Declaração de Edgar Correia, membro da Comissão Política do Comité Central, Conferência de Imprensa

Sobre a situação política e social

A Comissão Política do PCP, ontem reunida, destaca na análise da presente situação política e social os seguintes aspectos:

Enquanto o Governo e o partido que o suporta cultivam a imagem do "optimismo" e da "auto - satisfação" Maastrichtiana, aqui e além já pontuada por marcas de arrogância, os sinais que provêm do país real traçam um quadro económico e social bem mais sombrio e inquietante.

As expressões que traduzem um profundo mal-estar social multiplicam-se. E estão em desenvolvimento formas de intervenção e lutas em torno de objectivos muito diversos.

Movimentam-se os trabalhadores, os estudantes, os agricultores. Fazem ouvir a sua voz as populações, em torno de problemas inadiáveis. E a estrutura produtiva nacional, em particular muitas pequenas e médias empresas, dão sinais de que as suas dificuldades estão a ultrapassar todos os limites.

A Comissão Política do PCP alerta em relação à deterioração da situação económica e social do país a que a política do actual Governo do PS está a conduzir, na continuidade, nos aspectos essenciais, da orientação seguida pelos governos anteriores da responsabilidade do PSD.

Constituiria um grave erro de apreciação que o PS confundisse o que se passa a nível institucional, onde o PSD e o PP não encontram motivos de discordância de fundo com a política que o Governo tem vindo a realizar e que por isso se confinam a uma oposição "faz-de-conta", com a situação real do país e a profundidade e seriedade dos problemas com que os portugueses estão confrontados.

Que não venha o PS, que está a levar por diante uma política que serve os interesses do grande capital e que satisfaz a direita, a reclamar apoios à esquerda e dos trabalhadores quando o tempo das suas aflições políticas novamente chegar.

O PCP, que dentro de poucas semanas irá realizar o seu XV Congresso, assume nas presentes circunstâncias da vida nacional o propósito de uma redobrada intervenção.

Intervenção no plano político directo, através de uma mais dinâmica comunicação com a sociedade portuguesa e do desenvolvimento de novas iniciativas.

Intervenção na esfera social, apoiando e animando as mais diversas expressões de luta e de reivindicação, em torno de problemas e com objectivos concretos, e actuando para a sua objectiva convergência.

Intervenção, também, ao nível das instituições, potenciando a acção do grupo parlamentar e dos autarcas do PCP, em íntima ligação com os problemas e as movimentações dos trabalhadores, da juventude, dos agricultores, e das populações.

A actualização das pensões da Segurança Social ontem anunciada pelo Governo justifica uma apreciação muito crítica por parte do PCP.

É conhecido que o baixíssimo nível da grande maioria das pensões da Segurança Social constitui um dos mais graves problemas sociais com que os portugueses estão confrontados. Na realidade, mais de dois terços do total de pensionistas de velhice e de invalidez do Regime Geral (contributivo) da Segurança Social, abrangendo um milhão 650 mil beneficiários, recebem presentemente pensões inferiores a 30 contos por mês. E elevam-se a cerca de 90% os pensionistas que auferem valores inferiores a 50 contos por mês.

Vir agora o governo do PS anunciar uma actualização do Regime Geral de apenas 3,3%, um valor semelhante ao da inflação verificada no presente ano, significa que de facto e acima da pensão mínima, os pensionistas não vão ter quaisquer aumentos reais de pensões.

Quanto à pensão mínima do Regime Geral e à pensão social importa sublinhar que a actualização anunciada pelo Governo não ultrapassa o ridículo montante de 37$00 e 34$00 por dia, respectivamente.

A Comissão Política do PCP considera, por isso, que o país está perante decisões que representam uma profunda injustiça social e uma flagrante violação dos compromissos que o PS inscreveu no programa eleitoral e posteriormente no programa do actual Governo.

O Governo anunciou também uma actualização extraordinária na faixa dos pensionistas que, cumulativamente, tenham 75 ou mais anos de idade, tenham descontado durante 24 anos ou mais e recebam pensões de montante inferior a um salário mínimo. Trata-se evidentemente de uma medida de carácter positivo, embora de alcance muito limitado e de expressão efectivamente modesta e que no essencial visa encobrir o facto da grande maioria dos pensionistas do Regime Geral não beneficiar de qualquer aumento real do valor das pensões.

Não se compreende que pensionistas com uma longa carreira contributiva e que auferem pensões muito degradadas tenham que esperar pelos 75 anos - que muitos infelizmente não atingem - para ver um pouco minorada a situação de profunda injustiça em que foram lançados. Dir-se-ia que o Governo está à espera que muitos pensionistas desapareçam para lhes reconhecer, tarde de mais, o seu direito a uma pensão mais digna.

Nesta actualização extraordinária e de alcance limitado, que segundo os números oficiais apenas abrange 40 mil de um total de um milhão e 650 mil pensionistas, não parece difícil descortinar um propósito propagandístico do Governo. E a pretensão de desviar as atenções da opinião pública das decisões fundamentais que adoptou no sentido de em 1997 não haver aumento do valor real das pensões para a grande maioria dos pensionistas.

O facto destas decisões de não aumento do valor real das pensões ocorrer na mesma altura em que o Governo, cedendo às pressões das multinacionais farmacêuticas, procedeu a um significativo aumento dos preços dos medicamentos (e em que um terço dos comparticipados, que têm preços até 1.000$00, registaram uma subida de 8%), esclarece outra faceta de uma política com dois pesos e duas medidas: por um lado, são ratados os benefícios sociais; por outro lado, são inteiramente satisfeitos os grandes interesses que se dedicam à exploração de necessidades básicas da população.

O PCP defende, quanto ao valor das pensões e reformas, que elas deverão ser anualmente elevadas, de forma a garantir o incremento do seu valor real e a sua efectiva revalorização, devendo esse aumento incidir prioritariamente sobre as pensões mais baixas.

A justeza do princípio de que as pensões mais baixas devem beneficiar de uma actualização superior às restantes, que o PCP há muito sustenta, não deve significar que haja pensionistas, embora em número reduzido, que vejam diminuídas as suas pensões.

O PCP assume com clareza o objectivo, cuja aplicação é recomendada pela Organização Internacional do Trabalho, de que as pensões e reformas mínimas não sejam inferiores a 60% do salário mínimo nacional. E proclama a necessidade de uma política que garanta efectivamente os direitos adquiridos a todos os beneficiários da Segurança Social, bem como o rigoroso respeito pelos direitos em formação por parte de todos os contribuintes da Segurança Social.

A Comissão Política do PCP pronuncia-se firmemente contra a conjugação de posições e atitudes recentes que visam pôr em causa a credibilidade e a independência das magistraturas e, em particular, do Ministério Público, um dos mais importantes esteios da defesa da legalidade democrática.

O PCP declara-se clara e firmemente contra fugas de informação que violam o segredo de justiça, permitindo "julgamentos" por via mediática que podem por em causa a presunção de inocência dos arguidos em processo criminal. Esta questão deveria ser colocada, aliás, não só a respeito de casos que envolvem figuras conhecidas da área política e do mundo dos negócios, mas também a propósito de arguidos pertencentes a outras classes e camadas sociais mas que não têm possibilidades de recorrer às mesmas armas de defesa.

O PCP admite que seja necessário repensar o alcance do regime geral do segredo de justiça, tendo em conta os novos fenómenos que se verificam e a diversidade de valores a proteger.

No entanto é manifestamente descabido que a presunção de inocência afaste a necessidade de um pleno apuramento da verdade em todos os casos submetidos à apreciação dos tribunais.

As acusações de Proença de Carvalho atribuindo exclusivamente as fugas de informação ao Ministério Público e de Freitas do Amaral responsabilizando por elas a Procuradoria Geral da República são particularmente graves, na medida em que não são acompanhadas de qualquer fundamentação minimamente credível. Para além dos seus objectivos imediatos, elas indiciam uma campanha cujas finalidades políticas ficaram bem patentes no facto de Proença de Carvalho ter defendido, uma vez mais, que o Ministério Público perca a sua independência e fique colocado na dependência do Governo, onde se tornaria um alvo mais fácil para aqueles que pretendessem influenciar as suas decisões.

O PCP considera que seria dever de personalidades com responsabilidades públicas absterem-se de posições que, objectivamente, possam aparecer perante a opinião pública como formas de pressão sobre o funcionamento independente da justiça ou até como promotoras da perda de confiança na isenção e imparcialidade dos magistrados nos casos em que estão envolvidas figuras de grande destaque na vida política e no poder económico.