Intervenção de

Regiões de turismo - Intervenção de José Soeiro na AR

Declaração política, sobre a importância do poder local na definição das regiões de turismo e de condenação da proposta de novo regime jurídico que o Governo apresentou sobre as mesmas

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:

Uma vez mais a Assembleia da República está em vias de ser confrontada e afrontada com a política de factos consumados que tem caracterizado a acção do actual Governo.

Uma vez mais os factos demonstram à saciedade que o tão propalado discurso da participação, da disponibilidade para o diálogo, da abertura à procura de consensos o mais amplos possíveis, de respeito pela vontade democrática dos interessados, não passa de publicidade enganosa, de letra morta, de forma ardilosa de enganar os mais incautos.

Esperava-se, atendendo à importância da matéria, das instituições envolvidas e do peso económico e social do sector, um debate aberto, sério e, sobretudo, o respeito por uma realidade construída ao longo de muitos anos, com o empenho e a dedicação de muitos homens e mulheres de todos os quadrantes políticos; esperava-se que o Governo percebesse que estava a percorrer um caminho errado e reconsiderasse a forma pouco digna como vinha a conduzir este processo; esperava-se que o Governo pusesse fim ao secretismo que tem caracterizado a sua acção nesta matéria há dois longos e intermináveis anos e compreendesse, finalmente, que a melhor forma de construir uma solução credível, ajustada às novas realidades, passível de merecer amplo consenso institucional e político, capaz de contribuir para a valorização e a dignificação do sector e das instituições que tanto têm feito para a sua valorização e reconhecimento, quer no plano nacional quer no plano internacional, era apresentar nesta Assembleia um proposta de lei que abrisse caminho a um processo legislativo democrático, transparente, com o envolvimento real e participado de todos os interessados.

 Mas não foi este o caminho escolhido pelo Governo! Cego e surdo a todos os sinais, de forma prepotente, colocando mais uma vez à frente dos interesses do sector, das regiões e do País os interesses obscuros que se movimentam em torno de muitos dos chamados projectos de interesse nacional, os famosos PIN e PIN+, e cedendo às pressões de pequenos poderes partidários instalados, o Governo não resistiu à tentação de provocar um verdadeiro «golpe de estado» no sentido de tentar governamentalizar o que não pode nem deve ser governamentalizado.

É desta fraude monumental, deste abuso do poder, deste assalto despudorado à descentralização, registado como «projecto de Decreto-Lei n.º 667/2007» no livro de registo de diplomas da Presidência do Conselho de Ministros, em 11 de Dezembro de 2007, que estou a falar.

Sim, Sr.as e Srs. Deputados, é das Regiões de Turismo que estou a falar; é da manifesta inconstitucionalidade desta tentativa do Governo de usurpar às autarquias aquilo que sempre emanou da sua iniciativa, do seu livre e democrático associativismo intermunicipal.

Tratar as regiões de turismo como se fossem uma qualquer dependência do Ministério da Economia, ignorar o papel determinante do poder local nestas estruturas, destruir marcas que levaram anos e anos a afirmar e procurar impor, em sua substituição, verdadeiros «paus-mandados» do Governo a funcionar a «toque de caixa» do todo-poderoso Turismo de Portugal não só não é uma atitude própria de um governo democrático e de um Estado de direito digno desse nome como revela a arrogância e a prepotência de quem pretende impor uma tal situação.

É desta burla inqualificável de pedir parecer à Associação Nacional das Regiões de Turismo e à Associação Nacional de Municípios Portugueses sobre um projecto de decreto-lei, e depois aprovarem em Conselho de Ministro um documento absolutamente distinto do primeiro, que estou a falar!

É desta trapaça monumental de andarem a anunciar ao País durante meses e meses consecutivos a criação de cinco regiões de turismo, correspondendo às cinco NUTS II hoje existentes, e agora, sem corarem de vergonha, apresentarem um País retalhado em 12 estruturas, sem qualquer coincidência territorial com as NUTS existentes e cuja avaliação mostra o arbítrio e a irracionalidade que está na base desta opção.

Arbítrio e irracionalidade esses que têm, entretanto, uma estratégia bem evidente: fazer do Douro, do Oeste, da Serra da Estrela, do Litoral Alentejano e de Alqueva verdadeiras reservas de PIN e PIN+ à custa das nossas reservas agrícola e ecológica, transformadas em chorudas negociatas, coutadas à mercê dos grandes interesses imobiliários e especulativos, torneando os instrumentos de gestão territorial e deitando por terra as mais elementares regras de planeamento e ordenamento do território.

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados,

O PCP, que por diversas vezes colocou ao Governo a importância de apresentar uma proposta de lei-quadro das regiões de turismo nesta Câmara como forma de dignificar estas importantíssimas estruturas, que tiveram no passado, têm no presente e devem continuar a ter no futuro um papel insubstituível na defesa e valorização do nosso património turístico e que avançou atempadamente com o seu próprio projecto de lei, cujo agendamento irá propor já para o início de Janeiro, não pode deixar de condenar veementemente o comportamento retrógrado e antidemocrático expresso através do projecto do Decreto-Lei n.º 667/2007 o qual ficará para a história do turismo português como uma nódoa negra que nenhuma solução, por mais milagrosa que seja, será capaz de apagar.

A desautorização em Conselho de Ministros da proposta que andou a propalar por todo o País põe a nu a fragilidade do actual Ministro da Economia cuja intervenção pública constitui um permanente e cada vez maior embaraço para o Governo.

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista está confrontado com um de dois caminhos: ou alinha em todo este embuste assumindo o papel acrítico e de caixa de ressonância do Governo  ou assume o seu estatuto e contribui para que a Assembleia da República, no quadro das suas competências próprias intervenha no sentido de impedir o desenvolvimento deste processo e de construir com a participação real de todos os interessados a lei-quadro das regiões de turismo de que Portugal precisa, uma lei que consagre atribuições e competências claras, financiamento adequado e uma estrutura de direcção onde o poder local continue a ter papel primordial e onde continuem a ter assento os verdadeiros representantes do turismo regional.

Aqui fica o desafio!

 (...)

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados,

Obrigado, Sr. Deputado Mendes Bota pelas questões que colocou. São muitas, o tempo é escasso, amanhã teremos oportunidade de continuar o debate e aprofundá-lo, mas, apesar do pouco tempo, não posso deixar de dizer-lhe no essencial o seguinte: o Governo passou meses e meses, para não falar em dois anos, a falar nesta Câmara em dar coerência ao território, em avançar com estruturas tendo em vista a futura regionalização que correspondesse às NUTS II.

O Sr. Ministro da Economia passou todo o seu tempo, durante meses consecutivos, a anunciar às estruturas, um pouco por todo o lado, que iríamos ter regiões de turismo de níveis correspondentes às NUTS II, ou seja, cinco regiões de turismo. Foi desautorizado em Conselho de Ministros e acabou por apresentar um projecto de decreto-lei que - é preciso sublinhar isto -, na verdade, é uma fraude inaceitável, porque apresentaram um projecto à Associação Nacional de Municípios Portugueses e à Associação Nacional das Regiões de Turismo, e depois aprovaram outro, completamente diferente, como hoje vem anunciado na comunicação social. E se olharmos com atenção para as propostas das regiões de turismo encapotadas, porque o Governo não teve a coragem de assumir isso, elas não são cinco mas são 10 mais duas, são 12!!

Esta é que é a realidade!...

Portanto, alguém do Partido Socialista que nos diga quais são as diferenças de competências ou de poderes que estão atribuídas no projecto de decreto-lei, em relação às chamadas regiões de turismo e às chamadas outras estruturas regionais de turismo. O que nós temos é um mapa feito por medida, um mapa que tem claramente o objectivo de corresponder à área de influência dos PIN e, naturalmente, a servir interesses que nada têm a ver com o desenvolvimento nem do turismo, nem da regionalização e nem do País. E é a isto que temos de estar atentos!

Aliás, se juntarmos a este diploma outros diplomas que andam a circular - estou a lembrar-me do regime jurídico dos empreendimentos turísticos -, claramente, vimos que há uma estratégia que nada tem a ver com a defesa do turismo nem com o desenvolvimento do turismo.

(...)

Sr. Presidente,
Sr.ª Deputada Hortense Martins,

Agradecendo as questões que me colocou, lembro-lhe, em primeiro lugar, que há muito tempo que o Grupo Parlamentar do PCP propôs, na Comissão de Economia, a vinda do Sr. Ministro para discutir o PRACE. Esperámos dois anos pelo cumprimento de um requerimento aprovado em comissão, mas que nunca foi concretizado porque o Sr. Ministro fugiu, com a cumplicidade do Partido Socialista!

Em segundo lugar, apresentámos um projecto de lei e aguardamos que o Governo ou a bancada do Partido Socialista avançassem com uma proposta que permitisse um debate sério, honesto e transparente nesta matéria. Até hoje, só através da comunicação social sabemos quais são as intenções do Governo.

O Governo fugiu sempre a vir a esta Câmara prestar contas do que anda a fazer nesta matéria! E não venham com indicadores. Vamos ao concreto!

A Sr.ª Deputada referiu que «o País está pulverizado»... Naturalmente, também partilhamos da ideia de que é excessivo existirem 19 regiões de turismo, mas, atenção, o que os senhores estão a querer fazer não é aglutinar!

Vamos ao Alentejo! Durante anos, trabalhou para criar uma região de turismo do Alentejo, tendo-se associado as quatro regiões de turismo que aí intervêm. Qual é a vossa proposta? A vossa proposta é dividir o Alentejo em três, sem qualquer coerência territorial ou correspondência à realidade!

É o Alentejo do sequeiro e é o Alentejo do regadio! É o Alentejo de 35 municípios e é o Alentejo de Alqueva e é o Alentejo do litoral! Isto não é sério! Era bom que os senhores medissem bem os passos que vão dar a seguir e que a bancada do Partido Socialista abrisse os olhos e compreendesse que ainda está a tempo de intervir no sentido de corrigir o mau caminho pelo qual o Governo quer levar o turismo em Portugal!

É preciso ter em conta que há uma realidade que emana do poder local e que temos de respeitar as autarquias e as regiões de turismo. E os senhores não estão a respeitar!

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