Pergunta ao Governo N.º 2072/XII/2

Situação da Cinemateca, Museu do Cinema e Arquivo Nacional da Imagem em Movimento

Situação da Cinemateca, Museu do Cinema e Arquivo Nacional da Imagem em Movimento

O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, no âmbito da sua actividade regular de contacto com as instituições e entidades, realizou uma visita à Cinemateca Portugesa - Museu do Cinema e ao Arquivo Nacional da Imagem em Movimento.
A Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema atravessa, como certamente saberá o Governo, uma situação de densas dificuldades, criada pela convergência de dois factores: o da diminuição substantiva das receitas da taxa de publicidade (de que recebe 20%), fruto da conjuntura económica do país; e o da consolidação de uma política cultural que despreza o património e a arte, que destrói activamente o serviço público de arte e cultura, a pretexto da falta de meios e recursos financeiros.
O orçamento anual da Cinemateca contou, porém, até 2010 com uma componente importante de Investimento, proveniente do PIDDAC, que não mais se verificou. Esse investimento assegurava a capacidade de modernização dos equipamentos e, muitas vezes, a sustentabilidade da Cinemateca. Com a total supressão do investimento público em Cultura e Património que o actual Governo PSD/CDS impõe e com a diminuição acentuada do financiamento por via da taxa de publicidade, a Cinemateca vê-se numa situação de pré-ruptura, sem capacidade de assegurar o pagamento das suas despesas de funcionamento, onde se
podem incluir as despesas com vencimentos, as despesas com água, electricidade e manutenção.
Tendo em conta as características e a missão da Cinemateca, não será possível exigir a esta instituição que angarie mais receita própria do que aquela que vem angariando através de bilheteira. Todavia, outras formas de obtenção de receita própria estão a ser obstaculizadas pelo próprio Governo, o que demonstra bem as reais intenções da política de direita. Veja-se a capacidade de angariação de receita própria por via da prestação de serviços, principalmente ao estrangeiro, que o ANIM revela com o seu conjunto de técnicos e equipamentos. O laboratório do ANIM, em trabalhos de restauro e conservação prestados a outras entidades, poderia multiplicar a sua receita própria - como aliás já sucedeu no passado. Tal não sucede por força da não renovação dos contratos imposta pelo Governo, que teve efeitos em Dezembro de 2012 e que depauperou todos os museus da tutela directa do Governo. Neste caso, a impossibilidade de contratar, faz com que o ANIM não possa efectuar o volume de trabalhos para o exterior que lhe permitiriam aumentar de forma sensível as suas receitas.
A carência financeira, como é conhecido, tem inclusivamente influenciado a própria programação da Cinemateca. Em Maio, por exemplo, a Cinemateca cinge praticamente a sua programação à exibição de obras da sua própria colecção, pois sequer tem meios para pagar os transportes de filmes, mesmo que cedidos gratuitamente por congéneres de outros países.
Evidentemente, que não existe, só por esse factor, uma perda na qualidade, mas certamente existe uma limitação do âmbito das exibições e uma crescente perda de diversidade, na medida em que a colecção é limitada.
É ainda de salientar que durante a visita, ficou evidente a carência tecnológica da Cinemateca e do ANIM. Por um lado, a Cinemateca não dispõe de projecção digital adaptada ao formato dominante. Da mesma forma, o ANIM não dispõe de dispositivos de exibição digital adaptados à norma vigente. Isso significa, na verdade, que nem os depósitos legais de obras cinematográficas realizados hoje são passíveis de verificação pelo Arquivo.
Oequipamento que converte película em formatos digitais está avariado e não existe nenhum equipamento que possibilite a conversão de digital em película. Isto significa que, no momento actual, o ANIM está limitado também na conversão para formatos digitais - importante trabalho na componente da cedência de imagens. A máquina em causa está desde 2001 desactualizada e a sua manutenção é impossível, dada a sua obsolescência avançada. Da mesma forma, está o Arquivo impedido de converter obras entregues ou depositadas em formato digital para película.
O trabalho da Cinemateca, onde se inclui o trabalho do ANIM, é de uma importância fundamental na política cultural e na democratização do acesso ao património cinematográfico português, do ponto de vista do visitante e do investigador. A disponibilização bibliográfica, a exibição, a conservação, são tarefas de que a cinemateca está incumbida pelo Estado, mas para as quais não são assegurados os meios necessários.
Mais grave tudo se revela, quando compreendemos que o actual financiamento se reduz a cerca de 40% do financiamento de 2010 e que este nível de funcionamento não permite a realização da missão da cinemateca. Aliás, mesmo a dimensão da conservação está ameaçada, na medida em que a preservação das obras em formato digital requer meios de que o ANIM não está dotado e tem uma janela de conservação bastante inferior à da película.
Em caso de ruptura no funcionamento dos cofres do Arquivo, ficarão em risco incalculáveis valores do património cinematográfico do país. E hoje estão já em risco as produções mais recentes.
Também a qualidade do serviço tende a degenerar, apesar do esforço e dedicação dos profissionais. Por exemplo, o serviço de bilheteira é já, por vezes, assegurado por um vigilante, o que, além de exceder as suas obrigações, representa também uma perda na dimensão da qualidade do atendimento e da informação prestada ao visitante. A exiguidade dos meios materiais tem correspondência com a exiguidade dos meios humanos.
Nestes termos, ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais aplicáveis, requeiro a V. Exa se digne solicitar ao Governo, através do Sr Secretário de Esatdo da Cultura,resposta às seguintes questões:
1. Tem o Governo disponibilidade para assumir a sua responsabilidade e dotar extraordinariamente a Cinemateca - Museu do Cinema, de uma verba de 1.600.000 euros, para assegurar as despesas de funcionamento de 2013?
2. Que medidas tomará o Governo para garantir uma fonte de financiamento público que não coloque a Cinemateca na estrita dependência das receitas da taxa de publicidade, e que assegure o nível de financiamento compatível com as responsabilidades da instituição?
3. Que medidas tomará o Governo para que o ANIM seja urgentemente dotado do equipamento e do pessoal necessário para que sejam garantidas as melhores condições de conservação do património que lhe está confiado, tanto em formato digital como em película?
4. Que medidas tomará o Governo para que a programação da Cinemateca - Museu do Cinema não seja confinada às colecções próprias, no sentido de alargar a difusão cultural e cinematográfica, direito dos portugueses e tarefa do Estado?

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