Intervenção de

Situação laboral na Qimonda e Yasaki Saltano

 

Declaração política tecendo críticas ao Governo por não tomar medidas capazes de fazer face à crise com que se debatem as empresas Qimonda e Yasaki Saltano

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

De boas intenções está o Governo e o Inferno cheio!

Depois de o Sr. Primeiro-Ministro considerar a Qimonda como uma empresa modelo, exemplar no panorama nacional, depois de várias visitas e sessões de propaganda em volta desta empresa, depois de milhões e milhões de euros de apoios, depois dos 150 milhões de euros da Qimonda-Portugal que voaram para a Alemanha, o Governo assiste ao desmantelamento desta empresa sem que se perceba uma acção concreta que seja para garantir o seu futuro e o dos cerca de 1700 postos de trabalho que estão em causa.

Face às notícias do início do processo de insolvência na empresa, o inenarrável Ministro da Economia, Manuel Pinho, disse que o Governo tudo iria fazer para recuperar os incentivos concedidos, assumindo, assim, que mais nada havia a fazer. Na prática, o Sr. Ministro «atirou a toalha ao chão» logo no início do combate.

Poucos dias depois, quer o Sr. Primeiro-Ministro quer o Sr. Ministro, desdobraram-se em declarações para tentar corrigir o erro e disseram que o Governo não «atirou a toalha ao chão» e que tudo iria fazer para salvar a empresa.

O Sr. Ministro da Economia afirmava que o Sr. Primeiro-Ministro estava em contacto permanente com o Governo alemão.

Nesta fase, a questão já não é saber se o Governo desistiu. A questão é saber se o Governo alguma vez levantou os braços para combater. A verdade é que os resultados estão à vista. O Governo diz-se muito preocupado, anuncia que tudo está a fazer, que está empenhado em encontrar um investidor, mostra boas intenções, mas resultados, zero. Não se conhece uma iniciativa em concreto e a verdade é que a situação se agravou de uma forma preocupante. Ontem mesmo, 600 trabalhadores foram despedidos e foi anunciada a aplicação do lay-off a 800 trabalhadores.

Assim, dos mais de 1700 trabalhadores que a Qimonda empregava, apenas 200 se mantêm em plenas funções. Fica claro que o Governo se mostra alegadamente «preocupado» com a situação, mas são os trabalhadores que pagam e que sofrem as brutais consequências desta situação.

Importa referir que estes despedimentos vão agravar a já preocupante situação de desemprego que se vive no distrito do Porto e que os salários dos trabalhadores que estão no lay-off serão reduzidos, recebendo apenas 2/3, o que implica sacrifícios inaceitáveis e incomportáveis para os trabalhadores e suas famílias.

O Governo, que foi tão diligente em encontrar soluções para a especulação bolsista, que não olha a meios para salvar os grandes senhores da banca, tem de tomar medidas para salvaguardar a Qimonda e os seus postos de trabalho.

Salvar esta empresa é importante, não só para Portugal mas também para a Europa, uma vez que é fundamental dominar e estar na vanguarda da tecnologia dos semi-condutores. Assim, o Governo não pode desistir deste processo e tem de tomar medidas, em Portugal mas também a nível europeu, para que a viabilização desta empresa seja uma realidade. Ou seja, o Governo, de uma vez por todas, tem de passar das palavras aos actos.

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Um outro exemplo de uma situação preocupante é a que se vive na Yasaki Saltano. Instalada em Portugal desde 1984, esta empresa beneficiou de um conjunto significativo de apoios nacionais e internacionais, registou dezenas de milhões de euros de lucros e, ao mesmo tempo, iniciou vários processos de deslocalização, nomeadamente para África e para a Europa de Leste. Promoveu diversos despedimentos colectivos ao longo dos últimos anos e encerrou a sua unidade de Vila Nova de Gaia. Hoje, nesta empresa, apenas existem cerca de 1400 postos de trabalho quando, em 1996, empregava mais de 7000 trabalhadores.

Não satisfeita, esta empresa anunciou recentemente um processo de lay-off que irá envolver 768 dos 1340 trabalhadores que emprega. Lay-off este que irá reduzir em 1/3 o salários dos trabalhadores sem que, por parte do Ministério do Trabalho, se conheça qualquer iniciativa de controlo ou fiscalização.

Face a todas estas situações, face à grave crise social e de desemprego que vivemos, onde pára o Sr. Ministro do Trabalho? Anda no seu frenesim inaugural. Está em todo o lado a distribuir protocolos e dinheiro, em plena campanha «pré-eleitoral», sem que sejam conhecidas medidas suficientes e capazes do seu Ministério para enfrentar a actual crise.

Quando questionado pelos jornalistas, no intervalo da chuva de protocolos que anda a assinar, lá disse, referindo-se à situação da Qimonda, que «do ponto de vista da protecção social, o Governo lá estará para apoiar todos os trabalhadores que agora vivem numa situação difícil» e que «o Governo não baixa os braços», isto é, mais do mesmo, ou seja, nada. E quanto à Yasaki, zero, parece que não é nada com ele.

O importante mesmo, para este Ministro, é celebrar protocolos e avançar a toda a força com a propaganda.

Estes dois exemplos de investimento estrangeiro levam-nos a reflectir no tipo de investimento estrangeiro que queremos para o nosso país e quais as consequências para o desenvolvimento nacional que representa. Importa referir que, podendo constituir um elemento de desenvolvimento, o investimento estrangeiro pode, também, ser uma ameaça.

As deslocalizações, a imposição de trabalho sem direitos, a baixa incorporação tecnológica, a transferência de lucros para o estrangeiro sem cuidar do reinvestimento e de uma justa distribuição dos lucros, bem como o «consumo» dos apoios comunitários, são algumas das ameaças que nenhum dos Governos, sejam do PS ou do PSD, com ou sem o CDS, soube acautelar.

Por isso, questionamos: até quando vai o Governo permitir este tipo de investimento estrangeiro? Até quando vai deixar os interesses nacionais nas mãos de interesses estrangeiros? Que medidas vai tomar para salvaguardar os postos de trabalho? Está ou não o Governo disponível para apertar os critérios e aumentar a fiscalização do lay-off, para impedir o regabofe em que este se transformou?

Da nossa parte, a resposta é clara. É possível, necessário e urgente a ruptura democrática de esquerda que o PCP propõe, para que se construa uma sociedade mais justa e que respeite quem trabalha.

(...)

Sr. Presidente,
Sr.ª Deputada Alda Macedo,

Agradeço a questão que coloca.

É evidente que a situação que se vive na Yasaki Saltano e na Qimonda exige, por parte desta Assembleia da República, uma forte preocupação.

Os impactos sociais do encerramento ou da deslocalização destas empresas são demasiado graves para que fiquemos indiferentes a esta realidade.

A verdade, respondendo à sua pergunta, é que não se vê qualquer medida no plano concreto. Temos um anúncio de boas intenções por parte do Governo, que está preocupado, que está a envidar todos os esforços, mas, no plano concreto, não se sente, não se vê uma medida que seja para inverter um caminho preocupante para o futuro daqueles distritos e para os trabalhadores. Quanto à confiança que podemos ter neste Governo, terá confiança a banca e os grandes grupos financeiros, que lidam bem com o Governo e que vêem medidas serem aprovadas de um dia para o outro para se salvarem, mas não existem medidas de criação e de manutenção do emprego.

É preciso ser exigente, sim, com quem abandona o nosso país e acumulou riqueza à custa da riqueza produzida pelos trabalhadores e também dos apoios de que beneficiou. Mas, nessas situações concretas, o que importa transmitir aos trabalhadores é que a Qimonda tem «pernas para andar», que a Qimonda tem condições para ser viável, sendo preciso encontrar uma solução, no plano nacional e internacional, que salvaguarde os postos de trabalho.

Não bastam a retórica e as boas intenções, é preciso haver medidas concretas para que isso aconteça. E não temos confiança alguma no Governo - até agora não pudemos ter - porque, no plano das medidas concretas, como disse na minha intervenção, o resultado é zero.

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