Intervenção de

A situação dos trabalhadores da empresa ROHDE, em Aveiro<br />Intervenção da Deputada Odete Santos

Senhor Presidente Senhores Deputados:Os trabalhadores da multinacional alemã da indústria do calçado Rohde, estão a ser alvo de uma grosseira ameaça aos seus direitos.São cerca de 989 ( mais de metade dos trabalhadores da unidade industrial sita na Feira ) os homens e as mulheres que se confrontam com a ameaça de ver suspensos os contratos de trabalho, porque a empresa recorreu ao regime do lay off, argumentando com a falta de encomendas.No passado dia 30 de Setembro realizou-se um plenário de trabalhadores, convocado pelo Sindicato, para aprovarem as formas de luta contra uma pretensão da empresa que, por injustificada, é ilegítima e ilegal.Na manhã que antecedeu o plenário, a administração, pressurosa, fez saber que injustificaria as faltas dadas pelos trabalhadores que participassem na iniciativa sindical. Sem que tivesse sido esgotado o crédito de horas previsto no contrato colectivo de trabalho.Foi grande a pressão exercida sobre os trabalhadores.Abandonados pelo IDICT que, chamado a comparecer para garantir o direito de reunião, cerrou os olhos ao pedido urgente de intervenção, os trabalhadores compareceram em número tal, que pode dizer-se que a administração da multinacional alemã sofreu, no atribulado processo que desencadeou, a primeira derrota.Os trabalhadores sabem que para vencer é preciso lutar. E que a liberdade sindical é um direito conquistado com muitos sacrifícios que, sendo perdido, traduzirá a perda da liberdade, em sentido amplo.Os trabalhadores da unidade de Santa Maria da Feira, na sua maioria mulheres, com a sua presença no plenário sindical- só com essa presença- disseram aos empresários alemães: Vimos dizer que não temos medo!Ao rejeitarem, numa moção, o regime do lay off, as trabalhadoras e os trabalhadores repudiaram também expressamente, o pacote laboral. Afirmando dessa forma que a suspensão dos contratos de trabalho que a multinacional alemã pretende impor com a benção do Ministério do Trabalho, mais não é do que uma forma grosseira de chantagem para tentar que os trabalhadores desistam de lutar pelos seus direitos.De facto, no requerimento que a administração da Rohde apresentou para solicitar a suspensão dos contratos de trabalho, nem sequer se preocupou em fundamentar a pretensão de acordo com o que a lei exige.Apesar de ser uma má lei- trata-se de um diploma que descapitaliza a segurança social a favor das entidades patronais - apesar disso, a empresa nem sequer se conforma com as exigências mínimas inscritas na mesma.E como se já contasse com o deferimento do pedido, apenas o justificou com a falta de encomendas em determinado produto.Acontece, no entanto, que as estatísticas oficiais, as do INE, e os números recentes divulgados pela própria Associação dos Industriais do calçado, revelam que a indústria do calçado portuguesa está em alta. Ao contrário do que acontece na União Europeia.Com efeito, com uma produção que tem vindo a aumentar, ao contrário do que acontece, por exemplo, na Itália que tem vindo a perder posições, a indústria de calçado portuguesa ganhou ainda quotas de mercado na Europa no primeiro semestre deste ano, num momento em que as importações totais europeias diminuíram 5,7%.Segundo os dados estatísticos, Portugal, no primeiro semestre do corrente ano exportou 203 milhões de euros para o mercado germânico, mais 5,7% do que no período homólogo do ano anterior. E isto numa altura em que as importações totais da Alemanha aumentaram apenas 0,15 por cento.Mas também em França ( que registou na venda do calçado português um aumento de 5,4 %para 6,4% desde finais do ano 2000).Na Espanha ( aqui as exportações nacionais obtiveram um crescimento superior a 21% para 3 milhões de pares) No próprio Reino Unido ( em que o calçado português consegue ser responsável por 5,6% das importações inglesas mesmo num contexto de drástica retracção das importações inglesas em relação a todos os países intra e extra comunitários).Em todos estes países a indústria de calçado portuguesa graças à qualidade do trabalho produzido pelos trabalhadores portugueses, tem tido um comportamento positivo.É assim que soam a falso as toscas justificações para o lay off apresentadas pela multinacional alemã Rohde.No contexto atrás descrito, como podem aplicar-se á indústria de calçado portuguesa recomendações no sentido de redução do pessoal?De resto, os dados relativos à evolução da indústria de calçado demonstram que o caminho certo não é o da redução do número de trabalhadores, mas precisamente o inverso.Enquanto a Itália tem registado uma drástica redução da sua produção, a par e passo com a redução também acelerada dos níveis de emprego na indústria e a perda de posições no contexto europeu e internacional, em Portugal a indústria de calçado aumentou os níveis de emprego, a produção, as exportações.E enquanto a multinacional alemã que produz para o maior mercado das exportações portuguesas- o país em que tem a sede, a Alemanha - quer enveredar pelo caminho de aumentar a competitividade e a produtividade à custa dos direitos dos trabalhadores, à custa de agir como uma sanguessuga em relação à segurança social, usando as verbas dos trabalhadores em seu próprio proveito, a evolução da indústria de calçado portuguesa demonstra que o aumento de produtividade, a boa performance do calçado português se conseguiu com investimentos da ordem dos 100 milhões de euros por ano. Com inovações tecnológicas para as quais contribuiu sobretudo a Companhia de equipamentos industriais também sedeada no Distrito de Aveiro, que foi também a principal fornecedora de novas tecnologias para uma grande empresa de calçado Chinês. Assim, torna-se evidente que os objectivos prosseguidos pela Rohde, são bem diferentes dos que sumariamente enuncia na fundamentação que apresentou para a suspensão dos contratos de trabalho.Não podemos esquecer-nos que a apresentação do falsamente denominado Código do Trabalho foi antecedido de um grave pronunciamento de empresários alemães que ameaçaram retirar os seus investimentos do país e deixar os trabalhadores no desemprego se a legislação laboral não fosse alterada no sentido da desregulamentação do trabalho e da perda de direitos conquistados pelos trabalhadores ao longo dos séculos XIX e XX.Não podemos esquecer-nos que em entrevista de 2 de Setembro passado, um representante da Associação dos Industriais do Calçado, ao mesmo tempo que assinalava os resultados positivos do sector, recomendava às empresas associadas que reivindicassem a alteração da legislação laboral, segundo ele rígida e inflexível.E então compreende-se que o lay off é de facto uma arma usada para tentar enfraquecer resistências e lutas contra o pacote laboral.Uma arma política contra direitos, que redunda também no enfraquecimento do prestígio do calçado português.Estamos perante uma empresa que já há cerca de 1 ano recorreu à suspensão de contratos de trabalho.Que então prometeu que não voltaria a recorrer a semelhante medida.Que durante 1 ano quis aumentar a produtividade à custa do aumento dos ritmos de trabalho.Que alimentando-se da segurança social não tem sido fiscalizada na sua actuação.Que não cumpre as leis do País e recusa aos organismos sindicais a fundamentação do regime de lay off.Os trabalhadores portugueses sabem que não podem contar com este Governo, com este Ministro do Trabalho, para defender os seus direitos.Mas a avaliar pela disposição dos trabalhadores da Rohde, pela sua capacidade de resistência e luta, a política anti laboral não poderá passar sobre a dor infinita de quem trabalha.

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