Projecto de Resolução N.º 362/XII/1.ª

Rejeição da proposta de reorganização dos cuidados hospitalares na Região Oeste

Rejeição da proposta de reorganização dos cuidados hospitalares na Região Oeste

O Governo apresentou uma proposta de reorganização dos cuidados hospitalares na Região Oeste, que integra os Concelhos de Alcobaça, Alenquer, Arruda dos Vinhos, Bombarral, Cadaval, Caldas da Rainha, Lourinhã, Mafra, Nazaré, Óbidos, Peniche, Sobral de Monte Agraço e Torres Vedras, abrangendo uma população de 440 mil habitantes, de acordo com os dados dos Censos de 2011.

Apesar de o Governo ter anunciado a elaboração da Carta Hospitalar há largos meses e que a reorganização hospitalar respeitaria os seus pressupostos, mesmo sem estudos, sem avaliação e sem a análise dos impactos no acesso aos cuidados de saúde, o Governo continua a propor alterações “à peça”, que no essencial vão ao encontro da austeridade imposta pelo Pacto de Agressão da troika, subscrito por PS, PSD e CDS-PP, visando um único objetivo – reduzir despesa pública na saúde “custe o que custar”, sobretudo aos utentes.

A Região Oeste tem atualmente dois centros hospitalares: o Centro Hospitalar de Torres Vedras, que integra o Hospital Distrital de Torres Vedras e o Hospital Dr. José Maria Antunes Júnior – Sanatório do Barro e o Centro Hospitalar do Oeste Norte (CHON) eu engloba o Hospital Distrital das Caldas da Rainha, o Hospital Bernardino Lopes de Oliveira – Alcobaça, o Hospital São pedro Gonçalves Telmo – Peniche e o Hospital Termal Rainha D. Leonor – Caldas da Rainha. A proposta apresentada pretende fundir estes centros hospitalares e criar um grande centro hospitalar – Centro Hospitalar do Oeste.

Enumeram como pressupostos da proposta de reestruturação dos cuidados de saúde no Oeste (porque para além da criação do Centro Hospitalar do Oeste, preveem também a fusão de Agrupamentos de Centros de Saúde, ACES Oeste Norte e Oeste Sul num único agrupamento para uma população de cerca de 400 mil habitantes), entre outros, a concentração, racionalização e otimização de recursos, a redução de custos e sustentabilidade económico-financeira e a proximidade e articulação dos cuidados prestados à população. Como veremos adiante, a eventual concretização desta reestruturação, conduzirá à redução de serviços e valências, ao maior afastamento das unidades de saúde das populações e à degradação dos cuidados de saúde prestados.

A lógica que sustenta esta proposta do Governo não assenta em critérios clínicos, de acessibilidade dos utentes à saúde e da qualidade dos cuidados prestados, mas única e exclusivamente em critérios de natureza economicista.

A proposta prevê para o Hospital Distrital de Torres Vedras a desclassificação das urgências médico-cirúrgicas para urgências básicas e o encerramento da maternidade e dos serviços associados, como a neonatologia e a obstetrícia/ginecologia, concentrando estes serviços no Hospital Distrital das Caldas da Rainha. A desclassificação das urgências só por si poderá ser determinante para a perda de outras valências e especialidades no Hospital de Torres Vedras. Pretendem pura e simplesmente encerrar o Hospital do Barro, com o consequente desmantelamento do serviço de pneumologia, de medicina física e reabilitação e a redução de capacidade ao nível dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica, nas consultas e internamentos.

Quanto ao Hospital Distrital das Caldas da Rainha, a concentração das urgências médico-cirúrgicas conduzirá a uma situação de rutura, devido ao aumento da afluência de utentes e do tempo de espera para o atendimento, tendo em conta que já hoje não assegura uma resposta eficaz e atempada à população que abrange. Preveem a perda de valências e especialidades deste hospital, nomeadamente a cirurgia geral, otorrino e a ortopedia.

O Hospital Termal, único no país e com uma água mineral ímpar pelas suas características, constitui uma mais-valia ao nível da saúde e um polo dinamizador da economia da região, pelo que deverá permanecer no Serviço Nacional de Saúde. Este hospital tem atualmente 1500 utentes por ano, já teve mais de 8 mil utentes por ano. Mas o interesse do Governo não é potenciar este importante património histórico e de saúde, nomeadamente através do investimento de cerca de 2 milhões de euros, para a sua requalificação, antes pretende privatizá-lo. Mais uma vez são os interesses privados que se sobrepõem aos públicos.

Para o Hospital de Peniche o que o Governo prevê na prática é o fim do hospital, transformando-o num grande centro de saúde, retirando-lhe o serviço de urgências básicas. Terá uma unidade de cuidados continuados e o centro de saúde será transferido para estas instalações.

Embora o Governo já tenha assumido publicamente, que a população dos Concelhos de Alcobaça e Nazaré serão referenciados para o Hospital de Leiria, no que diz respeito ao Hospital de Alcobaça, a perspetiva do Governo inscrita na referida proposta, é encerrar o internamento e transferir as urgências básicas para os cuidados de saúde primários, com a possibilidade da sua privatização, através da entrega das instalações à Santa Casa da Misericórdia.

A concentração e encerramento de valências hospitalares propostos pelo Governo para a Região Oeste não têm em consideração as insuficientes acessibilidades e mobilidade, nem a progressiva degradação das condições de vida da população, fruto dos cortes nos salários, reformas e pensões, das reduções das prestações sociais e do aumento dos preços de bens essenciais. Esta reestruturação na prática restringe e até impossibilita mesmo o acesso da população à saúde.

Um argumento recorrentemente utilizado para justificar a concentração de serviços pelo Governo é a “sustentabilidade económico-financeira”. O Governo esquece-se de referir os sucessivos anos de elevado subfinanciamento crónico das unidades hospitalares ou os atrasos nos pagamentos, que originaram o seu endividamento. Por exemplo, o Centro Hospitalar de Torres Vedras registou um resultado líquido negativo em 2011 superior a 9 milhões de euros, apesar de ter reduzido os custos em 10% face a 2010, o que corresponde a um corte orçamental superior a 23%. Para 2012 o Governo pretende aplicar novo corte.

Se existe uma situação económica e financeira desfavorável nos hospitais, esta deve-se principalmente aos incumprimentos e à política de desinvestimento no Serviço Nacional de Saúde de sucessivos Governos.

Tanto o Centro Hospitalar de Torres Vedras, como o CHON têm uma grande carência de profissionais de saúde, nomeadamente de médicos, devido às saídas, seja por aposentação ou outros motivos. Acrescendo a isto a restrição na contratação de trabalhadores, não restou outra alternativa, senão, a contratação de profissionais de saúde através de empresas de trabalho temporário, a custos muito superiores e sem vínculo à instituição. Em ambos os centros hospitalares o número de médicos contratados com outros vínculos é superior aos médicos com vínculo à instituição. No Centro Hospitalar de Torres Vedras existem 66 médicos com vínculo à instituição e 120 com outros vínculos, e no CHON existem 74 médicos com vínculo contra 88 com outros vínculos. Quanto a esta questão o Governo não propõe nenhuma solução. Aliás a fusão destes centros hospitalares não vai resolver o problema da falta de profissionais de saúde, antes irá contribuir para o seu agravamento.

Quer a criação do Centro Hospitalar do Oeste, quer a fusão dos ACES Oeste Norte e Oeste Sul, pretendem diminuir drasticamente os serviços, valências e a capacidade do Serviço Nacional de Saúde na Região Oeste, com graves prejuízos para toda a população abrangida, num contexto de agravamento e encarecimento do acesso à saúde, devido ao aumento brutal das taxas moderadoras, do custo dos medicamentos e do transporte de doentes não urgentes.

A proposta de reestruturação dos cuidados hospitalares na Região Oeste contraria o princípio constitucional do direito à saúde, dado que a sua concretização constituiria mais um elemento de privação do acesso à saúde para milhares de utentes.

O PCP não concorda com a proposta em causa, porque ela não corresponde a nenhum ganho em saúde, muito pelo contrário, constitui uma perda muito significativa no plano dos cuidados de saúde, para beneficiar as entidades privadas existentes na Região Oeste.

Defendemos a rejeição desta proposta de reestruturação dos cuidados hospitalares na Região Oeste e que o processo para a sua implementação deverá ser imediatamente suspenso. Propomos que o Governo desencadeie um processo de planeamento e organização dos serviços públicos de saúde, articulando os cuidados de saúde primários, continuados e hospitalares, envolvendo a comunidade local, os utentes, os profissionais de saúde e as autarquias, face às necessidades da população, dotando as unidades de saúde públicas dos meios e recursos humanos adequados para garantir uma resposta de qualidade e eficaz do Serviço Nacional de Saúde aos utentes da Região Oeste.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte

Projeto de Resolução

A Assembleia da República recomenda ao Governo que:

1. Rejeite e suspenda a reestruturação dos cuidados hospitalares da Região Oeste e inicie um processo de discussão e envolvimento da comunidade local (utentes, profissionais de saúde e autarquias) sobre a reorganização dos cuidados de saúde ao nível os cuidados de saúde primários, continuados e hospitalares e a sua articulação entre si, que possibilite adequar a resposta às necessidades da população.

2. Garanta uma rede de cuidados primários de saúde na região do Oeste apta a satisfazer as necessidades básicas das populações, assente na organização dos centros de saúde tendo por base o Concelho e que suspenda a criação de mega Agrupamentos de Centros de Saúde.

3. Atribua às unidades hospitalares e aos cuidados de saúde primários, os meios financeiros e profissionais de saúde necessários, com vínculo à função pública, para que assegurem a prestação de cuidados de saúde de qualidade.

Palácio de São Bento, em 6 de Junho de 2012

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