Projecto de Lei N.º 37/XV/1.ª

Revoga a extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras

Exposição de motivos

Na XIV Legislatura, o Governo fez aprovar na Assembleia da República alterações à Lei de Segurança Interna, à Lei de Organização da Investigação Criminal e às Leis Orgânicas da PSP e da GNR, tendo como único objetivo a extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.

O Governo pretendeu extinguir o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, repartindo as suas atuais atribuições por cinco entidades distintas: o Serviço de Estrangeiros e Asilo a criar, o Instituto de Registos e Notariado, a Polícia judiciária, a Polícia de Segurança Pública e a Guarda Nacional Republicana.

O PCP não concordou com essa pretensão e votou contra a proposta de lei.

Não está em causa a justeza da razão invocada pelo Governo de separar, no âmbito do SEF, as funções policiais das funções administrativas. Essa separação é adequada, é justa e o PCP sempre a defendeu. Não é justo nem adequado que tudo o que se relaciona com o estatuto legal dos estrangeiros em Portugal seja tratado por um serviço policial, como se os estrangeiros fossem potenciais delinquentes. Se um cidadão nacional renova o seu cartão de cidadão no Instituto dos Registos e Notariado não há qualquer razão para que um cidadão não nacional tenha de recorrer a um serviço policial para requerer ou renovar a sua autorização de residência.

O problema não está, portanto, na criação de um novo Serviço de Estrangeiros e Asilo. A questão é a de saber se uma medida dessa natureza deve implicar necessariamente a extinção do SEF enquanto serviço de segurança, ou seja, se existem razões válidas para extinguir o SEF nas circunstâncias, no tempo e no modo em que o Governo o pretende fazer.

Na verdade, o momento escolhido pelo Governo para propor a extinção do SEF, não podia ser pior. Não só não constava no programa do Governo a extinção do SEF, como esse processo, no momento em que surgiu, não poderia deixar de ser visto como uma fuga para a frente perante as dificuldades que o Governo enfrentou na sequência de um crime horrível cometido nas instalações e por elementos do SEF. Ninguém acredita que o Governo avançasse para a extinção do SEF se esse crime não tivesse sido cometido e se não tivessem sido cometidos erros dramáticos na gestão política desse processo.

Mas ao avançar para a extinção, o Governo fez recair as consequências do crime sobre toda uma instituição e sobre todos os elementos que a integram, e essa generalização não é justa. Perante um crime horrível, exigia-se uma rigorosa investigação, a condenação dos responsáveis, e a adoção de medidas organizativas que garantam que nada de semelhante voltará a acontecer. Extinguir uma força policial em consequência de um crime cometido por elementos seus é tratar essa força como se fosse uma associação criminosa e isso não é justo.

A questão, porém, não é só a do momento em que a extinção foi decidida. É também a de saber se há razões suficientes para supor que da distribuição das funções policiais do SEF por três forças de segurança distintas haverá ganhos para a segurança interna. Essas razões não estão demonstradas.

O SEF desenvolve a sua atividade há mais de 35 anos. Tem uma experiência própria decorrente da sua ação no terreno, com atribuições específicas e distintas das que pertencem a outras forças e serviços de segurança. Tem um papel específico e relevante em matéria de cooperação internacional. Tem uma identidade e uma experiência própria de intervenção em áreas tão complexas como o combate às redes de imigração ilegal ou de tráfico de seres humanos. Tem uma formação específica, distinta da que é ministrada às forças e serviços de segurança por onde os seus efetivos vão ter de se repartir.

As dificuldades com que o SEF se tem debatido ao longo dos anos decorrem, em larga medida, de uma escassez de recursos humanos, cujo reconhecimento unanime atesta a importância da sua missão.

Pretende o Governo que os profissionais do SEF com funções policiais sejam repartidos por três forças de segurança. Acontece, como ninguém ignora, que a natureza dessas forças reflete enormes diferenças quanto à sua natureza e quanto ao estatuto dos seus profissionais. O problema, contudo, está muito longe de ser de natureza estatutária ou socioprofissional. O problema é o de saber se, conhecidas as dificuldades que afetam as forças e serviços de segurança para garantir a multiplicidade de funções de que são incumbidas, haverá condições para que os elementos do SEF integrados nestas forças possam garantir o grau de especialização que atualmente os diferencia.

A opção de extinguir o SEF foi medida avulsa, uma ação típica de fuga para a frente, sem equacionar globalmente a estrutura nacional de segurança interna e sem medir previamente todas as dificuldades decorrentes desse processo. Arrisca-se, se for por diante, a criar situações de instabilidade ao nível das diversas forças e serviços envolvidos e a causar prejuízos sérios ao país em matéria de segurança interna.

Apesar das críticas, o Governo decidiu mesmo avançar com a extinção do SEF e essa decisão, aprovada na AR, traduziu-se na Lei n.º 73/2021, de 12 de novembro, que introduziu alterações na Lei de Segurança Interna, na Lei de Organização da Investigação Criminal e nas Leis Orgânicas da PSP e da GNR.

Publicada em 12 de novembro de 2021, a lei deveria entrar em vigor em 12 de janeiro de 2022. Sucede, porém, que as dificuldades para que o PCP alertou em devido tempo, não tardaram em surgir, o que levou o Governo a propor à Assembleia uma alteração à lei, antes mesmo da sua entrada em vigor, no sentido de alargar o respetivo período de vacatio legis, de modo que a entrada em vigor só ocorra no próximo dia 12 de maio.

A situação de indefinição em que o Governo lançou o SEF é insustentável. A recente demissão do Diretor Nacional é um reflexo disso mesmo. O SEF é hoje uma instituição paralisada, com todas as consequências que isso implica para os cidadãos que precisam de resolver inadiavelmente problemas relacionados com a sua permanência em Portugal. Em vez de tentar perceber como pode extinguir o SEF, melhor seria se o Governo se preocupasse em criar condições para que ele pudesse trabalhar.

É isso que o PCP propõe com o presente projeto de lei. Revogar as alterações legislativas aprovadas no âmbito do processo de extinção do SEF e repristinar as normas revogadas do modo a manter o estatuto jurídico e operacional do SEF. Haverá então condições de serenidade para tomar as decisões que se imponham para separar devidamente as funções policiais das administrativas relativamente em tudo o que se refere ao estatuto jurídico dos cidadãos estrangeiros em Portugal.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

Norma revogatória

A presente lei revoga a Lei n.º 73/2021, de 12 de novembro, que introduziu alterações na Lei de Segurança Interna, na Lei de Organização da Investigação Criminal e nas Leis Orgânicas da PSP e da GNR.

Artigo 2.º

Norma repristinatória

  1. São repristinados:
    1. Os artigos 12.º, 23.º-A e a alínea d) do n.º 2 do artigo 25.º da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto;
    2. os artigos 3.º, 18.º e 21.º da Lei n.º 53/2007, de 31 de agosto;
    3. os artigos 3.º, 22.º e 40.º da Lei n.º 63/2007, de 6 de novembro;
    4. os artigos 7.º e 13.º da Lei n.º 49/2008, de 27 de agosto.
    5. o Decreto-Lei n.º 252/2000, de 16 de outubro;

nas redações anteriores à Lei n.º 73/2021, de 12 de novembro.


  1. É consequentemente revogada a Lei n.º 89/2021, de 16 de dezembro.

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.

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