Nota da Comissão Nacional do PCP para as Questões da Educação e Ensino

Sobre o projecto de Decreto-lei que altera o regime Jurídico de Autonomia, Administração e Gestão dos Estabelecimentos Públicos da Educação Pré-Escolar e dos Ensinos Básico e Secundário

Encontra-se em consulta pública até ao próximo dia 31, o projecto de decreto-lei que define o novo Regime Jurídico de Autonomia, Administração e Gestão dos Estabelecimentos Públicos da Educação Pré-escolar e dos Ensinos Básico e Secundário. São quatro as questões mais relevantes que sustentam o chumbo do PCP ao projecto do Governo PS.

1. O conjunto das alterações que o Governo PS se prepara para introduzir na gestão das escolas do ensino não superior, constitue mais uma peça de um puzzle que tem vindo a ser construído nestes últimos dois anos e meio, cujo objectivo final é uma reconfiguração do nosso sistema educativo. Desde há muito que ficou clara a intenção do Governo de alterar substancialmente aquelas que são as linhas mestras da Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovada em 1986 na Assembleia da República, em torno da qual foi construído um amplo consenso a todos os níveis, político, social e ainda na comunidade educativa.

É neste sentido que fazemos uma leitura crítica da política de encerramentos de escolas, da profunda alteração imposta ao Estatuto da Carreira Docente, da sistemática desvalorização da profissão e dos profissionais docentes e não docentes, do modelo, também imposto, de Avaliação de Desempenho de Professores, das alterações curriculares e da reorganização no 1º ciclo do Ensino Básico e da perspectiva de alargamento do regime de mono-docência ao seu 2º ciclo, bem como do projecto governamental de municipalização de todo o Ensino Básico com transferências de competências que as autarquias, como forma de desresponsabilizar o Governo das suas incumbências constitucionais na área do ensino e educação.

2. O conjunto de alterações, muitas delas em completo desrespeito pela Lei de Bases e algumas delas de constitucionalidade duvidosa, é o prelúdio para o surgimento, em breve, de uma proposta global de alteração dessa Lei estruturante para o sistema educativo, agora com o argumento de que se trata de uma adequação ao que já está implementado no terreno. Desta forma o Governo PS e a maioria política que o suporta na AR, fogem a um debate nacional que poderia ter, como conclusão, a recusa de muitas das medidas que têm vindo a ser implementadas. É assim no ensino não superior, mas também no ensino superior, como se pode verificar no novo Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior imposto pelo Governo e Grupo Parlamentar do PS na AR.

Entretanto chamamos a atenção para o facto de ter sido aprovado na Madeira um regime jurídico sobre a gestão das escolas muito semelhante e que o Tribunal Constitucional considerou inconstitucional.

3. Sobre algumas medidas apontadas no projecto importa desde logo salientar o facto do mesmo amputar o que resta da participação democrática na vida das escolas. Ao impor uma direcção uni-pessoal – o Director da Escola – e um Conselho Geral em que para além da diminuição do peso dos professores, trabalhadores não docentes e, nas escolas do ensino secundário, dos estudantes, interdita a sua presidência aos docentes e não docentes, numa clara desvalorização do papel daqueles que vivem o quotidiano escolar. O Governo abre, assim, caminho a um controlo ainda mais apertado, por parte do Ministério da Educação sobre tudo o que se passa na escola, na linha do que tem vindo a acontecer com medidas anteriores. Esta sua intenção e as propostas que apresenta nesse sentido são o desmentido mais evidente de um discurso sobre autonomia que tem vindo a encher-lhe a boca.

4. O Governo tem afirmado que este projecto encerra três grandes objectivos: reforçar a autonomia das escolas; reforçar a participação das famílias e criar lideranças fortes. Nada mais falso!

São vários os pontos do projecto que apontam inequivocamente para a perda de autonomia. Desde logo a existência de um Director (cargo uni-pessoal não eleito colegialmente), no qual recai toda a responsabilidade da direcção da escola; o facto de o Ministério poder, quando entender, demitir esse director; o facto de não atribuir ao Conselho Geral mais nenhuma responsabilidade além daquelas que as Assembleias de Escola têm actualmente. Entre outras, estas são medidas essenciais para o objectivo estratégico do Governo PS que é, de facto, governamentalizar ainda mais a vida das escolas. Não é irrelevante para a concretização deste objectivo, o facto de ser o Director a nomear todos os órgãos de gestão intermédios da escola e, por essa via, nomear o essencial do Conselho Pedagógico.

Também no que respeita à participação das famílias descobre-se uma grande dose de cinismo. Desde logo porque uma das principais causas, se não a primeira, do abandono e do insucesso escolares, se encontra nas condições sócio-económicas da grande maioria das famílias portuguesas que se tem agravado muito com a acção do Governo PS, contribuindo ainda mais para o afastamento dos pais da participação na vida da escola.

Por último, não está demonstrado a não ser por alegados «estudiosos» ao serviço do Ministério da Educação, que a condição prévia para a existência de lideranças fortes seja acabar com direcções colegiais e substitui-las por cargos uni-pessoais. Aliás, os trabalhos de avaliação externa realizados pela Inspecção Geral de Educação durante o ano lectivo de 2006/2007, não sustentam o projecto do Governo. O que o Governo sabe, mas isso não diz, é que, desta forma, com o regresso ao “velho director”, será muito mais fácil ao Ministério determinar a gestão das escolas, exercendo um controlo directo sobre o Director que pode, em qualquer momento, ser demitido pelo titular da pasta da Educação. E continua o ME a falar de autonomia das escolas!...

Este projecto evidencia as intenções do Governo e do PS que trocam a prevalência de critérios pedagógicos por uma direcção e gestão impositiva, burocratizada e autoritária, esquecendo que a escola deve ser uma conjugação de esforços e não palco de conflitos e que só a abnegação e empenho de docentes e funcionários com a sua participação criativa, consegue, em muito casos, fazer funcionar escolas com significativas insuficiências. E esquece que o papel essencial da escola é ser um espaço de aprendizagem e, como tal, um espaço de participação democrática.

Para o PCP é imperioso aplicar-se o princípio constitucional da gestão democrática, segundo o qual os órgãos directivos das escolas devem ser legitimados democraticamente, de forma a acolherem o pluralismo de interesses e opções dos vários componentes da comunidade escolar, garantindo-se desta forma a autonomia das escolas.

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