Nota da Comissão Política do PCP

Reforma Agrária: Emprego, produção, desenvolvimento

, constitui um objectivo e uma condição necessária ao
progresso do país.
Condição tanto mais premente quanto a dependência externa, a agudização do processo de liquidação do aparelho produtivo nacional, o desemprego crescente (mais de 700 mil trabalhadores) e o défice alimentar dão expressão à crise económica e social do país.

Em 9 de Fevereiro de 1975, o PCP realizou, em Évora, a I Conferência dos Trabalhadores Agrícolas do Sul. Mais de trinta mil trabalhadores, idos dos distritos de Évora, Beja, Portalegre,  Setúbal e Santarém,  participaram na Conferência e no comício de encerramento.

A Conferência e as decisões nela tomadas colectivamente, entre as quais se destacava a de avançar para uma «Reforma Agrária que entregue a terra a quem a trabalha», constituíram o primeiro grande passo no caminho da construção concreta da Reforma Agrária, substituindo o desemprego e a miséria pela produção, o trabalho e o pão.
Aquele importante acontecimento coroava a difícil, persistente e corajosa luta, na qual esteve sempre presente o PCP organizando-a e dirigindo-a, levada a cabo durante décadas pelo proletariado agrícola do Sul, sob a consigna «A Terra a quem a Trabalha» que foi parte relevante do combate travado pelo povo português contra a ditadura fascista que, por isso, a reprimiu violentamente, com perseguições, prisões e torturas de milhares de trabalhadores, em que pontuaram os assassinatos dos militantes comunistas Alfredo Lima, em Alpiarça, em 1950, Catarina Eufémia, em Baleizão, em 1954 e José Adelino dos Santos, em Montemor-o-Novo, em 1958.

Tratou-se da decisiva e impetuosa arrancada para a liquidação do latifúndio secular explorador e opressor que – com as suas herdades que iam dos 1000 aos 10 mil hectares e em que os 500 maiores proprietários possuíam mais terra do que os 500 mil mais pequenos – fora um sustentáculo fundamental do regime fascista e era, na nova situação da Revolução saída do 25 de Abril, um poderoso sustentáculo da contra-revolução.

A Reforma Agrária não foi a caricatura que dela fizeram muitos daqueles que ao longo dos anos tentaram reescrever a história. Tratou-se da resposta necessária à situação entretanto criada, em que a sabotagem económica pelos agrários se havia generalizado; em que os gados ou eram abandonados ou eram levados clandestinamente para Espanha; em que as culturas eram abandonadas, a azeitona não era apanhada e olivais e searas eram incendiados; em que as máquinas eram tiradas das explorações; em que o desemprego aumentava e, tal como no passado, a fome voltava a instalar-se nas casas dos trabalhadores.

Tratou-se de, com a Reforma Agrária, concretizar um programa de transformação económica e de justiça social, necessidade objectiva para a resolução dos problemas da produção e do emprego nos campos do Sul.

Ao assinalar os 35 anos do início do processo transformador da Reforma Agrária, o PCP valoriza um processo que, em menos de um ano, mudou a face do Sul do País, com a ocupação e cultivo de mais de 1 milhão de hectares de terras, que aumentou a área cultivada com o desbravamento das grandes extensões de terras abandonadas e incultas, incrementando a produção e incorporando na sua actividade uma perspectiva de desenvolvimento.

Ao assinalar os 35 anos do início daquela que foi conhecida como «a mais bela conquista da revolução» - conquista que a Constituição da República Portuguesa,  aprovada em 2 de Abril de  1976, viria a consagrar  - o PCP valoriza o momento em que, pela primeira vez na história do nosso país, trabalhadores libertados da exploração tomaram conta da terra, organizaram e dirigiram a produção agrícola e conseguiram a transformação completa das estruturas agrárias, a diversificação e o progresso da produção, a liquidação do desemprego e a melhoria radical das suas próprias condições de vida.

Ao assinalar os 35 anos do início dessa obra colectiva, o PCP sublinha o momento, como poucos na História de Portugal, em que milhares de homens e mulheres tomaram nas suas mãos os seus destinos, exactamente porque, como afirmou Álvaro Cunhal nessa 1ª Conferência “A Reforma Agrária surge natural como a própria vida, aparece como necessidade objectiva de resolver o problema do desemprego e da produção, como solução indispensável e única”.

Ao assinalar os 35 anos do início dessa heróica jornada, o PCP lembra que ela só foi vencida pela ofensiva destruidora e criminosa contra a Reforma Agrária - iniciada pelo primeiro Governo PS/Mário Soares, em particular com a tristemente célebre Lei Barreto, e prosseguida pelos que se lhe seguiram – que se caracterizou, do início ao fim, não apenas pela violação da legalidade, mas também pela ilegalidade assumida como instrumento de acção. Acção cuja violência ficou bem expressa no assassinato dos militantes comunistas José Geraldo(Caravela) e António Maria Casquinha.

Assinalar os 35 anos do acto inicial da Reforma Agrária em Portugal é, para o PCP,  um momento de afirmação da sua importância histórica e do seu contributo, naquele momento, para o desenvolvimento do Sul do País, com profundo impacto no plano nacional, e para sublinhar a actualidade da exigência da realização de uma profunda alteração fundiária que concretize, nas actuais condições, uma reforma agrária nos campos do sul que liquide a propriedade latifundiária e que garanta o uso e posse da terra a quem a trabalhe.

Uma nova Reforma Agrária é, de facto, uma exigência do presente.
Exigência, para defender a produção nacional. Num tempo marcado pelo imenso défice estrutural de produção de bens agro-alimentares, num momento de forte abandono dos campos e das produções, quando, pelas regras da Política Agrícola Comum e imposições da União Europeia, umas poucas centenas de grandes agrários recebem milhões de euros sem que lhes seja exigida a produção de um grama sequer de alimentos, uma nova Reforma Agrária será o caminho para agarrar as potencialidades produtivas de milhares de hectares  que hoje ou estão  a monte ou mal aproveitados, ou servem apenas para reserva de caça, com os impactos que tal poderia ter na agro-indústria a montante e a jusante.

Exigência, para combater a desertificação daqueles campos e da região. Perante a expectativa cada vez mais evidente do desemprego - há mais de vinte anos com a destruição da Reforma Agrária e hoje em resultado da continuada política de direita - foram muitos milhares os que abalaram das suas terras, em demanda de melhores condições de vida. Uma nova Reforma Agrária criará emprego, abrirá novas perspectivas para a população do Alentejo.

Exigência, para garantir a posse nacional daqueles campos e o aproveitamento adequado das capacidades dos solos, prevenindo, designadamente, os efeitos negativos da exploração intensiva, e a utilização para fins agrícolas das infraestruturas entretanto conseguidas, entre as quais o Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva e, sem prejuízo do seu adequado aproveitamento energético e turístico, impedindo a transformação da região envolvente num gigantesco campo de golf, nas mãos de capital estrangeiro.

Para assinalar os 35 anos da Reforma Agrária nos campos do Sul, o PCP realizará este ano diversas iniciativas, das quais se destaca desde já, a Sessão Pública, em Montemor-o-Novo, no próximo dia 17 de Fevereiro, pelas 18 horas, em que intervirá o Secretário-Geral do PCP, Jerónimo de Sousa.

Evocar, 35 anos passados, a I Conferência dos Trabalhadores do Sul, é assinalar um acontecimento maior da Revolução de Abril e, por isso, um acontecimento carregado de futuro.

É, ao mesmo tempo, relembrar a Reforma Agrária como relevante conquista da Revolução e como componente indispensável da democracia e do desenvolvimento de Portugal.

E é, por tudo isso, sublinhar que, no futuro democrático de Portugal, com a luta dos trabalhadores rurais e do povo, a Reforma Agrária nos campos do Sul – com a liquidação do latifúndio e a entrega da terra a quem a trabalhe – é uma necessidade imperativa e incontornável.

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