Projecto de Resolução N.º 912/XII/3ª

Recomenda ao Governo que o Ministério da Saúde assegure diretamente a gestão da linha saúde 24 e salvaguarde os direitos dos enfermeiros

Recomenda ao Governo que o Ministério da Saúde assegure diretamente a gestão da linha saúde 24 e salvaguarde os direitos dos enfermeiros

A Linha Saúde 24 assumiu-se como um importante serviço público no encaminhamento de utentes para receberem cuidados de saúde, segundo a sua patologia e aconselhamento sobre as ações a desenvolver Contudo, este serviço público de saúde é gerido num modelo de parceria público-privada, tendo sido concessionado a uma entidade privada (atualmente a Linha de Cuidados de Saúde SA, LCS).

Na Linha Saúde 24 trabalham cerca de 400 trabalhadores, na sua esmagadora maioria enfermeiros que fazem o atendimento telefónico aos utentes. Muitos enfermeiros desempenham estas funções há mais de 10 anos, sem nunca terem tido um vínculo laboral estável. Os enfermeiros estão em regime de prestação de serviços (vulgo recibos verdes) ilegalmente, uma vez que desempenham funções permanentes, têm um horário de trabalho e têm uma hierarquia. Só pertencem ao quadro os supervisores.

Portanto, há anos que este serviço público é prestado por profissionais de saúde em situação de precariedade, sem que os seus direitos estejam garantidos.

Os enfermeiros já fizeram uma queixa à Autoridade para as Condições de Trabalho a denunciar a sua situação laboral, à qual ainda não obtiveram resposta.

Recentemente a LCS impôs uma redução salarial aos trabalhadores, nomeadamente de 20% no valor por hora e de 50% no valor por hora nos fins de semana, feriados, trabalho noturno e trabalho diurno especial.

Mais: para atingir os seus objetivos a empresa está a exercer junto dos profissionais de saúde uma pressão e chantagem vergonhosa para aceitarem estas condições, ameaçando com o despedimento. Vieram inclusive a público notícias que dão nota de que a LCS já está a despedir enfermeiros e que quem não aceitar não integrará as escalas de serviço já no mês de fevereiro.

Caso os enfermeiros não aceitem a redução salarial, a LCS prepara-se para substituí-los por outros sem conhecimento e experiência no atendimento num “call center” na área da saúde. A qualidade do serviço público prestado pode estar colocada em causa, atendendo às especificidades do desempenho destas funções e ao facto da Linha Saúde 24 muitas vezes constituir o primeiro contacto do utente com um serviço de saúde e funcionar como uma triagem no encaminhamento dos utentes para o estabelecimento de saúde mais adequado face à sua patologia.

Na sequência do concurso público, a gestão da Linha Saúde 24 foi adjudicada a um consórcio constituído pela LCS, a Optimus e a Teleperfomance. O critério que prevaleceu na adjudicação foi o preço mais baixo, reduzindo para mais de metade o valor pago por chamada (de 16€ para pouco mais de 7€).

A redução do custo do pagamento por chamada pretende-se que seja à custa da redução da remuneração dos enfermeiros. Diminui-se o valor por hora do trabalho dos enfermeiros, numa clara desvalorização do seu trabalho e aumento da exploração destes trabalhadores.

O Ministério da Saúde, sendo a entidade adjudicatária da Linha Saúde 24 e que estabelece as condições para a prestação deste serviço público de saúde, não se pode demitir das suas responsabilidades nesta matéria. O Governo deve intervir no sentido de garantir a qualidade do serviço prestado pela Linha Saúde 24 e os direitos dos profissionais de saúde. E a qualidade está intimamente associada à estabilidade e à motivação dos trabalhadores. Podemos afirmar que sem trabalhadores com direitos a qualidade está claramente comprometida.

A Linha Saúde 24 no contexto da prestação de cuidados de saúde é um serviço estratégico. Assume muitas vezes o primeiro contacto do potencial doente com os serviços de saúde, que o encaminha para a resolução do seu problema de saúde. No quadro do Serviço Nacional de Saúde, um serviço com esta relevância não pode ser gerido por empresas privadas que existem para garantir o lucro na sua atividade. Portanto, reduzir salários que por si já são baixos, de acordo com as responsabilidades dos enfermeiros neste serviço e manter na precariedade quase a totalidade destes, é desvalorizá-los profissional, social e materialmente.

Neste sentido, defendemos que a Linha Saúde 24 deve ser gerida diretamente por um serviço sob tutela direta do Ministério da Saúde, com profissionais de saúde integrados numa carreira com vínculo público, pondo fim a esta parceria público privada. E, no imediato, entendemos que os enfermeiros da Linha Saúde 24 que desempenham funções permanentes, com horário de trabalho e estão subordinados a uma hierarquia devem ser integrados no quadro, com vínculo efetivo e não podem ser sujeitos a uma redução salarial.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projeto de
Resolução

A Assembleia da República recomenda ao Governo que:

1. No imediato, enquanto entidade adjudicatária da Linha Saúde 24, intervenha no sentido de salvaguardar a qualidade do serviço prestado e os direitos dos enfermeiros, através da sua contratação com vínculo efetivo, sem redução de direitos, nem de condições remuneratórias.
2. Que inicie um processo de integração da gestão da linha saúde 24 no Setor Público Administrativo, garantindo a sua conclusão no prazo máximo de um ano, assumindo a transferência da totalidade dos trabalhadores, de acordo com o quadro legal em vigor.
3. No período de transição para o Setor Público Administrativo, os encargos do Estado com a linha saúde 24, garantem apenas os recursos necessários para a prestação do serviço público de saúde e a manutenção dos postos de trabalho.

Assembleia da República, em 17 de janeiro de 2014

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