Sobre a aplicação da Lei da IVG no SNS

 

Sobre a
aplicação da Lei da IVG no SNS e o direito a ser mãe e trabalhadora com direitos
Declaração
de Fernanda Mateus, da Comissão Política do PCP 

 

Um ano após o resultado do Referendo de
11 de Fevereiro, que culminou uma prolongada luta em Portugal contra a
criminalização da interrupção voluntária da gravidez e obrigou a Assembleia da
República a aprovar uma nova lei, assumindo, finalmente, as suas
responsabilidades na defesa da saúde e da dignidade das mulheres, a Comissão
Política do Comité Central do PCP destaca a urgência de dar corpo a novas
políticas que façam   cumprir a lei da
Interrupção Voluntária da Gravidez no Serviço Nacional de Saúde e promovam a
saúde sexual e reprodutiva das mulheres, bem como os direitos das mulheres
enquanto trabalhadoras e mães. .   

Vencer o medo
e a vergonha, favorecer a confiança no SNS 

1. Num contexto marcado por  concepções obscurantistas e conservadoras que
a partir do aparelho de Estado impuseram a clandestinidade, o medo e a vergonha
pela prática de interrupção voluntária da gravidez, cabe às instâncias públicas
e ao Governo do PS a tomada de medidas que favoreçam um clima de confiança no
Serviço Nacional de Saúde por parte das mulheres que necessitem de interromper
uma gravidez, através de uma acção política que tenha como prioridades:  

 

- A divulgação através de diversos
meios, de informação sobre o conteúdo da lei que permita ampliar o seu
conhecimento junto de diversos segmentos da população feminina em todo o
território nacional e que fomente o recurso atempado aos serviços públicos de
saúde; 

     

- A agilização
da articulação dos serviços públicos de saúde na garantia de atendimento
humanizado, celeridade no processo, condições de segurança e privacidade às
mulheres que necessitem de interromper uma gravidez ao abrigo da actual lei e
que incentive práticas contraceptivas que evitem futuras  gravidezes indesejadas;

 

- O incentivo
de  medidas que favoreçam uma maior
capacidade de intervenção dos Centros de Saúde na realização da IVG química,
favorecendo a proximidade do acompanhamento da mulher; 

 

- A avaliação
periódica do número de interrupções realizadas em meio hospitalar e
identificação da natureza das dificuldades e obstáculos ao cumprimento da lei
no Serviço Nacional de Saúde.

 

Serviço
Nacional de Saúde e direitos sexuais e reprodutivos

 

2. Um ano após a realização do
referendo, o PCP assinala a forte instabilidade que se vive na área da saúde
que se reflecte no afastamento das mulheres 
que necessitam de interromper uma gravidez nos serviços públicos.

 

Assiste-se ao alargamento do fosso
entre os direitos inscritos na lei e a insuficiente resposta da maioria dos
Centros de Saúde do país na indispensável acessibilidade das mulheres em idade
fértil a consultas de planeamento familiar e à gratuitidade dos meios
contraceptivos, a par das graves lacunas no atendimento dirigido aos
jovens.   

 

Acentuam-se as desigualdades entre
mulheres, com base na sua origem social 
e local de residência no acesso aos seus direitos em matéria de saúde
sexual e reprodutiva.

 

Ao invés de promover o papel do Serviço
Nacional de Saúde -  no sentido de
garantir a igualdade de direitos de todas as mulheres no acesso a cuidados
médicos qualificados  na gravidez, no
parto e pós-parto; na adequada informação sobre 
planeamento familiar e meios contraceptivos; na prevenção e tratamento
de doenças  do aparelho reprodutor e de
outros problemas ginecológicos - encerraram-se maternidades aumentando o número
de crianças que nascem a caminho dos hospitais.

 

Vinte e quatro anos após a aprovação de
uma lei sobre a educação sexual nas escolas continuam a anunciar-se medidas
que, na prática, estão muito longe de inscrever esta temática numa Escola
Pública de qualidade que contribua para a formação integral do indivíduo. 

 

Ser mãe e
trabalhadora com direitos

 

3. O direito de ser mãe e ser pai é uma
opção livre, consciente e responsável, que implica o direito a determinar o
momento e o número de filhos que se desejam e a partilha de deveres e
responsabilidades entre os progenitores na garantia do afecto, da segurança e
desenvolvimento da criança. Um direito que implica também que as entidades
patronais assegurem o cumprimento dos direitos de maternidade e paternidade das
trabalhadoras e trabalhadores, cabendo ao Estado promover a fiscalização do seu
cumprimento, a partir dos locais de trabalho. Ao Estado cabe cumprir e fazer
cumprir importantes preceitos constitucionais quanto à garantia de
independência económica e social dos agregados familiares, a uma mais justa repartição
do rendimento nacional em favor dos salários 
dos trabalhadores e trabalhadoras, à criação de uma rede pública de
equipamentos sociais de apoio à família e à criança, de qualidade e a preços
acessíveis.

 

Ao arrepio destes princípios e direitos
o Governo do PS  impõe um modelo
económico assente num forte desemprego e na precariedade laboral ao mesmo tempo
que anuncia falsas medidas de promoção da natalidade e apela ao nascimento de
mais bebés.

 

Em resultado do incumprimento dos
direitos de maternidade e da premeditada ineficácia dos organismos
fiscalizadores  as mulheres trabalhadoras
são penalizadas em função da gravidez e do apoio à família.                        .      

 

A ruptura com uma divisão do trabalho
que confinava as mulheres ao trabalho doméstico e aos filhos e os homens à
actividade profissional não é acompanhada pela ruptura que socialmente atribui
às mulheres responsabilidades especiais na maternidade e no apoio aos filhos e
à vida familiar. 

 

Uma realidade que tenderá a agravar-se
com as medidas em curso pelo Governo do PS na área laboral. O ataque à
contratação colectiva, a imposição dos despedimentos sem justa causa e a
eliminação dos limites diários dos horários de trabalho, num quadro de forte
precariedade laboral e do uso dos contratos individuais de trabalho permitem a
desresponsabilização das entidades patronais para com a renovação das gerações
representando um sério recuo no direito a ser mãe e trabalhadora.  

 

As medidas do Governo de apoio à
natalidade que prometem novas prestações sociais, mas que na prática dependem
do rendimento do agregado familiar comprometendo assim a protecção da função
social da maternidade e paternidade no âmbito da segurança social  - têm um alcance social muito limitado e
estão longe de corresponder ao objectivo de promoção da natalidade.

 

O actual Governo do PS mantêm  a norma do Código do Trabalho que,  pela mão do Governo  PSD/ CDS-PP, consagrou a possibilidade dos
trabalhadores  optarem por uma  licença de maternidade-paternidade de 150 dias
mas tendo como contrapartida a redução para 80% do respectivo subsídio fazendo
depender este direito da capacidade financeira dos trabalhadores o que introduz
um grave um factor de discriminação dos trabalhadores em função do seu nível de
rendimento.        

 

Aumenta o número de trabalhadores em
situação de desemprego prolongado que não cumprem os requisitos previsto na lei
para acederem ao subsídio de maternidade e paternidade assim como  o número de mulheres à procura do primeiro
emprego ou em situação de ausência de actividade laboral que estão excluídas de
acederem a importantes direitos de maternidade e paternidade.  Em 2005 das 109.457 crianças que nasceram
neste ano  apenas 76 127 requerentes
beneficiaram do subsídio de maternidade.

 

Ao mesmo tempo que se  mantêm a destruição da universalidade do
direito ao abono de família o que lesa os direitos das crianças em matéria de
protecção no âmbito da segurança social e o necessário reforço dos apoios à
família o Governo do PS prossegue a 
destruição do que resta da rede pública 
de equipamentos sociais de apoio à infância para dar lugar à
privatização destes equipamentos semeando a desigualdade e a exclusão de acesso
aos mesmos.

 

4. Com vista a uma adequada protecção
da função social da maternidade e paternidade o PCP, na sequências de
anteriores iniciativas apresentará durante esta semana duas iniciativas
legislativas que visam o reforço do papel da segurança social pública na
protecção da função social da maternidade 
e da  paternidade:  

 


Atribuição do subsídio de maternidade e paternidade a 100% em caso de
licença de 150 dias eliminando uma grave injustiça entre trabalhadores
constante no Código do Trabalho, pela mão do Governo PSD/CDS-PP e mantida pelo
o actual Governo do PS  que  faz depender o alargamento desta licença à
redução do valor do respectivo subsídio. Esta iniciativa dirige-se aos
trabalhadores do sector privado e igualmente à Administração Pública.

 

- A criação de um subsídio social de
maternidade e paternidade no período de 150 dias nos casos em que o trabalhador
não cumpra os prazos de garantia para aceder ao respectivo subsídio no âmbito
do regime contributivo por situação de desemprego (quando não tem direito ao
respectivo subsídio), ou à procura do primeiro emprego.   


Projecto de Lei n.º 460/X - Licença por maternidade/paternidade


Projecto de Lei n.º 459/X - Maternidade e paternidade

 

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