Projecto de Lei N.º 313/XIII/2.ª

Reforça a proteção dos arrendatários em caso de cessão de contrato de arrendamento

Reforça a proteção dos arrendatários em caso de cessão de contrato de arrendamento

(Terceira alteração à Lei n.º 6/2006, de 27 fevereiro, alterada pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto e pela Lei n.º 79/2014, de 19 de dezembro-Novo Regime de Arrendamento Urbano)

I

As alterações ao Regime de Arrendamento Urbano introduzidas pelo Governo PSD/CDS conduziram à precarização do direito à habitação, ao fragilizar os direitos dos inquilinos e arrendatários; e levaram ao encerramento de inúmeros estabelecimentos comerciais, em particular pequenas lojas dos bairros e das localidades em todo o território e criaram inúmeras dificuldades para centenas de coletividades. PSD e CDS impuseram normas para facilitar os procedimentos de despejo, através do Balcão Nacional do Arrendamento; aumentaram brutalmente os valores de renda, incomportáveis para muitas famílias face aos seus rendimentos; e retiraram garantias de transmissibilidade, reduzindo assim a estabilidade no direito à habitação.

Nestes quatro anos de aplicação do regime do arrendamento urbano a avaliação é profundamente negativa. De março de 2014 a junho de 2016 deram entrada 10.405 processos de despejo no Balcão Nacional de Arrendamento, tendo sido despejadas 4.423 famílias. De facto, não estamos perante uma lei que promove o acesso à habitação na vertente de arrendamento, mas uma lei de despejo, como o PCP e bem a caracterizou em 2012.

É o direito à habitação, consagrado na Constituição da República que é negado, com a liberalização do dito “mercado de arrendamento”.
PSD e CDS foram aduzindo falsos argumentos para justificar estas alterações, como a dinamização do “mercado de arrendamento”, a promoção da mobilidade das pessoas, a redução do endividamento das famílias e do desemprego ou a requalificação das cidades e dinamização do setor da construção. Mas na verdade a verdadeira intenção do anterior Governo, como a realidade confirma, foi criar um instrumento que serve os interesses dos senhorios, do capital financeira e da sua atividade especulativa no imobiliário, em detrimento dos interesses dos inquilinos e dos arrendatários e o direito à habitação, consagrado constitucionalmente.

O Novo Regime do Arrendamento Urbano imposto por PSD e CDS é injusto e desigual, ao retirar direitos à parte mais fraca no processo – os inquilinos e os arrendatários, ficando os senhorios com um poder desmesurado para unilateralmente aumentar o valor das rendas ou para despejar os inquilinos e arrendatários. Uma lei que conduziu ao agravamento das condições de vida de muitas famílias, a acrescer às inúmeras dificuldades já sentidas decorrente da degradação das condições económicas e sociais, para além de contribuir também para o crescimento da pobreza, do desemprego e da exclusão social.

As famílias de mais baixos rendimentos, as famílias de idosos e as famílias, cujo agregado familiar integre um elemento com incapacidade superior a 60% são as mais afetadas. Por isso é também uma lei que introduz ainda mais assimetrias ao atirar milhares de famílias dos centros das vilas e cidades para as periferias.

II

O PCP entende que o direito à habitação deve ser concretizado através de adequadas políticas promovidas pelo Estado, assim como o Estado deve apoiar o pequeno comércio tradicional e as coleticvidades de desporto, cultura e recreio, pela importante função social que desempenham.

Reconhecemos igualmente o importante papel que o comércio local tem em diversas localidades. É parte integrante da vida dos bairros antigos das vilas e cidades, para além de constituir uma atividade económica relevante e representar milhares de postos de trabalho.

Consideramos que a solução definitiva para pôr fim às injustiças e desigualdades que resultam do regime de arrendamento urbano passa, naturalmente pela criação de um novo modelo assente numa perspetiva de salvaguardar o direito à habitação, as atividades económicas, as entidades de cariz comunitário e social e simultaneamente promover a reabilitação urbana e a dinamização das vilas e cidades, permitindo a fixação de novas pessoas nos centros das localidades. No entanto fase à emergência em que se encontram muitas famílias e à urgência de proteger os inquilinos e arrendatários, o Grupo Parlamentar do PCP propõe um conjunto de iniciativas legislativas que alteram cirurgicamente o regime de arrendamento urbano e que resolvem problemas concretos sentidos pelos inquilinos e arrendatários, sem perder de vista a necessidade de uma intervenção mais profundo, dando tradução institucional ao compromisso que assumiu com os inquilinos e arrendatários.

Uma das alterações introduzidas por PSD e CDS foi a facilitação dos mecanismos para a cessão do contrato de arrendamento, deixando muitas vezes, inquilinos e arrendatários em situações de enorme fragilidade. Praticamente por decisão unilateral dos senhorios, estes podem iniciar o processo de cessão do contrato de arrendamento.

De forma a proteger os inquilinos e arrendatários, assim como salvaguardar o direito à habitação, a atividade económica desenvolvida pelos pequenos estabelecimentos comerciais e a atividade cultura, desportiva e recreativa das coletividades de cultura e recreio que são parte constituinte de determinada comunidade, o Grupo Parlamentar do PCP propõe o reforço da proteção dos inquilinos e arrendatários através da necessidade da
notificação pessoal de resolução do contrato ao inquilino ser feita por mandato para o efeito; da comunicação para o mesmo efeito, mas feita por carta, só se poder considerar realizada caso o destinatário se tenha recusado a receber ou não a ter levantado nos prazos previstos no regulamento dos serviços postais; tratando-se de casa de morada de família a notificação deve ser feita para ambos os membros do casal, sob pena de ineficácia; da possibilidade de o arrendatário requerer um título executivo para os efeitos legais caso as dívidas atinjam os montantes previstos na legislação, a alteração de prazos prevalecendo os direitos dos cidadãos e a eficácia dos procedimentos, designadamente nos casos de denúncia pelo senhorio ou denúncia justificada.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República e da alínea c) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo-assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º
Alteração à Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro
Novo Regime do Arrendamento Urbano

Os artigos 9.º, 10.º, 12.º, 14.º e 14.º-A da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, alterada pela
Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto e pela Lei n.º 79/2014, de 19 de dezembro, passam a ter a
seguinte redação:

«Artigo 9.º
[Formas da comunicação]

1- (…).
2- (…).
3- (…).
4- (…).
5- (…).
6- (…).
7- A comunicação pelo senhorio destinada à cessação do contrato por resolução, nos
termos do n.º 2 do artigo 1084.º do Código Civil, é efetuada mediante:
a) (…);
b) Contacto pessoal de advogado, solicitador ou agente de execução, comprovadamente
mandato para o efeito, sendo feita na pessoa do notificando, com entrega de duplicado da
comunicação e cópia dos documentos, que a acompanhem, devendo o notificando assinar
o original;
c) (…).

Artigo 10.º
[Vicissitudes]
1- A comunicação prevista no n.º 1 do artigo anterior considera-se realizada ainda que:
a) A carta seja devolvida por o destinatário se ter recusado a recebê-la;
b) …).
2- O disposto no número anterior não se aplica às cartas que:
a) (…);
b) (…);
c) Seja devolvida por não a ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços
postais.
3- (…).
4- (…).
5- (…).

Artigo 12.º
[Casa de morada de família]
1- Se o local arrendado constituir casa de morada de família, as comunicações previstas no
n.º 2 do artigo 10.º devem ser dirigidas a cada um dos cônjuges, sob pena de ineficácia.
2- (…).
3- (…).

Artigo 14.º
[Ação de despejo]
1- (…).
2- (…).
3- (…).
4- (…).
5- Se, dentro do prazo referido no número anterior, os montantes referidos no número
anterior não forem pagos ou depositados, o senhorio pode pedir uma certidão dos autos
relativa a estes factos, a qual constitui título executivo para efeitos de despejo do local
arrendado, na forma de processo executivo comum para entrega de coisa certa.

Artigo 14.º A
[Título Executivo]
1- Não sendo o locado desocupado na data devida por lei ou convenção das partes, podem
servir de base à execução para entrega de coisa certa:

a) Em caso de cessação por revogação, o contrato de arrendamento, acompanhado do
acordo previsto no n.º 2 do artigo 1082º do Código Civil;
b) Em caso de caducidade pelo decurso do prazo, não sendo o contrato renovável por ter
sido celebrado para habitação não permanente ou para fim especial transitório, o contrato
escrito donde conste a fixação desse prazo;
c) Em caso de cessação por oposição à renovação, o contrato de arrendamento,
acompanhado do comprovativo da comunicação prevista no artigo 1097.º do Código Civil;
d) Em caso de denúncia por comunicação, o contrato de arrendamento, acompanhado dos
comprovativos das comunicações previstas na alínea c) do artigo 1101.º do Código Civil e
no artigo 1104.º do mesmo diploma;
e) Em caso de resolução por comunicação, o contrato de arrendamento, acompanhado do
comprovativo da comunicação prevista no n.º2 do artigo 1084.º do Código Civil, bem
como, quando aplicável, do comprovativo, emitido pela autoridade competente, da
oposição à realização da obra;
f) Em caso de denúncia pelo arrendatário, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 31.º, o
comprovativo da comunicação da iniciativa do senhorio e o documento de resposta do
arrendatário.

2- O contrato de arrendamento é título executivo para a ação de pagamento de renda
quando acompanhado do comprovativo de comunicação, com eficácia, ao arrendatário do
montante em dívida.

3- O requerente terá de comprovar o pagamento do imposto de selo do contrato de
arrendamento ou a declaração das rendas para efeitos de IRS ou IRC.

4- As rendas que se forem vencendo na pendência da ação de despejo devem ser pagas ou
depositadas.»

Artigo 2.º
70.ª Alteração ao Código Civil
São alterados os artigos 1083.º, 1084.º, 1094.º, 1101.º e 1103.º do Código Civil aprovado
pelo Decreto-Lei n.º 47 344, de 25 de novembro de 1966 que passam a ter a seguinte
redação:

«Artigo 1083.º
[Fundamento da resolução]
1- (…).
2- (…).
3- É inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento em caso de mora igual ou
superior a três meses no pagamento da renda, encargos ou despesas que corram por conta
do arrendatário ou de oposição por este à realização de obra ordenada por autoridade
pública, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 3 a 5 do número seguinte.
4- É ainda inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento no caso de o arrendatário
se constituir em mora superior a oito dias, no pagamento da renda por mais de quatro
vezes seguidas, ou seis interpoladas, num período de 12 meses, com referência a cada
contrato, não sendo aplicável o disposto nos n.ºs 3 e 4 do número seguinte.
5- (…).

Artigo 1084.º
[Modo de operar]
1- (…).
2- A resolução pelo senhorio quando fundada em causa prevista nos n.ºs 3 e 4 do artigo
anterior, bem como a resolução pelo arrendatário, operam por comunicação à contraparte
donde conste fundamentadamente, sob pena de ineficácia:
a) Invocação e descrição da obrigação incumprida;
b) Informação de que, no caso de falta de pagamento de renda, encargos ou despesas que
corram por conta do arrendatário nos termos do n.º 3 do artigo anterior, a resolução fica
sem efeito se o arrendatário puser fim à mora no prazo de dois meses.
3- Revogado.
4- (…).
5- Fica sem feito a resolução fundada na oposição pelo arrendatário à realização de obra
ordenada por autoridade pública se, no prazo de 60 dias, cessar essa oposição.

Artigo 1094.º
[Tipos de contratos]
1- (…).
2- (…).
3- No silêncio das partes, o contrato considera-se celebrado por prazo certo, pelo período
de cinco anos.

Artigo 1101.º
[Denúncia pelo senhorio]
O senhorio pode denunciar o contrato de duração indeterminada nos casos seguintes:
a) (…);
b)- (…);
c) Mediante comunicação ao arrendatário com antecedência não inferior a cinco anos
sobre a data em que pretenda a cessação.

Artigo 1103.º
[Denúncia justificada]
1- A denúncia pelo senhorio com qualquer dos fundamentos previstos nas alíneas a) e b)
do artigo 1101.º é feita mediante comunicação ao arrendatário com antecedência não
inferior a um ano sobre a data pretendida para a desocupação e da qual conste de forma
expressa, sob pena de ineficácia, o fundamento de denúncia.
2- (…).
3- (…).
4- N situação prevista no número anterior, a desocupação tem lugar no prazo de 60 dias
contados da receção da confirmação, salvo se não se encontrar decorrido o prazo previsto
no n.º 1, caso em que a desocupação tem lugar até ao termo do último dos prazos.
5- (…).
6- A invocação do disposto na alínea b) do artigo 1101.º. obriga o senhorio, mediante
acordo e em alternativa:
a) A garantir o realojamento do arrendatário em condições análogas às que este já detinha,
quer quanto ao local quer quanto ao valor da renda e encargo;
b) Ao pagamento de uma indemnização correspondente a cinco anos de renda, sendo esta
determinada nos termos das alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 35.º do NRAU.
7- (…).
8- A indemnização devida pela denúncia referida no n.º 7 deve ser paga, sob pena de
ineficácia da denúncia, 50%, nos oito dias após comunicação, e a parte restante no ato da
entrega do locado.
9- (…).
10- (…).
11- (…).»

Artigo 3.º
Regime transitório
Aos contratos de arrendamento ainda existentes até à entrada em vigor do NRAU e que
ainda se mantenham em regime vinculativo ou de perpetuidade, não lhes são aplicáveis as
normas do NRAU.
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, em 3 de outubro de 2016

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