Projecto de Resolução N.º 482/XII-2ª

Sobre o combate à pobreza

Sobre o combate à pobreza

O Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza assinala-se em Portugal num preocupante quadro social marcado pela existência de milhões de portugueses e suas famílias em risco de pobreza, ao mesmo tempo que está em crescimento o número dos que se encontram em situação de pobreza absoluta.

O empobrecimento, a pobreza e a exclusão social estão a crescer e a instalar-se na sociedade portuguesa em relação estreita e direta com o brutal agravamento das desigualdades sociais, do galopante aumento do desemprego, o acentuar dos baixos salários e reformas e a crescente limitação e mesmo exclusão de acesso a importantes apoios e prestações sociais na saúde, na segurança social e no ensino.

As consequências da aplicação do Pacto de Agressão estão a repercutir-se de forma agravada ao longo deste ano: ampliaram-se as situações de fome e de carência alimentar entre a população; aumentaram os casos dramáticos de cortes no abastecimento de serviços de água, luz e gás nas casas de muitas famílias. Cresceram as situações de perda da habitação por impossibilidade em cumprir com os respetivos compromissos, originando situações de entrega do respetivo imóvel ao banco ou de ações de despejo. À falta de condições financeiras das famílias, sucedem os casos de atraso ou não pagamento de creches e lares de pessoas idosas, ou a difícil opção entre comer ou comprar medicamentos. Retomaram-se os livros de venda a fiado.

A fome está cada vez mais presente nos lares de muitas famílias. Muitas delas auferem ainda rendimentos do seu trabalho ou das suas reformas, mas que já não lhes permitem uma vida digna. São exemplos: os cerca de 500 mil trabalhadores que auferem o salário mínimo nacional e que ao final do mês, levam para casa 432 euros; ou os cerca de 1,5 milhões de pensionistas que recebem menos de 500 euros mensais.

A maioria das instituições da área da Acção Social a intervir no terreno confrontam – se todos os dias e cada vez mais com uma dupla realidade: aumentam os pedidos de ajuda, mas faltam condições para responder positivamente a este crescente aumento de pedidos de ajuda social.

Acresce a agudização da escassez e mesmo a ausência de meios públicos – financeiros e humanos – para dar combate ao flagelo da pobreza e da exclusão social, em particular junto dos chamados grupos de risco. São disso exemplos, a falta de apoio às mulheres que pretendem sair das redes de prostituição; o desinvestimento no trabalho junto dos toxicodependentes; a falta de meios técnicos e humanos para detetar e acompanhar as situações de risco de crianças e jovens, de idosos, ou pessoas com deficiência, bem como das pessoas designadas como sem abrigo.

Um empobrecimento refletido no aumento de crianças, jovens e idosos em situações de pobreza que o Conselho da Europa (10 de Julho de 2012) relacionou com o desemprego, os cortes nos salários e nos benefícios sociais. Foi o próprio Comissário dos Direitos Humanos, que visitou Portugal em Maio, que referiu que as medidas de austeridade aplicadas em 2010 e 2011 aumentaram o risco de pobreza entre as crianças e o aumento do número das que dependem de apoios de instituições de caridade e de outras organizações não governamentais. Do mesmo modo, foi referido que os idosos estão a ser penalizados pelos cortes nos benefícios sociais e pelo aumento dos custos com os cuidados de saúde, transportes públicos, alimentação, entre outros.

O atual quadro social para além de problemas imediatos de privação do acesso a alimentos, bens e direitos, está a gerar problemas ao nível da saúde mental. Falta apoio médico ou dinheiro para a compra dos respetivos medicamentos. Aumentam os casos de suicídios. Um quadro social potenciador do aumento de diversos tipos de violência.

O aumento do risco de pobreza está em estreita relação com a destruição, em curso, de importantes funções sociais do Estado. Foram reduzidos na segurança social os valores de importantes prestações sociais - abono de família, subsídio social de desemprego, subsídio de doença, rendimento de inserção social. Ao mesmo tempo que têm vindo a ser impostas alterações legislativas que excluem do acesso a apoios e prestações sociais milhares de portugueses e suas famílias, que são confrontados com uma espiral de empobrecimento, de pobreza e exclusão social. Milhares de trabalhadores e de reformados esgotam o seu rendimento mensal no pagamento da habitação, água, eletricidade e pouco lhes resta para a alimentação. Questões básicas, como óculos ou idas ao médico numa situação de doença passaram a ser um “luxo”.

A realidade nacional confirma que a substituição de direitos económicos e sociais por políticas públicas assistencialistas e caritativas, apresentadas pelo CDS-PP e pelo PSD como a «solução» socialmente justa para apoiar quem mais precisa, corresponde a um grande retrocesso político e social e salda-se por um profundo fracasso porque crescem o número de situações de empobecimento, de pobreza e exclusão social sem qualquer resposta.

Entretanto, o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza é marcado pela apresentação pelo Governo PSD/CDS-PP da proposta de Orçamento do Estado para 2013, alicerçada em elevados níveis de desemprego, numa brutal redução do rendimento disponível das famílias por via da redução dos salários e das reformas e num brutal aumento da carga fiscal em sede de IRS. O que, combinado com o generalizado aumento do custo de vida e novas reduções nas transferências sociais, representa uma deliberada opção política pela acentuação das injustiças e desigualdades na distribuição do rendimento nacional, aumentando o fosso entre a pobreza da maioria da população e a acumulação da riqueza e dos privilégios de uma minoria social – os grupos económicos e financeiros.

Para o PCP a luta contra a gravidade e brutalidade dos fenómenos da pobreza e do empobrecimento em Portugal é indissociável da luta contra a rejeição do Pacto de Agressão e contra o Governo que o executa, e pela exigência da ruptura com a política de direita e por um governo patriótico e de esquerda que assuma como prioridades o desenvolvimento económico e social assente na defesa da produção nacional, na valorização dos salários e das pensões, na promoção das funções sociais do Estado na segurança social, na saúde e no ensino.

O PCP considera, entretanto que são necessárias medidas que respondam ao atual quadro de empobrecimento generalizado da população. Foi com esse objetivo, que apresentou um Projecto de Resolução “Pelo combate ao empobrecimento e à agudização da pobreza entre mulheres”, em 16 de Março de 2012, entre outras iniciativas que visam enfrentar esta realidade.

A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República Portuguesa, recomendar ao Governo:

1-Que proceda de forma urgente ao recenseamento por distrito e que obtenha informação das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira sobre:

a) o número de famílias que deixaram de conseguir pagar as mensalidades nas IPSS para as valências de infância (creche, infantário e ATL) e respetivos montantes;
b) o número de escolas com crianças em situação de carência alimentar e das situações em que os pais têm atrasos no pagamento das refeições;
c) o numero de pessoas e famílias que estão a viver sem água e sem eletricidade por falta de pagamento;

2.Que adote as medidas necessárias para:

a) que as escolas possam dar resposta às situações de carência alimentar;
b) que se garanta o apoio necessário para que as famílias mantenham o fornecimento de água, eletricidade e outros bens essenciais;

3-Que informe ainda a Assembleia da República sobre:

a) a aplicação do Programa de Emergência Social, designadamente sobre os meios financeiros envolvidos, número de instituições que abrangeu e número de pessoas que foram abrangidas, por distrito, por cada uma das suas medidas; quais as instituições envolvidas e o número de pessoas abrangidas, por cada uma das medidas;
b) o modo como foram distribuídas as verbas de apoio ao alargamento das cantinas sociais, o número das que foram apoiadas por distrito, número de refeições apoiadas, indicando quais são os critérios de acesso e as listas de espera existentes.

Assembleia da República, em 17 de Outubro de 2012

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