Intervenção de

Regiões de turismo - Intervenção de José Soeiro na AR

Regime jurídico das regiões de turismo

 

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:

Ao agendar para hoje o seu projecto de lei (n.º 417/X) que estabelece um novo regime jurídico das regiões de turismo, o Grupo Parlamentar do PCP dá cumprimento ao seu público compromisso de intervir no sentido de contrariar a declarada intenção do Governo de liquidar as actuais regiões de turismo, decretando, de forma arrogante, prepotente, antidemocrática e inconstitucional, a sua substituição por estruturas governamentalizadas, subordinadas ao poderoso patrão Turismo de Portugal, talhadas cirurgicamente à medida de mesquinhos interesses clientelares e partidários, estabelecidos ou a estabelecer, que têm como pano de fundo a transformação de importantes áreas da Reserva Ecológica Nacional e da Reserva Agrícola Nacional em vultuosos e especulativos negócios, verdadeiras coutadas para implantação de grandes projectos imobiliários, astutamente apresentados como projectos turísticos, certos de que a gula, a sofreguidão e também algum desespero do Governo em conseguir a qualquer preço promessas de investimentos e de criação de hipotéticos postos de trabalho, para contrapor à grave situação económica e ao galopante crescimento do desemprego que se verifica no País, levarão o diligente Ministro da Economia a transformá-los, num ápice, em projectos ditos de interesse nacional - os famosos PIN + ou PIN -, forma ardilosa de tornear e esvaziar de conteúdo os instrumentos de planeamento e ordenamento do território e de concentrar no Governo todo o poder de decisão, de forma absolutamente

ilegítima. Fica, assim, cumprido um dos desígnios deste agendamento: abrir o debate.

O debate plural, transparente, sério e democrático que, há muito, devia ter sido iniciado aqui, na Assembleia da República.

O debate que possa conduzir à construção de uma solução credível, ajustada às novas realidades, passível de merecer amplo consenso institucional e político e capaz de contribuir para a valorização e dignificação do sector e de todos aqueles que nele trabalham, das autarquias e das regiões de turismo por estas criadas, que tanto têm feito para a afirmação e evolução positiva do turismo em Portugal.

O debate a que o Governo tem fugido nos últimos dois anos, desde que o Ministro Manuel Pinho, de forma canhestra, por pura ignorância ou má fé, anunciou a extinção das regiões de turismo, através do PRACE, como se de uma qualquer repartição do seu Ministério se tratasse.

Sr.as e Srs. Deputados:

Esta é a resposta política aos golpismos do PRACE, que o Governo invoca para tentar, ao arrepio da Constituição, governamentalizar o que não pode nem deve ser governamentalizado.

Esta é a resposta política ao abuso do poder, ao assalto despudorado à descentralização, à manifesta inconstitucionalidade que caracteriza a tentativa do Governo de, por via de um absurdo, incoerente e vergonhoso decreto-lei, tentar usurpar às autarquias locais aquilo que sempre emanou da sua soberania e iniciativa e do seu livre e democrático associativismo intermunicipal.

Esta é a resposta política à opacidade, ao secretismo e à falta de seriedade política que têm caracterizado a acção governativa sobre esta importantíssima matéria, como o testemunha o facto de o Governo ouvir a Associação Nacional de Municípios Portugueses, a Associação Nacional das Regiões de Turismo, estruturas representativas do sector, na base de um projecto de decreto-lei e, depois, aprovar, sub-repticiamente, em Conselho de Ministro, sem qualquer nova consulta, uma proposta que contraria e afronta todas os pareceres que lhe foram expressos.

Que belo exemplo de democracia! Que belo exemplo de diálogo e de concertação! Que belo exemplo de respeito e consideração pelas opiniões solicitadas! Que belo exemplo de procura de amplos consensos!

Que vergonha, Sr.as e Srs. Deputados! Que vergonha que, depois de mais de 30 anos de liberdade e de democracia, seja possível um tal acto governativo!

Porque é de uma vergonha que se trata, uma vergonha sobre a qual VV. Ex.as devem reflectir, e bem, antes de decidirem o destino a dar ao projecto de lei que hoje discutimos. Porque ainda estamos tempo de abrir caminho a um processo legislativo democrático, transparente, com o envolvimento e real participação de todos os interessados, razão primeira deste agendamento e que está ao nosso alcance concretizar. Assim haja vontade política.

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:

O projecto de lei apresentado pelo Grupo Parlamentar do PCP, partindo da realidade actual, a existência de 19 regiões de turismo, e tendo no horizonte a criação e instituição de regiões administrativas, entidades a quem deve competir no futuro, que esperamos próximo, a definição das orientações no plano regional para a valorização, promoção e desenvolvimento equilibrado das potencialidades turísticas existentes, responde construtivamente a um amplo conjunto de preocupações e marca a substantiva diferença entre um projecto descentralizador, respeitador do poder local, inspirado no espírito e na letra da Constituição, e o projecto centralista, autoritário e inconstitucional do Governo.

Um projecto que confirma e consagra a soberania e a iniciativa do poder local na criação das regiões de turismo e a livre criação de federações destas como forma de responder à partilhada preocupação de não perder nada do que foi construído ao longo dos anos e de criar um novo impulso que assegure escala capaz de potenciar recursos e oportunidades, como o demonstra a positiva experiência do Alentejo, em contraponto com a liquidação administrativa, prepotente e anticonstitucional, das actuais regiões de turismo e marcas existentes e a imposição de um patrão todo poderoso, o Turismo de Portugal, que ainda terá que provar a justeza da sua existência, a imposição de novas marcas e, até, a localização das sedes como pretende o Governo.

Um projecto que clarifica e reforça as atribuições e competências das regiões de turismo e respectivas federações numa lógica descentralizadora e responsabilizante, em contraponto com a usurpação de poderes e o sistema de atribuição de competências dependente do estado de espírito da tutela governamental e que todos sabemos bem ao que conduz: ao clientelismo e ao compadrio.

Um projecto que propõe, de forma inovadora, a criação de um fundo de desenvolvimento turístico, a criar na base de um mínimo de 0,5% das receitas totais do turismo do ano anterior apuradas pelo Banco de Portugal, e um modelo objectivo e transparente para a sua distribuição, repondo um direito das autarquias ilegalmente usurpado no passado, em contraponto com a dependência do financiamento arbitrário, sem critérios objectivos, como tem sido imposto nos últimos anos e que o actual Governo quer consagrar como princípio, com a agravante de pretender criar um «saco azul» de 10%, a distribuir pela tutela governamental. É o regabofe da clientela.

Um projecto que reconhece e consagra a importante participação de todos os interessados, públicos e privados, que desenvolvem actividade em cada região no sector do turismo, na gestão e definição das orientações para o desenvolvimento turístico através de uma estrutura de direcção que tem presente as melhores, mais eficazes e comprovadas experiências.

Sr.as e Srs. Deputados,

O projecto que hoje discutimos é um projecto aberto, um ponto de partida que submetemos já a uma audição pública e que mereceu uma opinião positiva e genericamente favorável ao seu conteúdo por parte dos representantes de regiões de turismo, autarquias, estruturas associativas representativas do sector e técnicos qualificados na área do turismo, que nos honraram com a sua participação.

Venham agora as vossas críticas e venham, sobretudo, as propostas de alteração concretas, pois a nossa vontade é a de construir com todos a lei de que as regiões de turismo precisam para uma maior afirmação do turismo em Portugal.

(...)

Sr. Presidente,
Sr.ª Deputada Hortense Martins,

Começo por agradecer a pergunta que fez e a oportunidade que me dá de perguntar a si, ao seu partido e ao seu Governo por que razão há 19 regiões de turismo em Portugal. É voluntarismo, apenas? Ou é a correspondência com uma realidade objectiva que levou à sua constituição? Quem é que constituiu essas regiões de turismo? Deixo-lhe estas perguntas a si.

Ao Partido Socialista pergunto por que razão no Alentejo, precisamente onde o PCP tem a influência que tem, foi possível construir uma solução diferente daquela que existe no resto do País. É que no Alentejo há a Associação das Regiões de Turismo, que funciona para rentabilizar recursos humanos, recursos técnicos. É um exemplo que os senhores não foram capazes de aplicar no resto do País, porquê?

Antes de falarmos, devemos reflectir, porque, às vezes, o «telhado» é frágil e à primeira pedra «cai-nos em cima»!

Já respondi! Se ler com atenção, verificará que não está lá qualquer proposta de divisão das regiões de turismo, nem há duplicação. As federações assumem as funções das regiões de turismo quando as mesmas lhes são delegadas. Há um estímulo financeiro para a federação, que conduz, efectivamente, à possibilidade de agregar com cooperação, com respeito pelas marcas, com respeito pela realidade e, sobretudo, com respeito pelas pessoas, que é o que os senhores não estão a fazer!

Os senhores só querem impor, administrativamente e contra a Constituição, um modelo tutelado pelo Governo, governamentalizado, autocrático. Reflictam sobre isto!

Ainda hoje, tivemos aqui um bom exemplo: o Sr. Ministro Mário Lino, disse há uns tempos «jamais, jamais» e hoje teve de vir aqui reconhecer que tinha errado.

Mas os senhores ainda estão a tempo de emendar o erro. Como ainda não temos nada aprovado, há a possibilidade de abrir um debate sério, um debate construtivo. Era isso que o Partido Socialista devia fazer.

Em vez de se preocupar em, no fundo, apresentar uma proposta alternativa ou em discutir aqui, na Assembleia da República, esta questão, esconde-se nos gabinetes, violando frontalmente as opiniões daqueles que representam o turismo em Portugal, aqueles que construíram o turismo sério e não o turismo que o Governo se propõe alcançar.

(...)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,

Em primeiro lugar, devo dizer que creio que a forma como todos interviemos e a própria disponibilização, por parte do Bloco de Esquerda, deste tempo suplementar para o PCP mostram o empenho desta Câmara em promover o debate sério, democrático, plural que o tema exige.

De entre as muitas questões que foram suscitadas refiro, em particular, a que é relativa à área, pois quase podemos dizer que é a questão central nesta matéria.

A questão da área tem solução. Estamos perante um projecto. Vamos discuti-lo e iremos dar resposta a essa questão. Não é difícil!

Por exemplo, o Sr. Deputado Ceia da Silva sabe que a disponibilidade não foi apenas manifestada pelo PS e pelo PCP, sabe que o próprio PSD, os agentes económicos, o poder local, as regiões de turismo envolvidas, todos estiveram envolvidos na discussão da construção de uma solução para o Alentejo. Portanto, é possível construir soluções.

Se o problema é existirem actualmente 19 regiões e haver o risco de passarem a ser 21, partamos das 19, façam-se as alterações nesse sentido e avance-se, mas deixem passar o diploma para ser discutido em comissão.

É que se estão a desafiar-nos para discutir e, depois, fecham a porta, dizendo que não há espaço para fazer a discussão, então, o que querem? Se todos queremos discutir a sério, nesta Câmara, então, venha a proposta do Governo que nós cá estamos para admiti-la e discuti-la com toda a abertura, em conjunto com o nosso próprio diploma, para encontrarmos a tal resposta que é exigida para o desenvolvimento do turismo em Portugal.

O debate tem de ser feito com as regiões de turismo que existem, com o poder local democrático que existe, com todas as pessoas que estejam interessadas no sector, porque o sector merece-o.

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