Projecto de Resolução N.º 932/XII/3.ª

Recomenda ao Governo que promova a declaração de nulidade ou a anulação dos contratos de permuta financeira (swap) celebrados entre entidades públicas empresariais e instituições financeiras

Recomenda ao Governo que promova a declaração de nulidade ou a anulação dos contratos de permuta financeira (swap) celebrados entre entidades públicas empresariais e instituições financeiras

Ao longo dos anos, diversas empresas públicas recorreram à celebração de contratos swap com motivações que iam muito além da simples cobertura de risco de taxa de juro. Apesar dos alertas, nomeadamente do Tribunal de Contas, relativamente aos riscos excessivos e à utilização imprudente de dinheiros públicos, o anterior Governo, do PS, não implementou mecanismos adequados de acompanhamento e controlo, dando cobertura à proliferação desta prática lesiva do interesse público.

Estes contratos swap, muitos deles de natureza especulativa, revelaram-se altamente ruinosos para o Estado. Em junho de 2011, as perdas potenciais para as empresas públicas ascendiam já a 1.648 milhões de euros. Apesar do atual Governo ter conhecimento, desde a sua tomada de posse, da gravidade do problema, não atuou de forma decisiva, permitindo que as perdas potenciais fossem aumentando. Em setembro de 2012, altura em que o IGCP assumiu a responsabilidade pela gestão da carteira de swaps das empresas públicas, as perdas potenciais atingiam os 3.142 milhões de euros. Nestes 14 meses, entre junho de 2011 e setembro de 2012, de quase total inação do Governo PSD/CDS, as perdas potenciais cresceram a um ritmo médio de 3,6 milhões de euros por dia.

Só a partir de setembro de 2012 é que se deu início à recolha sistemática de informação sobre os swaps e à sua análise, levada a cabo pelo IGCP, assessorado por uma empresa de consultadoria financeira – a StormHarbour – e por um consultor legal – a Sociedade de Advogados Cardigos.

Em outubro de 2012, na posse de todos os elementos e de pareceres técnicos financeiros e jurídicos, preparados pela StormHarbour e pela Cardigos, o Governo PSD/CDS optou por negociar com os bancos o cancelamento de 69 contratos swap, a maioria dos quais de natureza especulativa, pagando-lhes, entre março e junho de 2013, a avultada soma de 1.008,5 milhões de euros. Ao mesmo tempo que cortava salários e pensões, que reduzia ou mesmo eliminava prestações sociais, que prosseguia o desmantelamento das funções sociais do Estado, que impunha um inqualificável saque fiscal aos rendimentos do trabalho, que esmagava os portugueses e a economia nacional com a sua política de exploração e empobrecimento, o Governo decidia, mais uma vez, favorecer os interesses da banca em detrimento do interesse público, entregando-lhe mais de mil milhões de euros pelo cancelamento de contratos swap.

Impunha-se uma outra opção, a de a utilizar todos os meios legal e politicamente admissíveis para promover, consoante os casos, a declaração de nulidade ou a anulação dos contratos swap celebrados entre empresas públicas e instituições financeiras, eliminando as perdas potenciais que lhes estavam associadas.

A este propósito interessa assinalar que a consultora jurídica Cardigos, no seu parecer, anexo ao Relatório do IGCP, concluía que as empresas públicas não tinham capacidade para celebrar as operações identificadas pelo IGCP como sendo de natureza especulativa na medida em que a prática desses atos conduzia à inobservância do objeto social e à violação de limites legais e estatutários. Em consequência, de acordo com a Cardigos, a nulidade dos contratos swap especulativos podia ser arguida a todo o tempo por qualquer interessado e implicava a destruição retroativa de todos os seus efeitos, nomeadamente, a restituição de tudo o que tivesse sido prestado ao abrigo do negócio jurídico nulo.

O Governo PSD/CDS optou por não enfrentar as instituições bancárias que haviam celebrado contratos swap com as empresas públicas, preferindo entregar-lhes mais de mil milhões de euros pelo cancelamento dos swaps em vez de recorrer, designadamente à via judicial para declarar a sua nulidade.

Afirma o Governo – falsamente – que esta opção não teve custos para os contribuintes. Na realidade, o Governo ao mesmo tempo que procedia ao cancelamento dos contratos swaps das empresas públicas, desfez também a carteira de swaps do IGCP, relativa à cobertura de risco da dívida da República. Contudo, o montante recebido pelo cancelamento dos swaps do IGCP era uma receita do Estado, que, pela natureza dos contratos swaps envolvidos, não seria posta em causa pelas instituições financeiras. Assim, essa receita iria sempre materializar-se: imediatamente, se o Estado e a banca optassem pelo cancelamento dos swaps; ou gradualmente, ao longo dos próximos anos, à medida que os swaps atingissem a maturidade. Foi esta receita do Estado que o Governo utilizou para pagar à banca pelo cancelamento dos swaps das empresas públicas.

Se a opção do Governo tivesse sido a de promover a declaração de nulidade ou a anulação dos contratos swap celebrados entre empresas públicas e instituições financeiras, o Estado eliminaria – total ou parcialmente – as perdas potenciais associadas a esses swaps, poupando centenas de milhões de euros ao erário público. Quanto às receitas dos swaps da dívida pública contratados pelo IGCP, manter-se-iam como receitas do Estado e poderiam ter sido utilizadas para outros fins.

Conclui-se, assim, que a opção do Governo de pagar à banca pelo cancelamento dos swaps das empresas públicas foi contrária ao interesse público (e, consequentemente, favorável ao interesse das instituições bancárias envolvidas), traduzindo-se num avultado custo para o o povo português e para o país.

Os swaps cancelados entre março e junho de 2013, em resultado de uma “negociação” com a banca contrária ao interesse público, não esgotam contudo o universo de todos os swaps contratados pelas empresas públicas. De fora ficaram os contratos swaps celebrados com o Banco Santander, caraterizados pela consultora jurídica Cardigos, no seu parecer, como especulativos, muito especulativos e extremamente especulativos. De acordo com o Relatório do IGCP, as perdas potenciais associadas aos swaps celebrados com esta instituição financeira atingiam, em setembro de 2012, o valor de 1.426 milhões de euros.

Impõe-se, relativamente aos contratos swap celebrados por empresas públicas e que ainda se encontram ativos, uma abordagem radicalmente diferente daquela usada com os demais swaps. O Governo não pode continuar a pagar à banca pelo cancelamento destes contratos. Na estrita defesa do interesse público, deve utilizar todos os meios política e legalmente admissíveis para promover, consoante os casos, a declaração de nulidade ou a anulação dos contratos swaps, eliminando as perdas potenciais associadas.

Assim, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte:

Resolução

A Assembleia da República recomenda ao Governo que, na estrita defesa do interesse público, utilize todos os meios política e legalmente admissíveis para promover, consoante os casos, a declaração de nulidade ou a anulação dos contratos de permuta financeira (swap) celebrados entre entidades públicas empresariais e instituições financeiras, nacionais ou internacionais, eliminando as perdas potenciais que lhes estão associadas.

Assembleia da República, em 31 de janeiro de 2014

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