Intervenção de João Ramos na Assembleia de República

Recomenda ao Governo que solicite à Comissão Europeia que retire da agenda a alteração do Regulamento (CE) n.º 1331/2008, do Parlam. Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, e que irá permitir o uso de polifosfatos ao processo de salga do pescado

(projeto de resolução n.º 468/XII/2.ª)
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Discutimos, hoje, um projeto de resolução que recomenda ao Governo que intervenha junto da Comissão Europeia no sentido da suspensão do processo de introdução de fosfatos na cura do bacalhau.
Esta proposta da Comissão surgiu a partir de uma proposta da Dinamarca, da Islândia e da Noruega, estes últimos países não-membros da União Europeia — convém lembrar.
O processo que se pretende introduzir parece afetar apenas o nosso País e não traz qualquer melhoria ao introduzir na cura do bacalhau um produto sintetizado artificialmente. O que claramente fazem os fosfatos é aumentar o peso do peixe, e pode ser esse o interesse dos exportadores: vender água a preço de bacalhau!
Para além disso, ao dificultar o processo de secagem, acarreta maiores custos no processo sobrecarregando as empresas industriais portuguesas e, certamente, os consumidores.
Em Portugal, há unanimidade quanto à recusa deste novo procedimento. Todos os Deputados portugueses no Parlamento Europeu subscreveram uma missiva ao Comissário Dali manifestando o seu desacordo com a medida e solicitando intervenção para a sua não implementação.
O Partido Comunista Português, através dos seus Deputados no Parlamento Europeu, tem vindo a intervir no sentido de esclarecer o processo e as implicações desta medida. Também aqui, na Assembleia da República, apoiaremos este projeto do PS, em coerência com a nossa posição: Portugal tem que manifestar claramente em Bruxelas que não aceitará a entrada no País de bacalhau com fosfatos.
Contudo, a unanimidade dos partidos políticos contra a introdução de fosfatos na cura do bacalhau não nos deve inibir de refletir sobre os contornos deste processo. Países exteriores à União Europeia propõem alterações que afetam países membros e a União assume essas alterações mesmo contra os interesses desses países membros.
Isto remete-nos para duas constatações.
Desconhecemos as medidas tomadas pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros no âmbito dos contactos bilaterais com a Noruega em torno deste processo. A diplomacia económica não pode ser apenas uma estrutura de propaganda para o Ministro Portas. Ou o Ministério dos Negócios Estrangeiros abdicou de contactos bilaterais, deixando nas mãos da União Europeia a defesa dos interesses de Portugal perante países terceiros? Se assim é, o caso que hoje discutimos é um bom exemplo de que essa é a pior opção para Portugal.
Os partidos que têm governado o País enquanto decorre o processo de adesão e integração europeias estão agora contra esta medida, e isso é positivo. Mas isto não esconde as suas responsabilidades. Os processos de aprofundamento do federalismo europeu e a eliminação de mecanismos que o País tinha para impedir decisões comunitárias contra o seu interesse, como o direito de veto, têm sido opções do PS, do PSD e do CDS.
Estas opções, a que chamaram «mais Europa», não têm resolvido os problemas do País nem da União Europeia, mas deixaram Portugal à mercê das vontades dos donos da Europa e até de países terceiros ao processo europeu. É por isso que o PCP sempre tem dito que, antes de discutirmos se queremos mais ou menos Europa, temos de discutir que Europa e para que fim.

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