A situação das pescas nacionais

Nota da Comissão de Pescas Junto do Comité Central do PCP

As pescas portuguesas enfrentam, no imediato e a curto prazo, problemas graves que a não serem resolvidos de acordo com os interesses nacionais colocam seriamente em causa a viabilidade futura de muitos dos segmentos da nossa frota.

Tendo presente a reunião do Conselho de Ministros da União Europeia do dia 22 de Outubro, na qual está agendada a discussão da revisão da Política Comum de Pescas, e a recente mudança de responsável por esta área no actual Governo, o PCP traz ao conhecimento da opinião pública três questões que, sem prejuízo de outras mais específicas, constituem questões centrais para a actividade das pescas portuguesas e para os cerca de 40.000 pescadores que nelas exercem a sua actividade.

A pesca da sardinha em perigo

É público que nos últimos anos a abundância de sardinha nas costas portuguesa e espanhola tem sofrido fortes oscilações, resultantes principalmente de variações ambientais (correntes, ventos, temperaturas, etc.) e não tanto, neste caso concreto, da exploração dos recursos. Bem pelo contrário, têm sido os pescadores, organizações de produtores e armadores portugueses, por sua própria iniciativa, que têm reduzido o seu esforço de pesca, para defesa dos recursos, sem quaisquer compensações, o que revela um alto grau de consciência e de sentido de responsabilidade que importa sublinhar.

É o que está a acontecer em 1998, com a redução da actividade em 10% e a 180 dias de pesca por ano.

O PCP tem acompanhado desde sempre e com preocupação, a situação dos mananciais da sardinha e as medidas necessárias à defesa do recurso mas também à defesa desta actividade, o que levou ainda recentemente uma delegação do nosso Partido a visitar e a reunir com dirigentes do IPIMAR. É que a sardinha representa cerca de metade das capturas totais em águas nacionais suportando a pesca do cerco toda uma actividade ao nível da indústria de conservas que, no conjunto, são responsáveis por mais de 8.000 empregos directos. Acresce que estamos perante uma pescaria sem grandes alternativas de reconversão para outras actividades.

Daqui, a nossa forte preocupação pelas informações que apontam para a possibilidade da Comissão Europeia vir a impor uma redução, para 1999, do esforço de pesca na sardinha que poderia atingir os 90%. Esta proposta baseia-se aparentemente em relatórios de peritos e instituições como o Conselho Internacional para a Exploração do Mar que afirma estarem "os stocks fora dos limites biológicos de segurança".

Sem pretendermos pôr em causa os relatórios científicos, a verdade é que, já posteriormente, outros estudos apontam para uma subavaliação da biomassa, pelo que não se justificariam reduções tão drásticas do esforço de pesca que, a concretizarem-se, teriam gravíssimas consequências para a pesca da sardinha, para a indústria de conservas e para muitas comunidades que dependem em grande medida da pesca do cerco.

Importa ainda sublinhar que a situação da distribuição dos mananciais da sardinha é muito diferente de zona para zona. Assim, enquanto em toda a costa Sul de Portugal (a zona que vai da Costa Vicentina e se prolonga até Cádiz) - de acordo com os próprios relatórios científicos - não existem problemas de stocks, designadamente de juvenis, a situação parece diferente na Costa Norte de Espanha (Galiza). O próprio relatório do cruzeiro realizado em Março/Abril de 1998 pelo navio de investigação português "Noruega", cobrindo a costa continental portuguesa e parte da costa espanhola (Golfo de Cádiz), afirma "que se verifica um aumento geral do número total estimado de sardinha nos cruzeiros efectuados entre Fevereiro de 1996 e Março de 1997, estando a abundância de sardinha em Março de 1998 sensivelmente ao nível da estimada em Março de 1997".

Neste quadro e tendo em conta que Portugal tem um nível médio de desembarques anuais de 90.000 toneladas e a Espanha de 20.000/30.000 toneladas e que os problemas de stocks, particularmente de juvenis são bem mais graves na costa espanhola do que na costa portuguesa, o PCP reclama do Governo português a adopção das seguintes medidas para uma posição negocial no próximo Conselho de Ministros das Pescas da União Europeia:

  • aprofundamento dos trabalhos de investigação científica numa perspectiva dinâmica de apuramento da situação real dos stocks de sardinha;
  • separação, para efeitos de adopção de medidas de gestão, da situação dos stocks nas costas portuguesa e espanhola;
  • não aceitação para Portugal de uma nova redução do esforço de pesca para além daquela que o País já realizou em 1997 e 1998, por claramente injustificada.

Em perigo o Acordo de Pescas com Marrocos
Soluções e alternativas são necessárias

Como por várias vezes já tem sido alertado, o Acordo de Cooperação entre a Comunidade Europeia e Marrocos em matéria de pesca terminará a sua vigência em Novembro de 1999, tendo Marrocos já feito saber que tal acordo não seria renovado.

Este Acordo é particularmente importante para as pescas portuguesas. No seu âmbito, 51 embarcações com comprimentos iguais ou superiores a 12 metros operam nas águas marroquinas, correspondendo a 1/5 do total nacional da arqueação bruta, cujas características são as da pesca artesanal pertencentes, na generalidade, a empresas familiares. Entre tripulantes embarcados e pessoal de terra o Acordo dá emprego a 1.260 inscritos marítimos. Só a Olhão e a Sesimbra estão afectas 36 das 51 embarcações que operam em Marrocos.

A taxa de utilização do Acordo está acima dos 90% e às 7.500 toneladas de pescado capturado anualmente correspondem um valor de cerca de 3,4 milhões de contos anuais, quase totalmente descarregado em portos portugueses. Descontados os desembarques da sardinha, as descargas da frota de Marrocos correspondem a 12% da quantidade e 13% do valor dos desembarques nacionais.

Todos estes dados são do conhecimento do Governo e foram, aliás, recentemente divulgados pela Direcção Geral das Pescas.

Ora, a questão que se coloca é saber o que o Governo tem feito para defender os interesses portugueses protegidos pelo Acordo. É que Marrocos tem insistentemente afirmado que a sua posição de não renovação do Acordo para defesa dos seus próprios recursos e actividade não tem nada a ver com a pesca portuguesa mas particularmente com a frota espanhola que tem assumido posições depradadoras dos recursos e lesivas dos interesses marroquinos.

Assim sendo, e tendo em conta como o próprio Governo reconhece, que a renegociação do Acordo com Marrocos é essencial para a frota portuguesa, é vital que o prosseguimento da actividade da frota portuguesa que opera em Marrocos seja dissociada da actividade de outras frotas e de acordos globais da Comissão Europeia que só prejudicam as pescas portuguesas.

Nesse sentido, o PCP propõe que o Governo português crie as condições para uma negociação bilateral de Portugal com Marrocos, dado que, como afirma a própria Direcção Geral das Pescas, nada impede que, mesmo num Acordo de Partenariado entre a Comunidade e Marrocos, existam "várias componentes" diferenciadas consoantes os Países.

A revisão da Política Comum de Pescas
tem de defender os recursos das águas nacionais

Um terceiro conjunto de questões essenciais para o futuro da pesca em Portugal tem a ver com a revisão da Política Comum de Pescas, previsto para 2002. Os primeiros passos já começaram a ser dados pela Comissão Europeia com o envio de um inquérito às organizações do sector em toda a Europa comunitária. Sem prejuízo de uma tomada de posição mais desenvolvida num próximo futuro, o PCP desde já chama a atenção e reclama do Governo português:

  • a elaboração, em articulação com as organizações representativas do sector, de uma estratégia de defesa dos interesses nacionais e de propostas a apresentar à Comissão Europeia antes dos factos estarem consumados, designadamente a defesa intransigente da zona das 12 milhas (não aceitando nenhuma redução) como área de soberania nacional reservada exclusivamente às frotas nacionais dos Estados ribeirinhos;
  • a defesa de um direito de pesca preferencial na zona contígua (até às 24 milhas náuticas) e a possibilidade de Portugal, pela sua situação especial, poder alargar esse direito de pesca para além daquela área;
  • a recusa do sistema de gestão de quotas individuais transferíveis (ITQ) por tal significar o estabelecimento de um direito de propriedade privada no Mar com a consequente concentração das licenças de pesca na posse de um reduzido número de empresas e a perda do acesso aos recursos pesqueiros pelas frotas e populações ribeirinhas, designadamente as que se dedicam à pesca artesanal;
  • a defesa de políticas e medidas de gestão que respeitem as diferentes condições biogeográficas e sociais das pescas europeias e relacionem a dimensão e responsabilidades de cada frota com o potencial dos respectivos recursos. Isto é, a frota portuguesa não pode ser penalizada por actividades de sobrepesca e de delapidação de recursos causados por outras frotas.

Por último, em relação ao Espadarte, cuja actual distribuição de quotas é manifestamente injusta para a nossa frota face ao que está atribuído aos espanhóis (560 toneladas para a nossa frota no Continente e 6.000 toneladas para a frota espanhola) e dado tratarem-se de capturas a exercer nas nossas águas, impõe-se garantir uma correcção a tais montantes de forma a que a frota portuguesa não fique na situação inaceitável de subalternização que os números acima referidos evidenciam.

Face à importância e gravidade dos assuntos que estão em cima da mesa, o PCP vai requerer a chamada, com urgência, à Comissão de Agricultura da Assembleia da República, do novo Secretário de Estado das Pescas para confrontar o Governo português com os problemas existentes e com as soluções propostas.

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