Queremos ouvir os ex-ministros e actuais ministros do PSD, do CDS e do PS que caucionaram estas opções, David Neeleman e Humberto Pedrosa, os responsáveis da UE que impuseram o plano de reestruturação, os representantes dos trabalhadores.

2. Esta Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP tem na sua origem a revelação pública de que o despedimento de uma administradora resultou num prejuízo de cerca de 500 mil euros para o erário público. Entretanto vieram também a público informações que dão conta de que a TAP terá sido comprada com dinheiros da própria TAP, através da manipulação do processo de compra de aviões, e também de que os administradores privados da empresa terão sido remunerados à margem do Relatório e Contas da própria empresa, entre vários outros aspectos de um processo mais vasto que contou com a cumplicidade dos Governos do PSD/CDS e do PS e lesou profundamente a TAP.

Se já antes era difícil compreender que o inquérito se limitasse a avaliar o processo de despedimento de uma administradora, agora torna-se impossível admitir que tal aconteça. Não é admissível que se investigue um despedimento que custou 500 mil euros ao erário público e, ao mesmo tempo, se feche os olhos aos prejuízos provocados pelo último processo de privatização da TAP que podem chegar aos 1 000 milhões de euros.

O PCP irá, por isso, propor o alargamento do âmbito da Comissão de Inquérito ao último processo de privatização. Depois de conhecidos os escândalos relativos à compra dos aviões e às remunerações dos administradores privados da TAP, certamente que PS e BE não repetirão a recusa a essa proposta apresentada pelo PCP aquando da constituição da Comissão de Inquérito e ela terá, agora, condições de ser aprovada para que nenhuma responsabilidade fique por apurar em tudo quanto possa ter prejudicado a TAP, o erário público e o interesse nacional.

Além disso, há um conjunto de aspectos que devem merecer especial destaque no apuramento a fazer, com reflexos nas personalidades a ouvir e nos documentos a recolher pela Comissão de Inquérito.

3. É objecto da Comissão de Inquérito apurar a prática na TAP quanto a remunerações e desvinculações dos membros dos órgãos sociais da TAP. Para que esse apuramento seja feito com rigor é essencial que se conheçam com detalhe quais foram, ao longo dos últimos 10 anos, as práticas, critérios e decisões da TAP neste âmbito. Para que não fiquem responsabilidades por apurar é essencial que seja apurado o que aconteceu nos últimos 10 anos, sabendo-se que muito do que aconteceu não pode acontecer numa empresa pública e só acontece na TAP porque PS e PSD impuseram uma excepção na lei, permitindo que a TAP seja gerida como se de uma empresa privada se tratasse. Para que não fiquem responsabilidades por apurar é essencial que se perceba por que motivo foi o período em que a TAP foi gerida por privados (2015 – 2020) aquele em que se praticaram as maiores ilegalidades no capítulo das remunerações dos órgãos sociais e em que mais dinheiro foi desviado da TAP para essas remunerações.

É igualmente objecto da Comissão de Inquérito avaliar as decisões de gestão da TAP que possam ter lesado os interesses da companhia e, logo, o interesse público e as responsabilidades da tutela nessas decisões. Para que essa avaliação seja feita com rigor é essencial que se conheça com detalhe a verdadeira situação em que a empresa se encontrava no início de 2020 e o impacto das decisões tomadas no âmbito do processo de reestruturação imposto pelo Governo e pela União Europeia entre 2020 e 2022. Para que não fiquem responsabilidades por apurar é essencial que se conheçam todos os motivos que levaram ao buraco nas contas da TAP exposto pela pandemia, sobretudo depois de se saber que esse buraco foi aberto com a privatização de 2015 e a tomada de decisões que prejudicaram a TAP para beneficiar a outra empresa do mesmo dono , decisões essas que se somaram aos prejuízos provocados por anteriores processos de privatização, pela compra da Manutenção Brasil e pela privatização da ANA, bem como pelas opções das tutelas que impuseram, a todas as administrações da TAP até 2015 e após 2019, o objectivo de preparar a TAP para ser vendida.

E não é possível apurar as responsabilidades da tutela no processo de reestruturação sem compreender o papel da Comissão Europeia.  Qual a razão de terem sido impostas à TAP regras diferentes das que foram acordadas com as grandes companhias europeias de aviação aquando da pandemia? Porque razão não são permitidos apoios públicos à TAP que são facilitados às empresas privadas? E como avaliar a decisão do Governo PS de indemnizar David Neeleman em 55 milhões de euros sem perceber se o mesmo governo sabia ou não da fraude que esteve na origem da compra da TAP com dinheiros da TAP?

Esta Comissão de Inquérito tem pela frente muitos obstáculos a superar para poder cumprir os seus objectivos, desde logo os que resultam da total opacidade da gestão privada, mesmo quando a propriedade é pública. Será necessário que a Comissão de Inquérito vença essa opacidade – alimentada pelas cláusulas de confidencialidade – que impede a transparência e facilita o crime. Toda a gente sabe que quem comprou a TAP foi David Neeleman, no entanto, no recato dos relatórios confidenciais e dos acordos parassociais secretos, todas as instituições, desde a ANAC à Comissão Europeia, passando pelos Governos, fingiram que quem comprava era Humberto Pedrosa, para assim se cumprir a directiva europeia. É essa prática de opacidade, de quem necessita de se esconder da lei e das instituições públicas, que depois gera o pagamento de indemnizações gigantescas aos quadros superiores das empresas privadas como aconteceu com Alexandra Reis, mas também com os CEO da EDP, da GALP ou da PT.  É preciso que, no decorrer do inquérito, se reflicta sobre os reais impactos e implicações de tal opacidade e nos mecanismos eficazes para a combater e impedir.

4. O PCP intervirá para que esta Comissão de Inquérito não seja um mero estendal de casos, passando ao lado das questões de fundo que lesaram profundamente a TAP e o erário público. O PCP não contribuirá para que esta Comissão de Inquérito seja mais um instrumento da campanha contra a TAP visando a sua entrega a uma multinacional estrangeira. E procurará ainda intervir  nesta Comissão de Inquérito para ajudar a eliminar a maior das mistificações montadas contra a TAP: a de que esta é um sorvedouro de dinheiros públicos, quando representa para o País um instrumento de criação de riqueza, coesão e soberania nacional.
 

Comissão de Inquérito à TAP

Documentos que pretendemos sejam fornecidos à Comissão de Inquérito

  • Informação detalhada da TAP SGPS sobre todas as saídas de administradores e directores da TAP nos últimos 10 anos, se houve lugar ao pagamento de indemnização por essas saídas, e se esses administradores e directores mantêm ainda alguma remuneração ou benefício.
  • Documentação referente a todo o processo de aquisição pela TAP dos 53 A330 e de dispensa da opção de compra de 10 A350, incluindo: todos os contratos assinados entre as partes (TAP, Airbus e Atlantic Gateway); todos os pareceres e memorandos jurídicos elaborados para apoiar a TAP, o Governo e a Parpública neste processo no quadro da privatização da TAP e depois; a nota legal de 11 de agosto de 2022 da SLCM, entregue à TAP, bem como a nota de síntese e todos os memorandos e pareceres anexos.
  • Informações detalhadas da TAP SGPS sobre todas as remunerações dos membros do Conselho de Administração da TAP nos últimos 10 anos, incluindo salários, prémios, regalias, e incluindo as que foram disfarçadas de prestação de serviços externas, bem como toda a documentação que permita aferir da legalidade dessas remunerações e da eventual responsabilidade política da sua atribuição.
     
  • Relatórios e Contas da TAP SGPS, dos últimos 10 anos, incluindo a informação existente sobre 2022
  • Informação da Segurança Social sobre as receitas originadas nos últimos 10 anos para a Segurança Social Portuguesa das seguintes empresas e seus trabalhadores: Grupo TAP (TAP SA, SPDH, Portugália, Cateringpor, Megasys, UTS); Ryanair.  
  • Informação da Administração Tributária sobre as receitas de IRS originadas nos últimos 10 anos nos trabalhadores das seguintes empresas: Grupo TAP (TAP SA, SPDH, Portugália, Cateringpor, Megasys, UTS); Ryanair.
  • Informação da Administração Tributária sobre as receitas fiscais originadas nos últimos 10 anos pelas seguintes empresas: Grupo TAP (TAP SA, SPDH, Portugália, Cateringpor, Megasys, UTS); Ryanair.
  • Informação do Turismo de Portugal do volume de apoios distribuídos nos últimos 10 anos pelas seguintes empresas: Grupo TAP (TAP SA, SPDH, Portugália, Cateringpor, Megasys, UTS); Ryanair.
  • Informação sobre o volume de indemnização paga aos distintos accionistas da TAP SGPS no quadro da capitalização da empresa pelo Estado na sequência da pandemia de Covid-19.
  • Toda a documentação referente ao processo de reestruturação da TAP acordado entre o Governo português e a Comissão Europeia;
  • Resumo, por cada um dos últimos 10 anos, dos pagamentos realizados às consultoras Syburi e Boston Consulting Group.
  • Todos os protocolos, memorandos, contratos ou acordos assinados entre o Governo e a Atlantic Gateway;

Pessoas que pretendemos ouvir:

  • Alexandra Reis – ex-administradora da TAP, ex-Presidente do CA da NAV, ex-Secretária de Estado do Tesouro
  • Christine Ourmières-Widener – CEO da TAP
  • Miguel Frasquilho – ex-Presidente do CA da TAP
  • Ramiro Sequeira – Administrador e anterior CEO da TAP
  • Pedro Nuno dos Santos - Ministro das Infraestruturas entre 2019 e 2023
  • Pedro Marques - Ministro das Infraestruturas entre 2015 e 2019
  • Pires de Lima – Ministro da Economia entre 2013 e 2015
  • Sérgio Monteiro – Secretário de Estado das Infraestruturas, Transportes e Comunicações entre 2011 e 2015
  • Margrethe Vestager – Comissária Europeia que tratou da reestruturação da TAP
  • Violeta Bulc – Comissária Europeia que assumiu que a privatização da TAP estava legal  
  • José Luís Arnaut  - Presidente da ANA
  • David Neeleman
  • Humberto Pedrosa
  • Paulo Duarte – Dirigente do SITAVA
  • Tiago Lopes – Dirigente do SPAC
  • Ricardo Penarróias – Dirigente do SNPVAC
  • Cristina Carrilho – Presidente da Comissão de trabalhadores da TAP
  • Luís Laginha de Sousa – Presidente da CMVM
  • Luís Ribeiro – Presidente da ANAC
  • Jaime Serrão Andrez – Presidente da Parpública
  • Maria de Fátima Castanheira Cortês Geada – ex-Presidente do Conselho Fiscal da TAP
  • Economia e Aparelho Produtivo
  • Assembleia da República
  • Comissão de Inquérito
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  • TAP