Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

«O roubo organizado pelo governo aos portugueses será derrotado»

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No debate quinzenal realizado hoje na Assembleia da República, Jerónimo de Sousa confrontando o Primeiro-Ministro com o roubo organizado aos trabalhadores e ao povo, afirmou que a luta contra este pacto de agressão será a causa da derrota destas políticas de desastre nacional.
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Debate com o Primeiro-Ministro sobre as conclusões da Cimeira e os desafios europeus

Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados,
Sem dúvida — e reconheceu-o —, o que este Conselho Europeu decidiu foi a acelerada concretização da centralização e concentração do poder da União Europeia com os instrumentos que lhe estão associados. E referiu, concretamente, o Pacto para o Euro Mais, o semestre europeu e a governação europeia. Ou seja, o que se decidiu foi, no fundo, uma maior operacionalização destes instrumentos de centralização e concentração.
Foi um Conselho Europeu que fugiu às causas estruturantes da crise, um Conselho que revelou contradições no seu seio, um Conselho que procurou fugir para a frente em relação à realidade e aos problemas.
Mas não podemos deixar de registar com inquietação os novos e graves passos dados para institucionalizar o processo de extorsão da soberania dos Estados ao poder de decisão das suas legítimas instituições pela imposição do denominado «pacto orçamental», com a imposição de inscrição na Constituição de um limite de défice de 0,5%, o que significa um verdadeiro golpe constitucional.
Queríamos dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que em relação as estas questões alguns dos seus seguidores e apoiantes vêm desenvolvendo a teoria de que é assim porque manda quem paga. Estamo-nos a referir concretamente à Alemanha.
Pois, Sr. Primeiro-Ministro, é importante saber que, se mandasse, Portugal mandava muito. Pagamos em dinheiro, com juros especulativos, como está a acontecer neste momento, mas pagámos também em espécie: pagámos com a destruição do nosso aparelho produtivo e da nossa produção nacional; pagámos com a desactivação da nossa indústria pesada — metalomecânica, siderurgia, indústria naval; pagámos com a destruição da nossa agricultura; pagámos com a destruição da nossa frota pesqueira; pagámos com a desactivação da nossa marinha mercante; pagámos no tempo em que vinham «paletes» de dinheiro de fundos comunitários, a troco da liquidação do nosso aparelho produtivo, para que alguns ganhassem, como foi o caso da Alemanha, que começou a exportar para cá tudo o que pretendia!
Sr. Primeiro-Ministro, não queremos mandar noutros, mas o que dizemos é que deixem ao menos os portugueses construir o seu devir colectivo, deixem ao menos que sejam os portugueses a mandar em Portugal e não qualquer potência estrangeira renegociando a dívida, procurando investir na produção nacional, criando mais emprego, respeitando e defendendo os salários, as reformas, as pensões e os direitos de quem trabalha. Se tivesse ido por aí, de certeza que o rumo da União Europeia seria diferente! Não o fez, claudicou, e o que vem aqui apresentar é uma exigência, particularmente ao Partido Socialista, para capitular, para se dobrar e aceitar um golpe constitucional!
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Um reparo: não foi a dívida que destruiu o aparelho produtivo, foi a destruição do aparelho produtivo que levou à existência da dívida actual.
O Sr. Primeiro-Ministro diz que não, mas foi. Mas foi!
Passo a um outro tema de grande actualidade, Sr. Primeiro-Ministro: apresentaram, esta semana, a proposta de aumento da jornada de trabalho e já estão convocados para Domingo, creio, para tentar alterar as normas de despedimento do Código do Trabalho, no dia em que anunciam o aumento da electricidade, poucos dias depois do anúncio do aumento das taxas moderadoras, da linha de privatização da segurança social, do corte no subsídio de desemprego, etc., etc.
Sr. Primeiro-Ministro, os conteúdos das iniciativas revelam a verdadeira face deste Governo, a sua natureza de classe e o seu ódio aos trabalhadores, visando o aumento da exploração.
Mobiliando todo o arsenal ideológico das inevitabilidades, convocando os seus economistas, os seus comentadores, os seus analistas, quis o Governo que o roubo organizado fosse também um roubo consentido por parte daqueles que estão a ser expropriados. Não conseguiu, como se viu, com a greve geral.
Mas o que era anúncio vai começar a ser acto. E, em relação ao horário de trabalho, Sr. Primeiro-Ministro, fique sabendo o seguinte: essa é uma luta que os trabalhadores de todo o mundo travam há mais de 100 anos, com avanços, com recuos, mas foi sempre essa luta que determinou esses avanços. Em relação a essa tentativa brutal de pôr os trabalhadores portugueses a trabalhar mais 16 dias à borla, para além dos quatro dias feriados que querem eliminar, pode estar consciente do seguinte: se pensa que os trabalhadores vão permitir esse roubo consentido está enganado!
Os trabalhadores vão lutar para que isso não aconteça!
Sr. Primeiro-Ministro — o tempo de que dispunha já acabou —, faço-lhe só um apelo: no fim do ano, no Natal, quando se dirigir aos portugueses, não lhes deseje boas-festas, porque pode ser muito mal-entendido por milhares de famílias que não vão ter boas-festas, que não vão ter a ceia de Natal. Os desempregados, os pobres, os excluídos, aqueles que estão ameaçados nos seus direitos, os expropriados do subsídio de Natal não vão ter boas-festas.
Se pensar em fazê-lo, Sr. Primeiro-Ministro, tape as orelhas porque, de certeza, a resposta que ouviria seria significativa. Faça as boas-festas com a sua família, não as dirija aos portugueses, porque o senhor, com a sua política, está a infernizar a vida e esta passagem de ano de muitos portugueses no nosso país!

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