Intervenção de Bernardino Soares na Assembleia de República

Rendimento Social de Inserção

Segunda alteração à Lei n.º 13/2003, de 21 de Maio, alterada pela Lei n.º 45/2005, de 29 de Agosto, que revoga o rendimento mínimo garantido, previsto na Lei n.º 19-A/96, de 29 de Junho, e cria o rendimento social de inserção e segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 283/2003,
de 8 de Novembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 42/2006, de 23 de Fevereiro (projecto de lei n.º 232/XI-1.ª)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Paulo Portas
Não vai levar-me a mal, mas, procurando fazer uma pequena síntese dos debates de ontem e de hoje, acho que podemos dizer que, para a direita, com o apoio do PS, «abriu a caça» aos pobres, «abriu a caça» aos desempregados, «abriu a caça» a todos os que recebem as prestações sociais.
O Sr. Deputado referiu que já há 400 000 beneficiários do rendimento
social de inserção e que já se gastam 600 milhões de euros.
Então, Sr. Deputado, por que é que isto acontece? Será porque aumentaram as fraudes, ou porque aumentou a pobreza, ou porque aumentou a exclusão social, ou porque baixaram os rendimentos, ou porque aumentou o desemprego em consequência das políticas deste Governo, mas também em consequência das políticas que os senhores fizeram quando estiveram no governo?!
Disse o Sr. Deputado que o rendimento social de inserção tem defeitos. Pois tem, Sr. Deputado! E tem porque o rendimento social de inserção não pode ser apenas a atribuição de uma prestação, tem de haver acompanhamento para uma verdadeira inserção social.
E por que é que não há essa inserção social? Porque não há condições nos serviços da segurança social para fazer esse acompanhamento, porque os senhores e, agora, o Governo do PS diminuíram o número de funcionários, diminuíram os meios.
Bem pode o senhor agora dizer que é preciso trabalhar para que exista uma verdadeira inserção das pessoas, mas, se não há pessoas nos serviços para trabalharem nessa inserção, ninguém fará esse milagre, Sr. Deputado Paulo Portas. É aqui que está o problema.
O Sr. Deputado até falou na questão das escolas, e tem razão: é preciso acompanhar as crianças que estão nas escolas, porque a isso obriga o rendimento social de inserção.
Contudo, se deixarmos que elas sejam postas nas escolas e, depois, não haver nessas escolas ninguém que apoie a sua integração, nenhum professor que lhes dê um acompanhamento especial, ninguém que ajude à sua integração na comunidade educativa, estamos a «lavar as mãos», como faz o Governo e como fizeram os senhores quando estiveram no governo.
É uma grande hipocrisia dizer que beneficiários do rendimento social de inserção «despejam» os seus filhos nas escolas, quando se sabe que é por falta de meios nas escolas que elas também não conseguem dar-lhes o apoio de que precisam!
Depois, diz o Sr. Deputado — e é verdade! — que há fraudes. Pois, há fraudes, Sr. Deputado!
Mas, para as fraudes, responde-se com fiscalização, não se responde com cortes naqueles que não são fraudulentos!
Por que é que não há fiscalização, Sr. Deputado? Não faltam também funcionários na segurança social, para fiscalizar o rendimento social de inserção?! Não faltaram no tempo em que o senhor estava no governo?!
Não faltam com o Governo do Partido Socialista?!
Então, quando os senhores aplaudem o corte em funcionários públicos — como este Governo fez —, quando dizem que ainda era preciso diminuir mais os funcionários públicos, não estão a dizer que é preciso diminui-los também nos que fiscalizam o rendimento social de inserção?! Ou, aqui, já não são os funcionários públicos que têm de fazer esta fiscalização?! Será algum outsourcing que irá fazer esta fiscalização?
O Sr. Deputado está sempre a dar o exemplo daquele senhor, lá em cima, que ganhou o Totoloto e que tem uma casa… É sempre o mesmo exemplo. Sr. Deputado, e já foi vereador na Câmara Municipal de Lisboa, olhe à volta da Assembleia da República, olhe para a freguesia das Mercês, para Alfama, para o Bairro Alto, e veja quantos idosos encontra — e o senhor sabe que eles lá estão — e que até são proprietários de prédios, de prédios degradados (pois não têm dinheiro para os recuperar), que até têm lá a sua casinha, há muitos anos, que já vem da sua família. O senhor quer que estas pessoas — não é o senhor, lá, do Totoloto! — também sejam prejudicadas pelas alterações que os senhores pretendem?!
Isto porque, se se conta o património dessa forma, isso vai significar que essas pessoas, que o senhor diz defender, também vão ser prejudicados!
Depois, o Sr. Deputado propõe a suspensão automática, ao fim de três prestações.
Mas, ó Sr. Deputado, então, o Estado não fiscaliza, o Estado não vai lá ver como é que é, e, portanto, quem paga é o beneficiário, porque houve alguém que não foi fiscalizado. Isto
não é aceitável!
Passo à questão das reformas. O Sr. Deputado diz que quer compensar, que quer usar a poupança no rendimento social de inserção para aumentar as reformas. Eu acho que isto é uma grande hipocrisia e registo que já alterou um pouco em relação ao Orçamento do Estado.
No Orçamento do Estado, se a minha memória não me trai, os senhores propunham um aumento das reformas que custava 50 milhões e um corte no rendimento social de inserção de 70 milhões; agora, já dizem que uma parte vai para o défice, já não é para os reformados.
Sr. Deputado, se o senhor quer mesmo aumentar as reformas, então, não deve fazer depender esse aumento da fiscalização do rendimento social de inserção, porque senão o senhor é que está a deixar que os fraudulentos prejudiquem os reformados. O que nós dizemos é que as
reformas devem aumentar, independentemente das fraudes do rendimento social de inserção, que estas, sim, também têm de ser fiscalizadas.
Para terminar, Sr. Presidente, é preciso dizer que o CDS e a direita têm um grande aliado, que é o PS! O PS é responsável pela falta de fiscalização!
O PS, que arranjou destacamentos fortemente armados, para a ASAE, não é capaz de arranjá-los para as situações delicados do rendimento social de inserção, que também existem! O PS que destrói a Administração Pública e que diminui os seus funcionários!
Mais: o PS que, em muitos sítios deste País, usa o rendimento social de inserção como arma de chantagem política, de chantagem eleitoral e de chantagem partidária!
O PS põe alguns funcionários com cartão partidário a, subliminarmente, sussurrar ao ouvido dos beneficiários do rendimento social de inserção que têm de votar no PS senão perdem o rendimento social de inserção!
Os senhores sabem bem que isto é verdade, e o País sabe bem que isto é verdade!
Portanto, Sr. Deputado Paulo Portas, este debate tem uma grande vantagem, em parte, para o PS e, em outra parte, para o PS, PSD e CDS. Para o PS, tem a grande vantagem de, no momento em que se prepara para fazer cortes cegos e congelamentos nas prestações sociais, aparecer aqui a fazer um discurso a favor das prestações sociais contra o CDS que não tem qualquer adesão à realidade, porque o que o PS faz é cortar nas prestações sociais.
Para o PS, PSD e CDS este debate tem muita vantagem, porque, assim, escondem os verdadeiros responsáveis da crise, que não são o vizinho do lado, lá do bairro, que tem o rendimento social de inserção mas, sim, aqueles que lucraram com a crise, os grandes grupos económicos, a banca e o sector financeiro, e estes é que os senhores não querem que sejam atingidos pelas penalizações e pelas fiscalizações!
(…)
Sr. Presidente,
Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos,
O seu Governo anunciou, agora, que é preciso cortar no subsídio de desemprego porque os desempregados têm de procurar trabalho.
Esta é que é uma política social?! Esta é que é a vossa política social?!
Ou é exactamente o mesmo que o CDS e o PSD dizem?
Os senhores anunciaram, agora,…
Vão ouvir, até ao fim! Podem fazer o barulho que quiserem.
Anunciaram, agora, que vai haver um tecto para as prestações sociais. Isto é mais ou menos a mesma coisa que aquela a regra das três prestações, como diz o Dr. Paulo Portas. É que a partir daquele limite, tenham direito, ou não, não levam a prestação!
Então, esta é que é a vossa política social?!
Os senhores é que «abrem a porta» à direita com as políticas que fazem, porque fazem um discurso de defesa da política social e, depois, cortam nas prestações sociais, cortam nas reformas!
Srs. Deputados, eu vou assumir aqui tudo o que disse, porque é verdade — e todo o País sabe disso — que há uma utilização partidária do rendimento social de inserção, Isto é uma realidade em muitos sítios do País!

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